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DOI: https://doi.org/10.35699/2238-037X.2019.12299
(IM) POSSIBILIDADES DE REGULAÇÃO NO TRABALHO EM
PROFISSIONAIS DO CENTRO DE MATERIAL ESTERILIZADO (CME)
1
(Im) possibilities of regulation in the work of professionals from the Center of
Sterilized Material (CSM)
RODRIGUES, Pedro Luiz C.
2
MENDES, Davidson Passos
3
RESUMO
Partindo de uma alise aprofundada sobre a atual situação das relões de trabalho e suas
consequências para os atores envolvidos, o presente artigo, por meio da ergonomia e da ergologia,
buscou dar visibilidade ao trabalho desenvolvido em um Centro de Materiais Esterilizados (CME),
situado em um hospital, e as estragias ali constrdas e necesrias para a geso do trabalho.
Buscou-se demonstrar as diversas atividades inerentes à prática do trabalho, bem como as
variabilidades presentes nesse contexto, bem como as diversas estratégias de regulão no trabalho
ao almejar dois objetivos principais: 1) manutenção da ppria saúde e, 2) eficiência na realização do
trabalho. Foi evidenciado que há insuficiência de materiais e equipamentos e que isso impacta
diretamente no cotidiano da assistência, na carga de trabalho dos trabalhadores do setor e de outros
setores em interface com o CME. Porém, pode-se demonstrar também, que estratégias foram
construídas e compartilhada, moduladas pela compencia individual/coletiva analisada e que se
mostrou de fundamental importância para a geso da produtividade e dos riscos no contexto
analisado.
Palavras chave: Estragias de Regulão. Centro de material esterilizado. Saberes e valores.
ABSTRACT
Based on an in-depth analysis of the current labor relations situation and its consequences for the
actors involved, this article, through ergonomics and ergology, sought to give visibility to the work
carried out in a Center for Sterile Materials (CME) in a hospital, and the strategies built there and
necessary for work management. It was tried to demonstrate the diverse activities inherent in the work
practice, as well as the variabilities present in this context, as well as the various strategies of work
regulation, aiming at two main objectives: 1) maintaining one's own health and 2) job. It was evidenced
that there is insufficient materials and equipment and that this has a direct impact on daily care, the
workload of workers in the sector and other sectors in interface with the CME. However, it can also be
demonstrated that strategies were constructed and shared, modulated by the individual / collective
competence analyzed and that proved to be of fundamental importance for productivity and risk
management in the analyzed context.
Keywords: Regulation strategies. Centro of Sterilized Material. Services and values.
1
Este estudo faz parte da pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa pela Universidade Federal de Itajubá Campus Itabira,
sob registro CAAE 75205517.5.0000.5559 e 75205517.5.3001. 5110. Este projeto é idealizado por um grupo de estudos em Ergonomia
Hospitalar e foi apresentado como pesquisa para um Projeto de Iniciação Científica.
2
Graduado em Engenharia de Saúde e Segurança do Trabalho pela Universidade Federal de Itajubá.
3
Doutor em Educação pela UFMG, Mestre em Engenharia de Produção pela UFMG, Graduado em Fisioterapia pela UFMG. Professor
adjunto 3 da Universidade Federal de Itajubá.
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INTRODUÇÃO
As transformações ocorridas nos sistemas de produção entre a primeira revolução
industrial até as atuais formas de capitalismo globalizado são acompanhadas de
mudanças nos modos de viver, trabalhar e de adoecer, afetando todos os níveis e
esferas da produção, as relões de competitividade empresarial, a divisão
internacional do trabalho, o conteúdo do trabalho e as condições de gestão da saúde
no trabalho (ECHTERNACHT, 2008).
Muitos autores têm se dedicado a estudar esse fenômeno, e entre eles
(HENNINGTON, 2011) reforça esse pensamento dizendo que o mundo do trabalho, ao
longo dos últimos culos, vem passando por intensas e profundas transformações e
sua dinâmica individualista e fragmentadora tem repercutido de maneira contundente
na forma de ser e de se fazer o trabalho.
Trabalhar é gerir-se em um meio cuja estrutura produtiva, composta por normas de
ordem técnica, organizacional e gerencial, heterodetermina os objetivos do trabalho,
seus instrumentos, tempo e espaço. Porém, essa heteroderminação não exclui a
mobilização de saberes e valores incorporados nas práticas da atividade, condição
para o agir competente em um meio produtivo em constante transformação
(ECHTERNACHT, 2008). A atividade de trabalho exige uma constante arbitragem
entre o uso de si por si e o uso de si pelos outros, com um debate constante entre as
normas antecedentes e as normas inscritas na história do corpo de quem trabalha
(SCHWARTZ, 2000). Isso implica em reinterpretar e renormalizar as normas
antecedentes, com o objetivo de ajustá-las a si mesmo e à situação de trabalho
(MENDES, 2015).
Diante dessas observações, constatou-se que o setor de produção de serviços tem
sentido o impacto dessa mudança de cenário, já que quando comparado ao setor
primário e secundário tem características que o difere dos demais. Entre elas estão a
proximidade entre trabalhador e consumidor como uma das principais características
das relações de trabalho desse setor com possibilidades de repercussões específicas
nos processos saúde doença. Além disso, a simultaneidade é um elemento
fundamental nesse contexto, haja visto que, a produção do serviço ocorre no momento
em que ele é consumido, surgindo daí o conceito de inestocabilidade, ou seja, não
pode ser estocado e mensurável, tornando-se intangível.
