Análise da presença da atividade da enzima alfa-amilase salivar em cães
Anne Karoline Mendes da Silva
1
*; Natan Dias de Oliveira
2
; Elber Gomes Sousa
3
; Valéria Magro Octaviano
Bernis4; Walter
Octaviano Bernis Filho5
DOI: https://doi.org/10.35699/2447-6218.2020.25948
Resumo
A alfa-amilase salivar é uma enzima unida ao cálcio que inicia a digestão de carboidratos tanto na cavidade oral como no
vestíbulo da boca. Em animais, a alfa-amilase é secretada pelo tecido pancreático de todos os vertebrados e pela glândula
salivar de alguns, entretanto, estudos sobre a presença da atividade da alfa-amilase na saliva de cães são escassos e
contraditórios entre literaturas. Diante isso, o objetivo dessa pesquisa foi identificar a presença da atividade da enzima alfa-
amilase salivar em cães. O protocolo usado para a determinação da enzima foi o descrito no kit colorimétrico específico e
adaptado, sendo utilizado como base o método colorimétrico. Nesta metodologia, foi utilizado um kit de reagentes para
determinação da atividade da amilase, onde a amostra de saliva foi incubada com o substrato amido e aquecida em temperatura
de 38,9°C, para simular a temperatura média do corpo de um cão. Pela adição da solução iodada, o amido não hidrolisado adquire
coloração azul que diminui proporcionalmente à atividade enzimática, sendo comparado com um controle. Com os resultados
obtidos dessa pesquisa, é possível concluir que, ao realizar a análise laboratorial das amostras colhidas, foi possível observar
que não há presença significativa da alfa-amilase na saliva de cães que seja capaz de hidrolisar o amido.
Palavras-chave
: Amido. Atividade enzimática. Saliva.
Analysis of the presence of activity salivary alpha-amylase enzyme in dogs
Abstract
Alpha-amylase is an enzyme united to calcium that initiates the digestion of carbohydrates in the oral cavity as well as in oral
vestibule. In animals, alpha-amylase is secreted by the pancreatic tissue of all vertebrates and by the sali- vary glands of
some. However, it is observed that studies on the presence of alpha-amylase activity in the saliva of dogs are scarce and
contradictory between literatures. Accordingly, the aim of this investigation was to identify the presence of alpha-amylase
enzyme in dogs. The protocol used to determine the enzyme was described in the specific colorimetric kit and adapted, being
used as a basis the modified colorimetric. In this methodology, a reagent kit was used to determine amylase activity, where the
saliva sample was incubated with starch substrate and heated to a tem- perature of 38,9°C, to simulate a dog›s average body
temperature. By adding the iodine solution, the non-hydrolyzed starch acquires a blue color that decreases proportionally to the
enzymatic activity, being compared with a control. With the results obtained from this research, it is possible to conclude that,
when performing the laboratory analysis
1Instituto Federal do Norte de Minas Gerais. Salinas, MG. Brasil.
https://orcid.org/0000-0002-9494-1500
2Instituto Federal do Norte de Minas Gerais. Salinas, MG. Brasil.
https://orcid.org/0000-0001-5446-6744
3Secretaria de Saúde, Setor de Vigilância Epidemiológica, Canil Municipal. Salinas, MG. Brasil.
https://orcid.org/0000-0003-1296-2904
4Instituto Federal do Norte de Minas Gerais. Salinas, MG. Brasil.
https://orcid.org/0000-0001-8248-160X
5Instituto Federal do Norte de Minas Gerais. Salinas, MG. Brasil.
https://orcid.org/0000-0001-6553-6808
*Autor para correspondência: annemendes300@gmail.com
CADERNO DE CIÊNCIAS AGRIAS
Agrarian Sciences Journal
2
Silva, A. K. M. et al.
of the samples collected, it was possible to observe that there is no significant presence of alpha-amylase in the saliva of dogs
that is capable of hydrolyzing starch.
Keywords:
Enzymatic activity. Saliva. Starch.
Introdução
Durante o processo de domesticação dos animais,
quando sua alimentação passou a ser controlada por ho-
mens,
eles tiveram várias funções, desde fonte de alimento próxima ao
homem, proteção contra outros animais, caça
a pragas e
atualmente considerados membros da família (Ogoshi, et al.
2015).
enzima. Na citação de Reece (2017), descreve a presença
da
enzima alfa-amilase na saliva de cães e gatos.
