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Fri, 05 Feb 2021 in Reme: Revista Mineira de Enfermagem
DESAFIOS PARA O CUIDADO ÀS FAMÍLIAS DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
RESUMO
Objetivo:
conhecer as ações de cuidado realizadas pelos profissionais da Atenção Primária às famílias de crianças com deficiência.
Método:
estudo qualitativo, fundamentado no referencial filosófico do Cuidado Centrado no Paciente e na Família, realizado em um dos seis distritos de saúde de uma capital do Centro-Oeste brasileiro. Foram informantes 41 profissionais de saúde que atuavam nas equipes da Estratégia Saúde da Família, vinculadas às Unidades Básicas, que possuíam crianças com deficiência residentes em sua área de abrangência. Os dados foram coletados no período de junho a agosto de 2018, mediante entrevistas semiestruturadas, áudio-gravadas, e submetidas à Análise de Conteúdo.
Resultados:
a atenção à saúde é centrada nos aspectos clínicos da deficiência da criança, não inclui a família nos cuidados e nem reconhece suas demandas, crenças, autonomia ou necessidades relacionadas aos cuidados. A assistência é realizada a partir da demanda espontânea, se restringe às visitas domiciliares, dispensa de materiais e medicamentos e encaminhamentos para especialidades relacionadas à deficiência. Suas ações não são sistematizadas, nem as crianças acompanhadas longitudinalmente ou suas famílias incluídas/consideradas na assistência/cuidados.
Considerações finais:
os profissionais de saúde atuantes neste cenário necessitam de capacitação específica para que a assistência prestada às famílias de crianças com deficiência seja focada na integralidade do cuidado e nas necessidades da criança e de sua família, reconhecendo suas potencialidades, e a importância de sua autonomia e participação no cuidado.
Main Text
INTRODUÇÃO
No Brasil estima-se que 10% das crianças nascem ou adquirem algum tipo de deficiência ao longo da vida (física, auditiva, visual, intelectual ou múltipla) que pode desencadear limitação de funções, atividades ou papel social, dependência de mecanismos compensatórios, necessidade de ações de cuidado que atendam às especificidades, além do uso contínuo, acima do usual, dos serviços de saúde.1,2
As famílias de crianças com deficiência vivenciam mudanças na organização estrutural, desencadeando alterações em sua dinâmica familiar, redefinição dos papéis e sobrecarga física e emocional. O acompanhamentodessas famílias porprofissionais de saúde é essencial, pois elasnecessitam de preparo paracuidar adequadamente da criança e apoio para realizar seu autocuidado3, e também deajuda para reconhecerem suas próprias necessidades, poisé comum elegeremo cuidado à criança como a mais importante, senãoúnica, prioridade.4
As crianças com deficiência, às vezes, estão sujeitas a internações prolongadas, reinternações mais frequentes, além de complicações no prognóstico. Por essa razão, é fundamental garantir-lhes, via Sistema Único de Saúde (SUS), o direito à saúde em todos os níveis de complexidade, o que constitui um desafio para os serviços de saúde.5
Nesse cenário, a atenção primária à saúde (APS)e, de forma mais específica, asequipes da Estratégia Saúde da Família (ESF)devemse constituirnas principaisportas de entrada dessas famílias no sistema de saúde. Isso porque as ações e estratégias desenvolvidas na APS podem facilitar o acesso e garantir que o itinerário terapêutico dessas crianças ocorra de acordo e a partir de suas necessidades específicas, além das de suas famílias.2,6
A atuação oportuna dessas equipes também deveria favorecer a continuidade do cuidado, componente central para a integralidade e a longitudinalidade7, que são preceitos básicos da APS.8 Contudo, o crescimento no número de crianças com condições crônicas de saúde e com demandas específicasde cuidado tem implicado desafios diários não somente para as famílias, mas também para os profissionais de saúde, em especial os que atuam na APS, que necessitam estar preparados paraacolheressa população e assegurar-lhe umaassistência de qualidade ecom equidade.9