Segundo (MENDES, 2012) tanto o hospital, bem como os outros equipamentos da
rede assistencial (Unidades Básicas de Saúde, Unidades de Pronto-atendimento,
Centros de Ateão Psicossocial, etc), têm se mostrado como um importante e grave
foco de problemas relacionados à Saúde do Trabalhador e Segurança do Trabalho e
exigido, de modo crescente, intervenções preventivas. Tais repercussões da atividade
de trabalho sobre a saúde têm sido conformadas em processos de desgaste e
adoecimento variados, entre os quais destacam-se as LER/DORT, variadas
manifestações de adoecimento psíquico e os acidentes de trabalho.
Dando luz à área hospitalar devido ao seu papel essencial na sociedade, vemos que
além das características ligadas às atividades dos setores de serviço, existem outras
particularidades da esfera hospitalar, já que os trabalhadores inseridos nesse contexto
convivem diariamente com vidas humanas em momentos de grande vulnerabilidade,
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experimentando emoções variadas que os expõem a riscos que vão além dos
objetiváveis.
Dentro desse contexto, o Centro de Material de Esterilização (CME) é uma unidade,
dentro do complexo hospitalar, que presta atendimento indireto ao paciente, tendo
como foco principal o processamento de materiais/artigos utilizados no cuidado ao
usuário do serviço, em toda a sua diversidade. Acredita-se que seja um ambiente com
uma complexidade que favoreça a exposição do trabalhador a riscos, considerando
que o sujeito trabalha em contato com fluidos orgânicos, calor e substâncias químicas
decorrentes de processos qmicos e térmicos de desinfecção e esterilização, em
ambiente confinado, sob rotinas motonas e/ou exaustivas e não raramente
insuficiente em recursos materiais e humanos.
A partir daí, despontam-se algumas questões: quais são os elementos necessários
para que se efetive as estratégias de regulão adotadas pelos trabalhadores para
manutenção da própria sde e gestão da carga de trabalho? Como o coletivo de
trabalho lida com a insuficiência de recursos e materiais? Os valores ali colocados em
prática são reconhecidos por todo hospital?
Com base nesse panorama e ambicionando responder às questões propostas, o
presente estudo tem como objetivo esmiuçar/analisar o funcionamento de um Centro
de Material Esterilizado de um hospital do interior de Minas Gerais, evidenciar as
estratégias de regulão e gerenciamento da carga de trabalho e observar como é feito
o uso de si e do coletivo de trabalho para atender toda demanda a eles apresentada,
bem como os infinitos modus operandi, associadas à história de vida de cada
trabalhador, os valores ali colocados em prática e sua singularidade, no momento da
tomada de decisões.
A GESTÃO DA ATIVIDADE: DESVELANDO AS ESTRATÉGIAS DE REGULAÇÃO
A atividade de trabalho é ão enigmática singular do humano que produz história.
Aquele que trabalha, responde de maneira única a uma demanda, investe todas as
dimensões do seu ser (bio-psíquica-social) para gerenciar a distância entre a tarefa e
as concretudes da realidade (DANIELLOU, LAVILLE & TEIGER, 1989; SCHWARTZ &
DURRIVE, 2010).
Trabalhar é escolher as quais riscos se expor e quais responsabilidades assumir.
Trabalhar é também gerir-se (SCHWARTZ, 2004), aquele que trabalha escolhe que
uso fará de si mesmo,a partir do momento em que há escolhas a se fazer, isso impõe
responsabilidade e precauções importantes (TRINQUET, 2010, p. 98).
Diversos são os fatores que acometem ao aumento da carga de trabalho do setor de
enfermagem, como disposto por Silva et al (2016), observa-se uma elevada carga
horária de trabalho, baixa remuneração, relações de poder e hierárquicas
extremamente demarcadas, baixa autonomia no processo de trabalho e elevadas
exigências para alcaar os objetivos institucionais e melhorar os indicadores
produtivos e de qualidade.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) refere que o trabalho deve ser prolífero,
remunerado, exercido em condições de seguraa e igualdade, sem discriminão e
capaz de possibilitar uma vida digna ao profissional (OIT, 1990). Mas, como podemos
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observar no contexto da sociedade capitalista, nem sempre este se configura desta
forma, podendo gerar sofrimento e adoecimento.
Diante de tal situação e suas inúmeras formas de compor o ambiente de trabalho, os
profissionais inseridos nesse contexto buscam formas de gerir as variabilidades. Essa
estratagema utilizada pelo sujeito no ato de trabalhar tem como objetivo principal a
realização de um trabalho de qualidade, bem como a manutenção da própria saúde no
desenvolvimento da atividade laboral.
Como evidenciado por Schwartz (2011, p. 139):
O protocolo é falho, é caracterizado por um vazio de normas, o que significa que ele não
consegue antecipar o que vai ser preciso fazer para lidar com a articulação trama e
urdidura, assim cada um trata esses vazios de normas recorrendo a um universo de
recursos pessoais, hierarquizado por seu conjunto de valores do momento.
