(Siqueira, 1981a). Obviamente, neste período, os elementos da cultura brasileira estariam enraizados em
sua prática composicional. Assim, em 1972, Siqueira compõe o já mencionado Recitativo, Ária e Fuga para
Violoncelo e Orquestra de Câmara, obra que possui características neoclássicas aliada ao emprego das
escalas modais (Santos, 2013). Outra produção que se distancia da influência da música nordestina e que
também utiliza escalas modais é o Concertino para Violoncelo e Orquestra (1971). Por outro lado, a Sonata
objeto deste estudo, escrita no mesmo período composicional, faz claras referências às expressões culturais
do Nordeste, conforme visto, com a presença de um aboio e de um samba, além do emprego de escalas
modais e sonoridades nordestinas. O que demonstra que Siqueira possuía uma facilidade em compor,
simultaneamente, obras de estilos e origens contrastantes. Seja baseado em estéticas europeias, como
também nas manifestações culturais brasileiras.
5. Considerações finais
José Siqueira deixa em sua obra um importante registro da cultura de nosso país, cujas características
certamente devem ser estudadas e preservadas. Notamos, na II Sonata, um considerável conhecimento do
compositor sobre as manifestações culturais do Nordeste, associado a uma técnica composicional refinada
e própria do compositor. Assim, podemos constatar que Siqueira também se utilizava de fontes consistentes,
ao fazer referência a obras de importantes compositores do século XX, resultando em obras relevantes para
a expansão da literatura musical brasileira. Como é o caso da presente Sonata, através da qual Siqueira tem
a intensão de homenagear o maior violoncelista do século XX. No entanto, a despeito de empregar
sonoridades brittenianas, o compositor não perde a sua individualidade enquanto artista, sendo capaz de
unir elementos da música de concerto europeia com as expressões populares de seu país natal. Aspecto
através do qual deixou importante contribuição ao movimento modernista brasileiro.
A partir desta pesquisa, passamos a compreender que seria complexo encapsular José Siqueira em meras
fases composicionais, já que o compositor apresenta pluralidade e flexibilidade em suas obras para
violoncelo. Ou seja, Siqueira demonstra facilidade para escrever em estilos distintos, quase que
simultaneamente. O que vai ao encontro do pensamento expresso por Tacuchian (2022), em relação ao
dualismo presente na obra do compositor, conforme apontado neste artigo. Desta forma, uma mera divisão
em fases composicionais não seria suficientemente capaz de explicar como obras de estilos tão distintos
foram compostas em um mesmo período cronológico. Ademais, Tacuchian, ao realizar uma comparação
entre Siqueira e Villa-Lobos, afirma que ambos os compositores podem ser considerados nacionalistas,
entretanto, suas estéticas composicionais são completamente distintas. Assim, buscamos aqui uma
compreensão da música de Siqueira de forma mais aprofundada, ao levar em conta os aspectos mais amplos,
como também a individualidade do processo criativo do compositor.
A pesquisa documental e as entrevistas realizadas, até o momento, não comprovam se Britten e Siqueira se
encontraram em algum momento de suas trajetórias, nem qual foi o aprofundamento da relação entre
Siqueira e Rostropovich. Entretanto, as duas obras aqui abordadas apontam que os ideais destas duas
mentes criativas, de fato, se entrelaçaram. Podendo, em uma suposta reunião, estar presente a figura
catalisadora de Mstislav Rostropovich. Devemos considerar que a década de 1970, período de composição
da II Sonata de Siqueira e da Terceira Suíte de Britten, foi marcada pelo ápice da Guerra Fria, ocasião em que
dados documentais da extinta União Soviética, como atas de reuniões e encontros oficiais, por exemplo,
eram tratados como confidenciais. Ao mesmo tempo, esta época também foi marcada pelo período mais
crítico da ditadura militar no Brasil, que tratava qualquer um que demonstrasse interesse pela cultura