Alguns estudos têm revelado que a atenção dispensada pelas equipes da ESF às crianças com deficiência é frágil, desarticulada e descontínua, o que tem levado alguns autores a inferir que isso pode estar relacionadoao despreparo dos profissionais para atenderem às necessidades dessa população.10,11
Estudo realizado em Recife (PE) com mães de crianças com microcefalia mostrou que o cuidado a essas crianças precisava se estender à família, a qual tem papel determinante no cuidado e na reabilitação e precisa ser auxiliada e apoiada por profissionais de saúde, principalmente pelos da APS. Isso porque, por estarem inseridos na comunidade, esses profissionais têm mais acesso e vínculo com a família, o que influencia positivamente o acompanhamento e a oferta de orientações às famílias, considerando-se as diferentes realidades domiciliares.12
Cabe destacar que o vínculo entre a família e os profissionais de saúde é fundamental para a promoção de um cuidado de qualidade à criança e também para promover o bem-estar de toda a família. Entretanto, para que isso ocorra é necessária assistência universal, integral, contínua e resolutiva, pautada, por exemplo, nos princípios do Cuidado Centrado no Paciente e na Família (CCFP), pois o envolvimento da família no planejamento dos cuidados é fundamental para que haja mais resolutividade no desenvolvimento da criança.13
Considerando-se esse cenário e a necessidade de assistência diferenciada, a utilização dos preceitos do CCPF, na condução da assistência, surge como uma possibilidade promissora. Trata-se deuma filosofia destinada à união entre os cuidados prestados pela equipe multiprofissional, dando voz ao paciente e à sua família, respeitando seus valores e considerando sua importância na recuperação de saúde do paciente.14,15
Cabe ressaltar que, ao se adotar o CCPF como referencial para a atuação dos profissionais, torna-se necessárioconsiderá-lono planejamento, na execução enaavaliação da assistência à saúde oferecida.
É importante salientar que essa abordagem corrobora as políticas de saúde que orientam a prática dos profissionais no âmbito da APS, especialmente no que se refere à valorização do cuidado voltado para o indivíduo e sua família. Desse modo, ao utilizar o referencial do CCPF naorganização dos serviços de saúde e na prática profissional, amplia-se o nível de atenção à saúde e a abrangência da assistência.16
Os preceitos dos CCPFs são passíveis de serem adotados no âmbito da APS, pois coadunam com seuspreceitos básicosno que se refere à necessidade de considerar a família como foco/objetoda atenção, o que exige interação da equipe de saúde com esse sistema social e conhecimento amplo de seus problemas de saúde. Exige também o desenvolvimento de habilidades que permitam à equipe abordar a família e construir uma relação de trabalho que promova um cuidado mais adequado para as crianças e suas famílias.17,18
Apesar dessas vantagens, até onde se sabe esse referencial não tem sido utilizado no âmbito da APS. Nesse sentido, questiona-se: como é a assistência oferecidaàs famílias de crianças com deficiência pelos profissionais que atuam na APS? Quais ações de cuidado são realizadas? O que facilita e dificulta essa assistência? Para responder a esses questionamentos, definiu-se como objetivodo estudo: conhecer as ações de cuidado realizadas pelos profissionais da atenção primária à saúde às famílias de crianças com deficiência.
MÉTODO
Trata-se de estudo descritivo, de abordagem qualitativa, sustentado pelo referencial filosófico do CCPF13, desenvolvido em consonância com os critérios estabelecidos pelo Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ).19
O estudo foi desenvolvido em um dos seis distritos de saúde de uma capital do Centro-Oeste brasileiro. O distrito mantém 12 unidades básicas de saúde da família (UBSF) que, no âmbito da Atenção Básica, assistem uma população em torno de 185 mil habitantes, residentes em 14 bairros. Esse distrito de saúde foi selecionado por conveniência, pois corresponde à área de atuação dos cursos de saúde da universidade a que a pesquisa se vincula.
