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eISSN 2317-6377
Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do
frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e
Egberto Gismonti entre 1965 e 2003
Overview of the ways of playing Baião, Maracatu and Frevo on drums in
recordings by Hermeto Pascoal and Egberto Gismonti between 1965 and 2003
Christiano Lima Galvão
Pesquisador independente, Rio de Janeiro (RJ), Brasil
infocgalvao@gmail.com
SCIENTIFIC ARTICLE
Section Editor: Ronan Gil de Morais e Luís Bittencourt
Layout Editor: Edinaldo Medina
License: "CC by 4.0"
Submitted date: 21 apr 2023
Final approval date: 16 oct 2023
Publication date: 20 dec 2023
DOI: 10.35699/2317-6377.2023.45902
RESUMO: Este artigo traça um amplo panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações
de Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti entre 1965 e 2003. Usando como procedimentos metodológicos a transcrição musical e
a análise descritiva, este texto lança luz sobre trechos de performances de relevantes bateristas brasileiros como Airto Moreira,
João Palma, Robertinho Silva, Zé Eduardo Nazário, Nenê, Alfredo Dias Gomes e Márcio Bahia. Com relação ao referencial teórico,
a pesquisa se apoia no trabalho de Franco Fabbri (1980) sobre gênero musical. O texto conclui que o baião, o maracatu e o frevo
na bateria estiveram expressivamente presentes na discografia de Hermeto e Egberto no período estudado, e que a contribuição
dos seus bateristas foi fundamental para a consolidação dos modos de execução destes gêneros musicais na música instrumental
brasileira.
PALAVRAS-CHAVE: Bateria; Hermeto Pascoal; Egberto Gismonti; Gênero musical; Música instrumental brasileira.
ABSTRACT: This article provides a broad overview of the ways of playing Baião, Maracatu and Frevo on the drum set in recordings
by Hermeto Pascoal and Egberto Gismonti between 1965 and 2003. Using musical transcription and descriptive analysis as
methodological procedures, this text sheds light on excerpts of performances by relevant Brazilian drummers such as Airto
Moreira, João Palma, Robertinho Silva, Eduardo Nazário, Nenê, Alfredo Dias Gomes and Márcio Bahia. Regarding the theoretical
framework, the research is based on the work of Franco Fabbri (1980) on musical genre. The text concludes that Baião, Maracatu
and Frevo on the drums were significantly present in the discography of Hermeto and Egberto in the period studied, and that the
contribution of their drummers was fundamental to the consolidation of the ways of playing these musical genres in the Brazilian
jazz.
KEYWORDS: Drums; Hermeto Pascoal; Egberto Gismonti; Musical genre; Brazilian jazz.
Per Musi | Belo Horizonte | v.24 | Section RePercussions | e232427 | 2023
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
1. Introdução
As variadas formas de execução de ritmos nordestinos na bateria, levando em consideração os diversos
aspectos da performance, encontram no âmbito da música instrumental brasileira um campo bastante fértil
e criativo. É importante salientar que considero música instrumental brasileira, ou simplesmente, música
instrumental, aquele gênero musical que surgiu entre o final dos anos 1960 e início dos anos 1970 no qual
instrumentistas e compositores sedimentaram uma linguagem musical que articulava gêneros populares
brasileiros em diálogo, explícito ou não, com estilos do jazz, entre outras correntes (Bastos e Piedade 2006,
935). Desta forma, a sedimentação da música instrumental ao longo da década de 1970 se deu por diversos
fatores como, por exemplo, as condições mercadológicas da indústria fonográfica no Brasil, o contexto da
música brasileira produzida na época, as diversas correntes estilísticas do jazz nos Estados Unidos e a atuação
de compositores e instrumentistas brasileiros (Bastos e Piedade 2006, 935; Bahiana 2005, 1). Dentre os
fatores citados, posso dizer também que as obras musicais de Egberto Gismonti e Hermeto Pascoal
exerceram um papel importante no processo de consolidação da sica instrumental, servindo como pilares
fundamentais do gênero. Não obstante, estes pilares não teriam uma estrutura adequada se não fossem
apoiados também nas colaborações dos instrumentistas que gravaram boa parte de suas obras, destacando
aqui os bateristas e percussionistas.
Deste modo, este texto propõe focar na discografia de Egberto Gismonti e Hermeto Pascoal, lançando luz
sobre a execução da bateria no que tange à interpretação do baião, maracatu e frevo. A escolha dessa
investigação se deu por algumas razões. A primeira delas é pelo fato de trabalhar com o estudo da
performance de ritmos nordestinos na bateria na música instrumental em minhas pesquisas acadêmicas
(Galvão 2015 e 2022) e na minha trajetória profissional. Segundo, apesar de reconhecer as diferenças
estético-musicais, o material discográfico de Hermeto e Egberto que abarca a interpretação do baião, do
frevo e do maracatu é muito representativo. Assim, a escolha desta temática investigativa se deu não
somente por uma curiosidade pessoal, mas pela importância e predominância que os ritmos nordestinos
elencados adquiriram no repertório dos compositores e também nas performances dos seus bateristas,
conforme ilustro ao longo deste texto.
Sendo assim, este artigo traz recortes da interpretação do baião, do maracatu e do frevo nas performances
de sete relevantes bateristas brasileiros que gravaram álbuns de Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti entre
1965 e 2003. São eles: Airto Moreira, João Palma, Robertinho Silva, Zé Eduardo Nazário, Nenê, Alfredo Dias
Gomes e Márcio Bahia. O recorte temporal, a escolha dos álbuns e a seleção dos citados bateristas foi feita
a partir de uma extensa escuta investigativa na discografia de Hermeto e Egberto, desde o princípio de suas
carreiras, em meados nos anos 1960, até o início dos anos 2000. O critério adotado foi o de averiguar nas
gravações a presença da bateria executando o baião, o maracatu ou o frevo
1
.
Na pesquisa, comecei a investigação pelos álbuns individuais de cada compositor, lançados no final dos anos
1960 e princípio de 1970. Obedecendo o critério de seleção escolhido, focando nas gravações de Hermeto
Pascoal, seria necessário iniciar com o disco A Música Livre de Hermeto Pascoal de 1973 no qual surge os
primeiros registros de execução de baião na bateria na sua discografia solo. No entanto, decidi considerar
1
Na investigação encontrei vários temas que são tocados somente com auxílio da percussão (sem bateria),
ou em performances solo dos compositores. Pelos parâmetros escolhidos, estas músicas não entraram na
pesquisa.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
dois álbuns anteriores dos grupos Sambrasa
2
(1965) e Quarteto Novo
3
(1967), nos quais Hermeto atuou
juntamente com o baterista e percussionista Airto Moreira, um dos objetos de estudo deste artigo. Esta
parte da investigação finalizou com o álbum Mundo Verde Esperança (2003), registro que conta com a
derradeira gravação do baterista Márcio Bahia com o grupo de Hermeto. Como mostrarei neste texto, Bahia
tem uma longa contribuição na discografia do compositor alagoano.
Com relação aos álbuns de Egberto Gismonti, no seu disco de estreia, intitulado Egberto Gismonti, lançado
em 1969 (Moreira 2016, 19), há a interpretação de alguns gêneros musicais brasileiros, porém não
execução de ritmos nordestinos na bateria. No lançamento seguinte, Sonho 70 (1970), se repete a mesma
situação. Não obstante, ritmos do Nordeste brasileiro na execução de bateristas só surge no disco Água e
Vinho de 1972. Por este motivo, minha escuta se iniciou neste álbum. Importante dizer que entre os anos
1970 e o princípio dos anos 2000, Egberto lançou vários álbuns sem bateria
4
. Não obstante, apoiado no
critério adotado, finalizei a escuta investigativa com o álbum El Viaje, lançado no ano de 1992.
Como procedimentos metodológicos utilizei a transcrição musical de trechos da interpretação de baião,
maracatu e frevo por parte dos bateristas e a análise descritiva destas performances. Com relação ao
referencial teórico, me apoiei no trabalho do musicólogo Franco Fabbri (1980, 1) que versa sobre a definição
de gênero musical. Segundo Fabbri, gênero musical é a reunião de eventos musicais governados por um
conjunto definido de regras socialmente aceitas. Apesar de afirmar ser impossível listar todos os tipos de
regras, Fabbri faz uma tipologia do que considera mais recorrente como as Regras Semióticas, ligadas aos
códigos, escritos ou não, a partir dos quais se cria uma relação entre a expressão de um evento musical e o
seu conteúdo, Regras de Comportamento, relacionadas às reações comportamentais e psicológicas do
músico (artista) e da plateia, Regras Sociais e Ideológicas, que descrevem os aspectos sociológicos e
ideológicos presentes em um gênero musical, Regras Econômicas e Jurídicas, que tratam das forças
econômicas e jurídicas que podem influenciar um gênero, e as Regras Formais e Técnicas, que tratam,
justamente, dos aspectos formais e estruturais do gênero, das técnicas de execução do instrumento e da
performance (Fabbri 1980, 3).