Como se não bastasse lidar com essas questões, esses profissionais ainda estão
submetidos a infortúnios de ordem organizacional, mais precisamente relacionada com
a insuficiência de recursos materiais. Para Fajardo Ortiz (1972, p.7), os problemas da
gestão da saúde referem-se à insuficiência de pessoal; insuficiência de recursos
econômicos e materiais”; administração antiquadas; e locais e equipamentos
inadequados.
Análise interessante é feita por Lima; Barbosa (2001, p. 40) que considera a
organização hospitalar como [...] uma empresa de multiprodutos, com vários
processos de produção altamente interdependentes, cujos produtos se articulam para a
produção de seu principal produto, qual seja, o diagstico e tratamento do paciente.
Atentos a isso, analisar a gestão de riscos no trabalho, a assistência ao paciente e a
construção da saúde/doença implica acessar a singularidade das experiências
individuais e coletivas de reconhecimento e hierarquizão dos riscos diante das
especificidades das situações produtivas (MENDES; CUNHA, 2017, p. 25).
A melhor maneira de se identificar quais são as ferramentas utilizadas por esses
colaboradores para subjugar essas variabilidades e efetivar a realização do trabalho é
adentrar no ambiente de trabalho, compreendê-lo e reconhecer as individualidades
presentes em cada situação ali apresentada.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo qualitativo e descritivo com fundamentação teórica e
metodológica baseadas na Ergonomia e na Ergologia.
A construção da ação ergomica é sempre situada no tempo e no espaço, uma vez
que cada situação de trabalho tem suas características singulares (variabilidade na
execução do trabalho, das suas condições e dos objetivos de produção) e as
possibilidades para o seu desenvolvimento e a concretizão das transformações são
fruto de uma ação social na qual diferentes sujeitos podem ter uma contribuição
significativa. A contribuição da ergonomia está precisamente em reincorporar os
sujeitos do trabalho nas suas análises e, esse interesse central pela atividade exige um
esforço de observar o trabalho com uma lupa (SCHWARTZ & DURRIVE, 2010, p.
39). Segundo Silva et al. (2015, p. 90), não se pode negligenciar que há um conjunto de
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fatores que, conjugados, permitem que cada um faça a gestão daquelas infidelidades
de maneira a produzir os resultados esperados.
Colocadas e debatidas essas questões centrais que compõem um conjunto trico
ergonômico, optou-se também pelo aprofundamento epistemológico da Ergologia. A
ergologia também se apropria e aprofunda as noções da ergonomia sobre a diferença
entre prescrito e real e as variabilidades presentes nas diversas situações de trabalho.
A atividade é, portanto, uma noção que deve ser associada à dinâmica da própria vida
(CANGUILHEM, 2010).
PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS
Inicialmente foi acordado com o Diretor Técnico do hospital todas as características da
pesquisa, bem como os detalhes sobre as visitas técnicas e critérios de postura e
confidencialidade. Posteriormente, foi realizada uma reunião com a Responsável
Técnica do setor, em que foi apresentado a ela e logo em seguida aos colaboradores, o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, assegurando o total conhecimento e
voluntariedade dos envolvidos. Somente após essa etapa inicial é que de fato se iniciou
a entrada no setor e a coleta de dados. Além disso, o estudo foi aprovado em 2 comitês
de ética em pesquisa (proponente e coparticipante), por meio dos Certificados de
Aprovação para Apreciação Ética CAAE 75205517.5.0000.5559 e
75205517.5.3001.5110, respectivamente.
Logo após toda a formalizão da parte burocrática, foram realizadas observões
sistemáticas por meio do acompanhamento diário do setor analisado, conhecendo
assim todo o processo de trabalho, fluxo de serviço e características do ambiente.
As coletas foram feitas entre os meses de março a junho de 2018 e, em um primeiro
momento, foi coletado através de um questionário semiestruturado informações sobre
aspectos sócio demográficos dos participantes, tais como, idade, sexo, jornada de
trabalho, setor de trabalho, tempo de serviço e escolaridade. A partir daí, através de um
estudo com caráter descritivo e exploratório, foi possível compreender as diversas
situações vividas no ambiente, já que a coleta de dados se deu no ambiente natural,
por meio do acompanhamento do dia a dia de trabalho, transcrição das verbalizões
dos trabalhadores envolvidos, confrontação simulnea em determinadas questões e,
posteriormente, ordenação e estudo dos pontos que apresentaram maior relevância.
A posteriori, após uma série de visitas e certo contato com os funcionários, foram
realizadas indagações voltadas para a rotina de trabalho, tentando compreender o fluxo
do processo e a base da rotina do local. Questões acerca de como é realizada a
lavagem e o preparo do material cirúrgico; quais os procedimentos são realizados na
esterilizão e armazenamento do material cirúrgico e as dificuldades e facilidades no
seu cotidiano de trabalho, ao desenvolver as atividades inerentes ao processo de
esterilizão.
CARACTERÍSTICAS DO HOSPITAL
O hospital estudado se mantém por meio de recursos governamentais e por meio do
Pro Hosp do governo estadual. É referência microrregional em traumatologia,
maternidade e de hemodiálise para uma população estimada em 300 mil habitantes,
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pois, além de atender os habitantes da cidade onde está situado, presta atendimentos
aos habitantes das cidades da região.
