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DOI: 10.35699/2317-6377.2022.48275
eISSN 2317-6377
Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis:
Análise da relação entre música e imagem
Makis Solomos
https://orcid.org/0000-0003-3804-2620
Universidade Paris 8, MUSIDANSE
Makis.Solomos@univ-paris8.fr
André Villa
https://orcid.org/0000-0001-9146-473X
Universidade Paris 8, MUSIDANSE
andre.villa@univ-paris8.fr
SCIENTIFIC ARTICLE
Submitted date: 09/12/2022
Final approval date: 15/04/2023
Resumo: O filme Oriente-Ocidente, dirigido por Enrico Fulchignoni com música de Iannis Xenakis (ainda não
disponível comercialmente) é, em geral, apenas mencionado através da versão de concerto homônima da música de
Xenakis. Esta indisponibilidade da obra cinematográfica é lamentável, primeiro porque se trata de um documentário
com excelente conteúdo e excelente qualidade visual e, segundo, porque demonstra a extraordinária capacidade de
imaginação sonora de Xenakis. Esta imaginação expressa-se através de ideias musicais (composicionais), mas
também através da forma como Xenakis ilustra e comenta as imagens do filme. O artigo estuda pela primeira vez o
filme enquanto tal e a sua música através da relação entre música e imagem.
Palavras-chave: Xenakis; Orient-Occident; música eletroacústica, trilha sonora.
Abstract: The film Orient-Occident, directed by Enrico Fulchignoni with music by Iannis Xenakis (not yet
commercially available) is, in general, only mentioned through the homonymous concert version of Xenakis's music.
This unavailability of the cinematographic work is regrettable, firstly because it is a documentary with excellent
content and excellent visual quality and, secondly, because it demonstrates Xenakis' extraordinary capacity for sonic
imagination. This imagination expresses itself through musical (compositional) ideas, but also through the way
Xenakis illustrates and comments on the film’s images. The article studies film as such for the first time and its music
through the relationship between music and image.
Keywords: Xenakis; Orient-Occident; electroacoustic music; film-music.
Per Musi, no. 42, Sessão Temática: Iannis Xenakis, e224229, 2022
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
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Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis:
Análise da relação entre música e imagem
Makis Solomos, Universidade de Paris 8, MUSIDANSE, makis.solomos@univ-paris8.fr
André Villa, Universidade de Paris 8, MUSIDANSE, andre.villa@univ-paris8.fr
1. Introdução
Durante o início dos anos 1960 (ou final dos anos 1950), Xenakis teve a oportunidade de lucrar algum
dinheiro compondo, paralelamente às suas obras musicais, trilhas sonoras para várias mídias. Estas trilhas
incluem Formes rouges (Formas vermelhas, retirada de seu catálogo) para o filme homônimo também
referida como Pièce K (Peça K) nos esboços de Xenakis para 8 sicos (um dos quais toca Ondes
Martenot, um caso único na música de Xenakis) e Vasarely, para 4 músicos também para um filme (que
também foi retirada, mas agora está disponível em um disco comercial
1
); música para três spotes
publicitários: para a pasta de dentes alemã Odol, para a loção pós-barba holandesa “Pitralon”, e também
para o creme de barbear holandês “Pitrell”; e talvez para alguns outros projetos.
A única obra bastante conhecida desta categoria é a música para o filme Orient-Occident, devido ao fato de
Xenakis, após a composição da trilha sonora, decidir compor uma peça para concerto com o mesmo título,
a partir do mesmo material. Isto é importante porque, de fato, é através da peça eletroacústica chamada
Orient-Occident que o filme Orient-Occident é conhecido nos dias de hoje (2023), ainda não existe uma
versão comercialmente disponível ou restaurada do filme
2
.
Este artigo enfoca o filme Orient-Occident. Precedido por um artigo que analisa a relação entre a música
para o filme e a música para a versão de concerto (Solomos 2009) artigo do qual se extrai alguns
elementos , pela primeira vez, ele estuda o filme como tal e sua música. Vamos analisar o filme, a música
do filme e a relação entre a música e a imagem
3
.
2. O filme
Comissionado pela Unesco, o filme Orient-Occident, de um pouco mais de 20 minutos de duração, foi
realizado em Cannes por Enrico Fulchignoni em maio de 1960. Trata-se de uma exposição de 1958-59
organizada por Vadim Elisséeff, curador do museu parisiense Musée Cernuschi, durante a qual foram
exibidas esculturas e outros objetos da Ásia, Europa e Egito, destacando as relações entre Leste (Oriente) e
1
Iannis Xenakis, Electronic music 2: Polytope de Cluny, Hibiki Hana Ma, Neg-ale for “Vasarely”, Mode
Records, mode 203, 2008. Notas de programa de Makis Solomos.
2
Gostaríamos de agradecer ao GRM (Groupe de recherches musicales) e seu ex-diretor, Daniel Teruggi, que
nos forneceu uma cópia. Hoje em dia o filme pode ser consultado na internet:
https://www.youtube.com/watch?v=7siM9_9GSiI.
3
Trechos do presente artigo foram extraídos do artigo de Solomos (2009) e traduzidos por Danilo Rossetti.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
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Oeste (Ocidente). O subtítulo do filme é Images d’une exposition (Imagens de uma exposição),
provavelmente uma referência a Mussorgsky. No filme, um texto falado descreve estas relações, um texto
que, se confiarmos nos créditos finais do filme, foi escrito por Pierre Henry. Fulchignoni escreveu um artigo
importante sobre sua colaboração com Xenakis, no qual ele escreve:
O filme era difícil de fazer, pois envolvia a mudança de um lugar para outro, de uma
cultura para outra, de uma época para outra. Uma das seções do filme, por
exemplo, envolveu a transição da estátua imóvel, de perspectiva frontal, como a
dos egípcios, para a escultura dinâmica e tensionada da Grécia, particularmente a
de Alexandre, através de várias etapas. O objetivo era dar a impressão desta
evolução e ao mesmo tempo aquela da permanência mágica e imutável do corpo
humano. Havia todo tipo de casos deste tipo. Se eles me colocavam problemas
difíceis como cineasta, eles colocavam problemas talvez ainda mais complexos para
o músico, porque, onde a transição visual podia encontrar soluções na montagem,
para a música, estas mesmas operações de montagem implicavam extensões de
uma área para outra, um empreendimento muito mais complexo
4
. (1981, 256-257,
trad. Danilo Rossetti)
Segundo estes relatos de Fulchignoni, a realização do filme durou cerca de oito meses, fato que de certa
forma chama a atenção para a complexidade do projeto. Sobre a produção do projeto, por exemplo, as
dificuldades com as filmagens dos planos, devido ao fato de ser necessário filmar objetos de tamanhos
muito diferentes. A equipe era também constituída por dois cineastas italianos bem qualificados. O diretor
de fotografia, Piero Portalupi, era um cinematógrafo muito experiente com vários longas-metragens em
seu currículo. Piero Portalupi foi auxiliado por Idelmo Simonelli, um experiente operador de câmera,
maquinista e igualmente diretor de fotografia. A montagem do filme consumiu três meses de trabalho e
obrigou Fulchignoni e Elisséeff a encontrar um fio condutor para desenvolver uma narrativa visual
coerente e fluida. Somam-se a isso os dois meses em que Xenakis, Pierre Henry e alguns colegas do GRM
trabalharam para criar a música, a narração e mixagem da trilha sonora do documentário.
