Trabalho & Educação | v.28 | n.1 | p.9-12 | jan-abr | 2019
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EDITORIAL
Todas as instituições de ensino foram abertas ao povo gratuitamente e ao
mesmo tempo purificadas de toda interferência da Igreja e do Estado. Assim,
não somente a educação se tornava acessível a todos, mas a própria ciência
se libertava dos grilhões criados pelo preconceito de classe e pelo poder
governamental.
Karl Marx A guerra civil na França, 1871.
Esse ensinamento de exatos 148 anos atrás nos faz refletir sobre os rumos que
deveríamos perscrutar para perseguir na caminhada pelo futuro da educação no Brasil,
também no mundo, no século XXI.
O cerio atual que envolve a política educacional do atual governo no Brasil torna ainda
mais urgente seguirmos em busca das possibilidades apontadas pelos que tomaram o
céu de assalto em 1871 na França.
Entendemos ser pertinente iniciar o editorial da Revista Trabalho & Educação (28.2), nos
reportando, de forma breve, ao cenário político brasileiro, que nos anos mais recentes de
nossa história, e mais fortemente nesse ano de 2019, se vê seriamente ameaçado pelos
cortes orçamentários significativos, principalmente para o ensino público superior,
comprometendo o Ensino, assim como as Pesquisas e a Extensão.
Tal redução nos repasses afetará além de importantes pesquisas na pós-graduação,
também acarretará um expressivo aumento da evasão de alunos, principalmente os de
baixa renda, que das bolsas dependem para se manter nas universidades, sendo esse
um fator de grande preocupação e angústia aos que verdadeiramente se comprometem
com a educão pública, universal à todos. Os cortes vão além do comprometimento de
verbas destinadas às bolsas de pesquisa, as universidades se veem obrigadas tamm
a cancelar serviços e dispensar funciorios, alterando substantivamente o
funcionamento das instituições.
Como nos diz o professor Roberto Leher em recente artigo publicado no Le Monde
Diplomatique Brasil:
Ao associar as universidades e IFs ao futuro, sem sequer esboçar o busílis da queso
universitária brasileira, a ausência de políticas de financiamento, o objetivo do PL parece
ser o de ajuste das instituições ao novo contexto de forte decréscimo do financiamento
público resultante da EC 95/2016. Nesse sentido, o PL es em conformidade com a
chamada Ponte para o Futuro que preconizava o fim da vinculação constitucional de
verbas para a educação. Em suma, é um PL de transição para um novo modelo em que
o Estado, à revelia da Constituição Federal, renuncia ao seu dever de prover recursos
para as autarquias e fundações públicas.
A retirada da comunidade acadêmica dos principais conselhos de ministérios e órgãos
que envolvem políticas públicas é congruente com o posicionamento governamental
pouco amigável em relação ao conhecimento científico e está em linha com a tentativa
de estabelecer um novo modelo de financiamento claramente inexequível: os fundos o
asseguram custeio e investimentos em infraestrutura geral. O fracasso previsível do novo
modelo possivelmente desaguará no fim da gratuidade da pós-graduação e da
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graduação, novamente, um modelo impraticável no Brasil e que mostra sinais de crise
em pses como os Estados Unidos e Inglaterra.
O intento heterônomo de subordinar o essencial da vida universitária aos contratos de
gestão é claramente inconstitucional. O pilar axial dessa inconstitucionalidade é o
deslocamento do preceito autonomia de gestão financeira” para autonomia financeira.
Assim, medidas legítimas, como o intento das instituições valorizarem seu patrinio e
ampliarem suas receitas próprias, são desvirtuadas. No PL tais medidas são
descaracterizadas para servir de pretexto para o controle governamental das instituições,
novamente uma explícita afronta ao preceito constitucional da autonomia.
Somente nos resta a luta tendo como télos o farol que nos apontou os comunardos de
1871. Uni-vos pela educação pública, universal, para todos, livre das injunções do Estado
e de seus governos e governantes despóticos e a serviço dos interesses privados.