Desse modo, as transcrições e as análises descritivas apresentadas na subseção 3 deste artigo, com os
trechos das performances dos bateristas selecionados, estão relacionadas com as rítmicas tradicionais do
baião, do frevo e do maracatu, de acordo com as Regras Formais e Técnicas (Fabbri 1980, 3). Sendo assim,
ilustro nas Figuras 1, 2, 3 e 4 os padrões rítmicos do baião, do seu subgênero xaxado (Santos 2013, 88-106),
do maracatu
5
e do frevo, tradicionalmente executados com os instrumentos de percussão, e que foram base
para as transcrições realizadas.
2
Sambrasa Trio: Hermeto Pascoal (piano, flauta), Humberto Clayber (contrabaixo), Airto Moreira (bateria).
3
Quarteto Novo: Airto Moreira (bateria, percussão), Heraldo do Monte (guitarra, viola), Théo de Barros
(contrabaixo, violão) e Hermeto Pascoal (flauta, piano).
4
Dança das Cabeças (1977), Sol do Meio Dia (1978), Folk Songs, Mágico (1980), Egberto Gismonti (1984),
Dança dos Escravos (1989), Infância (1991), Música de Sobrevivência (1993), Meeting Point (1997), entre
outros (Galvão 2022, 116).
5
Os tipos de maracatu, presentes no estado de Pernambuco, são popularmente conhecidos como maracatu
nação ou maracatu de baque virado, e maracatu rural ou de baque solto (Santos e Resende 2005, 29). Neste
artigo o padrão referencia de maracatu será o de maracatu de baque virado.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Figura 1 Padrão básico de baião com agogô, triângulo e zabumba
Fonte: Santos (2013, 89) e transcrição do autor
Figura 2 Duas variações de xaxado com agogô, triângulo e zabumba
Fonte: Gravação de “Xaxado da Paraíba”
6
(1957) de Marinês (transcrições do autor)
Figura 3 Duas variações de padrão rítmico do maracatu de baque virado com instrumentos de percussão
Fontes: Batuque Book Maracatu (Santos e Resende 2005, 86-87) com transcrição do autor
Figura 4 Padrão base de frevo com pandeiro, caixa e surdo
Fonte: Galvão (2022, 8)
6
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=vwrT7SJR-Q8. Acesso em: 9 nov. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
2. Levantamento quantitativo do baião, do maracatu e do frevo na bateria em
gravações de Egberto Gismonti e Hermeto Pascoal
No intuito de obter um amplo panorama desta investigação, trago nesta seção um levantamento
quantitativo da presença do maracatu, do baião e do frevo na bateria na discografia de Hermeto Pascoal
entre 1965 e 2003 e de Egberto Gismonti entre 1972 e 1992. Com relação à obtenção das fontes primárias
(Lakatos e Marconi 1991, 174-213), este levantamento mapeia em quais álbuns dos artistas se encontram
as performances dos ritmos nordestinos na bateria. Esta pesquisa quantitativa preliminar foi fundamental
para as transcrições posteriormente realizadas.
Na investigação dos álbuns pesquisados foi possível perceber que ritmos nordestinos estão bastante
presentes tanto na obra de Egberto Gismonti quanto na de Hermeto Pascoal. Deste modo, de acordo com
critério de pesquisa adotado, elenquei quantitativamente em quais álbuns e faixas o maracatu, o baião
(xaxado) ou o frevo foram executados na bateria. Este levantamento possibilitou observar o quanto estes
gêneros aparecem na discografia dos compositores entre 1965 e 2003, conforme ilustro nas tabelas a seguir.
A Tabela 1 mostra assim a discografia de Egberto Gismonti entre 1972 e 1992, e a Tabela 2 a de Hermeto
Pascoal entre 1965 e 2003.
Tabela 1 Baião, maracatu e frevo na bateria na discografia de Egberto Gismonti entre os anos de 1972 e 1992
Quantidade
Faixa(s) do álbum
Água e vinho (1972)
2
3, 10
Academia de Danças (1974)
3
2, 10, 11
Corações Futuristas (1976)
3
1, 7, 8
The Altitude of the Sun (1976)
2
1, 5
Carmo (1977)
1
1
Nó Caipira (1978)
2
2, 5
2
5, 9
1
4
Circense (1980)
1
5
1
1
Em Família (1981)
1
1
1
3
Sanfona (1981)
2
4, 5
1
3
2
1, 5
Feixe de Luz (1988)
2
1, 14
1
1
El Viaje (1992)
2
1, 8
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Tabela 2 Baião, maracatu e frevo na bateria na discografia de Hermeto Pascoal entre os anos de 1965 e 2003
Álbuns / Gênero na bateria
Quantidade
Faixa(s) do álbum
Sambrasa Trio /Em Som Maior (1965)
Baião
1
10
Quarteto Novo (1967)
Baião
1
6
A Música Livre de Hermeto Pascoal (1973)
Baião
4
1, 3, 4, 5
Hermeto Pascoal & Grupo Vice-Versa. Viajando com o som. The lost 76’vice-versa Studio session (1976 / 2017)
Baião
2
2, 4
Maracatu
1
4
Slaves Mass (1977)
Baião
1
8
Zabumbê-Bum-Á (1979)
Baião / xaxado
4
1, 3, 5, 7
Frevo
2
6, 8
Maracatu
1
9
Hermeto Pascoal ao vivo Montreux Jazz Festival (1979)
Baião / xaxado
8
2, 3, 5, 6, 9, 10, 12, 14
Cérebro Magnético (1980)
Baião
1
1
Hermeto Pascoal & Grupo (1982)
Baião
5
2, 3, 6, 8, 9
Frevo
2
8, 10
Lagoa da Canoa Município de Arapiraca (1984)
Baião
3
4, 7, 8
Frevo
2
1, 9
Maracatu
1
8
Brasil Universo (1985)
Baião
5
1, 4, 6, 7, 10
Frevo
1
7
Só Não Toca Quem Não Quer (1987)
Baião
3
1, 9, 13
Frevo
2
9, 19
Maracatu
1
16
Festa dos Deuses (1992)
Baião
3
3, 11, 15
Maracatu
1
1
Mundo Verde Esperança (2003)
Baião
6
5, 6, 8, 9, 11, 12
Frevo
6
1, 2, 9, 11, 12, 14
Maracatu
2
5, 8
Transportando para gráficos os dados obtidos nas Tabelas 1 e 2, é possível ter uma maior clareza com relação
ao quantitativo da presença do baião, do maracatu e do frevo executados na bateria nas discografias de
ambos os compositores em função da linha temporal. O resultado é ilustrado da seguinte maneira: o
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
gráfico 1 representa os discos de Egberto Gismonti
7
(Figura 5) e o gráfico 2 os discos de Hermeto Pascoal
8
(Figura 6).
Figura 5 Gravações de baião, frevo e maracatu na bateria da discografia de Egberto Gismonti entre 1972 e 1992
Figura 6 Gravações de baião, frevo e maracatu na bateria da discografia de Hermeto Pascoal entre 1965 e 2003
Ao unirmos em um único gráfico os dados obtidos nas figuras acima, percebe-se que o baião, o maracatu e
o frevo na bateria estão presentes de maneira constante em ambas as discografias (Figura 7).
7
O elevado número de gravações de baião em 1976 é devido ao lançamento de dois discos: Corações
Futuristas e The Altitude of the Sun.
8
O elevado número de gravações de baião em 1979 é devido ao lançamento de dois discos: Zabumbê-Bum-
Á e Hermeto Pascoal Ao Vivo Montreux Jazz Festival.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Figura 7 Gravações de baião, frevo e maracatu na bateria nas discografias de Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti entre 1965 e 2003
Legenda cores: azul (baião Hermeto), laranja (frevo Hermeto), vermelho (maracatu Hermeto),
amarelo (baião Egberto), roxo (frevo Egberto) e verde (maracatu Egberto)
Ao observar os dados obtidos, é possível perceber que o gênero musical do baião aparece em um maior
número de registros (68), seguido pelo frevo (19) e por fim, pelo maracatu (12). Com relação ao total dos
dados levantados, ilustro separadamente a presença do baião, do maracatu e do frevo na bateria nos álbuns
de Hermeto e de Egberto, respectivamente, nas Figuras 8 e 9.