O filme, nas palavras de seu diretor, narra “o quadro de contatos entre culturas
5
(Fulchignoni 1981, 257).
Além disso, o documentário como uma espécie de catálogo de exposição nos mostra, por meio de sua
excepcional composição de imagens, “a extensão do intercâmbio artístico no mundo antigo
6
. Quanto à
construção da narrativa do filme, Fulchignoni descreve que deviam escolher entre duas opções: seguir um
encadeamento cronológico ou um encadeamento temático. A opção cronológica, segundo o diretor, teria
4
“Le film était de réalisation difficile, puisqu’il s’agissait de passer d’un endroit à l’autre, d’une culture à
l’autre, d’une époque à l’autre. L’une des sections du film, par exemple, comportait le passage d’une
statuaire immobile, à perspective frontale, comme celle des Égyptiens, à la sculpture dynamique, en
tension, de la Grèce, celle d’Alexandre en particulier, à travers plusieurs étapes. Il s’agissait là de donner en
même temps l’impression de cette évolution et celle de la permanence magique et immuable du corps
humain. Il y avait toutes sortes de cas de ce type. S’ils me posaient, en tant que cinéaste, des problèmes
ardus, ils en posaient peut-être d’encore plus complexes au musicien, car, là où la transition visuelle pouvait
trouver des solutions dans le montage, pour la musique, ces mêmes opérations de montage impliquaient
des prolongements d’une zone dans l’autre, entreprise beaucoup plus complexe”.
5
“le cadre des contacts entre les cultures”.
6
“l’ampleur des échanges artistiques dans le monde ancien”. Texto da narração de Orient-Occident (1’00’’).
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
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os obrigado a fazer a montagem saltar muitas vezes de um território a outro, sob pena de fragmentar e
dispersar o discurso, tornando-o assim visualmente confuso (258).
2.1. O desenvolvimento do fio condutor da narração
Fulchignoni e Elisséeff optaram por concentrar a narração do filme essencialmente nos temas (e.g.,
movimento corporal, arte animal representada nas imagens, monstros e bestiários fantásticos,
maternidade). Essa escolha permitiu que Orient-Occident expressasse ideias comuns às esculturas em
torno desses elementos. O fato de sublinhar as transformações ou os elementos que se mantêm
constantes nas representações do corpo humano, dos corpos dos animais ou mesmo de destacar certos
detalhes compartilhados na composição de diferentes esculturas (e.g., a simetria do rosto e/ou do cabelo)
tornou a narrativa fluida pela comparação simples e direta de alguns elementos temas comuns às obras
que se sucedem nas imagens. A narração cinematográfica, independentemente da construção de sua
sequência de estátuas que ziguezagueia entre origens distantes tanto geograficamente quanto
cronologicamente, é de uma coerência bastante simples cuja apresentação, encadeada via os citados
temas, facilita não somente a compreensão como o acesso do conteúdo do documentário ao grande
público.
O estilo narrativo de Orient-Occident é, de certa forma, um tanto padrão para documentários ditos à
tse, isto é, documentários que visam persuadir o espectador a adotar um certo ponto de vista sobre o
sujeito abordado (Lindenmuth, 2011). Essa construção da narrativa é baseada em uma narração over, uma
voz que narra de forma omnisciente e “autoritária” – o conteúdo do filme e que nos explica, por vezes de
forma bastante redundante, tudo o que vemos na imagem. Essa voz invisível e desencarnada é o que o
realizador britânico Paul Rotha chama de “voz de deus” (apud Chanan 2007, 88) à qual muitos
documentaristas na época (início dos anos 60) eram refratários, visto que esta proposta reduz tanto o
poder da imagem quanto o desenvolvimento de uma perspectiva do espectador. Momento em que
precisamente começa a se desenvolver o chamado cinéma-vérité ou cinéma directe (Freire 2011; Gauthier
1995, cap. 5), potencializado pelas inovações teóricas e terminológicas (Graff 2011, 31-46) mas
também pelos desenvolvimentos tecnológicos dos quais podemos citar a silenciosa e portátil câmera
Éclair-Coutant 16mm e, principalmente, o surgimento do também portátil gravador Nagra III (1958).
Esses elementos possibilitaram não somente a mobilidade, mas principalmente a gravação síncrona das
imagens com o som direto, captando assim as reações produzidas em situação pelos sujeitos do filme “pris
sur le vif”, como em uma observação da “autenticidade do vivido” nos diria Edgar Morin (apud Gauthier
1995, 74)
7
, correalizador com Jean Rouch de Chronique d’un été. Filmado em 1960 e lançado em 1961, este
filme é considerado o pivô dessa transformação nos documentários etnocinematográficos. Uma
abordagem em total contraponto com filmes que visam descrever. No entanto, o conteúdo proposto por
Orient-Occident a apresentação sistemática de um assunto artístico e cultural via exemplos que remetem
à um catálogo de exposição (vide o subtítulo do filme: Images d’une exposition) de certa forma demanda
e cauciona esse formato de narração over ou voz de deus. Em complementaridade com a música de
Xenakis, esta forma de narrativa dota de palavras sujeitos que não podem se expressar (e.g.,
documentários sobre animais e, justamente, objetos). Uma relação que sublinha e torna evidente a
7
Gauthier, Guy. 1995, op. Cit., p. 74. Ibid. para a próxima citação.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
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porosidade que, ao curso de séculos na antiguidade, se consolida entre culturas tão distantes geográfica e
cronologicamente.
2.2. A composição das imagens
Em termos de cinematografia, podemos elencar 7 elementos básicos que constituem a composição das
imagens (Block 2014).
Cor: sendo o documentário em preto e branco, o elemento cor está obviamente excluído da composição
de suas imagens.
Níveis de cinza (ou seja, a luminosidade do objeto em relação a uma escala de tons ou níveis de cinza): o
nível de cinza dos elementos que compõem as cenas muda em relação à densidade da intensidade e a
incidência de luz (luminância) (Andersson 2015, 337 e segs.). Orient-Occident utiliza um desenho de luz que
coloca em destaque não somente as formas, mas também os relevos e detalhes das obras. O chamado
contraste tonal se desenvolve através da diferença no brilho dos objetos. A diferenciação por níveis de
cinza opera, entre outros, com a percepção da profundidade do conteúdo da imagem. Com as mesmas
proporções, objetos mais claros geralmente parecem mais próximos ao espectador quando comparados
aos mais escuros.