No início do ano de 2016, esse hospital passou a atender toda a demanda advinda do
processo de transformação do outro hospital da cidade em atendimento à saúde, dado
que, a populão que utiliza plano de saúde passaria a ser atendida somente em um
hospital e o mesmo ainda não possuía atendimento emergencial. No intuito de atender
a demanda da população, que ficaria carente desse tipo de atendimento, o pronto
atendimento (PAC) foi aberto em uma área antiga do hospital, sendo dessa forma um
local provisório, mas que atualmente consegue atender a população.
A partir das características iniciais levantadas sobre a situação atual do hospital, ficou
acertado que aquele seria um local que traria grandes contribuições para ambos os
lados, haja vista que, os pesquisadores/universidade teriam uma área gigantesca e
interessantíssima para prodão de conhecimento, e a instituição objeto de estudo
poderia colher os frutos dessa parceria aumentando a satisfação dos funcionários,
melhorando as condições de trabalho e, consequentemente, aumentando a
produtividade dando ênfase à saúde dos colaboradores que ali atuam.
Como no hospital existem diversos setores, após uma alise detalhada de todos eles,
elegeu-se o Centro de Material Esterilizado (CME) para o foco da pesquisa, em razão
de sua centralidade, complexidade, prestação de atendimento a todos os setores do
hospital, pouco reconhecimento do valor do trabalho ali prestado por outros
funcionários da instituição, além do papel da coletividade na gestão da carga de
trabalho.
Esse setor é composto por 27 profissionais, todas do sexo feminino e seu
funcionamento se dá 24 horas por dia, em 2 turnos de trabalho e 1 turno com horário
administrativo, válido somente para as duas enfermeiras chefe.
Essa unidade funcional de apoio técnico é responsável pelo processamento de
produtos para a saúde em serviços de saúde. Esse setor atua visando à prevenção de
infecções, mesmo que indiretamente, articulando ciência, segurança e qualidade, por
meio da equipe de enfermagem.
Todos os materiais não descartáveis utilizados no hospital para atendimento aos
pacientes passam pelo local, já que o instrumental utilizado pelo paciente deve ser
processado adequadamente a fim de que esse material não se torne uma fonte de
contaminação e transmissão de microrganismos. Abaixo temos um esquema do ciclo
de utilização dos materiais e as etapas de processamento dentro da unidade
especializada.
FIGURA 1- Dinâmica Centro de Material Esterilizado
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Fonte: Imagem retirada da internet.
4
Além do atendimento ao hospital, o CME faz o processamento dos materiais utilizados
pelo Pronto Socorro, unidade que fica em anexo ao hospital, o que demanda aos
funcionários uma exata caracterizão da origem dos materiais chegados ao expurgo,
para que logo após finalizado o processo de esterilizão, esse conteúdo volte ao seu
local de origem para não causar maiores transtornos.
A análise dos números fornecidos pela instituição mostra a importância da unidade e a
carga de trabalho a que estes trabalhadores estão submetidos. No ano de 2017 foram
realizados aproximadamente 20 mil atendimentos pelo hospital, derivando daí algo em
torno de 800 cirurgias/mês, demonstrando a importância do centro de processamento
para o correto funcionamento desta engrenagem.
Como visto, além de ser um ambiente de trabalho que requer atenção especial devido
a sua complexidade, a grande demanda por utensílios para atender aos diversos
setores, bem como alguns problemas causados por insuficiência de recursos materiais
e limitões do espaço físico podem agravar ainda mais esse contexto. Para que todo
o processo seja realizado com o grau de êxito esperado, mesmo diante das inúmeras
variabilidades que se apresentam cotidianamente, os trabalhadores traçam estratégias
de regulação para manter a eficiência no trabalho e para manutenção da própria saúde,
sendo o coletivo de trabalho peça chave para o cumprimento do esperado.
OBJETO DE ESTUDO: ENFERMEIROS, TÉCNICOS EM ENFERMAGEM E AUXILIARES
O trabalho do enfermeiro do CME é bastante complexo, pois acumula características
técnico-assistenciais, como a gestão de pessoas e da área física, atividades privativas
ao setor, manuseio de novas tecnologias, além da capacidade de visualizar as
necessidades de outras áreas que dependem do seu trabalho (TAUBE; ZAGONEL;
MEIER, 2007).
O perfil dos entrevistados obedece a algumas características, como: faixa etária
variando entre 23 e 65 anos, com tempo médio de prestão de serviços no setor em
até 5 anos, público exclusivamente feminino e com funções variando entre enfermeiras,
técnicas em enfermagem e auxiliares.
A população é composta por 27 pessoas, sendo que no decorrer da pesquisa 1
funcionária estava afastada por motivos de sde, o participando do processo. O
regime de trabalho é de 12x36 (doze horas de trabalho por 36 horas de descanso),
com o primeiro turno iniciando às 7 da man e finalizando às 19 horas. Para a
4
Disponível em: http://www2.ebserh.gov.br/documents/147715/0/central+de+material+e+esterilização.
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responsável técnica da área e uma outra enfermeira que faz o acompanhamento da
unidade, o horário obedece ao turno administrativo.