Figura 8 Baião, frevo e maracatu na bateria em gravações de Hermeto Pascoal entre 1965 e 2003
Figura 9 Baião, maracatu e frevo na bateria em gravações de Egberto Gismonti entre 1972 e 1992
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Fazendo uma análise dos gráficos nas Figuras 8 e 9, conclui-se que, proporcionalmente, tanto Hermeto (47
gravações) quanto Egberto (21 gravações) registraram em maior número o baião em suas gravações com
bateria. Nessa perspectiva, o frevo foi o segundo gênero mais gravado por Hermeto (15) e o maracatu por
Egberto (5). O terceiro e último gênero musical com maior número de gravações foi o maracatu para
Hermeto (7) e o frevo para Egberto (4). Importante ressaltar que não é objetivo deste trabalho realizar uma
simples comparação quantitativa dos referidos artistas, no sentido de imputar juízo de valor e hierarquizar
suas obras musicais. Afirmo que ambas as discografias são de extrema relevância para a música brasileira.
Minha intenção aqui é ilustrar que Hermeto e Egberto gravaram diversas composições nas quais se percebe
a utilização recorrente e consistente da bateria executando determinados ritmos nordestinos. Neste sentido,
baseado nos resultados obtidos na análise quantitativa, posso afirmar que o baião, o frevo e o maracatu na
bateria estiveram expressivamente presentes nas gravações de Hermeto e Egberto Gismonti entre 1965 e
2003. Não obstante, estes registros, que ajudaram a consolidar o que hoje se conhece como música
instrumental brasileira, tiveram a grande colaboração dos instrumentistas que atuaram junto aos referidos
compositores, destacando aqui, especificamente, a atuação dos bateristas nas gravações.
3. Panorama da execução de baião, maracatu e frevo nas gravações dos
bateristas de Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti entre 1965 e 2003
Trago agora um amplo panorama das variadas interpretações de baião, frevo e maracatu na bateria na
discografia de Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti entre os anos de 1965 e 2003. Este panorama é formado
por recortes que trazem trechos de performances de sete relevantes bateristas que gravaram com os
referidos compositores neste período: Airto Moreira, João Palma, Robertinho Silva, Eduardo Nazário,
Nenê, Alfredo Dias Gomes e Márcio Bahia. Os recortes foram selecionados a partir do levantamento
discográfico realizado anteriormente (Tabelas 1 e 2), ressaltando os respetivos álbuns e faixas. Para cada
baterista, faço um breve histórico da trajetória musical de cada um de acordo com a literatura (Bergamini
2014; Braga 2011; Demarchi 2013; Dias 2013; Dourado 2012; Galvão 2015; Gioia 2011; Marques 2020;
Marques e Hashimoto 2017; Mei 2010; Nenê 2017; e Silva 2013; Silva 2016) para contextualizar as
transcrições.
As análises descritivas dos trechos das performances dos bateristas são focadas, preferencialmente, nas
questões rítmicas e evidenciam os variados recursos interpretativos utilizados, ilustrando a forma peculiar
de interpretação do baião, do frevo ou do maracatu nas gravações estudadas. Este estudo, como dito
anteriormente, foi apoiado nas Regras Formais e Técnicas dos gêneros musicais (Fabbri 1980, 3), sendo
referências de identificação das rítmicas estruturantes de cada gênero musical estudado, presentes na
interpretação das performances transcritas. O entendimento da definição de gênero musical abordado por
Fabbri (1980) auxiliou nas transcrições e análises descritivas no sentido de ter como bases iniciais os padrões
característicos dos instrumentos de percussão dos gêneros musicais estudados. Cito como exemplos destes
padrões os toques e variações de zabumba (maceta e bacalhau
9
) no baião e no xaxado, a caixa de guerra
(tarol) e os baques (batidas) do tambor alfaia marcante do maracatu de baque virado (Santos e Resende
2005, 39-87), bem como o rulo e os acentos da caixa no frevo (Saldanha 2008, 184). Não obstante, apresento
na Figura 10 a notação para bateria no pentagrama que foi utilizada neste trabalho.
9
Baqueta fina e flexível usada na membrana inferior do zabumba, gerando um timbre de frequência média-
aguda.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Figura 10 Notação para a bateria utilizada nas transcrições
3.1. Airto Moreira em gravações de Hermeto Pascoal entre 1965 e 1977
O percussionista e baterista Airto Moreira nasceu no dia 5 de agosto de 1941 em Itaiópolis, interior de Santa
Catarina (PR). Em 1955, mudou-se para Curitiba onde passou a atuar como baterista, percussionista e cantor
em conjuntos de baile. Entre os anos de 1959 e 1960 mudou-se para São Paulo onde se estabeleceu
profissionalmente. Durante a década de 1960, além de tocar e gravar com diversos artistas da sica
brasileira, Airto atuou em grupos ligados ao sambajazz como o Sambalanço Trio
10
e Sambrasa Trio.
Participou dos festivais de música popular brasileira do final dos anos 1960, incluindo sua atuação com o
grupo Quarteto Novo, que lançou seu único disco de carreira em 1967. Por volta de 1968, Airto Moreira se
mudou para os Estados Unidos, onde construiu uma sólida e bem-sucedida carreira como instrumentista e
artista solo. Atuou junto a nomes como Miles Davis, Chick Corea, Weather Report, Return to Forver, Santana,
Paul Simon, Paul Desmond, Astrud Gilberto, Stan Getz, Tom Jobim, Milton Nascimento, Flora Purim, entre
muitos outros (Dias 2013, 9-47). Com sua carreira individual, lançou uma extensa discografia cujo catálogo
incluiria álbuns como Natural Feelings (1970), Seeds On The Ground (1971), Free (1972), Virgin Land (1974),
Identity (1975), The Other Side of This (1992), Life After That (2003) e mais recentemente Aluê l de 2017
(Mei 2010, 33).
Airto construiu uma grande parceira musical com Hermeto Pascoal desde os grupos Sambrasa e Quarteto
Novo nos anos 1960. Esta parceria se estendeu nos álbuns Natural Feelings e Seeds On The Groung de Airto
Moreira, ambos de 1970, bem como Hermeto (1970) e Slaves Mass (1977) de Hermeto Pascoal. Neste artigo,
foco na atuação de Airto Moreia executando ritmos nordestinos na bateria em discografia de Hermeto
Pascoal entre 1965 e 1977, como indicado na Tabela 3.
Tabela 3 Baião na bateria de Airto Moreira em gravações de Hermeto Pascoal entre 1965 e 1977
Álbuns de Hermeto Pascoal
Faixas
Baião por Airto Moreira
Sambrasa Trio / Em Som Maior (1965)
10 “Lamento Nortista”
Baião (0:00-0:24)11
Quarteto Novo (1967)
6 “Síntese”
Baião (0:44)
Slaves Mass (1977)
8 “Open Field”
Baião
O álbum Em Som Maior (1965) do grupo Sambrasa Trio teve Hermeto Pascoal como arranjador (Galvão 2015,
35). De modo geral, o disco tem uma sonoridade no estilo sambajazz. Entretanto, uma nítida referência
aos ritmos nordestinos na introdução de “Lamento Nortista”. Aqui, Airto reproduz de maneira muito
inventiva uma variação do padrão de baião do zabumba no surdo da bateria. Ele complementa a batida com
10
Sambalanço Trio: Cesar Camargo Mariano (piano), Humberto Clayber (contrabaixo, harmônica), Airto
Moreira (bateria).
11
Posição na faixa em termos de minutagem.
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11
Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
o aro da caixa e o hi-hat com pé
12
nos contratempos. O interessante é que, na gravação (28:17 e 28:38
13
),
nota-se uma diferenciação de timbre do aro da caixa com sons agudo e grave, do mesmo modo que os blocos
de madeira usados pelos grupos regionais de baião (Figura 11). Não posso afirmar de maneira precisa como
Airto conseguiu este efeito, no entanto, posso supor que ele deve ter percutido o aro da caixa com a ponta
da baqueta para obter o som agudo e com o meio do corpo da mesma para ter o som grave.
Figura 11 Baião executado por Airto Moreira na faixa “Lamento Nortista” (28:24) do álbum Em Som Maior (1965) do Sambrasa Trio
Fonte: Transcrição do autor
Na gravação do álbum Quarteto Novo (1967), Airto fez uso muito criativo da percussão (caxixi, triângulo,
pandeiro, queixada de boi) nas faixas “O ovo” (baião), “Fica Mal com Deus” (baião com trechos em 7/8),
Canto Geral (baião em 7/8 e samba lento em 2/4), “Algodão” (baião) e “Canta Maria” (tocada em 6/8). A
bateria de Airto aparece somente nas faixas “Síntese” (baião), “Misturada” (samba em 7/8) e “Vim de
Sant’Ana” (samba jazz). Destaco aqui o tema “Síntese”
14
, no trecho do solo de piano (0:44), em que Airto
executa uma levada de baião bastante interessante. Neste recorte da gravação, o baterista toca dialogando
com o piano, no qual o bumbo faz um padrão de base de baião, o hi-hat com uma célula de xaxado, e a
cúpula do prato de condução figuras sincopadas (Figura 12).