Espaço: a escolha de um espaço predominantemente plano, construído pelo posicionamento frontal dos
objetos face à câmera os chamados planos frontais produz, em teoria, um espaço “sem profundidade”
(e contrasta justamente com o elemento anterior, que acentua a percepção de profundidade por
diferentes níveis de cinza). A principal razão dessa construção de um espaço plano é que
majoritariamente em Orient-Occident uma ausência de pontos de fuga, o que por momentos torna
inoperante a ilusão de profundidade cinematográfica pela perspectiva (ilusão, visto que a tela é,
obviamente, 2D). O espaço é, portanto, bastante neutro” e esse espaço real” que está na frente da
câmera é assim representado de forma a corresponder com o que está no quadro cinematográfico (Villain
1984). Isto se pelo simples fato que os planos frontais reforçam a natureza bidimensional da superfície
da tela. Um espaço que agora molda as escalas as proporções dos objetos na imagem. Sem perspectiva e
sem outros referenciais que não sejam os próprios objetos, o espaço nico assim construído mantém a
sua neutralidade para chamar a atenção exclusivamente sobre os objetos (e seus detalhes) acentuando as
suas qualidades. Essas qualidades expõem as tridimensionalidades das obras reforçadas por outros
elementos que compõem a imagem (e.g., jogo de sombras e luzes, profundidade de campo, movimento
dos objetos). Em princípio, as obras são todas apresentadas em uma mesma escala, o que não nos permite
perceber suas respectivas dimensões. Como consequência, torna-se impossível uma comparação entre os
volumes físicos das obras. Mesmo quando as estátuas são apresentadas simultaneamente no quadro (e.g.,
1112’’), a composição da imagem atua para sublimar as diferentes proporções físicas das mesmas. Em
outras palavras, as diferenças nas proporções entre as estátuas ocorrem mais nas relações entre o todo e
suas partes, entre uma obra e seus detalhes, entre a textura de suas superfícies e o foco de uma
profundidade de campo por vezes bem pouco profunda. Tais fragmentos de representação do corpo
humano também são colocados em valor pelo recorte do quadro a “aproximação da câmera” pela
mudança de valor de plano e pelo percorrer da câmera na extensão da superfície das obras.
Como foi dito, em planos frontais as esculturas surgem sem uma relação de perspectiva que possa se
construir entre o espaço e a obra ali localizada. De alguma forma, o fundo em relação às obras nos propicia
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
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essa profundidade neutra que faz emergir as figuras em primeiro plano, como em uma relação
figura/fundo nos termos da Gestalt (Guillaume 1979). A cinematografia a captação do movimento por
momentos “imita” a fotografia still a captura do instante e se apresenta como em um catálogo de
exposição. Mas isso dura apenas instantes que se encontram dispersos em diversos planos do
documentário. Nesses momentos, as técnicas cinematográficas viabilizam a construção de uma
perspectiva para além das próprias obras visto que há uma ausência de contextualização das esculturas em
relação ao espaço onde se inserem. Se desenvolve assim a impossibilidade de se determinar uma escala
com base no tamanho dos objetos. Uma tal comparação de grandezas poderia sugerir uma escala de
valores de julgamento estético relativa à dificuldade de execução das obras. Frente a estátuas muito
grandes, pensamos no empenho em sua execução em relação à superfície a ser trabalhada, a
complexidade para se respeitar suas proporções, a dificuldade de acesso para poder se esculpir a matéria-
prima, o tempo de trabalho dedicado a esculpi-la. Para objetos muito pequenos, dos quais os broches e
colares que foram usados no documentário (Fulchignoni 1981, 259), tais esculturas podem evocar a
necessidade de se aplicar gestos precisos e absolutamente delicados, técnicas complexas e de uma
dificuldade de execução exacerbada pela então ausência de ferramentas e tecnologias.
No entanto, em certos momentos do filme, o espaço é construído por sutis ângulos de planos de filmagem
(e.g., plongée e contra plongée sem grandes inclinações). Essa perspectivação visa construir um equilíbrio
que vem destacar os detalhes nas texturas das superfícies das obras, qualidade que é ainda amplificada
por recorte dos planos em aproximação dos objetos (assim como pela incidência e a intensidade da
iluminação). O fato de podermos perceber detalhes e texturas das obras com estes planos próximos
também cria a ilusão de profundidade em contraponto aos supracitados planos frontais e o espaço plano.
A ilusão de perspectiva também surge de tempos em tempos, motivada em grande parte pelas mudanças
das formas das obras graças aos movimentos que estas realizam girando sobre si mesmas.
Finalmente, em certos momentos do filme, principalmente quando uma aproximação das obras, a
profundidade de campo vem igualmente quebrar esse espaço plano.
Linhas: o elemento linha, diferente dos demais que compõem uma imagem, surge quando existe
contraste. Existem diversas maneiras de se criar linhas como atributos de uma imagem (e.g., borda,
contorno, eixo, intersecção de planos) (Block 2014, cap. 4). A borda determina a silhueta, o perfil de um
objeto em 2D. O contorno faz o mesmo, mas em objetos em 3D. Em Orient-Occident, a imagem reforça
justamente os contornos das obras usando a diversidade de técnicas de composição de imagem que aqui
elencamos.
Formas: as sequências de imagens são compostas de maneira a operar sobre nossa percepção da
tridimensionalidade das obras que emergem sobre um espaço plano.
Ritmo: as obras audiovisuais possuem dois tipos de ritmo: a) o ritmo da trilha sonora, aqui composta pela
narração de Chambon e a música de Xenakis; e b) o ritmo visual, proporcionado principalmente pela
montagem e pelos movimentos dos objetos no quadro. Podemos também construir o ritmo visual pelos
movimentos de câmera e, em alguns casos, pelos movimentos e mudanças de luz. No entanto, o ritmo
visual de Orient-Occident se desenvolve lentamente ao longo do documentário. Em última análise, ele se
constitui principalmente como séries de movimentos que não definem ritmos. Esta “lentidão” de certa
forma nos permite contemplar as obras por tempo suficiente para nos assegurarmos pela imagem dos
detalhes das esculturas para as quais a narração nos chama a atenção. Este pode ter sido um dos fatores
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
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que permitiu ou sugeriu a Xenakis o uso, em certas passagens, de sons longos. Sons que se
desenvolvem lentamente sem sugerir articulações sonoras que venham se contrapor ou reforçar as
articulações de um ritmo visual pouco articulado. Em contraponto, em certos momentos o uso de
elementos rítmicos e articulados na trilha musical remetem não a elementos presentes na cena, mas a
uma forma de ilustração de sonoridades dessas culturas antigas. Ilustrações que emergem e se
constituem no nosso imaginário, visto que registros sonoros dessas culturas da antiguidade são,
evidentemente, totalmente inexistentes.