Esse breve preâmbulo aponta para algumas complexas questões que subjazem ao
universo dos textos que compõem esse número de Trabalho & Educação, vejamos.
O artigo de Annie Goudeax, Germain Poizat e Marc Durand aborda a transmissão
cultural como uma ferramenta para a formação profissional de adultos, e este
mecanismo se revela como unidades fundamentais de atividade, ou seja, formas
constituintes e constitutivas da sociabilidade e da humanidade. E nesse processo de
transmissão trazem a educação como a principal representante dessas unidades
antropológicas de atividade humana. A revista T&E traz esse artigo abrindo seu número
28.2 em leitura espelhada com seu original em francês, por ser essa contribuição inédita.
Está sendo publicado pela primeira vez em nossa revista.
O texto de Emmanuel Renault, que abre esse mero, propõe comparar como o
reconhecimento do trabalho é tratado no modelo de Honnet e na Psicodinâmica do
Trabalho. A tetica trabalho sempre esteve presente em Honnet, entretanto com
diferentes pontos de vista ao longo de seu desenvolvimento intelectual, acrescido a isso
o autor ainda se dispôs a realizar uma confrontação com a abordagem científica citada.
Ellen Cristine dos Santos Ribeiro, José Deribaldo Gomes dos Santos e, Karine Martins
Sobral, desenvolvem uma ótima contribuição em Trabalho, educação e capital:
percursos históricos e impedimentos para a formação omnilateral”. Os autores discutem
a relação entre o trabalho e educação. Manifestando a base da sociedade capitalista
através da separação entre trabalho manual e intelectual. Assim, propõe a construção
de uma pedagogia baseada nos conhecimentos acumulados historicamente. As ideias
se apoiaram nos pressupostos marxianos. O artigo discute as relações entre trabalho e
educação ao longo da história no intuito de evidenciar a perpetuação da dicotomia
expressa no modelo educacional vigente, sobretudo no ensino profissionalizante, que
tem reproduzido a cisão entre trabalho manual e intelectual na base da sociedade
capitalista.
O artigo intitulado O perfil profissional dos professores iniciantes e os fios condutores das
práticas pedagógicas revelou a fragilidade dos docentes em início de carreira e os
desafios presentes nas universidades. Optaram para esse estudo realizar uma análise a
partir do perfil profissional dos professores novatos dos cursos de engenharia, situados
em duas instituições de ensino superior de Santa Catarina e os fios condutores adotados
em suas práticas pedagógicas.
A síndrome de Burnout, foco da pesquisa realizada por Erika Cristina de Carvalho Silva
Pereira e Rogério Goalves de Freitas, é um distúrbio psíquico que está se tornando
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epidemia entre os professores do mundo inteiro. Para compreender melhor esse
fenômeno tal pesquisa se propôs a investigar os elementos causais e efeitos do Burnout
em professores de Educação Física a partir das prevalências dessa síndrome em
estudos realizados no Brasil e em alguns pses do mundo. A análise dos dados foram
embasadas no materialismo histórico dialético.
Valmir Alcantara Alves e Maria de Fátima Almeida Martins apresentam o texto que busca
apresentar uma discussão a respeito da mercantilização do trabalho do músico na
cidade de Belo Horizonte, nos revelam como ocorre a explorão da força de trabalho
desses profissionais. O que se percebeu foi que esses usos sobre os sujeitos se
modificam e disfarçam para se manter presentes e atuantes. Fruto da tese de doutorado
A relação do músico com o trabalho: quando o trabalho do músico passa de trabalho
improdutível para produtível em Belo Horizonte, defendida em 2018 na Faculdade de
Educação da UFMG, a tese tem como objeto de alise o músico e seu trabalho na
cidade Belo Horizonte.