Figura 12 Baião na execução do baterista Airto Moreira na faixa “Síntese” (1:06) do álbum Quarteto Novo (1967)
Fonte: Transcrição do autor
Um detalhe que gostaria de chamar a atenção nesta interpretação é que o padrão do hi-hat com executa
uma célula de xaxado (colcheia pontuada, semicolcheia, pausa de colcheia e colcheia), que é a mesma célula
rítmica de um dos padrões de caxixi usados por Airto na faixa “Algodão” do mesmo álbum. Essa forma de se
interpretar o baião na bateria de maneira mais “solta” (adaptando os padrões do caxixi na célula do xaxado
para o hi-hat com o pé) deve ter se iniciado, provavelmente, com Airto Moreira sob sugestão de Hermeto
Pascoal (Galvão 2015, 35). Com relação a este tipo de execução do hi-hat com o pé, Dias (2013) comenta
que este seria um uso melódico do chimbal
15
com esquerdo”, recurso característico do estilo de Airto
na bateria em meados dos anos 1960 (Dias 2013, 58-96).
12
Indicado como contratempo com pé na Figura 10.
13
Referência de minutos da faixa “Lamento Nortista” disponível na internet. Disponível em:
https://youtu.be/TEQuvkOzGPg?t=1703. Acesso em: 24 fev. 2023.
14
Disponível em: https://youtu.be/81pRm99dEyw?t=65. Acesso em: 24 fev. 2023.
15
Mesmo que hi-hat ou contratempo com o pé.
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12
Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
O disco Slaves Mass (1977) contém elementos predominantes do jazz fusion (Gioia 2011, 325), sendo um
álbum que apresenta longos improvisos dos solistas, misturas de estilos e diversos efeitos sonoros
inusitados. O baião aparece na faixa bônus “Open Field”
16
(Campo Aberto). Em contraste com boa parte da
estética do álbum, cuja improvisação resulta em performances mais livres, a execução de baião com
elementos do xaxado nesta sica é bastante nítida. Na introdução (0:04-0:20), Airto toca o bumbo no
padrão de xaxado e hi-hat com abertura no 2º tempo. Nota-se que a caixa não faz uma célula fixa a partir do
sétimo compasso da transcrição (0:21). Neste trecho, o baterista faz pequenas variações utilizando notas
fantasmas
17
em alguns trechos, pontuando síncopes que remetem a padrões de bacalhau do zabumba no
baião (Figura 13).
Figura 13 Baião executado por Airto Moreira na faixa bônus “Open Field” (0:04-0:21) do álbum Slaves Mass (1977) de Hermeto Pascoal
Fonte: Transcrição do autor
3.2. João Palma em gravação de Egberto Gismonti em 1972
O baterista João Palma (1943-2016), natural do Rio de Janeiro, foi um músico que teve grande atuação na
música popular brasileira e na música internacional. Começou sua carreira no ano de 1960 tocando com
artistas da bossa nova como Roberto Menescal. A partir de 1964, gravou e tocou com Maysa, Vinícius de
Moraes e Dorival Caymmi. João Palma se mudou para os Estados Unidos no ano de 1965, integrando a banda
do pianista Sérgio Mendes, colaborando em três discos. No ano de 1966, Palma foi convidado para
acompanhar o cantor norte-americano Frank Sinatra. João Palma gravou com Tom Jobim nos discos Tide,
Stone Flower, Matita Perê e Urubu. Além dos já citados artistas, Palma gravou com Egberto Gismonti, Dorival
Caymmi, Herbie Hancock, Paul Desmond, Milton Nascimento, Astrud Gilberto, entre muitos outros artistas
18
.
No disco Água e vinho (1972) de Egberto Gismonti João Palma gravou as seguintes faixas: “Ano Zero” e
“Mulher Rendeira”
19
. Esta última tem-se a performance de baião do baterista, que é a última trilha do álbum
(Tabela 4).
Tabela 4 Baião na bateria de João Palma no álbum Água e vinho (1972) de Egberto Gismonti
Álbum de Egberto Gismonti
Faixa
Baião por João Palma
Água e vinho (1972)
10- “Mulher Rendeira”
Baião (0:31)
16
Disponível em: https://youtu.be/ZkCFo-pSMuU?t=3. Acesso em: 24 fev. 2023.
17
Padrões tocados na caixa da bateria de forma não acentuada são comumente conhecidos como notas
fantasmas ou ghost notes.
18
Para saber mais sobre o baterista João Palma acesse: “João Palma”. Disponível em:
https://dicionariompb.com.br/artista/joao-palma/. Acesso em: 31 mar. 2023
19
Disponível em: https://youtu.be/Cy-kU9aK4LE?t=41. Acesso em: 24 fev. 2023.
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13
Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Nesta faixa, a bateria de João Palma começa a partir de 0:31, logo após uma introdução de cordas e de
um texto falado. Quando o ritmo se inicia, Palma toca uma batida de baião, em andamento muito rápido,
utilizando bumbo e hi-hat fechado como elementos de base. A caixa preenche os espaços acentuando a
segunda colcheia do tempo do compasso. Num primeiro momento, esta levada parece ser, de certa
forma, padronizada. No entanto, a execução da caixa preenchendo os espaços dá um balanço todo especial,
principalmente se levarmos em consideração o andamento acelerado. A subdivisão do bumbo, por sua vez,
emula as variações de batida do zabumba no baião (Santos 2013, 88). Este trecho é ilustrado em destaque
nos 4º e 5º compassos da transcrição (Figura 14).
Figura 14 Baião executado por João Palma na faixa “Mulher Rendeira” (0:42-0:45) do álbum Água e Vinho (1972) de Egberto Gismonti
Fonte: Transcrição do autor
3.3. Robertinho Silva em gravações de Egberto Gismonti entre 1972 e 1992
O baterista e percussionista Robertinho Silva nasceu no subúrbio da cidade do Rio de Janeiro em 1941 (Sá e
Silva 2013, 18). Músico autodidata, formou sua identidade musical através da autoaprendizagem, aulas
particulares e da prática em inúmeros bailes. Como influências, Robertinho se espelhou nos bateristas do
chamado samba bossa nova como Edison Machado, Milton Banana, Dom Um Romão, além de nomes do
jazz norte-americano como Philly Joe Jones, Elvin Jones, Art Blakey, Max Roach e Tony Williams. A partir dos
anos 1970, Robertinho Silva se consolidou profissionalmente ao tocar e gravar com grandes nomes da
música brasileira e internacional como Milton Nascimento, Som Imaginário, Tom Jobim, Gal Costa, Egberto
Gismonti, João Donato, Airto Moreira, Gilberto Gil, Paul Horn, Wayne Shorter, George Duke e Sarah
Vaughan. Como artista solo, Robertinho Silva lançou uma longa discografia que inclui os álbuns Música
Popular Brasileira Contemporânea - Bateria (1981), Bodas de Prata (1989), além de vários discos lançados
até o ano de 2012 no formado de duo ou pequenos grupos (Dourado 2012, 24-27). Robertinho Silva
colaborou de forma extensa na discografia de Egberto Gismonti entre 1972 e 1992 conforme pode ser visto
na Tabela 5.
Tabela 5 Baião, frevo e maracatu na bateria de Robertinho Silva em discografia de Egberto Gismonti entre 1972 e 1992
Álbuns de Egberto Gismonti
Faixas
Baião, frevo e maracatu por Robertinho Silva
Água e vinho (1972)
03 “Janela de Ouro” (A traição das esmeraldas)
Baião
Academia de Danças (1974)
02 “Jardim de Prazeres”
Baião no solo de violão (3:17-4:00)
10 “Conforme a Altura do Sol”
Baião experimental (improvisação)
11 “Conforme a Altura da Lua”
Baião experimental
Corações Futuristas (1976)
01 “Dança das Cabeças”
Baião (5:34)
07 “Ano Zero”
Trecho de baião (5:01-5:28)
08 “Baião do Acordar”
Baião experimental
The Altitude of the Sun (1976)
01 “Dança das cabeças”
Baião
05 “Tango”
Baião a partir do solo de flauta (1:54)
Carmo (1977)
01 “Baião Malandro”
Baião/rock
Circense (1980)
01 “Karatê”
Frevo
05 “Tá Boa Santa”
Baião
Feixe de Luz (1988)
01 “7 Anéis”
Choro/baião com levada de maracatu
14 “Forró Bodó”
Baião/forró
El Viaje (1992)
01 “Kateretê”
Levada de baião
08 “Forró Viajante”
Forró/baião
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14
Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
No arranjo de Janela de Ouro”
20
do álbum Água e vinho (1972), logo após parte cantada por Egberto (2:22),
o baião aparece de maneira gradual. Neste trecho, o teclado toca uma melodia que remete ao gênero
musical e é acompanhado pelas execuções de triângulo e caxixi (2:24). De forma sutil, Robertinho Silva inicia
a batida percutindo somente o bumbo no padrão de zabumba do baião. Gradativamente, o baterista vai
agregando outras peças como o aro de caixa e o hi-hat fechado, construindo aos poucos uma levada de baião
bem sucinta. A partir de 2:35, a levada de baião está bem clara. Neste trecho, Robertinho utiliza a abertura
do hi-hat na segunda colcheia do tempo do compasso, para, em seguida, tocar variações de aro que se
aproximam dos padrões de xaxado no zabumba (Figura 15).