Movimento: os movimentos que compõem as imagens se constroem de maneira plural, com movimentos
de câmera, movimentos de objetos, movimentos de luz e a combinação entre todos esses elementos.
Aspectos que propomos analisar de forma mais detalhada.
2.3. Movimentos de câmera e objetos
O filme de Fulchignoni usa movimentos de mera que preservam a natureza 2D do espaço cênico
simplesmente por o criar movimentos relativos: a) os pans horizontais, os pans verticais e as
aproximações pelas mudanças de valor do plano são amplamente trabalhados pelo posicionamento da
câmera em eixos frontais aos objetos; b) os movimentos que partem de um certo ponto no espaço e se
dirigem ao encontro dos objetos funcionam como uma espécie de entrada de cena de personagens. Neste
efeito bastante teatral, as personagens, as estátuas, ora surgem pelos lados do quadro, ora emergem por
baixo, como se saíssem de alçapões, ou, ocasionalmente, descem ao palco como que carregadas por um
mêkhanê, um mecanismo ou maquinaria do teatro grego antigo.
Quanto ao movimento de objetos, a rotação das obras em seus eixos longitudinais cria uma ilusão de
movimento circular da câmera em torno destas. Este movimento é um dos elementos que, tal como em
um museu onde podemos circular no entorno das esculturas, vêm chamar a nossa atenção não somente
quanto à tridimensionalidade dos objetos. Essa rotação coloca também em evidência o movimento
intrínseco às obras (e.g., pernas à frente, braços levantados, o calçar de uma sandália), movimento que
algumas esculturas já apresentam três milênios antes da nossa era (estátua egípcia, 16’22’’).
Finalmente, Orient-Occident é composto por uma diversidade de movimentos que se combinam a partir
dos diversos exemplos acima referidos, conjugando pans verticais com rotação das estátuas em seus eixos,
movimentos diagonais ou mesmo rotações das estátuas em seus respectivos eixos longitudinais. Tudo isso
somado a uma iluminação que, pelo movimento dos refletores de luz, clareia os objetos fazendo-os em
certos momentos simplesmente emergir sobre o fundo sombrio (129’’).
2.4. A iluminação
Ao que nos parece, a iluminação de Orient-Occident é produzida principalmente por dois pontos de luz: a
luz principal ou de ataque (key light) e uma luz lateral (a luz de preenchimento ou fill light). Mas em
diversos momentos, podemos perceber a existência de um provável terceiro ponto típico, a contraluz
(backlight), que tem por função recortar a silhueta dos personagens mis en scène (Andersson 2015,
cap. 12). A questão aqui é que a luz principal é por vezes colocada em posições laterais em ângulos bem
abertos (acima de 45°), o que tem por característica salientar o relevo das obras por meio de um
acentuado jogo de sombras e luzes. As luzes são, obviamente, ajustadas com grande precisão pois as áreas
iluminadas são, em determinados momentos, bem pequenas em comparação à superfície global das
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
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estátuas. Quanto aos movimentos da iluminação, estes se apresentam como um aspecto muito peculiar do
filme. Ainda que a luz não seja trabalhada com um ângulo zenital (north-light), posição que tende a
iluminar com uma forte conotação celestial ou divina” (Revault d’Allonnes 1991, 61) certos desenhos de
luz apresentados no filme se aproximam da chamada “iluminação Rembrandt”. Essa iluminação, dita claro-
escuro, produz um significativo sombreado principalmente na face do personagem e nos permite
destacar nas obras uma intensa estrutura dramática. Ao mesmo tempo, essa proposta nos mostra e
reforça a tridimensionalidade das esculturas.
2.5. A profundidade de campo
No cinema, a profundidade de campo constitui uma indispensável ferramenta de construção da narrativa
visual. Fulchignoni a usa para reforçar nossa atenção sobre os detalhes das obras. Desde a primeira estátua
apresentada pelo documentário, a aproximação feita pelo recorte (crop) da imagem via mudança no valor
de plano é enfatizada por uma profundidade de campo extremamente curta. Isso destaca a face da obra e
alguns dedos de sua mão direita, desfocando os ombros e outras partes da escultura presentes no quadro.
Outro exemplo é a representação de uma mãe carregando seu filho no braço em uma imagem encontrada
em Chipre e datada do 3º milênio A.C. (1437’’). A representação da criança, em foco, é também destacada
pela incidência e a densidade luminosa enquanto a barriga da mãe que a segura permanece nas sombras e
desfocada. Esses elementos são obviamente usados para guiar e situar com muita precisão o nosso olhar.
2.6. A estrutura visual e a estrutura narrativa
Podemos adicionar aos elementos básicos que constituem a composição das imagens alguns componentes
mais complexos e igualmente essenciais que compõem a estrutura visual e a estrutura narrativa.
A estrutura visual se constrói a partir da relação entre os 7 elementos de base supracitados e é amparada
principalmente por uma relação entre contraste e harmonia (Block 2014, 7 passim). Relação que, por sua
vez, define uma certa intensidade visual, isto é, o contraste, que conota bastante intensidade, e a
harmonia, que sugere o inverso. As sequências do filme se sucedem sem muito contraste (exceções feitas
em alguns momentos bem pontuais pela iluminação supracitada). Ou seja, com essa apresentação
harmoniosa, não aumento da intensidade visual. Uma intensidade que também nos poderia invocar
uma espécie de escala de valor em termos de julgamento estético das obras. Por exemplo, ao privilegiar
aquelas que se apresentariam num momento culminante da narrativa e/ou tensão visual do filme.
a estrutura narrativa desenvolve uma relação de tensão narrativa distribuída na duração de um filme.
Em geral, esse desenvolvimento se segundo regras básicas” de roteirização cinematográfica, em sua
maioria oriundas da literatura e do teatro, ainda que em filmes de documentário possam existir diferenças
em relação às estruturas narrativas que, em geral, regem um filme de ficção. No entanto, em Orient-
Occident, mesmo a narrativa não evolui propriamente para um clímax. Talvez o fato de terem privilegiado
o fio temático tenha evitado uma narrativa que tende a um cmax, alimentando justamente o equívoco de
uma simples evolução estética em termos cronológicos (e.g., uma última obra do filme que venha adquirir
um aspecto de ser o summum de todas as evoluções estéticas precedentes). Mas justamente, quando
surge a última obra do filme, ela é justamente a mais antiga de todo o documentário (5 mil anos). Ao invés
de propor uma espécie de “resolução” da narrativa, Orient-Occident nos sugere um novo ponto de partida,
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
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um convite para apreciarmos “uma nova viagem
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na diversidade e uma fértil porosidade entre as culturas
que, como o filme ilustra de forma magistral, ocorre desde a antiguidade. Em todo caso, todos esses
elementos preconizam que “se trata aqui de dar a impressão ao mesmo tempo dessa evolução e da
permanência mágica e imutável do corpo humano
9
” (Fulchignoni 1981, 258).