As funções a serem realizadas pelas funcionárias do CME variam de acordo com a
escala de trabalho. Foi instalada uma política de rotatividade no local, dividindo o centro
nos seguintes setores: expurgo, área de preparo, recepção/embalagens e arsenal. Elas
se revezam entre essas áreas, divididas em pequenos grupos pré-definidos e caso seja
necessário, há um remanejamento pontual para suprir determinada demanda.
Constatado isso e visto as diversas tarefas que os trabalhadores do setor podem ter
que desempenhar em seu ato laboral, um correto entendimento do fluxo de trabalho e
um maior detalhamento do setor estudado se fez necessário para auxiliar nessa
compreensão.
Sistemática de funcionamento do Centro de Material Esterilizado
Como dito, o Centro de Material esterilizado pode ser divido em 3 áreas, sendo essas
delimitadas por barreiras sicas e com características distintas.
Expurgo: A área de expurgo do CME é o local onde é feita a recepção de todo o
material contaminado e sujo da instituição, para limpeza, desinfecção e esterilização. É
fundamental que o material seja selecionado e desinfetado imediatamente após o seu
recebimento na área de expurgo, evitando o acúmulo dos mesmos e,
consequentemente, que matérias orgânicas fiquem aderidas, tornando mais dicil a
sua limpeza.
Outro ponto importante do processo é que essa limpeza seja realizada antes do
processo de esterilização, uma vez que a sujeira e matéria orgânica protegem os
micro-organismos, impedindo que o agente esterilizante aja sobre ele.
Nessa área, normalmente 2 funcionárias fazem o trabalho diariamente, sempre
munidas dos Equipamento de Proteção Individual (EPI) pertinentes como descrito no
mapa de risco do local. Basicamente são os óculos, máscaras, botas, luvas e avental
impermeável e protetor para rdo. Devido ao tipo de trabalho que é desenvolvido na
área, o funcionário utiliza também touca descartável, óculos de acrílico e luvas de
borracha antiderrapante para impedir que o funcionário entre em contato direto com
material ou objeto contaminado.
O material é recebido através de uma bancada na porta do expurgo e acondicionado
em uma mesa de apoio para conferência da quantidade e destino de origem. Uma
planilha deve ser preenchida com todos os dados, responsável pela entrega e pelo
recebimento e a data. Os horários de entrega são definidos previamente sendo que
apenas o Centro Cirúrgico e Hemodiálise tem permissão para efetuar a entrega dos
materiais assim que utilizam, devido a urgência em colocá-los prontos para o uso o
mais rápido possível. A padronizão de horários no recebimento do material é
importante para organizar a dinâmica do trabalho e favorecer o funcionário no
desenvolvimento das rotinas técnicas.
Devido à grande diversidade de instrumental e material recebidos em um CME, a
codificação dos mesmos é um processo que ajuda no controle, principalmente quando
se trata de caixas de instrumentais cirúrgicos. Esta codificação é feita através de cores
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pintadas em uma pequena parte de cada instrumental e caixa para que os materiais
sempre retornem para o seu setor de origem.
A área do expurgo requer do funcionário bastante atenção e responsabilidade, pois as
atividades ali desenvolvidas são o ponto de partida de todo o trabalho realizado no
CME. Compete ao técnico em enfermagem ou auxiliar realizar as atividades de acordo
com as rotinas técnicas, sempre sob a supervisão da Responsável Técnica do setor.
Área de Preparo: Esta área tem como objetivo proporcionar aos profissionais que
utilizarão o material esterilizado o conforto de ter nas os o material completo, na
sequência necessária e em perfeitas condições de uso. É nesta parte que se
concentram o maior número de atividades do setor, juntamente com a maior demanda
por funcionários.
As roupas que chegam da lavanderia passam pelo processo de separão e
dobragem, todas com uma metodologia específica de acordo com sua função. Sua
separação e acondicionamento em pacotes denominados campos são realizados
normalmente por 3 funcionárias, sendo que uma quarta funcionária posicionada
estrategicamente em frente às autoclaves registra tudo em planilhas, etiqueta todos os
pacotes e abastece as máquinas com o material a ser esterilizado.
Outra funcionária fica posicionada na bancada ao lado, fazendo a inspeção visual de
todos os equipamentos respiratórios. Esta bancada é equipada com uma lupa e luz
especial e o trabalho ali realizado requer concentrão e uma apurada vistoria. É aqui
também que são montadas as caixas com instrumental cirúrgico e material implantado,
procedimento este que só pode ser realizado pelas enfermeiras. Quando o processo
de inspão e montagem dos kits é finalizado, tudo tem que ser embalado em uma
manta adequada chamada de SSMMS
5
e colocado na autoclave para esterilização
com o programa adequado.
Arsenal: Também chamado de local de armazenamento, é aqui onde os produtos
saídos da autoclave e prontos para uso são acondicionados. A responsável técnica do
setor confere a lista de cirurgias programadas para o dia seguinte, e passa para a
funcionária que estiver alocada na área no dia separar e realizar a entrega desses
materiais para os setores. Todo esse processo tem horários pré-definidos e são
realizados até às 10 da manhã todos os dias, exceto para bloco cirúrgico e
hemodiálise, que não tem restrição de horários para fazer requisição.