O artigo de Adenil Alves Rodrigues, Egidio Martins e Ronaldo Marcos de Lima Araújo é
parte da tese que teve como foco a relação da produção-formação e a práxis política em
pescadores da colônia Z-16 no Pará, revelou a partir de entrevistas e da análise apoiada
no materialismo histórico dialético, que a práxis se revela como a luta pela transformação
da realidade e a negação dos impedimentos provenientes do modo de produção vigente.
O artigo de Fernando Lucas Oliveira Figueiredo e Santuza Amorim da Silva propõe fazer
uma relação entre os elementos identitários construídos por professores de História, e à
Constituição das Identidades na América Latina, através de seus aspectos gerais e as
políticas públicas educacionais da região metropolitana de Belo Horizonte. Para atingir
tais objetivos correlacionaram os dados apreendidos através de questionários, com a
temática presente no texto. Nos revelou então as necessidade constante que os
docentes têm de moldar sua identidade de acordo com a fase profissional, pessoal e
política que se encontra.
Shauma Tamara do Nascimento Sobrinho, Romier da Paixão Sousa e Rosimere
Scalabrin veem com um artigo que busca analisar de que maneira a formação técnico-
profissional contribui com a Educação do Campo, partindo da relação entre trabalho e
educação profissional. Este estudo também se referenciou no materialismo histórico
dialético. Como resultado da investigação constatou-se que há um comprometimento
com a formação dos alunos, aliado ao desenvolvimento da agricultura familiar da região.
Já o artigo de Karla Daniele de Souza Araújo e Maria Cristina Hennes Sampaio trata das
diferentes configurações presentes na realização de orientões acadêmicas. Utilizaram
como objeto de estudo os enunciados/discursos adotados durante essas atividades. A
Filosofia da Linguagem (Bajtin), a Teoria dialógica da linguagem/ Análise dialógica do
discurso (Bakhtin), e os pressupostos ergológicos de Yves Schwartz serviram como
base teórica para a análise dos dados. Constatou-se que relação entre orientando e
orientador levou os sujeitos a lidar com questões institucionais e pessoais, através de
normas que regulam suas funções.
Catarina Barbosa Torres Gomes trouxe à tona as expectativas dos estudantes quando
optam por um intercâmbio, como o Ciências Sem Fronteiras. Os fatores motivacionais
que contribuíram por essa escolha são diversos, como aprendizado de um novo idioma,
influencias familiares, pretensão de fazer uma pós-graduão nos países em que se
destinam, além de conhecer de forma mais próxima diferentes culturas.
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Pedro Luiz C. Rodrigues e Davidson Passos Mendes utilizaram as abordagens
ergonômicas e ergológicas para analisar as situações de trabalho e suas consequências
sobre os trabalhadores que atuam em um Centro de Materiais Esterilizados. Tais
manobras propiciaram reconhecer as atividades lá desenvolvidas e as estratégias
construídas para uma adequada geso do trabalho, especialmente na manutenção da
própria saúde e a eficiência na realização das tarefas.
Gabriela Chaves Marra, Simone Cynamon Cohen e Telma Abdalla de Oliveira Cardoso
discutem como a intensificação do trabalho e a forma de executar as tarefas nos
frigoríficos tem implicões na saúde dos trabalhadores.
Finalmente, Elourdiê Macena Corrêa de Lima, Luciana de Lima Pereira e Selma Suely
Bal de Oliveira, lança luzes sobre as mudanças no mundo do trabalho a partir das
últimas décadas do século XX, tendo como objetos de análise, a expansão do ensino
superior na rede privada da cidade de Manaus e a absorção da mão de obra no setor
produtivo das indústrias do Polo Industrial de Manaus.
Além dos artigos apresentados acima, a edição 28.2 da Revista Trabalho e Educação
traz também a publicação de resumos de teses e dissertações incorporados na temática
abordada pela revista.