2.7. As Sequências do Filme
O filme dura 20’10’’ e 82 planos de filmagem de cerca de 50 objetos, em três rolos. A Figura 1 apresenta uma
descrição linear do filme, com nomes e numeração dos objetos tal como encontrados nos Arquivos Xenakis, com a
tradução em português.
(1)
(2)
(3)
(4)
-
00’00’’
-
0
00’03’’
(fondu enchaîné) générique début
1
00’16’’
(fondu enchaîné) “Vénus tournante”
77
2
00’39’’
même statue, gros plan sur visage-main
3
00’48’’
“femme au collier” : panoramique des
pieds à la tête
78
4
01’11’’
(fondu enchaîné) “bas relief” avec
musiciens, plan général
182
5
01’27’’
même statue, plan rapproché
6
01’46’’
“premier bouddha”, tournant
184
7
02’02’’
même statue, panoramique des pieds à la
tête
8
02’29’’
“bouddha jambes croisées”, tournant
179
9
02’37’’
même statue, panoramique des pieds à la
tête
10
02’54’’
“personnages drapés”, “groupe de deux
statuettes”, bouddhas, plan général
187
11
03’12’’
même statue, gros plan
12
03’29’’
“statuette orientale tournante”
13
03’41’’
même statue, panoramique de bas en
haut
14
04’00’’
“autre bouddha tournant” (Japon ?)
185
15
04’19’’
même statue, gros plan visage-bras
194
16
04’28’’
même statue, très gros plan visage-bras
17
04’37’’
“bouddha coréen”
193
18
04’44’’
“génie plastique de l’Inde’”
19
05’00’’
“statuette orientale”, “bras cassé”,
tournant
196
20
05’14’’
(fondu enchaîné) même statue,
8
“un autre voyage”. Últimas palavras do texto da narração de Orient-Occident (19’00’’).
9
“Il s'agissait là de donner en même temps l'impression de cette évolution et celle de la permanence
magique et immuable du corps humain”.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
10
panoramique de bas en haut, tournant
21
05’32’’
(fondu enchaîné) même statue, gros plan
visage
22
05’53’’
(fondu enchaîné) “bouddha aux bras”,
panoramique de bas en haut
197
23
“bouddha khmer”
199
24
06’26’’
“petit lion”
163
25
06’37’’
“lions”, “plat”
126
26
06’50’’
“gorgone”
176
27
07’00’’
même statue, gros plan animaux du bas,
tournant
28
07’11’’
“deux bêtes”
129 A B
29
07’18’’
“masque”
168
30
07’28’’
même statue, gros plan
31
07’37’’
“objet”, “deux chevaux”, panoramique de
bas en haut
173
32
07’46’’
“éventail”
171
33
07’53’’
“garniture étrusque”, faisant partie du
char étrusque, gros plan
34
08’02’’
même statue, plan général
35
08’15’’
même statue, gros plan panoramique
gauche droite et bas haut
36
08’49’’
(fondu enchaîné) “archer sarde”, tournant
158
37
08’55’’
(fondu enchaîné) même statue, gros plan
sur tête, tournant
38
09’06’’
“la gitane”
39
09’14’’
même statue, gros plan sur tête
40
09’26’’
(fondu enchaîné) “étrusque tournant”
41
09’52’’
même, gros plan sur tête
42
10’01’’
même statue, gros plan profil
43
10’16’’
“romain romaine”
44
10’27’’
“romaine”, gros plan buste, tournant
45
10’39’’
(fondu enchaîné) “Aphrodite”
110
46
10’46’’
même statue, plan rapproché, tournant
47
10’55’’
(fondu enchaîné) “trois grâces”
111
48
11’19’’
(fondu enchaîné) “dame touie”, gros plan
pieds, tournant, puis panoramique des
pieds au visage
157
49
11’45’’
même statue, gros plan mains
50
11’55’’
même statue, gros plan tête
51
12’04’’
(fondu enchaîné) “statue de Rhodes”,
panoramique haut bas
52
12’26’’
“deux drapés”
113
53
12’43’’
“corps féminin”, tournant, panoramique
bas-haut
114
54
12’59’’
“maternité”
81
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
11
55
13’14’’
“Isis égyptienne” (maternité)
80
56
13’21’’
“maternité” (autre), tournant,
panoramique bas-haut
57
13’36’’
“une fécondité”
58
13’48’’
“deuxième fécondité”
59
13’55’’
“troisième fécondité”
60
14’02’’
“quatrième fécondité”
61
14’11’’
même statue, gros plan tête
62
14’19’’
même statue, gros plan bras avec bébé
63
14’27’’
“symbole” (deux statuettes)
64
14’40’’
même statue, gros plan sur l’une des deux
statuettes
65
14’47’’
(fondu enchaîné) “deux santons”
66
14’57’’
“grosse dame”
67
15’07’’
“?” (femme se tenant la poitrine)
68
15’22’’
(écran noir, le plan démarre à 15’33)
“homme”
100
69
15’45’’
même statue, gros plan, panoramique
bras-tête
70
16’04’’
(fondu enchaîné) “jambe en avant”,
tournant
103
71
16’16’’
“deux personnages”
72
16’30’’
“garçon à la toque”
73
16’42’’
(fondu enchaîné) “corps tournant”
74
16’56’’
(fondu enchaîné) “déesse” [Diane ou
Aphrodite avec pomme ?], tournant
75
17’26’’
même statue, gros plan visage
76
17’33’’
même statue, premier plan moyen,
poitrine
77
17’42’’
même statue, second plan moyen, poitrine
78
17’55’’
même statue, gros plan pied
79
18’04’’
même statue, gros plan main tenant un
fruit [?]
80
18’13’’
même statue, “déesse penchée”
81
18’27’’
(fondu enchaîné) statue Cyclades,
tournant
82
18’52’’
même statue, gros plan, panoramique
poitrine-tête
19’16’’
générique de la fin
20’02’’
écran noir
20’10’’
fin musique
Figura 1. Descrição linear do filme. (1) Tiros de acordo com o Arquivo Xenakis, Famille Xenakis, Dossiê Œuvres 9/3; (2) Timing; (3) Imagens;
entre aspas: nomes encontrados no Dossiê Œuvres 9/3; (4) Tradução em português; (5) Numeração dos objetos de acordo com Dossiê 9/2 e
9/3. Os três rolos: 1) disparos 0-23; 2) 24-67; 3) 68-final. De acordo com documentos de arquivo, o disparo 22 foi apagado, mas é provável
que, de fato, o disparo 23 foi apagado.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
12
3. A música do filme
Para a música do filme, Fulchignoni entrou em contato com Pierre Schaeffer, que já havia contribuído para
seus filmes (Fulchignoni 1981, 257). Schaeffer entregou a encomenda a Xenakis. Como podemos ver em
uma carta de Schaeffer a Fulchignoni, Xenakis teve muito pouco tempo para compor a música, apenas um
mês:
“Aos cuidados do Senhor Fulchignoni [endereço: Unesco]
Senhores,
Na sequência de uma visita dos meus colaboradores Pedrizet e Brissot, confirmamos os
termos do nosso acordo em relação à sonorização do filme Orient-Occident.
