Trabalho & Educação | v.29 | n.1 | p.7-13 | jan-abr | 2020
grande parte da população brasileira não tem acesso às condições mínimas de higiene
e possibilidades de se isolar em casa. Esta é a realidade de muitos que vivem em vilas
e favelas, daqueles que estão em situação de rua, da população carcerária brasileira,
bem como dos que seguem em trabalhos precários, sejam eles essenciais ou não. Neste
sentido, verifica-se que a pandemia carrega um recorte de classe, gênero e raça.
Não bastasse essa dura realidade brasileira, a pandemia do novo coronavírus nos atinge
num momento em que, mundialmente, o irracionalismo, o neopragmatismo, o
negacionismo e o fundamentalismo dominam, cada vez mais, os espaços da vida. Essa
preocupante constatação nos traz à mente os mais sinistros momentos já vivenciados
na história humana.
Nesse cenário, o conhecimento científico, que poderia apontar possíveis caminhos para
minorar nossas agruras, é renegado por necropolíticas (MBEMBE, 2018) responsáveis
por agravar os infortúnios que nos assolam, em meio a ondas de desinformações que
inundam a internet e as redes sociais online. As tecnologias de informação e
comunicação, que poderiam constituir instrumentos para atenuar nossas atuais
desventuras, são cada vez mais empregadas para estabelecer um poder informacional
(BRAMAN, 2006) que está a serviço de grupos que assumem abertamente identidades
fascistas e aliam-se a hostes de milicianos facínoras e corruptos.
Diante da suspensão temporária da educação presencial, imposta pela necessidade de
desacelerar a propagação do COVID-19, as instituições de ensino privadas vêm na
Educação a Distância (EaD) um instrumento para manter o mercado educacional em
operação, preservar taxas de retorno de investimento, índices de lucratividade e
payback. Para as classes menos favorecidas da sociedade, o resultado não poderia ser
pior. Grande parte da população brasileira não possui os instrumentos tecnológicos
mínimos e acesso à Internet com a qualidade necessária para participar efetivamente
das dinâmicas pedagógicas não presenciais. Além disso, boa parte das instituições de
ensino denominadas “públicas”, financiadas pelo Estado, não possuem recursos
financeiros, tecnológicos e humanos para migrar o ensino para o ambiente digital. Assim,
ampliam-se antigas desigualdades socioeducativas, num evidente favorecimento das
classes mais abastadas da sociedade brasileira.
Nesse angustiante cenário, a equipe editorial da revista Trabalho & Educação seguiu
suas atividades por meio do trabalho remoto e reuniões via internet. Privados dos nossos
saudáveis encontros presenciais, enfrentamos o desafio de manter a regularidade da
revista em meio a esse turbilhão que nos tragou. Para suplantar as dificuldades editoriais,
alguns elementos nos motivaram e alimentaram nosso desejo de superação. Em
primeiro lugar, o desejo de contribuir com a produção e a difusão de conhecimentos
científicos que tenham como horizonte a perspectiva emancipatória. Em segundo lugar,
o compromisso com a própria revista, importante veículo a serviço da educação, da
produção e divulgação de saberes. Ademais, o respeito com autores e autoras que nos
confiaram seus trabalhos acadêmicos e resultados de pesquisas. E finalmente, mas não
menos importante, o desejo de manter nossos leitores atualizados em relação às
produções acadêmicas do campo Trabalho e Educação comprometidas com o
pensamento crítico. O resultado desse esforço coletivo é o que nossos leitores e leitoras
podem agora conhecer.
Em primeiro lugar, merece destaque nesta edição, a entrevista que o Professor Luís
ALCOFORADO concedeu para Carlos COSTA e José G. OLIVEIRA. Alcoforado é
professor da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de