Participaram do estudo profissionais de saúde (agentes comunitários de saúde - ACS, enfermeiros, técnicos de Enfermagem e médicos) atuantes nas 12 UBSF, pois todas elas atenderam ao critério de possuir o cadastro de crianças (zero a 12 anos) com deficiência em sua área de abrangência. Não participaram os profissionais que estavam em férias (sete) ou em licença médica (seis) durante o período destinado à coleta de dados em cada UBSF. Ressalta-se que todos os profissionais convidados aceitaram participar.
A abordagem inicial dos profissionais para solicitar a participação no estudo foi realizada pessoalmente e, diante da concordância, foram agendados dia e horário mais convenientes para a realização da entrevista, de modo a não prejudicar a rotina do serviço.
Os dados foram coletados no período de junho a agosto de 2018 mediante entrevistas semiestruturadas realizadas em sala reservada nas próprias UBSF, pela pesquisadora principal. Elas foram audiogravadas após autorização, tiveram a duração média de 15 minutos e foram guiadas por um roteiro constituído de duas partes: a) questões relativas à caracterização dos participantes; b) questão norteadora: “como é a assistência às famílias de crianças com deficiência realizada por você e sua equipe?” Algumas questões de apoio foram utilizadas quando necessário: você se sente preparado para assistir essas famílias? Fale um pouco mais sobre isso. Em sua opinião, o que favorece e o que dificulta essa assistência? Como você acha que ela deveria ser?
Para a análise, as entrevistas foram transcritas na íntegra, preferencialmente no mesmo dia de sua realização e, posteriormente, todo o material foi submetido, manualmente, à análise de conteúdo, modalidade temática, utilizando-se as três etapas propostas: pré-análise, exploração do material e tratamentos dos resultados obtidos e interpretação.20 Na pré-análise foram realizadas a organização dos dados e a leitura exaustiva das entrevistas, com identificação das unidades de registro. Na exploração do material, os dados foram codificados e as categorias provisórias foram identificadas. Por fim, na etapa de tratamento dos dados e interpretação, foi realizado o reagrupamento dos códigos por semelhança, com confirmação das categorias provisórias, seguido de inferência sobre suas relações e interpretação à luz do referencial teórico do CCPF.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (Parecer nº 3.354.928). Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias, ficando uma cópia com o participante e outra com a pesquisadora. Visando à preservação do anonimato, os excertos das falas foram identificados pelos códigos ENF para enfermeiro; MED - médico; TE - técnico de Enfermagem; ACS - agente comunitário de saúde; e um número indicativo da ordem de realização das entrevistas.
RESULTADOS
Dos 41 profissionais de saúde participantes do estudo, têm-se: 14 ACS, 13 enfermeiros, oito técnicos de Enfermagem, seis médicos, os quais tinham idade que variou de 25 a 65 anos (média de 37 anos), e tempo de atuação em UBSF de um a 12 anos. Ressalta-se que 16 profissionais referiram ter contato com crianças ou adultos com deficiência fora do âmbito profissional e 28 afirmaram não conhecer integralmente as políticas públicas voltadas para essa população.
Da análise qualitativa dos dados emergiram duas categorias: “fragilidades nas ações de cuidado às crianças com deficiência e suas famílias”; e “desafios para o cuidado centrado nas crianças e nas famílias”, sobre as quais se discorre a seguir.
Fragilidades nas ações de cuidado às crianças com deficiência e suas famílias
A família da criança com deficiência é uma instância oculta no cuidado dos profissionais de saúde da ESF, pois a relação com ela é estabelecida especificamente em resposta ao fato ou incidente relacionado à criança que motivou a procura do serviço.
Essas famílias são identificadas e conhecidas pelos ACS como residentes em sua área adstrita, porém as ações e o atendimento realizado pelos profissionais de saúde seguem a mesma perspectiva do que é proporcionado, de maneira geral, às demais crianças, não sendo implementada alguma atenção ou ação diferenciada.