No resumo de sua tese, Carolina Noury Azevedo nos diz que seu objetivo era analisar,
discutir e compreender as manifestões da autoria no design editorial brasileiro.
Definindo, portanto, em quais publicações o designer deve ser considerado também
autor proprietário dos livros. Ao refletir sobre o designer enquanto autor do livro,
percebemos que a autoria se manifesta de forma diferente de acordo com o tipo de
publicão. Assim, procuramos definir em quais publicões o designer deve ser
considerado autor proprietário dos livros que projeta, portanto devendo ter seus direitos
assegurados.
A tese de Jacir Mario Tedesco Filho se propôs a investigar os efeitos da participação no
PIBIC-EM como fator contributivo a continuão dos estudos e se trouxe benecios em
relação a inserção no mundo do trabalho. Acrescido a isso, retomou os conceitos da
Educação Profissional e Tecnológica e de Educão e Trabalho. Além de questionar
sobre a imporncia da pesquisa como princípio educativo, tais questões tiveram a
perspectiva marxista como base para discussão.
Já Sérgio Rafacho teve como objeto de sua pesquisa de doutorado a efetividade da
gestão escolar em escolas públicas do estado de Minas Gerais, com prioridade na
formação e aprendizagem. Com a realização e divulgação desse estudo o autor visa
ascender uma discussão acerca da importância do trabalho do gestor na melhoria da
qualidade do ensino blico.
O resumo disponibilizado por Bruna Gonçalves aborda uma temática de importância
ímpar, que é a Divisão Sexual do Trabalho e a Violência Simbólica de Gênero. Junto a
autora, participaram da pesquisa alunas do curso de Engenharia Mecânica do CEFET-
MG, a pesquisa visou compreender as motivões adotadas por elas para continuar sua
formação acadêmica, as estratégias de resistência, os desafios e dificuldades
enfrentados durante o curso.
Boa leitura!
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Alana Pires Dale
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Hormindo Pereira de Souza Junior
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REFERÊNCIAS
AGÊNCIA SENADO. Novo governo promete mudanças profundas na educação. 2019.
Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2019/01/28/governo-promete-
mudancas-profundas-na-educacao. Acesso em: 28 ago. 2019.
DEUS, Enio Pontes de. O cenário político, a Educação e a Pesquisa Científica no Brasil.
Disponível em: http://adufc.org.br/2017/08/24/o-cenario-politico-a-educacao-e-a-pesquisa-
cientifica-no-brasil/. Acesso em: 28 ago. 2019.
LEHER, Roberto. Future-se” indica a refuncionalização das universidades e institutos
federais: uma análise preliminar. Disponível em: https://diplomatique.org.br/future-se-indica-a-
refuncionalizacao-das-universidades-e-institutos-federais/. Acesso em: 2 de agosto de 2019.
MARX, KARL. A guerra civil na França. São Paulo: Boitempo, 2011.
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Licenciada em Educação Física pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri
(UFVJM). Bacharel em Educação Física pelo Centro Universitário Claretiano. Mestre em Saúde
Coletiva pela Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista (UNESP).
Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pesquisadora nas áreas
da Saúde e Trabalho. Integrante do grupo de estudos da Ergologia do Trabalho da FAE/UFMG.
Membro da Sociedade Internacional de Ergologia. Membro do corpo editorial da revista Trabalho
e Educação da UFMG.
2
Bacharel e licenciado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre
em Educação pela UFMG. Doutor em História e Filosofia da Educação pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. Pós-Doutorado em Filosofia Política e Educação pela
Universidade Federal Fluminense. Professor Associado da UFMG. Professor do Programa de
Pós-Graduação Conhecimento e Inclusão Social em Educação da FAE-UFMG. Coordenador do
Grupo de Estudos e Pesquisas Marx, Trabalho e Educação da FAE-UFMG. Editor da Revista
Trabalho & Educação. Desenvolve pesquisas no campo de confluência entre trabalho, política,
formação e emancipação humana.