Resumimos abaixo as várias operações envolvidas neste trabalho:
1 - criação de uma trilha sonora em música concreta.
2 - mixagem e sincronização da trilha.
3 - tradução da versão francesa do comentário para inglês e espanhol.
4 - gravação de narradores fornecidos pelos senhores das versões francesa, inglesa e
espanhola dos comentários.
5 - Mixagem da trilha sonora e diálogo nas três versões.
6 - trabalhos de laboratório: gravação de uma cópia de trabalho em redução 16 m/m
- Regravação ótica das três trilhas sonoras finais correspondentes a cada versão.
- Gravação de três cópias standard de 35 m/m para cada versão.
[…]
O prazo de realização será de:
Quatro semanas para o ponto 1
Quatro outras semanas para o pontos 2.3.4.5.
Para o ponto 6, os prazos normais dos laboratórios.
[...]
10
.
10
Carta de Pierre Schaeffer para Enrico Fulchignoni, 2 de dezembro de 1959, Arquivos Xenakis, Família
Xenakis, dossier Œuvres musicales 2/4-2. “A l’attention de Monsieur Fulchignoni [adresse : Unesco]
Messieurs,
Faisant suite à la visite de mes collaborateurs Messieurs Pedrizet et Brissot, nous vous confirmons les
conditions de notre accord concernant la sonorisation du film Orient-Occident.
Nous vous résumons ci-dessous les diverses opérations relatives à ce travail :
1 réalisation d’une bande sonore en musique concrète.
2 mixage et synchronisation de cette bande.
3 traduction de la version française du commentaire en Anglais et en Espagnol.
4 enregistrement par speakers agréés par vous, des versions Française, Anglaise et Espagnole de ce
commentaire.
5 mixage des bandes musique et parole dans les trois versions.
6 travaux de laboratoire : tirage d’une copie de travail en réduction 16 m/m.
réenregistrement sur optique des trois bandes sonores définitives correspondantes à chaque version.
tirage de trois copies standard 35 m/m relatives à chacune de ces versions.
[…]
Les délais de réalisation seront :
De quatre semaines pour le point 1.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
13
Isto é confirmado por dois documentos GRM, assinados por Luc Ferrari, mostrando que Xenakis
trabalhou no estúdio GRM durante dezembro de 1959 (incluindo 2 de janeiro de 1960). A Figura 2 mostra o
primeiro documento, que é o cronograma projetado (o segundo documento introduz as correções
necessárias das datas), e que é interessante pois mostra a divisão do trabalho no GRM naquela época
(“prise son [gravação], manipulation [manipulação], etc.). É também importante notar que, neste
documento, Bernard Parmegiani é citado como assistente”. Um dos autores deste artigo perguntou-lhe
(em junho de 2006) se ele trabalhou em Orient-Occident, mas ele não conseguia se lembrar.
Natureza dos meios
técnicos
Número de
seções
previstas
Número de seções realizadas nas datas
seguintes:
1. Gravação do som
4
12/12
19/12
26/12
2/1
3
1
2. Manipulação
10
6
2
3. Montagem
síncronizada
6
6
3
4. Montagem simples
4
4
5. Escuta
6. Cópia
7. Divers
De acordo com Fulchignoni, Xenakis compôs a música em dois meses: “A composição musical em si foi
muito rápida: se não me engano, ela durou cerca de dois meses
11
. Se confiamos nos esboços de Xenakis,
ele também trabalhou na peça depois:
“terminé 1ère bobine 6/2/59” (“terminado 1º rolo…” e, claro, é 1960, e não 1959);
“fini 23-2-60” (“terminada em…”): provavelmente significando o término do segundo rolo (ver Figura 4);
“3e bobine Fulgh. 24-2-60” and “terminé 2-3-60”: provavelmente significando o terceiro rolo
12
.
A questão do período total necessário para compor o Orient-Occident não é anedótica. Mesmo se
chegarmos à conclusão de que Xenakis compôs a peça em três meses e contarmos o tempo gasto no
estúdio, não é muito tempo. Esta é provavelmente a razão pela qual a maioria dos sons do Orient-Occident
não foram produzidos para esta peça.
De fato, alguns dos sons do Orient-Occident vêm do Concret PH e Diamorphoses. Mas a maioria deles vem
de outras composições realizadas no GRM (obras de outros compositores). Esta é uma situação
excepcional para Xenakis. Ele frequentemente transferia seus materiais de uma peça para outra (tanto na
música instrumental quanto na música eletroacústica), mas Orient-Occident representava uma situação
Puis de quatre nouvelles semaines pour les points 2.3.4.5.
Pour le point 6 les délais normaux des laboratoires. […]”
11
Enrico Fulchignoni, op. cit., p. 259. “La composition musicale elle-même a été très rapide: si je ne me
trompe, elle a duré deux mois environ”.
12
Xenakis Archives, Famille Xenakis, Dossier Œuvres musicales 9/4.
Figura 2. Cronograma projetado (10 de dezembro de 1959) do trabalho de Xenakis nos estúdios do GRM. Arquivos Xenakis, Famille Xenakis,
Dossiê Œuvres musicales 9/1.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
14
única, na qual ele usou material de outros compositores, provavelmente porque ele não teve tempo de
produzir o seu próprio material.
Mas talvez haja outra explicação para esta situação. Talvez Schaeffer tenha pedido a Xenakis que usasse
sons da biblioteca de sons do GRM. Como é sabido, a produção desta biblioteca era um dos objetivos de
Schaeffer com seus estudos da música concreta. Até a redação do Traité des objets musicaux, Schaeffer
trabalhou mais como cientista do que como compositor, e também pediu aos outros compositores do
GRM que o fizessem; essa foi a razão do choque entre ele e Pierre Henry (Chion 2003, cap. 2). E é certo que
esta biblioteca serviu para projetos funcionais como o filme do Orient-Occident
13
.
Nos Arquivos Xenakis documentos que mostram que Xenakis trabalhou com a biblioteca de sons do
GRM, buscando sons para utilizar em Orient-Occident. A Figura 3 apresenta um documento de 18 de
novembro de 1959, no qual o compositor comenta ao ouvir alguns desses sons. Nós lemos: écoute de
sons (“escuta de sons). também números (5Fb15, 5Fb153..., 5Fe21, etc.) que devem
corresponder à numeração dos sons da biblioteca. Também encontramos indicações específicas a respeito
de: origens dos sons (“tube en carton”: “tubo em cartão”), descrições (“effet de gong bouddhique”: “efeito
do gongo budista”), e possíveis usos dos sons para a música do filme (para 5fe21”, que é o tube en
carton”: “sopas”: “suspiros”: veja abaixo).
