apenas reforça a ideia do devekut como um meio, e não um fim último no processo religioso do hassídico,
do judeu orante, e provavelmente do próprio Baal Shem Tov, na idealização do compositor.
A palavra devekut, do ídiche dveykes, significa comunhão com o Transcendente, e aparece inúmeras vezes
em sermões e ensinamento hassídicos. Entretanto, há uma intensa discussão sobre o conceito de devekut
entre os estudiosos da área. Atualmente, é mais amplamente aceite que não há uma conceção
unidimensional, e que para além da conexão com Deus, o termo pode também identificar estados de intensa
concentração ou de apego ao divino. Trata-se de uma experiência individual que, para alguns, pode significar
uma experiência de viver com Deus, enquanto para outros representa o temor do paraíso (Mayse e Reiser
2018).
O caminho para a transcendência é uma experiência individual. Entretanto, o nigun serve como um
reservatório (ou um recetáculo) para favorecer o processo individual e coletivo. Embora o processo seja
íntimo e particular, o nigun enquanto experiência comunitária recebe um impulso adicional através do
movimento e, eventualmente, da dança (Seroussi 2017).
Na imagem (Figura 12), uma fotografia de Bloch, vê-se uma paisagem com uma montanha e nuvens. Ernest
Bloch, além de compositor, era um fotógrafo amador. Algumas fotografias suas, por exemplo, consistem em
imagens de árvores, e receberam nomes de compositores, como Bach – a partir de uma perceção do próprio
compositor e fotógrafo, que registou a legenda sem maiores explicações. A figura proposta foi uma
fotografia realizada pelo compositor em Chatêl, França, no ano de 1935. Para os autores do artigo, poderia
perfeitamente servir como analogia para o orante, em pé como uma montanha, e o processo de
transcendência acima dele, em direção ao superior. Propõe-se um paralelo com a obra Nigun e o movimento
do próprio compositor, em busca de um sentido transcendente.
Os gestos musicais reproduzem uma forma de comportamento humano que liga o sujeito ao meio exterior.
Os ritos e ritmos ajudam o indivíduo a estabelecer interações sociais, a comunicar-se e a situar-se (Marothy
1993-1994). No processo de transcendência, há o desligamento da materialidade e a busca da conexão com
o superior.
A obra de Bloch é pautada pela autenticidade e expressividade. A análise musical e técnica, realizadas de
uma forma academicamente normativa, acaba por ser pouco representativa. O próprio compositor rejeitava
a ideia do virtuosismo sem sentido, que pouco teria a ver com seu trabalho. Na primeira metade do século
XX, Bloch observou o crescente interesse por composições cerebrais, que refletiam uma obsessão dos
compositores por técnica e procedimento. Entretanto, ele persistia em sua construção de uma música que
emanasse de uma raça, de um povo – uma forma de expressão da alma. Além disso, valorizava o artista,
dando-lhe indicações, em suas composições, para que o intérprete tivesse seu frescor de sensações e
pudesse executar uma obra com sinceridade e liberdade. Dessa forma, o compositor incluía espaços para
que o intérprete tivesse seus gestos de alguma liberdade (cadenza, ad lib), prevendo momentos de
expressividade, essenciais para o sentido musical de sua obra (Bloch e Frank 1933).
Program music? Let it be! The essential thing is that musical logic be observed… I have done
my best in that direction. Moreover, most of my works have been inspired by a poetic or
philosophical idea, even sometimes unconsciously. Art for me is an expression, an