Josso (1999, 2007, 2020) caracteriza essas ações como “pesquisa-formação”, em que é desenvolvida a
“elaboração da história [de vida] e do trabalho de análise dessas histórias narradas” (Josso 2007, 420–423).
Deste modo, essas narrativas (auto)biográficas podem evidenciar orientações para a vida, valores, desejos,
oportunidades, obrigações, continuidade, rupturas e transformações na vida social e profissional. E sua
análise pode revelar margens de liberdade, atitudes conformistas ou o esforço para sair de predisposições.
Além disso, o trabalho de reflexão individual e coletiva torna as mudanças possíveis.
Dessa maneira, as narrativas (auto)biográficas como instrumentos de reflexão de si podem contribuir para
o descobrimento e/ou conscientização de sentidos e significações, assim como de nossa liberdade e
responsabilidade na constituição de nossos percursos de vida individuais. Josso (2010, 211) defende que:
Temos de aprender a nos posicionar na vida de uma forma ativa, reavaliando ou pondo em
causa os conhecimentos que presidiram à compreensão do nosso devir e das
transformações de si. Temos de aprender a questionar a margem de liberdade que nos
podemos conceder entre as nossas vidas imaginárias e uma vida socioculturalmente
padronizada; aprender que podemos negociar as orientações da nossa vida, apesar das
nossas interdependências afetivas, sociais e culturais; e temos de aprender, também, a nos
tornar, cada vez mais conscientemente, autores do sentido da nossa vida. É esse o preço a
pagar para que a temporalidade da nossa existência comece a se transformar numa
verdadeira história de vida (Josso 2010, 211).
Deste modo, por intermédio do trabalho (auto)biográfico, podemos alcançar o que Josso (2010, 159–160)
denomina de “sujeito consciencial”, ou seja, um indivíduo que reflete sobre si, suas experiências passadas,
motivações presentes, projetos futuros, dentre outros aspectos. Esse processo de tomada de consciência,
apesar de demandar tempo, pode conduzir o sujeito a criticar pressupostos e representações que orientam
a vida, favorecendo mudanças. Josso (2014, 747) reafirma, assim, que a atenção consciente é uma condição
indispensável ao ser humano, estando presente em nossa capacidade de aprender, refletir, questionar,
responder aos desafios da vida, dentre outras questões.
Além da conscientização sobre a própria existência, as narrativas permitem acessar uma diversidade de
dimensões – sociológicas, psicológicas, culturais, políticas, dentre outras – que são formadoras do sujeito
(Josso 2010, 165; Rivas-Flores 2023, 122). Por conseguinte, o estudo das histórias de vida pode ajudar na
compreensão da dialética singular-plural em que as aspirações individuais dos sujeitos estão em constante
diálogo com o coletivo – família, grupos sociais, momento histórico, dentre outros aspectos (Josso 2010, 54–
55). Neste sentido, Josso (2014, 743–744) aponta que nossas histórias de vida estão em constante processo
dialético entre o individual – presentes em nossos interesses, percepções, sonhos e projetos próprios – e o
coletivo – interações sociais, contexto sociocultural, dentre outros. As experiências e aprendizagens
efetivamente abarcam alguma prática reflexiva e transformadora sobre as histórias de vida dos
participantes. O texto de Duarte e Azambuja (n.d.) – que infelizmente não está mais disponível on-line –
referia-se à pesquisa de mestrado de Duarte, então em andamento. Consideramos que sua proposta se
aproximava bastante do método próprio de Josso, partindo da narrativa (auto)biográfica com a finalidade
de provocar uma reflexão acerca dos motivos pessoais que fizeram com que os sujeitos participantes – ex-
alunos da rede pública da cidade de Pelotas-RS – desistissem de concluir os estudos de nível médio. A
pesquisa de Duarte está agora apresentada em seu livro (Duarte 2021).