FIGURA 2- Fluxo dos materiais ao entrar no CME
5
Manta com 5 camadas 100% Polipropileno, composta por três camadas externa de Spunbond e duas camadas interna de Meltblown
unidas através de processo de calandrag térmica, com isenção de produtos químicos na sua fabricação e porosidade controlada.
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Fonte: Imagem retirada da internet
6
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FIGURA 3- Croqui do centro de Material Esterilizado
Fonte: Próprio autor.
PRESCRITO X REAL: DIFICULDADES IMPOSTAS PELO TRABALHO
O coletivo de trabalho é elemento fundamental na construção das boas práticas de
segurança no trabalho, uma vez que a comunicação entre eles muitas vezes se dá
apenas pelo modo de olhar, determinado posicionamento no ambiente de trabalho e
outras características que somente quem está inserido no contexto consegue entender.
Atentos a isto, os profissionais do setor no decorrer da execução de suas atividades
lidam a todo instante com demandas das mais variadas formas. Durante a realizão
da pesquisa, diversas situações se apresentaram, e utilizando a ferramenta de
confrontão simultânea, as verbalizações foram fundamentais para entender a
situação.
Em uma delas, quando questionada sobre uma eventual necessidade de suprir a
demanda de um determinado instrumental, mesmo já reservados para o dia, obteve-se
a seguinte resposta:
“Se aparecer uma emergência e todos os kits para este tipo de cirurgia
estiverem reservados para o dia, a gente pega a caixa da cirurgia que for mais
tarde, envia para o bloco e depois busca correndo para esterilizar de novo.
Em outra situação presenciada, uma das máquinas de esterilização apresentou
problemas e como o local conta com apenas duas, esse fato ocasionou excesso de
demanda para a outra. Tentando manter o estoque do arsenal apto a atender as
possíveis solicitações do hospital, o corpo técnico do local reagrupou os materiais e, de
acordo com o levantamento feito pela técnica que monitorava o estoque no dia, ficou
definido que a prioridade seria os kits para operações de ortopedia.
Eu estou fechando a ortopedia (caixas) que é o que tem mais necessidade.
Quando a outra quina estiver pronta, a gente coloca os materiais que
ficaram para trás.
Todas essas situações ilustradas acima demonstram que o trabalho vai muito além do
planejado. O cronograma de realização das tarefas do dia, a ordem e forma de
execução das atividades e todos os outros fatores que compõem o ato de trabalho são
6
Disponível em: http://sinnapse.blogspot.com/2012/06/perioperatorio-central-de-material.html
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previamente decididos, mas a sua aplicão daquela forma ou não acontece no
momento em que o trabalho acontece, sendo o sujeito à frente daquela tarefa o
responsável pela escolha da melhor maneira de gerir a situação.
Durante a realização do estudo, diversos foram os fatores observados que intensificam
a carga de trabalho e geraram constrangimentos para os atores ali envolvidos. Por
meio do acompanhamento das atividades, observões do pesquisador e,
principalmente, verbalizações dos funcionários, verificou-se alguns elementos que se
destacaram dos demais. Entre eles estão:
- Insuficiência de recursos financeiros para modernização da unidade;
- Necessidade de automatização dos setores, facilitando o registro de entrada e saída
de utensílios, diminuindo o retrabalho;
- Ausência de um plano de manutenção preditiva para os equipamentos,
principalmente as autoclaves, evitando sobrecarga de trabalho e estresse quando
ocorrer algum problema;
- Ausência de um programa de treinamento e/ou reciclagem dos funcionários, visando
aprimorar a parte técnica e diminuir os erros causados pelo automatismo.
Discussão
De acordo com Winnicott (2011), o trabalho possibilita ao indivíduo um fazer criativo no
mundo, uma forma de expressão pessoal e social, agregado de valores intrínsecos,
que gera constrão e transformações, em dupla via, quando realizado em condições
favoráveis.
Atualmente, a informação e a comunicação se tornaram elementos fundamentais à
produção. Houve, também, uma apropriação e exploração de capacidades humanas
no mundo do trabalho como a criatividade, a capacidade organizativa e de cooperação,
a comunicação e a habilidade dos trabalhadores na resolução de problemas que
passam a ser valorizadas e imperativas no novo ideário produtivo (ANTUNES, 1999).
Em um dos locais que faz parte da divisão externa do Centro de Material Esterilizado
conhecido como Arsenal, ficou evidente a necessidade do trabalhador exercer ao
máximo sua capacidade de organizão e, sobretudo, de cooperação para atender as
expectativas que todo hospital deposita no local. Este ambiente é o local de retirada dos
materiais prontos para uso e uma funcionária por turno fica responsável pela tarefa. O
que acontece é que a organização das caixas ortopédicas que são mais pesadas nas
prateleiras de baixo, e o atendimento emergencial para setores que podem solicitar
material a qualquer hora, como Bloco Cirúrgico e Hemodiálise, demandam uma
atenção maior do colaborador, que além de gerir todo estoque e organizá-lo de
maneira menos penosa, precisa ficar atento a possíveis desabastecimento decorrentes
de pedidos aleatórios.
Esse local, assim como todo CME busca se regular e foge ao prescrito para dar conta
da demanda a eles apresentada, e os profissionais ali presentes se envolvem por
inteiro, fazendo daquilo muito mais que uma mera execução da tarefa, se envolvem por
inteiro, se sentem como fazendo parte do meio.