Figura 3. Comentários de Xenakis enquanto escutava a biblioteca de sons do GRM. Arquivos de Xenakis, Família Xenakis, Carnet 19, p. 103.
Muitos dos sons do Orient-Occident podem ser encontrados em composições de outros compositores do
GRM daquele período, seja porque eles eram os produtores desses sons (que eles “doaram” para a
biblioteca de sons GRM), ou porque eles mesmos os tiraram da biblioteca. Por exemplo, no início (000’’
031’’) do quarto estudo (“Objets liés”) do Études des objets de Schaeffer (1959, revisado em 1971), temos
três sons que encontramos em Orient-Occident: de acordo com o release da versão de concerto da
EMF/GRM em 711’’ 741’’, 116’’ 120’’, e 403’’ 409’’. Outros exemplos são as obras
13
A biblioteca de sons GRM é um dos mistérios da história da música concreta. Não muitos estudos
sobre ela. De acordo com Daniel Teruggi (e-mail de setembro de 2006 endereçado a um dos autores deste
artigo), havia três bibliotecas. A primeira foi criada por Pierre Henry a pedido de Schaeffer; e quando Henry
deixou o GRM, levou estes sons com ele. A segunda foi a que serviu para o Solfejo do objeto sonoro. A
terceira foi produzida nos anos 1970.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
15
Spatiodynamique (1954), que usa sons percussivos das esculturas de Nicolas Schöffer, e Coexistence
(1958), ambas de Henry.
Alguns dos sons em Orient-Occident também podem ser encontrados no Solfège de l'objet sonore,
publicado em 1967, para ilustrar o Traité des objets musicaux. Por exemplo, compare “Sexto ponto: timbre
instrumental no contexto da causalidade”: “62. Partes iniciais de 61 (folha metálica [...])
14
com o primeiro
som de Orient-Occident.
É devido a este fenômeno que Orient-Occident soa como uma pica produção da música concreta! É por
isso que em Orient-Occident, ao contrário de qualquer outra composição Xenakis desse período,
encontramos muitos sons diferentes (mais de 50). Finalmente, é por isso que temos aqui, pela primeira e
última vez na música de Xenakis, uma aparência de “objetos sonoros” no sentido schaefferiano da palavra.
Finalmente, é pela mesma razão que em Orient-Occident Xenakis provavelmente não fez uso da
formalização e, de maneira mais geral, de cálculos
15
.
4. Música e imagem
Xenakis aparentemente refletiu sobre a relação da música com a imagem não de uma forma abstrata,
mas de uma forma muito prática na composição da música enquanto trabalhava os detalhes concretos
de cada sequência. Fulchignoni disse que lhe mostrou o filme em sua última montagem e que deixou a
ele total liberdade. É certo que o filme abriu a imaginação de Xenakis, e é uma pena que o Orient-Occident
seja sua única (reconhecida) música cinematográfica! Pertencendo à estética do modernismo, Xenakis
rejeita em seu discurso a ideia de “sonorizar” as imagens. Falando de suas composições musicais para a
tragédia antiga, ele diz que elas não são um “acompanhamento”, e acrescenta: Não gosto de fazer música
para filmes, que são coisas figurativas e realistas, ou seja, sonorizar, finalmente, um filme ou uma peça de
teatro
16
(Delalande 1997, 133). Mas quando o lembramos que ele compôs Orient-Occident, ele exclama:
Mas era um filme baseado em objetos antigos, arqueológicos. Havia a Sardenha, havia a Grécia, havia o
Egito, havia o Extremo Oriente, havia a Pérsia, era magnífico. Era uma coleção extraordinária. E foi isso que
me motivou a fazer esta música, foi um comentário sonoro sobre estas peças
17
. De fato, a música da
versão em filme é um “comentário sonoro”.
14
Solfège de l’objet sonore. Pierre Schaeffer. Trois microsillons d’exemples sonores de Guy Reibel assisde
Beatriz Ferreyra illustrant le Traité des objets musicaux et présentés par l’auteur, Paris INA-GRM, 1967,
Nova edição: 1998, p. 51 e CD 2: 62.
15
Apesar do que ele diz em Formalized Music, capítulo II: “A primeira tese é que a estocástica é valiosa não
somente na música instrumental, mas também na música eletromagnética. Nós demonstramos isso em
várias obras: Diamorphoses […], Concret PH […], e Orient-Occident []” (Xenakis 1992, 43). “The first thesis
is that stochastics is valuable not only in instrumental music, but also in electromagnetic music. We have
demonstrated this with several works: Diamorphoses […], Concret PH […], and Orient-Occident […]”. Mas
talvez ele estivesse se referindo aos sons que Orient-Occident tomou emprestado de Concret PH.
16
“Je n’aime pas faire des musiques de films, qui sont des choses figuratives et réalistes, c’est-à-dire
sonoriser, finalement, un film ou une pièce de théâtre”.
17
“Mais c’était un film à partir d’objets anciens, archéologiques. Il y avait la Sardaigne, il y avait la Grèce, il
y avait l’Égypte, il y avait l’Extrême-Orient, il y avait la Perse, c’était magnifique. C’était extraordinaire
comme collection, d’ailleurs. Et c’est cela qui me motivait pour faire cette musique ; c’était un commentaire
sonore de ces pièces-là”.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
16
Nos esboços de Xenakis, várias anotações sobre a relação da música com a imagem. Por exemplo, a
Figura 4, que diz respeito ao segundo rolo, contém a numeração das filmagens (shots), os desenhos das
esculturas feitos por Xenakis, o cronograma e os pensamentos sobre a música a ser usada, como por
exemplo: “guerre(“guerra”: filmagem? 35), silence total quelques sons cloche 1 et les soupirs (“silêncio
total, alguns sons de sinos e suspiros”: para as filmagens 47-50), ressort Parmeg. (“primavera” e
“Parmeg.” provavelmente para Parmegiani: filmagem 63), “ici Φιλιπς - 12dB (“aqui Philips”, para Concret
PH: depois da filmagem 66), etc.
Os esboços mais avançados dos Arquivos Xenakis fornecem apenas algumas ideias sobre os sons a serem
usados; talvez outros esboços tenham sido perdidos, ou talvez Xenakis também improvisou no estúdio. Em
alguns esboços preliminares temos o texto que é falado no filme e alguns dos comentários de Xenakis, por
exemplo: Muito antes de ser uma fornecedora, a arte grega foi uma mensageira do Oriente para o
Ocidente(“Bien avant davoir été le fournisseur, l’art grec a été en Occident le messager de l'Orient”) é o
texto para a sequência 13, e “césure du climat musical sur le lion” (“quebra do clima musical sobre o leão”)
é o comentário de Xenakis. também algumas reflexões gerais, como as apresentadas na Figura 5.