Figura 15 Baião executado por Robertinho Silva em “Janela de Ouro” (2:26-2:39) do álbum Água e Vinho (1972) de Egberto Gismonti
Fonte: Transcrição do autor
Passando para o álbum Academia de Danças (1974), transcrevo, na Figura 16, um trecho da performance de
Robertinho Silva em “Jardim de Prazeres”
21
. Nesta faixa, o baterista toca o baião em andamento muito
rápido no solo de violão no final do tema (3:17-4:08). Retornando a ideia da construção gradativa da batida
em “Janela de Ouro” (1972), Robertinho executa a levada do baião aos poucos, optando por uma execução
mais padronizada, utilizando somente bumbo e hi-hat fechado, fazendo um acompanhamento introdutório
ao solo de violão (3:28). Focando o hi-hat, o baterista toca esta peça na subdivisão de semicolcheia (mesma
do triângulo no baião), utilizando aberturas no tempo do compasso binário. Quando começa a
improvisação do violão (3:33), o baterista toca um baião mais solto com prato de condução, bumbo e a caixa
com notas fantasmas.
Figura 16 Baião executado por Robertinho Silva em “Jardim de Prazeres” (3:28-3:37) do álbum Academia de Danças (1974) de Gismonti
Fonte: Transcrição do autor
Destaco a seguir a performance de Robertinho Silva em “Baião Malandro”
22
, faixa do álbum Carmo (1977).
Num determinado trecho do arranjo (2:08), a melodia e o triângulo da percussão remetem logo ao baião.
Em seguida (2:10), o baterista lança mão de uma interessante batida que mistura elementos do rock (caixa
nos tempos 2 e 4), juntamente com o padrão que caracteriza o gênero musical do baião (Fabbri 1980, 1). Na
20
Disponível em: https://youtu.be/SC6woFL8i-Y?t=144. Acesso em: 24 fev. 2023.
21
Disponível em: https://youtu.be/mhkJHvX6YiM?t=207. Acesso em: 25 fev. 2023.
22
Disponível em: https://youtu.be/7dcJ-uS3IOc?t=129. Acesso em: 25 fev. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
gravação, ele executa o bumbo (colcheia pontuada e semicolcheia), conjuntamente com o hi-hat abrindo
nos contratempos. Denominei esta performance de baião rock na bateria (Figura 17).
Figura 17 Baião rock executado por Robertinho Silva na faixa “Baião Malandro” (2:10) do álbum Carmo (1977) de Egberto Gismonti Fonte:
Transcrição do autor
Abordo agora o gênero musical do frevo, presente na gravação de “Karatê”
23
do disco Circense de 1980. O
arranjo, após o solo de violão, mistura elementos do frevo com o jazz de forma bem musical. A performance
de Robertinho Silva começa com um frevo bem padronizado: caixa com a célula rítmica característica,
acentos e rulo de 1 tempo de duração no final da frase de dois compassos (Saldanha 2008, 184). Se fosse
para emular o tempo forte do padrão tradicional do surdo no frevo, ou seja, mais próximo da referência da
percussão de acordo com as Regras Formais e Técnicas do gênero musical (Fabbri 1980, 3), o baterista teria
que tocar o bumbo somente no segundo tempo do compasso binário. No entanto, Robertinho Silva opta por
tocar o bumbo em todos os tempos do compasso, conjuntamente com o hi-hat com o , que faz uma breve
abertura junto com o rulo da caixa no último tempo. Esta interpretação de frevo cria uma levada bastante
sólida do gênero (Figura 18).
Figura 18 Frevo na execução do baterista Robertinho Silva na faixa “Karatê” (0:08-0:10) do álbum Circense (1980) de Egberto Gismonti
Fonte: Transcrição do autor
Na mesma faixa o baterista apresenta uma variação bem interessante. Após uma longa frase musical em
uníssono (3:30-3:35), Robertinho Silva toca o frevo utilizando o prato de condução, omitindo o bumbo em
boa parte da levada (3:36). A caixa, por sua vez, pontua de forma sutil os acentos característicos do gênero.
O resultado é uma batida surpreendentemente leve que se aproxima, de certo modo, da execução do jazz
na bateria (que utiliza muito o prato de condução), ao mesmo tempo que mantem as características rítmicas
do frevo (exemplo representado na Figura 19).
Figura 19 Variação de frevo executado por Robertinho Silva na faixa “Karatê” (3:36-3:39) do álbum Circense (1980) de Egberto Gismonti
Fonte: Transcrição do autor
23
Disponível em: https://youtube.com/shorts/3B4zlwNMgs8?feature=share. Acesso em: 25 fev. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
3.4. Zé Eduardo Nazário em gravações de Hermeto Pascoal em 1976 e Egberto Gismonti em
1978
O baterista e percussionista Eduardo Nazário nasceu em São Paulo no dia 25 de setembro de 1952. Tocou
e gravou com relevantes artistas nacionais e internacionais como Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti, Milton
Nascimento, Taiguara, John McLaughlin, entre outros. Em sua trajetória, participou de grupos instrumentais
como Grupo Um e Pau Brasil. Segundo Braga (2011), Nazário foi um dos pioneiros da chamada “barraca de
percussão”, que consiste em uma mesa com diversos instrumentos de percussão além de pedestais com
efeitos como guizos e sinos. Tal aparato foi utilizado pelo músico quando tocou com Hermeto Pascoal em
meados dos anos 1970 (Braga 2011, 37).
Eduardo Nazário gravou obras na discografia de Hermeto e Egberto a partir da segunda metade da década
de 1970. Com Egberto Gismonti, o baterista atuou no disco Caipira, de 1978. com Hermeto Pascoal,
Nazário gravou o disco Hermeto Pascoal & Grupo Vice-Versa. Viajando com o som. The lost 76’vice-versa
Studio session, gravado originalmente em 1976 e lançado em 2017.
Tabela 6 Baião e maracatu na bateria de Zé Eduardo Nazário em gravações de Hermeto Pascoal em 1976
Álbum de Hermeto Pascoal
Faixas
Baião e maracatu por Zé Eduardo Nazário
Hermeto Pascoal & Grupo Vice-Versa.
Viajando com o som. The lost 76’vice-
versa Studio session (1976 / 2017)
2 “Mavumvavumpefoco”
Baião (2:54)
4 “Casinha Pequena”
Maracatu (2:52)
O álbum Viajando com o som, The lost 76’ vice-versa Studio Session (1976/2017) é bastante experimental no
que tange a aspectos harmônicos, melódicos e tmicos empregados, como na faixa Mavumvavumpefoco”.
Entretanto, alguns gêneros são executados de forma mais próxima dos padrões tradicionais, mas com
algumas variações. Por exemplo, na faixa “Casinha Pequenina”
24
, Eduardo executa um maracatu
reproduzindo o padrão da caixa de guerra (tarol) na caixa da bateria, adicionando o toque múltiplo na
segunda nota do padrão e o bumbo executando a célula rítmica da alfaia do maracatu de baque virado
(Figura 20). O interessante é que esta levada bem sólida de maracatu faz um contraponto para a
improvisação livre do sax neste trecho (2:52).
Figura 20 Maracatu na bateria de Zé Eduardo Nazário na faixa “Casinha Pequenina” do álbum
Viajando com o Som (1976) de Hermeto Pascoal e Grupo Vice-Versa (2:52)
Fonte: Transcrição do autor
Passando para a discografia de Egberto Gismonti, elenco a contribuição da bateria de Zé Eduardo Nazário no
disco Nó Caipira de 1978 na Tabela 7.
24
Disponível em: https://youtu.be/cxJusVSG1Rc?t=170. Acesso em: 25 fev. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Tabela 7 Baião, maracatu e frevo na bateria de Zé Eduardo Nazário em gravações de Egberto Gismonti em 1978
Álbum de Egberto Gismonti
Faixas
Baião, maracatu e frevo por Zé Eduardo Nazário
Nó Caipira (1978)
2 “Nó Caipira”
Baião em 7/4 (3:25)
4 “Maracatu”
Maracatu
5 “Frevo”: a) “Frevo”;
b) “Esquenta Muié”;
c) “Frevo Rasgado”
Frevo e baião experimental
9 “Frevo Rasgado”
Frevo experimental
Na faixa “Maracatu” destaco tanto a sua interpretação quanto a parte técnica da execução. Diferentemente
da sua performance no fonograma “Casinha Pequenina” (Hermeto Pascoal), em “Maracatu” Nazário toca o
bumbo da bateria com um padrão mais complexo, reproduzindo um dos baques de alfaia do maracatu de
baque virado (Santos e Resende 2005, 57). No bumbo, ele executa a figura de semicolcheia, colcheia e
semicolcheia no tempo, acentuando a segunda nota do padrão (Figura 21). Do ponto de vista da
performance, este exemplo é de difícil execução pois necessita uma técnica de pedal de bumbo bastante
desenvolvida devido ao agrupamento de notas a serem executadas com o pé.