Como dito por Mendes (2014), o ato de trabalhar não se restringe a um uso
heterodeterminado de homens e mulheres pelos gestores dos sistemas de produção,
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mas a uma experiência de si mesmo, numa relação com a própria história. A atividade
humana de trabalho exige uma constante arbitragem entre o uso de si por si mesmo e
o uso de si por outros, num debate permanente entre as “normas antecedentes e as
normas internas inscritas na história do corpo de quem trabalha.
A preocupação com eficácia e racionalidade comumente presente nas organizações se
expressa no que os ergonomistas chamam detrabalho prescrito, ou seja,o trabalho
que foi determinado, cientificamente pensado por pessoas que fizeram cálculos de
tempo, de eficácia, portanto, que estudaram tudo, de fato, detalhadamente
(SCHWARTZ, 2010d, p. 40). Visando à menor perda de tempo, bem como encontrar a
maneira ótima para realização, o trabalho prescrito é definido de modo externo e
imposto aos trabalhadores. No entanto, conforme Duraffourg, Duc e Durrive (2010, p.
70), o prescrito tende a se dissolver, ou seja, pode estar [...] formalizado nos livros
sobre a organização, ele pode ser afixado num mural, ser objeto de esquemas,
modelos, razões. Ele é registrável, é visível, pode ser verbalizado.
Por outro lado, tudo o que é da ordem do real é dificilmente visto e expresso. Quantos
trabalhadores dizem:eu estou acostumado, e não conseguem verbalizar sua maneira
de fazer! Em razão disso, a Ergologia privilegia o conceito de normas antecedentes,
que engloba o conceito ergonômico de trabalho prescrito (TELLES e ALVAREZ, 2004).
Conforme Vieira-Júnior e Santos (2012, p. 94), o conceito de normas antecedentes
[...] é mais abrangente que o seu precursor [trabalho prescrito], por incorporar várias
dimensões presentes nas situações de trabalho, como: a) as aquisições de inteligência do
trabalhador; b) as experiências coletivas; c) o saber-fazer; d) as construções históricas
analisadas como patrinio cultural e científico; e) a dimensão dos valores, que
transcende a questão monetária e se posiciona na esfera do político, dos debates e dos
conflitos que findam por compor o cater híbrido desse conceito.
As normas antecedentes referem-se, portanto, ao modo como experiências coletivas
produzem normas situadas num tempo-espaço laboral, considerando-se ainda a
parcela de singularidade de cada trabalhador que compõe o grupo, uma vez que estão
subjacentes nelas valores coletivos e individuais (SCHWARTZ, DUC e DURRIVE,
2010d). O que leva a outro conceito relevante, o devalores, que, na Ergologia, refere-
se ao [...] peso que se atribui mais ou menos às coisas; uma hierarquia, uma
categorizão própria a cada um a propósito do que se estima, prefere, ou pelo
contrário se negligencia, rejeita. Em certa medida, é a tentativa de cada um de ter uma
maestria sobre o meio no qual se encontra (exemplo: um escritório personalizado). O
indivíduo não inventa sozinho a prescrição e nem os seus valores, mas retrabalha
incessantemente os que o meio lhe propõe (DURRIVE e SCHWARTZ, 2008, p. 27).
Diversos o os momentos em que o prescrito é deixado de lado e a atividade real
aflora, mostrando as estratégias adotadas pelo funcionário naquele exato momento.
Como exemplo, temos a recomendação a respeito do descarte dos sacos plásticos
utilizados para embalar a rouparia vinda da lavanderia. Segundo a prescrição, esses
sacos devem ser rasgados e descartados imediatamente na lixeira, já que vieram de
um local em contato com materiais não esterilizados. O que acontece é que o local de
descarte é afastado do local onde é feita a dobragem das roupas e, para evitar perda
de tempo, as funcionárias acumulam uma certa quantidade desse material nas
prateleiras e, assim que julgam necessário, fazem o descarte do mesmo. Vale observar
que o há risco de contaminação uma vez que os materiais da prateleira terão que
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passar ainda pelo processo de esterilizão, mas já fica evidenciado essa lacuna entre
a tarefa e a atividade.
Em um segundo momento, quando houve um problema técnico em uma das
autoclaves, pôde-se observar com bastante clareza a regulação que a enfermeira
chefe faz para gerenciar a equipe e consequentemente manter o padrão de
atendimento da unidade. Assim que foi detectada a disfunção no equipamento, foi
solicitado ao arsenal um levantamento do que estava armazenado e em consonância
com a agenda de cirurgias do dia, foi feito um rearranjo dos materiais que seriam
esterilizados, deixando somente os itens com maior urgência na fila da outra autoclave.
Esse ato de remanejar os itens pode parecer simples, mas só é bem feito e produz
efeitos benéficos devido a experiência da equipe em questão e o valor no trabalho,
caso contrário o impacto seria sentido por todo hospital.
Pelos dados coletados, observou-se baixa rotatividade na unidade estudada,
confirmando as verbalizões feitas pelos funcionários sobre a satisfação em trabalhar
naquele local. Em uma das ocasiões, foi feita a seguinte afirmativa por uma técnica:
Eu gosto muito do CME, já trabalhei em outros setores, mas aqui é o que eu mais gostei.