Parece aqui que Xenakis calcula a duração das sequências dedicadas às civilizações: “Grécia”, “extremo
oriente Japão Coréia (+Quemeres)”, etc. (“Grèce”, “extrême orient Japon Corée (+ Khmer)”, etc.), ou a
temas específicos: “animais”, “guerra”, etc. (“animaux”, “guerre”, etc.) e que ele fornece algumas
indicações sobre os sons.
Grèce [Grécia]
1’30’’+40’’+60’’+60’’+1’30’’+60’’
= 6’40’’ ≈ 7’
Maderna+cloche suisse
[Maderna+sino suíço]
Inde [Índia] 2’20’’+2’
= 4’20’’
[mot illisible] + voix grave [palavra
ilegível + voz grave]
extr. orient Japon Corée (+Kmer) [extr. orient
Japão Coreia (+Quemer)]
= 60’’
Japon [Japão]
animaux [animais]
= 1’30’’
= 60’’ 4’
Ferrari+Indes [mot illisible]
animaux+guerre [animais+guerra]
Figura 4. Esboços de Xenakis para Orient-Occident. Arquivos Xenakis, Família Xenakis, Dossier Œuvres 9/4, p. 26.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
17
guerre [guerra]
= = 1’30’’
[Ferrari+Índias palavra ilevel]
Beauté Touie Egypte [Beleza Touy Egíto]
= 1’
Mâche soupirs [Mâche suspiros]
Maternité [Maternidade]
= 1’30’’2’
Inde [Índia]
Mouvement+Bab+Egypte+Grèce gliss.
[Movimento+Bab+Egito+Grécia gliss.]
1’30’’
gliss. Pith+Metast
Se tentarmos estabelecer alguns princípios gerais a respeito da relação entre música e imagem em Orient-
Occident, podemos propor a seguinte tipologia:
a) Uso de música étnica. Ainda o foi mencionado que na partitura de Orient-Occident música da Ásia
Oriental, especialmente no primeiro rolo; ela “ilustra” os Budas.
b) Relações abstratas. Por exemplo, o início do filme.
c) Momentos em que a música imita a imagem. (Apesar do que Xenakis diz sobre a ideia de “sonorizar”
imagens, ele nunca recusou a noção de imitação, mesmo em suas composições musicais para tragédias
18
).
Por exemplo, em 113 (versão do filme), vemos uma escultura com músicos, um dos quais estocando
pandeiro; a música tem sons percussivos.
d) Ambiente sonoro. Esta é provavelmente a categoria mais importante. A correspondência entre música e
imagem é feita através de um clima geral. A título de ilustração, apresentamos dois extratos:
A parte do filme e da música mais comovente é a que evoca a textura dos sons pré-
históricos, sons que rodeavam os nossos antepassados muito distantes. Esta matéria
sonora pode parecer natural, mas é de uma natureza misteriosa, cuja fonte
desconhecemos quando faltam dados históricos, a atmosfera é muito propícia ao
enfeitiçamento. A certa altura, ouve-se algo como o galope de um auroque: é
precisamente a sequência da caça pré-histórica e o início da figuração. Por outro lado,
quando a música, sobretudo no final, prossegue numa espécie de fluxo, trata-se de
civilizações já reveladas em si mesmas, e nas quais aparece uma certa complacência, para
não dizer um certo narcisismo. Da fluidez do som em Alexandria, uma civilização da
volúpia
19
. (Fulchignoni 1981, 259-260)
e) Figuração (no sentido usado para a música barroca, por exemplo). Naturalmente, aqui precisaríamos das
palavras de Xenakis sobre suas intenções, e estas palavras não existem. Somente um estudo detalhado dos
comentários nos esboços poderia mostrar todas as instâncias de figuração. Um exemplo foi dado por
Xenakis em uma entrevista, e talvez seja o exemplo mais fascinante de figuração em Orient-Occident. No
filme, “havia uma estatueta egípcia de madeira fantasticamente bela, que traduzi em Orient-Occident
18
Ver também Polla ta dhina, sua música para os versos 332-367 de Antígona de Sófocles.
19
La partie du film et de la musique la plus émouvante selon moi est celle qui évoque la texture de bruits
comme préhistoriques, de sons qui entouraient nos très lointains ancêtres. Cette matière sonore pourrait
paraître naturelle, mais d’une nature mystérieuse, dont on ignorerait la source lorsque des données
historiques font défaut, on est dans une atmosphère très propice à l’envoûtement. À un moment, on entend
comme un galop d’aurochs : c’est précisément la séquence de la chasse préhistorique, et du
commencement de la figuration. Au contraire, lorsque la musique, vers la fin surtout, procède par sortes de
coulées, il s’agit de civilisations déjà révélées en elles-mêmes, et dans lesquelles apparaît une certaine
complaisance, pour ne pas dire un certain narcissisme. D’où cet aspect fluide du son pour celle d’Alexandrie,
civilisation de la volupté”.
Figura 5. Música e imagem. Arquivos Xenakis, Família Xenakis, extraídos do Dossier Œuvres musicales 9/4.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
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como suspiros; era uma caixa de cartão que fazia respirões e parecia suspiros, gemidos. Gemidos
perante a Beleza, de admiração
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(Delalande 1997, 133). A Figura 6 mostra esta deusa egípcia, como
mostrado no filme em 1138. O tubo de papelão que produz estes “suspiros” eróticos é provavelmente o
tube en carton” mencionado na Figura 3.
Figura 6. Estátua egípcia. Imagem do filme em 11’38’’.
5. Conclusão
É difícil concluir nossa análise. Digamos que o que é impressionante é a inventividade utilizada por Xenakis
para compor a música para o filme Orient-Occident, uma dupla inventividade. Por um lado, ele não poupou
nenhum esforço musical, apesar do tempo limitado à sua disposição e dos materiais emprestados. Isto é
evidenciado pela música da versão do concerto, para a qual Xenakis simplesmente cortou passagens
musicais da trilha sonora contendo música étnica ou efeitos sonoros simples, deixando o resto intocado e
simplesmente editando-o (Solomos 2009). Por outro lado, sua imaginação sonora para ilustrar e comentar
o filme é extraordinária: é realmente uma pena que ele não tenha feito mais música de filme!
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“il y avait une statuette égyptienne en bois qui était d’une beauté fantastique, et que j’ai traduite dans
Orient-Occident par des soupirs ; c’était une boîte en carton qui faisait des souffles et cela ressemblait à des
soupirs, à des gémissements. Des gémissements devant la Beauté, d’admiration”.
Solomos, Makis; e Villa, André. 2022. “Orient-Occident de Fulchignoni-Xenakis: Análise da relação entre música e imagem
Per Musi no. 42, Iannis Xenakis: 1-19. e224229. DOI 10.35699/2317-6377.2022.48275
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