Figura 21 Maracatu na bateria de Zé Eduardo Nazário na faixa “Maracatu”, álbum Nó Caipira (1978) de Egberto Gismonti (1:24)
Fonte: Transcrição do autor
Na faixa “Nó Caipira”
25
do mesmo álbum, na primeira exposição do tema, o baião é executado com
percussão (zabumba, triângulo, caxixi e blocos de madeira). Após o improviso, Zé Eduardo toca um baião na
fórmula de compasso 7/8, acentuando frases com os demais instrumentistas. Logo em seguida, na altura de
3:30, a pulsação muda quando os músicos tocam frases em uníssono em compassos ternário e quaternário.
Neste trecho, o baterista passa a tocar um baião em 7/4, usando mãos alternadas na caixa como elemento
condutor (Figura 22).
Figura 22 Baião em 7/4 na bateria de Zé Eduardo Nazário na faixa “Nó Caipira” do álbum Nó Caipira (1978) de Egberto Gismonti (3:33)
Fonte: Transcrição do autor
3.5. Nenê em gravações de Hermeto Pascoal entre 1973 e 1979 e Egberto Gismonti em 1981
Nenê (nome artístico de Realcino Lima Filho) nasceu em 1947 na cidade de Porto Alegre (RS). Músico de
formação autodidata, baterista, acordeonista, pianista e compositor, Nenê iniciou sua carreira por volta de
1959. A partir da década de 1960, se estabelece em São Paulo e se insere profissionalmente tocando em
clubes de jazz e boates na noite paulistana. Nos anos 1970, Nenê se destacou por sua atuação junto a
importantes nomes da sica brasileira como Milton Nascimento, Elis Regina, entre outros (Marques e
Hashimoto 2017, 2; Nenê 2017). No âmbito da música instrumental, Nenê teve importante participação na
25
Disponível em: https://youtu.be/3Bi0w-xgWr0?t=209. Acesso em: 25 fev. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
discografia de Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti. Com Hermeto gravou A música livre de Hermeto Pascoal
(1973), Zabumbê-Bum-Á e Hermeto Pascoal ao vivo Montreux Jazz Festival (1979), e com Egberto, Em Família
e Sanfona (1981). Durante sua trajetória, Nenê sedimentou uma bem-sucedida carreira solo na música
instrumental. Lançou mais de 10 álbuns autorais: Bugre (1983), Ponto dos Músicos (1984) e Minuano (1985),
Porto dos Cais (1997), Suíte Curral (1997), Caminho Novo (2002), Ogã (2005), Sudeste (2007), entre outros
(Marques 2020, 17 e 114-115). Apresento um resumo da colaboração de Nenê na discografia de Hermeto
Pascoal entre 1973 e 1979 na Tabela 8.
Tabela 8 Baião, maracatu e frevo na bateria de Nenê em gravações de Hermeto Pascoal entre 1973 e 1979
Álbuns de Hermeto Pascoal
Faixas
Baião, frevo e maracatu por Nenê
A Música Livre de Hermeto Pascoal (1973)
1- “Bebê”
Baião
3- “Plin”
Baião (2:14)
4- “Serearei”
Baião (3:40)
5- “O Gaio da Roseira”
Baião (5:15)
Zabumbê-Bum-Á (1979)
1- “São Jorge”
Baião
3- “Pimenteira”
Baião (2:36)
5- “Santo Antônio”
Baião
6- “Alexandre, Marcelo e Pablo”
Frevo
7- “Suíte Norte, Sul, Leste, Oeste”
Baião
8- “Susto”
Frevo
9- “Mestre Mará”
Maracatu (só nos tambores)
Hermeto Pascoal ao vivo Montreux Jazz Festival (1979)
2- “Forró em Santo André”
Baião
3- “Remelexo”
Baião
5- “Sax e Aplauso”
Baião (5:00)
6- “Lagoa da Canoa”
Baião
9- “Maturi”
Baião / xaxado
10- “Quebrando Tudo”
Baião (1:18)
12- “Forró Brasil”
Baião / xaxado
14- “Voltando ao Palco”
Baião (0:19)
No álbum A Música Livre de Hermeto Pascoal de 1973, Nenê apresenta quatro variações de levadas de baião
na longa faixa “Gaio da Roseira”
26
: (1) caixa como elemento condutor e variação de bumbo com frases de
zabumba (5:15); (2) hi-hat fechado, bumbo e aro de caixa no e tempo do compasso (5:35); (3) caixa
nos tempos 2 e 4 (5:54); e (4) bumbo sincopado no segundo compasso (6:10). Estes exemplos estão
ilustrados na Figura 23.
Figura 23 Variações de Baião na execução do baterista Nenê na faixa “O Gaio da Roseira” (5:15; 5:35; 5:54; 6:10) do álbum A música livre
de Hermeto Pascoal (1973)
Fonte: Transcrição do autor
26
Disponível em: https://youtu.be/HfZXXQvDPYw?t=313. Acesso em: 8 mar. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Neste disco, Nenê atuou como baterista e pianista (Marquês 2020, 90), dividindo as baterias do álbum com
o percussionista Anunciação. Na faixa “Serearei”
27
, o clima experimental é quebrado na parte final do arranjo
(canto de Hermeto, levada de bateria de Nenê e triângulo de Anunciação). Neste trecho (3:35) Nenê
interpreta o baião que não repete um padrão fixo de aro de caixa. Ele começa tocando o aro na terceira
semicolcheia do tempo do compasso binário e, logo em seguida, passa a fazer variações. Tanto o aro
quanto o bumbo estão remetendo às frases de zabumba (maceta e bacalhau) que dão um balanço bem
nordestino a esta execução (Figura 24).
Figura 24 Baião nas execuções de Nenê (bateria) e Anunciação (triângulo) no final da faixa “Serearei” (3:35), álbum A música livre de
Hermeto Pascoal (1973)
Fonte: Transcrição do autor
Focando agora no disco Zabumbê-Bum (1979), destaco a levada de frevo em “Alexandre, Marcelo e
Pablo”
28
. Aqui, Nenê tocou um frevo utilizando o hi-hat fechado e a caixa, alternadamente, se apoiando no
padrão tradicional do gênero. Esta levada (Figura 25) distribui a condução do frevo entre a caixa e o
contratempo (mão direita no hi-hat e mão esquerda na caixa), explorando outros timbres utilizando a
alternâncias entre as mãos em outras peças do instrumento (Marques e Hashimoto 2017, 7).
Figura 25 Frevo executado por Nenê, faixa “Alexandre, Marcelo e Pablo” (0:01-0:04), álbum Zabumbê-Bum-Á (1979) de Hermeto Pascoal
Fonte: Marques e Hashimoto (2017, 7)
No mesmo álbum, Nenê toca um baião usando o padrão rítmico em uníssono de bumbo e hi-hat com
com a célula do xaxado na faixa “Suíte Norte Sul Leste Oeste”
29
. Nesta gravação (0:36), o baterista utiliza,
também em uníssono, um motivo rítmico com caixa, prato de condução e tambor agudo (Figura 26).
27
Disponível em: https://youtu.be/BNn7ZYM0fvs?t=215. Acesso em: 8 mar. 2023.
28
Disponível em: https://youtu.be/fJFwrKWSmtM. Acesso em: 8 mar. 2023.
29
Disponível em: https://youtu.be/tKhIfaNbpG0?t=35. Acesso em: 8 mar. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Figura 26 Baião com motivos de xaxado por Nenê na faixa “Suíte Norte Sul Leste Oeste” (0:36) do álbum Zabumbê-Bum-Á (1979) de
Hermeto Pascoal
Fonte: Transcrição do autor
Passo agora para a discografia de Egberto Gismonti com a colaboração de Nenê na bateria.