Tenho até vontade de fazer uma pós um dia.
Pôde-se observar que o baixo índice de turnover no local analisado favoreceu o
estreitamente dos laços no ambiente e, por consequência, tornou o ambiente de
trabalho menos impessoal e de mais cil lida com os desafios diários.
Ao mesmo tempo, essa satisfação em trabalhar no local contrasta com a falta de
reconhecimento do restante do hospital sobre importância do trabalho desempenhado
por estas profissionais. Quando questionada sobre a visão dos funcionários de outros
setores sobre as atividades ali praticadas, a fala de uma delas foi categórica:
Cruz credo! Eu é que não quero ir pra lá lavar vasilha e dobrar roupa.
Conforme Silva e Aguiar (2008), o desprestígio da execução deste trabalho pode estar
ligado ao fato do desconhecimento deste setor pelas unidades consumidoras.
Vale ressaltar que, mesmo com essa hipossuficiência gratular, o trabalho
desempenhado por todas as profissionais do setor é sempre de alcançar a excelência
em todos os momentos, sendo a tomada de decisões baseada nos valores e ética ali
colocados em prática almejando o objetivo maior: prestar um atendimento de qualidade
ao paciente, mesmo que de forma indireta.
Daí emerge ainda as noções de Entidades Coletivas Relativamente Pertinentes e de
saberes investidos. A primeira é utilizada para diferenciar as entidades coletivas
daquelas definidas por organogramas ou por lugares, postos e responsabilidades,
remetendo, em vez disso, aos coletivos dentro de umcampo ergológico, ou seja, que
diz respeito à atividade humana, uma vez que suas fronteiras não são predefinidas,
mas sim assentadas pela atividade num dado momento, como sinfonias sem maestro
(SCHWARTZ, 2010a). A não de saberes investidos”, por sua vez, refere-se aos
saberes que ocorrem em aderência, em capilaridade com a gestão de todas as
situações de trabalho, e que são adquiridos nas trajetórias individuais, coletivas e
singulares (SCHWARTZ, 2010b). Ou seja, são os saberes diversos constitdos e
retrabalhados coletiva e individualmente nas atividades.
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Para que isso realmente se efetive e se desdobre em êxito na atividade realizada,
várias são as competências que devem ser colocadas em prática por essas
funcionárias. Segundo Scherer et al. (2016, p.95), cada gestão irá variar de indivíduo
para indivíduo, visto que, por meio de suas histórias, valores e a atividade ao qual está
ou já esteve exposto, cada indivíduo desenvolve uma forma de competência, tais
competências que são ferramentas cognitivas afiadas para desempenhar todas as
funções demandadas em seu dia a dia com qualidade e sensibilidade, o que determina
um maior uso de si.
Essa percepção única e individual dos momentos ali vividos é o que torna a atividade
singular, situando-a naquele tempo e espaço e exigindo do profissional habilidades que
muitas vezes foram desenvolvidas sem que ele mesmo percebesse. Esse
emaranhado de histórias, valores e competências é o que faz, por exemplo, os
funcionários do hospital realizarem empréstimos de materiais para outros hospitais,
mesmo que isso gere transtornos para eles, já que muitas vezes essas outras unidades
não possuem unidades de esterilização própria, aumentando o trabalho dos mesmos.
Essas e outras situações presenciadas são fundamentais para compreender a
construção do ato de trabalhar, e essa gestão de si por si e de si pelos outros é
característica fundamental no processo.
Reconhecer que existe uma lacuna entre a tarefa prescrita e a atividade real, enxergar
os valores dimensionáveis e o dimensionáveis que movem esses trabalhadores e
acima de tudo compreender que todos esses aspectos influenciam na carga de
trabalho a que estão submetidos é fundamental para a proposição de melhorias no
ambiente de trabalho.
Posto isto, o denominador comum que se chega ao analisar a unidade de esterilização
e juntamente com ela os profissionais ali inseridos, é de que prestar um serviço de
qualidade, conseguir gerir de maneira satisfatória a própria saúde e a sde dos
demais ali presentes sempre que possível para evitar distúrbios, bem como solucionar
as diversas problemáticas do cotidiano visando dar continuidade ao fluxo de trabalho é
o que todos esperam alcançar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conhecer a fundo a realidade de trabalho em que os colaboradores estão inseridos é
fundamental para a compreensão de como é feito o uso de si por si mesmo e o uso de
si por outros, na construção do coletivo de trabalho.
Entender como é o processo de gestão da unidade, maneiras utilizadas para superar
as adversidades inerentes ao ato de trabalhar, bem como a identificação das
estratégias empregadas para dar conta do que é demandado foi de suma importância
para a concepção deste estudo.
A proposição de melhorias no ambiente de trabalho se dá de maneira muito mais eficaz
quando o sujeito à frente da atividade é ouvido, e é através dos seus saberes que são
gerados espaços de debate para a construção de melhorias.
A utilizão da Análise Ergonômica do Trabalho juntamente com as ferramentas da
Ergologia foi fundamental para a compreensão da situação de trabalho analisada,
fazendo emergir a atividade, os constrangimentos e suas (im) possibilidades de geso,
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revelando as estratégias até então construídas, e demonstrando a importância do
coletivo de trabalho ali instalado.
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