A atenção dos profissionais é direcionada exclusivamente à criança com deficiência e fica sujeita à demanda em saúde apresentada pela família.
A visita domiciliar foi considerada pelos profissionais como uma ação realizada com a família, pois eles acreditam que a família esteja incluída porque a visita é desenvolvida no domicílio. A valorização das especificidades da criança, a abordagem realizada com esse público, as orientações e os encaminhamentos são ações destacadas pelos profissionais. Em relação à família, consideram ações o acolhimento e as orientações ofertadas ao cuidador principal, com quem, muitas vezes, os profissionais estabelecem comunicação.
Ao serem questionados sobre a resolutividade do acompanhamento das famílias na UBSF, os profissionais demonstraram acreditar que, na medida do possível, procuram realizar o que está ao alcance deles e do serviço - vacinas, consultas e dispensação de medicamentos. Salientaram ainda a necessidade que as famílias de crianças com deficiência têm em relação a poder usufruir de serviços de maior complexidade e de profissionais especializados. E consideram que, caso a estrutura e o serviço permitissem, seria possível oferecer mais à criança e à família.
Os participantes relataram a necessidade de mais integração entre os diferentes níveis de assistência, pois consideram que o manejo dos casos não é suficiente quando realizado apenas na APS.
Em relação às políticas públicas voltadas para as crianças com deficiência e suas famílias, os profissionais demonstraram conhecimento restrito, às vezes resumido ao atendimento preferencial. Observa-se que, embora os profissionais reconheçam a existência de direitos garantidos a essa população, eles não os conhecem de fato.
Desafios para o cuidado centrado nas crianças e nas famílias
Os profissionais referem que há limitações no âmbito da estrutura do serviço que dificultam a inclusão da família no processo e no planejamento do cuidado, por exemplo, o número insuficiente de recursos materiais e humanos. Para eles, a burocracia excessiva, a alta demanda de atividade e a falta de preparo desmotiva-os a ofertarum cuidado centrado na família. Não ter especialistas na unidade também é considerado uma dificuldade para o atendimento das crianças e suas famílias.
Os profissionais consideram que não há a infraestrutura necessária para que possam atender adequadamente as crianças e as famílias, pois algumas UBSF são instaladas em casas adaptadas, o que inviabiliza a acessibilidade desse público aos serviços. Nesses casos em específico, não ter acessibilidade implica não garantir dignidade e respeito a essas crianças e suas famílias e a mínima condição para o seu atendimento.
Na percepção desses profissionais, essas crianças e suas famílias não necessitam dos serviços ofertados na UBSF, por já receberem o atendimento indispensável às suas demandas em instituições especiais de saúde e reabilitação. Assim, focam a atenção em dar o apoio que julgam necessário às famílias quando elas buscam atendimento na unidade.
Os profissionais sentem a necessidade de integração entre os serviços de atendimento à criança e à família para a continuidade e acompanhamento delas na unidade. A falta de descrição de um fluxo norteador do cuidado às famílias dessas crianças nas políticas institucionais implica ações pautadas em um modelo biomédico, caracterizado pelo tecnicismo. Tal abordagem profissional não permite a inclusão da família, a informação compartilhada entre a equipe e os serviços e a tomada de decisões conjuntas.
Os profissionais revelaram que não se sentem capacitados/preparados para o cuidado das famílias de crianças com deficiência, pois não há ações de educação permanente ofertadas pelo serviço que os habilitem para o planejamento e a implementação do cuidado centrado na família. Eles reconhecem a necessidade de serem instrumentalizados para realizar esse tipo de abordagem para o engajamento da família no planejamento dos cuidados.
DISCUSSÃO
As ações dos profissionais voltadas para as famílias de crianças com deficiência nas UBSF mostram a fragilidade na abordagem da família e os desafios para manter a assistência que inclua a família em todas as esferas de atendimento.