Tabela 9 Baião, maracatu e frevo nas gravações de Egberto Gismonti em 1981 com Nenê na bateria
Álbuns de Egberto Gismonti
Faixas
Baião, maracatu e frevo por Nenê
Em Família (1981)
1 “Loro”
Baião
3 “Em Família”
Levada de maracatu (0:46-1:28)
Sanfona (1981)
1 “Maracatu”
Maracatu
3 “Frevo”
Frevo experimental
4 “Loro”
Baião
5 a) “Em Família”; b) “Sanfona”;
c) “Dança dos Pés”; d) “Eterna”
Levada de maracatu (0:19-2:28) e
baião (6:03-6:22)
Num trecho da gravação da faixa “Em Família” (6:03-6:22) do disco Sanfona (1981), especificamente na
seção na qual o baterista interage com a flauta na improvisação, Nenê executa um baião com mãos
alternadas na caixa, tocando frases de bumbo que remetem as variações de zabumba (6:09) no xaxado
(Figura 27).
Figura 27 Baião na bateria de Nenê na faixa “Em Família” (6:09) do álbum Sanfona (1981)
Fonte: Transcrição do autor
Nas faixas “Maracatu”, gravada no álbum Sanfona (1981) e “Em Família”
30
, presente no disco Em Família
(1981), Nenê apresenta uma inventiva ideia de levada de maracatu usando os tambores da bateria,
emulando padrões de alfaia, intercalados com o prato de condução (em destaque na Figura 28).
Figura 28 Maracatu por Nenê nas faixas “Em Família” (11:40) dos discos Em Família e Sanfona (1981) e “Maracatu” (Sanfona, 1981)
Fonte: Transcrição do autor
30
Disponível em: https://youtu.be/F_zNcQ43aZA?t=701. Acesso em: 8 mar. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
3.6. Alfredo Dias Gomes em gravação com Hermeto Pascoal em 1980
O baterista Alfredo Dias Gomes nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 1960. Estreou como profissional aos
18 anos tocando com Hermeto Pascoal e gravando, nesta fase, o álbum Cérebro Magnético (1980). Ao longo
de sua carreira, Alfredo Dias Gomes gravou e tocou com Ricardo Silveira, Márcio Montarroyos, Nico
Assumpção, Arthur Maia, Ivan Lins, entre outros. Em sua trajetória como artista solo lançou 12 álbuns
31
autorais, incluindo o mais recente Metrópole editado em 2021.
No álbum Cérebro Magnético (1980) de Hermeto Pascoal, Alfredo Dias Gomes divide a função de baterista
com o próprio Hermeto, que gravou bateria e percussão nas faixas “Dança da Selva na Cidade Grande”, Voz
e Vento”, “Diálogo”, “Eita Mundo bom” e “Religiosidade”. Neste artigo, destaco a execução de Dias Gomes
no baião “Correu Tanto Que Sumiu” (Tabela 10).
Tabela 10 Baião na bateria Alfredo Dias Gomes no álbum Cérebro Magnético (1980) de Hermeto Pascoal
Álbum de Hermeto Pascoal
Faixa
Baião por Alfredo Dias Gomes
Cérebro Magnético (1980)
1 “Correu tanto que sumiu”
Baião (0:43 - 1:15)
No arranjo de “Correu Tanto Que Sumiu”
32
, Hermeto Pascoal utiliza um recurso recorrente em sua
discografia que são as várias mudanças de andamento no mesmo tema (Silva 2016, 15). Na referida faixa, a
primeira exposição do tema é feita com piano e clavinete em andamento moderado. Antes da reexposição
do tema (0:46), Alfredo Dias Gomes, de maneira repentina, passa a tocar um baião em andamento muito
acelerado. A levada se torna complexa devido a grande velocidade de sua execução (aprox. 190 bpm). A
batida de baião consiste em: bumbo de baião/xaxado (colcheia pontuada, semicolcheia, pausa de colcheia
e colcheia), mão direita no contratempo fechado acentuando o mesmo padrão dos pés, mão esquerda na
caixa complementando com notas fantasmas (Figura 29).
Figura 29 Baião na performance de Alfredo Dias Gomes na faixa “Correu Tanto Que Sumiu” (0:46) do álbum Cérebro Magnético (1980) de
Hermeto Pascoal
Fonte: Transcrição do autor
3.7. Márcio Bahia em gravações com Hermeto Pascoal entre 1982 e 2003
Márcio Bahia nasceu em 1958 na cidade de Niterói, Rio de Janeiro. Baterista e percussionista, começou sua
trajetória inicialmente ligado ao rock progressivo. Posteriormente, desenvolveu suas aptidões no jazz e na
música brasileira. Começou com a autoaprendizagem e aulas particulares em meados dos anos 1970. Em
31
Para saber mais sobre o baterista Alfredo Dias Gomes acesse: “Alfredo Dias Gomes. Biografia”. Disponível
em: https://www.alfredodiasgomes.com.br/biografia. Acesso em: 11 mar. 2023.
32
Disponível em: https://youtu.be/Hyn1LRhSWV0?t=45. Acesso em: 14 mar. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
1976, entrou para a Escola Villa Lobos no Rio de Janeiro onde se formou no campo da percussão erudita
(Bergamini 2014, 1; Galvão 2015, 54).
Márcio se destacou como baterista através de suas performances no Hermeto Pascoal & Grupo, conjunto
no qual ingressou em 1981. O baterista colaborou intensamente na discografia de Hermeto entre 1982 e
1992 nos álbuns Hermeto Pascoal e Grupo (1982), Lagoa da Canoa Município de Arapiraca (1984), Brasil
Universo (1985), não toca quem não quer (1987) e Festa dos Deuses (1992). Esta fase é conhecida no meio
musical como sendo a da “Escola Jabour”
33
(Bergamini 2014, 3). No ano de 2002, após uma longa pausa,
Márcio voltou a gravar com o grupo de Hermeto no álbum Mundo Verde Esperança, lançado em 2003 (Silva
2016, 26). Outra colaboração expressiva de Márcio é com o bandolinista Hamilton de Holanda com quem
gravou diversos álbuns entre 2002 e 2017. Márcio Bahia lançou em 2011 um álbum autoral intitulado
Quebrando tudo (Galvão 2015, 5).
A contribuição da bateria de Márcio Bahia interpretando ritmos nordestinos na discografia de Hermeto
Pascoal entre 1982 e 2003 é bastante numerosa, conforme ilustrado na Tabela 11.
Tabela 11 Baião, maracatu e frevo na bateria de Márcio Bahia em gravações de Hermeto Pascoal entre 1982 e 2003
Álbuns de Hermeto Pascoal
Faixas
Baião, maracatu e frevo por Márcio Bahia
Hermeto Pascoal & Grupo (1982)
2 “Magimani Sagei”
Baião (1:23) caixa sem esteira e tambores
3 “Lá Na Casa da Madame Eu Vi”
Baião com aro de caixa e caixa
6 “Novena”
Baião
8 “Cores”
Baião (3:02), frevo (3:14)
9 “A Taça”
Baião (0:58-1:10; 2:09-3:52)
10 “Briguinha de Músicos Malucos no Estúdio”
Frevo (3:58)
Lagoa da Canoa Município de
Arapiraca (1984)
1 “Ilza na Feijoada”
Referência de frevo no final do tema (4:16-4:45)
4 “Papagaio Alegre”
Baião
7 “Spock na Escada”
Baião
8 “Mestre Radamés”
Trechos de maracatu (2:13-2:22) e baião (2:38-
2:46)
9 “Frevo em Maceió”
Frevo
Brasil Universo (1985)
1 “Mentalizando a Cruz”
Baião (7:15)
4 “Era Pra Ser e Não Foi”
Baião (2:07)
6 “O Tocador Quer Beber”
Baião/forró
7 “Arapuá”
Trechos de baião (5:47) e frevo (6:05)
10 “Sempre Feliz”
Baião
Só Não Toca Quem Não Quer (1987)
1 "De Sábado pra Dominguinhos”
Baião/xaxado
4 “Zurich”
Trecho de frevo em 2/4 (6:02-6:32) sobrepondo
ostinato de piano em 5/4
8 “Candango”
Xote
9 “Suíte Mundo Grande”
Referências de baião e frevo
13 “Ilha das Gaivotas”
Trecho de baião (2:02-2:08)
16 “Quiabo”
Maracatu
19 “Rancho das Sogras”
Frevo (1:53)
Festa dos Deuses (1992)
3 “Viajando Pelo Brasil”
Baião e levada de maracatu no final do tema
(4:48)
11 “Depois do Baile”
Levada de baião/xaxado em 7/8 no improviso
(3:02)
15 “Ginga Carioca”
Levada de baião em 7/8 no final do tema (4:00)
33
Fábio Bergamini (2014) afirma que o termo “Escola do Jobour” ou “Escola Jabour” não representa “uma
escola no sentido formal do termo. É apenas uma expressão endógena usada por Hermeto Pascoal e pelos
membros de seu grupo para designar esse período de intensa convivência, ocorrido no bairro do Jabour (RJ)
durante as décadas de 80 e 90” (Bergamini 2014, 23).
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Tab. 11 (cont.)