Diante dos questionamentos e divergências na
literatura sobre a presença da atividade da enzima alfa-a-
milase na saliva de cães, torna-se importante o desenvol-
vimento de pesquisas que esclareçam essa dúvida. Dessa
forma, com os resultados desse trabalho, objetivou-se
identificar a presença da atividade da enzima alfa-amilase
salivar em cães, tornando este, um estudo com potencial para
o conhecimento futuro relacionado à digestão de
alguns
animais monogástricos, como a melhora no balan- ceamento e
composição de rações incluindo carboidratos.
Com essa proximidade, com o aumento de pro-
dução de rações no país e devido à melhora do poder
aquisitivo de proprietários, cães e gatos, passaram a obter
alimentos mais sofisticados do que os que eram oferecidos
anteriormente, havendo uma importante modificação na
sua
alimentação nas últimas décadas. Com isso, estudos
referentes à digestão alavancaram, desde pesquisas re-
ferentes à ingestão de alimentos até a sua eliminação.
Material e métodos
Dentre os nutrientes necessário que estão na
alimentação desses animais, podemos notar que os car-
boidratos estão presentes em grandes quantidades em
alimentos secos e semiúmidos para gatos e, principalmente
para
cães, tornando-o o princípio nutricional em maior
quantidade na maioria dos alimentos secos para essas
espécies (NATIONAL RESEARCH COUNCIL, 2006).
Colheita de amostras:
Para este estudo foram analisadas amostras de
saliva
oriundas de animais do Canil Municipal de Salinas-
-MG. O protocolo experimental desse trabalho foi apro-
vado pela Comissão de Ética na Utilização dos Animais
(CEUA) do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais sob
o protocolo de número 07/2020.
Embora não seja um nutriente essencial, os car-
boidratos o bem utilizados e digeridos nessas espécies,
fornecendo uma fonte útil de energia e glicose. Na dieta dos
cães, a fonte energética com base nos carboidratos pode
reduzir a necessidade da proteína (Brown, 2009).
Foram colhidas onze amostras de cães sem raça
definida, dos quais cinco eram machos e seis eram meas. Os
animais recebiam diariamente ração comercial e água
à
vontade. Foi realizada a correta contenção física dos
animais, e com o auxílio de luvas e swab (zaragatoa), as
amostras foram colhidas do vestíbulo da boca dos cães
(todas simultaneamente no período da manhã) (Figura 1).
Fichas com as identificações do animal, sexo e tipo de
alimentação foram preenchidas (Tabela 1).
Sendo assim, é importante que haja um bom
aproveitamento dos carboidratos pelos animais, e, se- gundo
Moriel et al., (2010), o processo de quebra dessas grandes
moléculas se inicia na boca com a mastigação, onde o acesso
às enzimas salivares facilita sua digestão.
Em seguida, o swab foi inserido em microtubo
tipo
Eppendorf (tubo de microcentrífuga) para depositar a saliva.
Os microtubos haviam sido anteriormente identi- ficados e
colocados 2 mL de solução NaCl 0,9%. Os swabs
e luvas
utilizadas foram descartados e todo o material coletado foi
acondicionado em caixa de isopor com gelo,
para serem
conduzidos ao laboratório e armazenados em
congelador de
geladeira e mantidos congelados (-10°C) para posterior
determinação da presença da atividade da enzima alfa-
amilase salivar.
Dentre as enzimas estudadas no processo diges- tivo
dos carboidratos, podemos pontuar a alfa-amilase
salivar e a
amilase pancreática. A alfa-amilase salivar, era
conhecida
antigamente como ptialina e é uma enzima que pode
começar a clivar as ligações alfa-1,4 glicosí- dicas entre as
moléculas de glicose no amido (REECE, 2017), porém,
observa-se em animais que estudos sobre a presença da alfa-
amilase na saliva de cães são escassos e contrários entre
literaturas.
Análise laboratorial:
Nos animais onívoros, como ratos e porcos é ci-
tada a presença dessa enzima que digere amido (KLEIN,
2014). Nos animais carnívoros, como cães e gatos é citada,
mas
como ausente (Júnior; Lima; Saad, 2006). Existem opiniões
divergentes quanto a presença ou ausência da
As análises foram feitas 24 horas após a coleta,
sendo conduzidas em laboratório do Complexo de Aten-
dimento Clínico Veterinário do Instituto Federal do Norte
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Análise da presença da atividade da enzima alfa-amilase salivar em cães
de Minas Gerais (IFNMG) Campus Salinas, localizado na
Fazenda Varginha, Rodovia MG-404, Km 02, Salinas-MG.
