1. Introdução
As variadas formas de execução de ritmos nordestinos na bateria, levando em consideração os diversos
aspectos da performance, encontram no âmbito da música instrumental brasileira um campo bastante fértil
e criativo. É importante salientar que considero música instrumental brasileira, ou simplesmente, música
instrumental, aquele gênero musical que surgiu entre o final dos anos 1960 e início dos anos 1970 no qual
instrumentistas e compositores sedimentaram uma linguagem musical que articulava gêneros populares
brasileiros em diálogo, explícito ou não, com estilos do jazz, entre outras correntes (Bastos e Piedade 2006,
935). Desta forma, a sedimentação da música instrumental ao longo da década de 1970 se deu por diversos
fatores como, por exemplo, as condições mercadológicas da indústria fonográfica no Brasil, o contexto da
música brasileira produzida na época, as diversas correntes estilísticas do jazz nos Estados Unidos e a atuação
de compositores e instrumentistas brasileiros (Bastos e Piedade 2006, 935; Bahiana 2005, 1). Dentre os
fatores citados, posso dizer também que as obras musicais de Egberto Gismonti e Hermeto Pascoal
exerceram um papel importante no processo de consolidação da música instrumental, servindo como pilares
fundamentais do gênero. Não obstante, estes pilares não teriam uma estrutura adequada se não fossem
apoiados também nas colaborações dos instrumentistas que gravaram boa parte de suas obras, destacando
aqui os bateristas e percussionistas.
Deste modo, este texto propõe focar na discografia de Egberto Gismonti e Hermeto Pascoal, lançando luz
sobre a execução da bateria no que tange à interpretação do baião, maracatu e frevo. A escolha dessa
investigação se deu por algumas razões. A primeira delas é pelo fato de já trabalhar com o estudo da
performance de ritmos nordestinos na bateria na música instrumental em minhas pesquisas acadêmicas
(Galvão 2015 e 2022) e na minha trajetória profissional. Segundo, apesar de reconhecer as diferenças
estético-musicais, o material discográfico de Hermeto e Egberto que abarca a interpretação do baião, do
frevo e do maracatu é muito representativo. Assim, a escolha desta temática investigativa se deu não
somente por uma curiosidade pessoal, mas pela importância e predominância que os ritmos nordestinos
elencados adquiriram no repertório dos compositores e também nas performances dos seus bateristas,
conforme ilustro ao longo deste texto.
Sendo assim, este artigo traz recortes da interpretação do baião, do maracatu e do frevo nas performances
de sete relevantes bateristas brasileiros que gravaram álbuns de Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti entre
1965 e 2003. São eles: Airto Moreira, João Palma, Robertinho Silva, Zé Eduardo Nazário, Nenê, Alfredo Dias
Gomes e Márcio Bahia. O recorte temporal, a escolha dos álbuns e a seleção dos citados bateristas foi feita
a partir de uma extensa escuta investigativa na discografia de Hermeto e Egberto, desde o princípio de suas
carreiras, em meados nos anos 1960, até o início dos anos 2000. O critério adotado foi o de averiguar nas
gravações a presença da bateria executando o baião, o maracatu ou o frevo