Mundo Verde Esperança (2003)
1 “Taiane”
Frevo (2:23)
2 “Celso”
Trecho de frevo (0:09-0:13)
5 “Caio”
Trecho de maracatu (3:42) e baião (4:12)
6 “Taynara”
Baião em 7/4
8 “Ilzinha”
Maracatu, baião e trechos de baião em 7/8
(4:54-5:02) e 5/8 (5:03-5:06)
9 “Aluxan”
Trechos de frevo (2:08) e baião (2:22)
11 “Renan”
Frevo e baião (2:01; 3:31)
12 “Camila”
Frevo em 3/4 (1:50)
Trecho de baião em 3/4 (2:27)
14 “Ailin”
Levada baseada no frevo em 3/4
O disco Hermeto Pascoal & Grupo (1982) marcou os primeiros registros fonográficos das performances do
baterista Márcio Bahia no conjunto de Hermeto. No frevo “Briguinha de músicos malucos no estúdio”
34
,
Márcio executa uma variação da adaptação deste gênero para a bateria (que normalmente é tocado com
mãos alternadas na caixa), utilizando os acentos principais do gênero com uma das mãos na caixa, enquanto
o prato de condução toca um padrão na figura de colcheia (Figura 30). A resultante desta interpretação é
uma levada que sintetiza o frevo dando uma característica sonora mais “aberta” devido ao uso do prato.
Figura 30 Frevo com prato na execução de Márcio Bahia na faixa “Briguinha de músicos malucos no estúdio” (4:00) do disco Hermeto
Pascoal & Grupo (1982)
Fonte: Transcrição do autor
No mesmo álbum, na introdução da faixa Magimani Sagei
35
, a performance da bateria tem um caráter
bastante melódico (utilizando os tambores) que casa perfeitamente com a linha de baixo de Itiberê Zwarg
(Demarchi 2013, 71). Nesta perspectiva, no trecho 1:21 da gravação, Márcio toca uma levada de baião
usando uma frase que é tocada com tambor agudo e surdo, caixa sem esteira, e ostinato de bumbo e hi-hat
com pé na célula rítmica do xaxado (Figura 31).
Figura 31 Baião na bateria de Márcio Bahia na faixa “Magimani Sagei” (1:21) do álbum Hermeto Pascoal & Grupo (1982)
Legenda: D = mão direita e E = mão esquerda
Fonte: Transcrição do autor
No álbum Lagoa da Canoa Município de Arapiraca de 1984, a gravação de uma rápida performance de
maracatu no inventivo arranjo de “Mestre Radamés”. Do mesmo modo que “Série de Arco” e “Magimani
Sagei”, a parte da bateria foi totalmente escrita por Hermeto Pascoal e executada por rcio Bahia
34
Disponível em: https://youtu.be/wweL2lDB4do?t=239. Acesso em: 14 mar. 2023.
35
Disponível em: https://youtu.be/UnWFypcIljI?t=80. Acesso em: 14 mar. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
(Bergamini 2014, 36). A gravação de “Mestre Radamés”
36
começa com uma complexa e inusitada levada de
bateria, com andamento muito rápido, na qual Márcio Bahia executa abertura de hi-hat nos contratempos
e acentuações sincopadas no bumbo. A extensa melodia, que é apresentada de forma contínua e que não
se repete até o final do arranjo, é tocada sendo sobreposta pelas diversas levadas de bateria, junto com o
baixo, em inúmeros ritmos e andamentos. Dentre os vários gêneros tocados por Márcio, tem-se o maracatu
entre 2:13 e 2:22 na gravação. Neste trecho, Márcio toca o maracatu de forma breve, utilizando a caixa com
mãos alternadas e toque múltiplo com acento na segunda nota, e o bumbo marcando o que seria a rítmica
da alfaia do maracatu (Figura 32).
Figura 32 Maracatu por Márcio Bahia na faixa “Mestre Radamés” (2:13) do disco Lagoa da Canoa Município de Arapiraca (1984)
Fonte: Transcrição do autor
A execução de ritmos nordestinos em compassos ímpares como 3/4, 5/8, 7/4 e 7/8, apesar de não ser algo
muito comum pois estes são tocados normalmente em compassos binários ou quaternários, é bastante
recorrente na discografia de Hermeto Pascoal (Bergamini 2014, 112). No disco Festa dos Deuses (1992), por
exemplo, na seção dos improvisos da faixa “Depois do Baile”
37
(3:02-3:26), Márcio Bahia toca um
baião/xaxado em 7/8 com um padrão rítmico de bumbo e hi-hat com pé executado em uníssono (Figura 33).
Figura 33 Baião/xaxado em 7/8 por Márcio Bahia na faixa “Depois do Baile” (2:56) do disco Festa dos Deuses (1992)
Fonte: Transcrição do autor
Nesta perspectiva, no álbum Mundo Verde Esperança de 2003, ressalto o complexo arranjo da faixa
“Ilzinha”
38
. No final do tema, entre 4:35 e 5:03 na gravação, Márcio Bahia executa o baião em duas fórmulas
de compassos: 7/8 e 5/8. Nas duas levadas, o baterista utiliza o hi-hat fechado como elemento condutor
(Figura 34).
Figura 34 Baião em 7/8 e 5/8 por Márcio Bahia na faixa “Ilzinha” (4:54 e 5:03) do disco Mundo Verde Esperança (2003)
Fonte: Transcrição do autor
36
Disponível em: https://youtu.be/wf4gFFDZnRw?t=132. Acesso em: 14 mar. 2023.
37
Disponível em: https://youtu.be/r4fRERI9Yx4?t=174. Acesso em: 14 mar. 2023.
38
Disponível em: https://youtu.be/lJH6iH4l2hg?t=293. Acesso em: 15 mar. 2023.
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Galvão, Christiano Lima. Panorama dos modos de execução do baião, do maracatu e do frevo na bateria em gravações de Hermeto Pascoal e Egberto
Gismonti entre 1965 e 2003
Por fim, na faixa “Camila”
39
, do mesmo álbum, Márcio Bahia executa o frevo em compasso 3/4. Neste trecho
da gravação (1:51), o baterista toca, somente os acentos principais do frevo na caixa para em seguida
preencher, com mãos alternadas, a batida na subdivisão de semicolcheia, o que remete à rítmica tradicional
do gênero musical (Figura 35).
Figura 35 Frevo em 3/4 na bateria de Márcio Bahia na faixa “Camila” (1:51) do disco Mundo Verde Esperança (2003)
Fonte: Transcrição do autor
4. Considerações finais
Levando em consideração as transcrições realizadas, foi possível construir um amplo panorama dos modos
de execução do baião, maracatu e frevo na bateria na discografia de Hermeto Pascoal entre 1965 e 2003, e
na de Egberto Gismonti entre 1972 e 1992. Os recortes das performances dos bateristas estudados ilustram,
de forma clara, as diferentes maneiras de interpretação de ritmos nordestinos no fértil contexto musical das
obras destes compositores no período. Este argumento é reforçado pela expressiva contribuição dos
bateristas Airto Moreira, João Palma, Robertinho Silva, Eduardo Nazário, Nenê, Alfredo Dias Gomes e
Márcio Bahia nas gravações pesquisadas.
Do ponto de vista da performance destes bateristas, as variadas execuções de baião, de frevo e de maracatu
neste contexto musical podem ser entendidas como aquelas que se apoiam inicialmente nos padrões
tradicionais dos gêneros musicais, mas que permitem também inúmeras variações. Dentre alguns recursos
interpretativos evidenciados nas transcrições e que traduzem tais variações posso elencar: diversas técnicas
de execução da bateria, notas fantasmas na caixa, toque múltiplo, subdivisões do xaxado no hi-hat com pé,
padrões em uníssono com os pés e execução dos gêneros musicais em fórmulas de compassos 3/4, 5/8 e
7/8. Neste sentido, posso dizer que as performances dos bateristas que foram estudadas neste artigo ajudam
a compreender maneiras muito particulares de interpretação do baião, do maracatu e do frevo que se
encontram no contexto da música instrumental brasileira, principalmente, na discografia de Hermeto
Pascoal e Egberto Gismonti no recorte temporal estudado.
Finalmente, de acordo com o estudo quantitativo ilustrado no início do artigo, percebe-se que o baião, o
frevo e o maracatu na bateria estão constantemente presentes nos álbuns de Egberto Gismonti e Hermeto
Pascoal entre 1965 e 2003. Neste sentido, considerando a importância de suas obras, posso afirmar que
Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti, juntamente com seus instrumentistas, consolidaram um modo muito
especial de execução de ritmos nordestinos no âmbito da nossa música instrumental.
39
Disponível em: https://youtu.be/eDolUn6tzjo?t=110. Acesso em: 15 mar. 2023.
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Silva, Raphael Ferreira da. 2016. Improvisação e interação na “Escola Jabour”. Tese (Doutorado em Música).
Campinas: Universidade Estadual de Campinas.