A filosofia do CCPF é categórica ao afirmar que a família deve ser considerada como membro essencial da equipe de saúde, em especial as famílias de crianças com deficiência, pois estas enfrentam dificuldades para o cuidado no domicílio e necessitam de ações colaborativas com a equipe que lhes garantam a dignidade, o respeito e a informação compartilhada. Indo ao encontro dessa filosofia, ressalta-se que, no Brasil, a principal referência utilizada para nortear as ações em relação à inclusão da família nos contextos assistenciais é a Política Nacional de Humanização (PNH). 21
O SUS tem como princípio a garantia do acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde para todas as pessoas, e um dos pontos de atenção desse sistema é a APS, que desenvolve ações de promoção, prevenção, reabilitação e tratamento nos diferentes ciclos de vida. Entre seus princípios fundamentais destacam-se a longitudinalidade e a integralidade dos cuidados operacionalizados pela atuação das equipes da ESF.22
As ações de cuidado realizadas e reconhecidas pelos profissionais ocorrem de modo descontínuo, tanto para as crianças quanto para suas famílias. Isso vai contra os preceitos de integralidade do cuidado, que propõem que a pessoa seja considerada parte de um todo, inserida em um ambiente social e familiar. Esse modo de cuidar fere também os pressupostos do CCPF, os quais enfatizam a importância da participação da família no planejamento do cuidado e nas tomadas de decisão. Ademais, a rede de cuidados onde a criança é acompanhada em sua condição crônica de saúde não se articula com os serviços disponíveis na atenção primária.
Observou-se que os profissionais direcionam ações de cuidado quando a família procura o serviço para o atendimento de uma demanda pontual da criança, o que não condiz com os atributos básicos da APS, que direcionam para o cuidado integral, longitudinal e contínuo. Essa condição também foi encontrada em estudos que constataram que o acompanhamento das crianças e suas famílias pela ESF centra-se na deficiência, em seus sinais e sintomas e em sondagens, administração de medicamentos, curativos e orientação para aspiração e administração de dietas.17,23
Do mesmo modo, estudo de revisão destacou a valorização que é dada na assistência de Enfermagem aos aspectos clínicos relacionados à condição crônica da criança e conclui que o atendimento a essas crianças e suas famílias deveria considerar o todo, e não se restringir à atenção biomédica.24
Atinente a isso, para que as ações de saúde não se limitem à identificação das condições clínicas da criança, é necessário que se oferte cuidado integral que contemple os aspectos biopsicossociais, não só das crianças, mas também de sua família, possibilitando a vivência de experiências significativas para ambas e o reconhecimento de potencialidades.25
A fragmentação do cuidado impacta diretamente o acesso, a utilização dos serviços e a integralidade do cuidado prestado nos diferentes níveis de atenção. Para que haja continuidade do cuidado, as ações de saúde precisam ocorrer de forma integrada entre todos os níveis de assistência26, e o processo de comunicação entre eles deve ocupar papel central.
Os resultados encontrados neste estudo mostram a insuficiência da comunicação entre o profissional e a família. Estudo realizado nos Estados Unidos com familiares de crianças em condições complexas de saúde evidenciou que a deficiência na comunicação e coordenação do sistema de saúde muitas vezes resulta na falta de informação acessível e consolidada em relação à condição da criança e sua família.10
Além do mais, a informação compartilhada entre o profissional e a família é essencial para que ela se sinta instrumentalizada para enfrentar as intercorrências que a criança possa apresentar e para a adequada tomada de decisões, um dos pressupostos do CCPF.