Os microtubos do tipo Eppendorf foram descongelados em
temperatura ambiente.
Figura 1 Colheita de saliva através de swab (zaragatoa) no vestíbulo oral dos cães
Tabela 1 - Identificação dos animais que foram coletadas as amostras
Cão/amostra
C1
C2
C3
C4
C5
C6
C7
C8
C9
C10
C11
Identificação
Baia 08-H
Baia 16-P
Baia 16-P
Baia 16-P
Baia 15-O
Baia 15-O
Baia 15-O
Baia 13-M
Baia 13-M
Baia 04-D
Baia 11-K
Sexo
Macho
Fêmea
Fêmea
Fêmea
Macho
Fêmea
Fêmea
Macho
Macho
Fêmea
Macho
Alimentação
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
Ração comercial
O protocolo usado foi o descrito no kit colorimé-
trico específico (Amilase Colorimétrica K003, Bioclin,
Quibasa Química Básica Ltda®, Belo Horizonte, MG,
Brasil) e adaptado, sendo utilizado como base o método
colorimétrico modificado proposto por Caraway (1959),
onde
a amostra de saliva é incubada com o substrato amido
(Reagente 1) e aquecida em temperatura de 38,9°C, para
simular a temperatura média do corpo de um cão. Pela
adição da solução iodada (Reagente 2), o amido ainda não
hidrolisado, adquire coloração azul que diminui
proporcionalmente à atividade enzimática, sendo comparado
com um controle.
técnica empregada com o aspecto de saliva reagente,
como demonstra a figura 3.
Os tubos do tipo Falcon foram separados e identi-
ficados. Também foi adicionado um tubo controle. Com base
nas instruções do kit colorimétrico, foram distribuí- dos 0,5
mL do reagente 1 em cada tubo, que foram
mantidos por
dois minutos em banho-maria à 38,9°C. Ao
serem retirados
do banho-maria, foram adicionados 10
µL de cada amostra
em cada tubo. O controle não obteve
nenhuma adição. Em
seguida foram homogeneizados e mantidos em banho-maria
por sete minutos e trinta segundos a 38,9°C (Figura 2).
A saliva humana possui constante atividade da
enzima digestiva alfa-amilase (GUYTON; HALL, 2011).
Foi realizado um teste inicial com saliva humana, se-
guindo detalhadamente o método inicial, validando a
A análise da presença da atividade da enzima alfa-
-amilase salivar foi feita mediante a retirada dos tubos e
visualização macroscópica da coloração da amostra após
adicionar 0,5 mL do reagente 2 e homogeneizar.
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Silva, A. K. M. et al.
Figura 2 Amostras em banho-maria
Resultados e discussão
drolisado (a coloração da amostra salivar apresentou-se
amarela) validou a técnica empregada e foi comparado com
o controle (Figura 3).
A amostra de saliva humana empregada com o
resultado colorimétrico, macroscópico, do amido hi-
Figura 3 Amostra de saliva humana hidrolisada
Ao realizar a análise laboratorial das amostras
colhidas à campo dos onze animais, nenhuma apresen- tou
resultados colorimétricos significativos da atividade
enzimática. Ao adicionar o reagente 2, pode-se notar que
as amostras apresentaram a mesma coloração que o
controle e
as cores eram proporcionais entre si, indicando assim a
ausência da atividade da enzima alfa-amilase que
tenha a
capacidade de quebrar o amido. Isso pode ser evidenciado
na figura 4.
também que a quantidade de alfa-amilase salivar era
ausente ou muito baixa (Pasha, et al., 2018).
Conclusão
Com os resultados desse trabalho podemos con- cluir
que ao realizar a análise laboratorial das amos- tras
salivares, colhidas de cães do Canil Municipal de Salinas-
MG, foi possível observar que não há presença significativa
da alfa-amilase na saliva de cães que seja capaz de
hidrolisar o amido.
O resultado obtido contradiz o que foi pontuado por
Reece (2017) e Contreras-Aguilar et al., (2017), mas corrobora
com outros autores (Júnior; Lima; Saad, 2006;
Klein, 2014).
Em trabalho realizado onde analisavam a composição de
proteínas na saliva de cães, foi relatado
Aprovação do Comitê de Ética
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética no Uso
de Animais (CEUA) do Instituto Federal do Norte de Minas
Gerais sob número 07/2020.
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Análise da presença da atividade da enzima alfa-amilase salivar em cães
Figura 4 Amostra com resultado negativo para a atividade da enzima.
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