No Rio Grande do Norte, estudo com 13 profissionais levou os autores a concluírem que a APS possui fragilidades em seu papel de ordenador do cuidado à família, por não reunir condições materiais, tecnológicas, operacionais e organizacionais que lhe permitam ser a principal referência da família para o cuidado.27 Apesar da insuficiência de recursos materiais e estruturais para atender às necessidades dessas crianças e de suas famílias, ressalta-se que a equipe de saúde tem o papel de facilitar o acesso da criança com deficiência e sua família à atenção adequada, de qualidade e em tempo oportuno.28
Cabe salientar que as famílias, às vezes, vivem demandas exaustivas com as crianças, pois, dependendo da condição física e intelectual, elas exigem cuidados contínuos e o frequente deslocamento para centros de reabilitação. Mesmo com as políticas públicas, as famílias ainda percorrem, com os próprios recursos e condições, o itinerário para tratamento, reabilitação e promoção da saúde de seus filhos. Assim, elas precisam ser vistas e acolhidas pelos profissionais de saúde nos atendimentos à criança e de uma rede de apoio que as ajude a manejar e a conciliar o seu papel e os cuidados despendidos à criança com deficiência.29
Para que os profissionais reconheçam a família como unidade de cuidado e transformem o cuidado individualista, centrado no quadro clínico da criança, em assistência democrática, integral e baseada no acordo mútuo entre a equipe e família, é necessário que profissionais e gestores de saúde se conscientizem sobre a importância da participação da família em todo o processo de cuidado e forneçam recursos que subsidiem a prática profissional, tendo como filosofia o CCPF.26,28
É fundamental que os profissionais da APS desenvolvam habilidades para cuidar das famílias de crianças com deficiência, reconheçam e acolham suas demandas de saúde; estabeleçam vínculo com elas; promovam articulação e integração entre os diferentes níveis de atenção e respeitem as crenças e hábitos, o que é consonante com os atributos da APS e a filosofia do CCPF.17,18
Para estarem preparados para prestar assistência integral a essa população, os profissionais necessitam buscar, constantemente, educação, atualização e treinamento. Cabe ressaltar que a responsabilidade pelo aperfeiçoamento do conhecimento em relação a essa temática não é apenas da gestão institucional, mas principalmente dos próprios profissionais, porque são atividades complementares à sua formação.25
Destaca-se como limitação deste estudo o fato de ter sido realizado com profissionais de saúde pertencentes às ESF de uma região de saúde do munícipio, o que não permite suposições sobre como ocorrem as ações de cuidado realizadas pelos profissionais às famílias de crianças com deficiência em âmbito municipal.
Registra-se a necessidade de estudos com maior amplitude e com os familiares, para que estes possam expressar como se percebem cuidadas pelos profissionais de saúde na APS.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os profissionais de saúde praticam o cuidado fragmentado, centrado nas necessidades pontuais das crianças com deficiência e reconhecem que a escassez de recursos materiais e humanos e a insuficiência na formação e qualificação profissional dificultam a inclusão da família no planejamento e na implementação do cuidado. Além disso, a ausência de um sistema de referência e contrarreferência a continuidade e o acompanhamento do trabalho realizado com a criança e a família.
Os dados revelam que as ações são direcionadas, majoritariamente, às crianças, sendo a família pouco considerada como sujeito da atenção dos profissionais. Então, torna-se importante estender as ações para as demandas e necessidades de saúde tanto das crianças quanto da família. Também é necessário investir na formação profissional e capacitação no trabalho e desenvolver estudos que possam indicar estratégias eficazes para o atendimento à família de crianças com deficiência.
Finaliza-se dizendo que a articulação entre a equipe de saúde e a família possibilita ações de cuidado na perspectiva da integralidade, de modo que os profissionais considerem a família um agente envolvido na assistência, valorizando sua autonomia, seus sentimentos e suas necessidades como elementos centrais para a consolidação da atenção primária em saúde.
RESUMO
Objetivo:
Método:
Resultados:
Considerações finais:
Main Text
INTRODUÇÃO
MÉTODO
RESULTADOS
Fragilidades nas ações de cuidado às crianças com deficiência e suas famílias
Desafios para o cuidado centrado nas crianças e nas famílias
DISCUSSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS