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DOI: https://doi.org/10.35699/2238-037X.2021.33213
https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
DESESTABILIZAÇÕES E APRENDIZAGENS DO SINDICALISMO BELGA
NAS REESTRUTURAÇÕES PERMANENTES
1
Destabilizations and learnings of belgian trade unionism in permanent
restructuring
LOMBA, Cédric
2
RESUMO
Este artigo analisa as práticas e reações dos coletivos sindicais no contexto de reestruturações
permanentes da indústria europeia desde 1975. Parte-se do caso da indústria sidergica belga, onde
as fábricas passaram por repetidos planos de redução de mão-de-obra, mas onde a taxa de
sindicalização se manteve muito alta. A pesquisa combina pesquisa etnográfica em três bricas da
ArcellorMittal, entrevistas informativas e biográficas com trabalhadores, sindicalistas e gestores, assim
como arquivos da empresa e dos sindicatos. O artigo primeiro destaca as reações da direção sindical
para limitar os efeitos das reduções de pessoal e para contestar a implementação de uma gica
gestioria por parte dos especialistas. Em seguida, sublinha-se as transformações da morfologia do
grupo com a redução dos delegados sindicais, a ampliação de suas atividades de defesa individual e
coletiva dos trabalhadores e as reconfigurões das resistências organizadas na fábrica.
Palavras-chave: Reestruturão. Sindicalismo Trabalhadores. Conflitos. ArcellorMittal.
ABSTRACT
This article analyzes the practices and reactions of trade unions in the context of permanent restructuring
in the European industry since 1975. This article is based on the case of the Belgian steel industry where
plants have suffered repeated downsizing plans but where unionization rates remained very high. The
survey mixes ethnographic fieldwork in three plants, informative and biographical interviews with
workers, trade unionists and managers, as well as corporate and union archives. The article points at
first union leaders reactions from in order to limit the effects of downsizing and counter the managerial
logic developed by experts. It then highlights the changes in the group morphology of union
representatives in reduction, expanding their individual and collective activities in workers defense, and
reconfiguration of organized resistance in the plants.
Keywords: Restructuring. Unionism. Workers. Conflicts. ArcellorMittal.
1
Traduzido do francês por Rafael Fermino Beverari. Graduado (2010) e Mestre (2015) em Ciências Sociais pela Universidade Federal de
São Paulo. Doutorando (2018) no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
E-mail: rfbeverari@gmail.com
2
Diretor de pesquisa no CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique) - Centre de Recherches Sociologiques et Politiques de Paris
(CRESPPA-CSU). Email: cedric.lomba@csu.cnrs.fr
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INTRODUÇÃO
A indústria da União Europeia se caracteriza por um contexto de reestruturações
permanentes desde meados da década de 1970 (GAZIER e BRUGGEMAN, 2008). Os
setores industriais são particularmente afetados pelos cortes de emprego (siderurgia,
têxteis, estaleiros navais, etc.). Inúmeras fábricas foram fechadas e, as que estão em
funcionamento, passaram por vários planos sociais e mudanças organizacionais de
grande magnitude. Os efeitos destas reestruturões no sindicalismo se tornaram
objetos de debate nas Ciências Sociais. Alguns veem isso como uma das explicões
para o declínio do sindicalismo em muitos países europeus (LABBÉ e COURTOIS,
2001). O desaparecimento dos bastiões sindicais na metalurgia, por exemplo, a
sucessão de derrotas sindicais, a flexibilização do mercado de trabalho e a
desestabilização dos trabalhadores estáveis (CASTEL, 1997), o aumento do
individualismo dos trabalhadores colocados em concorrência ou a os temores das
repressões patronais são alguns dos argumentos que apontam neste sentido. Por outro
lado, as pesquisas indicam que a obrigatoriedade jurídica na Europa, desde acada
de 1990, de estabelecer dispositivos de informão dos representantes dos
trabalhadores durante os planos sociais, fortaleceu o diálogo e o reconhecimento das
organizações sindicais como atores legítimos em tempos de crise (DIDRY e JOBERT,
2010). Outras pesquisas destacam a diversidade de formas e conteúdos das reações
sindicais ante às reestruturões, às vezes dentro de um mesmo setor e de um mesmo
país, entre os colaboradores e as direções das empresas, o ativismo militante ou ainda
a "conformidade forçada" (KELLY, 2004; BACON e BLYTON, 2004). Essa diversidade
é explicada pelos contextos particulares de cada reestruturão e as escolhas
estratégicas do gerenciamento, mas também por causa das especificidades do
sindicalismo nas empresas afetadas, notadamente por seus vínculos com outras
estruturas (sindicatos nacionais ou regionais, partidos políticos, outros sindicatos), de
suas capacidades para mobilizar os trabalhadores, da intensidade da concorrência
sindical, de seus recursos materiais e imateriais, e até mesmo de suas ideologias
(FROST, 2000; PULIGNANO e STEWART, 2013). As pesquisas também
documentaram - por monografias - as formas de reações sindicais por negociações
(locais, nacionais ou internacionais), mobilizações coletivas (greves, ocupações,
manifestações, sequestros de dirigentes, mobilizões expandidas ao entorno da
empresa), uso de recursos jurídicos e intervenções midiáticas (BORY e POCHIC, 2014).
Estes trabalhos estudaram principalmente os períodos mais ou menos longos de reão
direta dos planos de reestruturação. Além disso, os trabalhos comparados tendem a
considerar os sindicatos, em cada local estudado, como estruturas homogêneas e
uniformes. Embora nos para importante preservar a ideia de analisar esses momentos
de cristalização das relações de forças, o viés deste artigo é acrescentar uma revisão
das práticas sindicais cotidianas (DUFOUR e HEGGE, 2002; SCOTT, 1985) no contexto
de sucessivas reestruturações. Trata-se, portanto, de considerar as reestruturões
como um processo de longa duração e não apenas como um momento de ruptura.
Neste sentido, somos capazes de compreender tanto as desestabilizações como as
aprendizagens do coletivo sindical da fábrica em interação com as estruturas de
dirigentes do sindicato da empresa, por vezes provenientes desta. É por isso que nos
apoiamos nos trabalhos de sociologia política e no envolvimento militante que ajudaram
a elucidar as práticas sindicais, os perfis dos militantes sindicalizados e os processos de
aquisições de competências específicas (SAWICKI e SIMÉANT, 2009; MISCHI, 2013).
Enquanto as pesquisas centradas sobre as negociações ou conflitos maiores se
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concentraram principalmente nos porta-vozes ou dirigentes sindicais, esta abordagem
abre a análise aos militantes de base (delegados sindicais de fábrica ou de escritórios) e
simpatizantes.
Para isso, contamos com pesquisas realizadas em fábricas siderúrgicas na Bélgica que
têm experimentado dezenas de planos de redução de empregados há quarenta anos,
mas onde a taxa de sindicalizão dos trabalhadores permanece muito alta. Em um
primeiro momento abordaremos as resistências das direções sindicais frente a estes
planos e a lógica de gestão especializada. Em seguida, alteraremos a escala de análise
para asbricas, um espo de aplicação das decisões tomadas em um nível superior
(da empresa ou do Grupo) em termos de gestão do emprego e organização do trabalho.
Trataremos, particularmente, das transformações da morfologia do grupo de delegados
sindicais, da expansão de suas atividades e resistências organizadas na fábrica.
UMA PESQUISA ETNOGRÁFICA E HISTÓRICA DOS TRABALHADORES NO CONTEXTO DE
SUCESSIVAS REESTRUTURAÇÕES
As fábricas siderúrgicas da empresa Cockerill na lgica passaram por 14 planos de
reestruturões desde a crise do aço na Europa, em 1975. De principal produtor
nacional, Cockerill se converteu, após a privatização, em uma subdivisão da filial
europeia da maior empresa siderúrgica do mundo (Arcelor em 1999 e depois
ArcelorMittal em 2006).
3
O número de empregados passou de aproximadamente 25.000
em 1975 (uma vintena de fábricas) para 11.000 em 1995 (11 fábricas) e menos de 1.000
em 2015 (5 fábricas). As reestruturações têm significado reduções massivas e contínuas
de empregados desde 1976 por diferentes modalidades de aposentadoria antecipada a
partir dos 50 anos
4
de idade, dos fechamentos definitivos ou temporários de fábricas,
amplo recurso a trabalho temporário, subcontratação nos anos 2000 e das sucessivas
transformações na organizão e técnicas do trabalho para redução dos custos de
prodão.
O coletivo atual de trabalhadores é composto exclusivamente por homens belgas e
italianos, a maioria formada em ensino secundário técnico ou profissional. Eles foram
contratados depois de períodos mais ou menos longos como empregados precarizados
na empresa e terem experimentados uma ou mais realocações nas fábricas da Cockerill.
Ao contrário de outros universos industriais, eles executam tarefas complexas de
regulação ou manutenção de processos automáticos em equipes de 3X8 e se
beneficiam de altos salários (da ordem de 2.000 euros líquidos). Para Cockerill, apesar
das reestruturações, a taxa de sindicalização dos trabalhadores sempre excede os 95%,
em um país com elevada taxa de sindicalização (FANIEL e VANDAELE, 2012). A
adesão sindical oferece benefícios materiais (especialmente a aceleração dos
pagamentos das prestações complementares de desemprego), mas são
frequentemente acompanhadas por uma forte convicção na ação coletiva. As
delegações sindicais de trabalhadores em Cockerill - a Federação Geral do Trabalho da
Bélgica (FGTB), social-democrata, e a Confederação Cristã (CSC), democrata-cristã -
3
Conservamos o nome de "Cockerill" para designar as fábricas belgas (região de Liége) de ArcellorMittal.
4
No regime de aposentadoria antecipada, os trabalhadores recebem um benefício de desemprego até a
sua aposentadoria e a empresa adiciona metade da diferença entre esse benefício e seu antigo salário. Esta
modalidade de aposentadoria não é obrigatória, mas a maioria a aceita por vários motivos (desgaste no
trabalho, cansaço das reestruturações, projetos familiares, pressão do coletivo ou da hierarquia, etc.).
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constituem, desde os anos 1930, uma das figuras de referência do sindicalismo belga
combativo.
Realizamos uma pesquisa durante dois planos de reestruturação nas fábricas Cockerill
(1996-2000 e 2011-2013). O primeiro, após o anúncio de uma redução de 20% da mão-
de-obra, se apoiava em uma observação in situ não-participante em três fábricas (um
alto-forno, um laminador e uma de revestimento de aço), integrando as equipes de
trabalhadores em regime de 3X8 durante 10 meses (LOMBA, 2005). Esta pesquisa foi
complementada por fontes de informações orais junto dos trabalhadores, gestores e
sindicalistas e pelos arquivos empresariais, sindicais e municipais. Após a revisitação
(BURAWOY, 2003) de 2011 a 2013, com as fábricas paralisadas, realizamos cerca de
trinta entrevistas biográficas com os trabalhadores e uma dezena com representantes
permanentes e delegados sindicais, bem como entrevistas informativas com
empregados e gestores. Finalmente, analisamos as fontes escritas da empresa e
sobretudo os arquivos sindicais sobre as negociações desde a década de 1980
(negociações dos planos de reestruturações, classificações, formações, discussões
sobre os acidentes de trabalho, reuniões paritárias, etc.) e na vida corriqueira das fábricas
(cartões individuais de carreiras ou de membros dos sindicatos, cartas e e-mails de
delegados sindicais aos diretores das fábricas, cadernos sindicais, informe das reuniões
nas fábricas, etc.).
CONTESTAÇÕES FRENTE ÀS REESTRUTURAÇÕES E CONTRAPOSIÇÕES SINDICAIS
Desde meados da década de 1970, a administração de Cockerill tem multiplicado os
planos de reestruturação. Estes planos são acompanhados pelo desenvolvimento da
especializão em gestão organizacional (DIDRY e JOBERT, 2010) que estabelece
uma interpretação oficial do passado e torna os projetos consistentes. Esta
especializão é fornecida por consultores externos e graduados nos cursos de
corcio ou administração que substituem os engenheiros em posições de direção da
Cockerill (LOMBA, 2013). Esta experiência leva a uma operação e pensamento voltados
para planos, neste caso planos de reestruturação que sempre resultam em reduções de
mão-de-obra e, às vezes, fechamento das fábricas. O sistema, que pode ser estendido
para a prática dos administradores no século XX (COHEN, 2011), organiza o ritmo da
empresa, une diferentes dimensões da organização (investimentos, fechamentos de
fábricas, organização do trabalho, preço de custo, volume de emprego, organização
financeira, etc.) e determina. Deste ponto de vista, no sentido de mobilizar a racionalidade
gerencial, ele tecnifica a justificativa das estratégias utilizadas e deslegitima as decisões
baseadas nas relões de força. Isto pode ser observado especialmente no uso
sistemático de benchmarking, que consiste em estabelecer objetivos quantificados para
ação e comparação das bricas entre si (BRUNO, 2013): nos anos 2000, as fábricas
europeias da ArcelorMittal são sistematicamente comparadas, desconsiderando as
especificidades locais, nos seus desempenhos econômicos e suas performances
particulares (taxa de avaria, acidentes, greves, índice de qualidade, etc.) para justificar
sua manutenção ou encerramento.
Perante estes argumentos e planos de reestruturação, os dirigentes sindicais esforçam-
se para manter os registros habituais de mobilização e construir alternativas industriais
reconhecidas como legítimas. A central dos trabalhadores metalúrgicos da FGTB,
majoritária, tem a peculiaridade de ter desenvolvido desde a década de 1950 uma
doutrina especificamente trabalhista e regionalista (FRANCQ e LAPEYRONNIE, 1990).
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Isso se traduz mais nas reivindicações do controle operário do que na co-gestão: uma
valorização do ponto de vista da base de trabalhadores, a mobilização e o conflito como
um instrumento de pressão e a defesa do desenvolvimento da região. Desde a década
de 1960, todos os dirigentes sindicais se apresentam como trabalhadores na brica,
frequentemente em Cockerill, antes de subir às escalas da hierarquia sindical. Não há,
neste caso, intervenções dos intelectuais ou militantes universitários encarregados de
renovar a coordenação sindical, como se pode observar em outros sindicatos
(GUILLAUME e POCHIC, 2014). Eles reivindicam autonomia frente aos especialistas
externos, mas estabelecem relações com a pequena burguesia intelectual, nas
estruturas de formação e estudos para militantes sindicalizados. Este é o caso da
Fondation André Renard (FAR), da central dos metalúrgicos FGTB, que agrupa os
universitários das Ciências Sociais com os sindicalistas, em sua maioria provenientes da
siderurgia.
Face à lógica dos planos de reestruturação, vários repertórios de ação coletiva (TILLY,
1986) foram utilizados, sucessiva ou simultaneamente, pelos sindicatos: as longas
greves do início dos anos de 1980 (mais de seis semanas seguidas, por exemplo, em
1982)
5
e as mais curtas (alguns dias, às vezes com sequestro de diretores) que
acompanhavam sistematicamente as negociações sobre os planos de aposentadoria
antecipada; as manifestações violentas ou midiáticas; as extenes da luta (cocios de
apoios que reuniram milhares de pessoas em 1982, 2003 e 2011, etc.); ou inclusive os
contatos formais ou informais com políticos de níveis locais ou nacionais (sobretudo
quando a empresa estava sob estatuto público nos anos de 1980 e 90).
No entanto, estes conflitos que mobilizam um grande número de trabalhadores quase
nunca conseguem reduzir a perda de emprego, mas oferecem condições satisfatórias
para os trabalhadores com mais de 50 anos de idade e compensações salariais para os
que permanecem. Desde os anos 2000, a duração das sequências de informão das
negociações dos planos aos representantes dos trabalhadores, que pode se propagar
por vários meses, esgota de facto as mobilizações coletivas (BAURAIND e
VANDEWATTYNE, 2014).
Sem entrar em detalhes, podemos observar as mudaas nos registros de intervenções
sindicais contra os últimos planos de reestruturação desde a privatização de 1999.
Nestas ocasiões, as propostas alternativas são apresentadas pelos "intelectuais da
instituição" (SAPIRO, 2009) da FAR, que se apoiam em novos recursos: particularmente
nos documentos fornecidos ao conselho de empresa e os relatórios de consultores
especializados no assessoramento aos representantes dos membros eleitos no
conselho de empresa europeu. Desde 1994 a União Europeia obriga as multinacionais
a informar aos representantes dos assalariados sobre os planos sociais e, neste
contexto, alguns sindicalistas, especialmente franceses e alemães, recorrem a
especialistas (consultores especializados na defesa dos trabalhadores) para ajudá-los a
analisar as informações fornecidas pela direção da empresa e a propor planos
alternativos.
6
Paula Cristofalo (2009) demostrou que, embora estes consultores estejam
próximos das organizações sindicais, os especialistas que eles mobilizam são
estudantes de universidades e se apresentam como "interventores" e não como
5
Este tipo de mobilização tamm aconteceu em outras empresas sidergicas da Europa na mesma época
(Meny e Wright, 1987).
6
Informe Syndex, Reorganização das plantas de carbono em Europa (com projeto de fechamento de Liége),
fevereiro de 2012, Miso para o Conselho de Empresa Europeu.
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"militantes". Embora utilizem os mesmos métodos de argumentação e longas
apresentações que os consultores que trabalham para a gerência, no entanto,
destacam-se ao valorizarem o saber-fazer dos trabalhadores ao compararem a Cockerill
com os pequenos produtores europeus independentes e não com as multinacionais
concorrentes da ArcelorMittal.
Mas, o conhecimento assim produzido não modifica radicalmente as percepções
sindicais e suas tradões em reivindicações. Seus planos alternativos são sempre
apresentados em uma forma curta, mais de um programa do que de um argumento,
mais da oralidade do que a escrita.
7
A nível tetico, eles criticam os efeitos indiretos
dos fechamentos (para subcontratados e fornecedores), a gestão de curto prazo do
capitalismo financeiro e o papel dos gestores internacionais, ao mesmo tempo em que
valorizam a habilidade técnica dos trabalhadores locais e engenheiros e insistem na
necessidade de investimentos para melhoramento das máquinas. Além disso, integram
o registro clássico do equilíbrio de forças ao tornar pública suas reivindicações e solicitar
a intervenção das autoridades públicas para pressionar a ArcelorMittal. Ainda, confiando
na legitimidade dos especialistas internacionais para justificar a viabilidade econômica de
Cockerill fora da ArcelorMittal, estes funcionários sindicais colocam as suas
reivindicações no quadro do regionalismo, em vez de procurarem, por exemplo, elaborar
respostas comuns com as organizões sindicais de outras fábricas da multinacional.
Na ArcelorMittal, como na maioria das multinacionais europeias, o conselho de empresa
europeu tem pouco poder e as organizações sindicais de diferentes países não chegam
a um acordo sobre reivindicações ou mobilizações comuns de grande escala devido à
competição entre as fábricas, as condições salariais e o enquadramento sindical muito
diferente de um país para outro, ou ainda os problemas linguísticos entre os
representantes sindicais. Ao final, nos últimos anos, os dirigentes sindicais mobilizaram
parte do conhecimento especializado tanto dentro como fora das organizações e estão
presos numa tensão entre a defesa das conquistas do grupo de trabalhadores e as
preocupões específicas da organização militante que vão além da fábrica. Deste ponto
de vista, assistimos a um processo de expansão dos repertórios de ação coletiva das
direções sindicais de Cockerill, que mantêm as mobilizões coletivas, mas que são
forçadas a se inscreverem-se na agenda dos sucessivos planos e a desenvolver contra-
argumentos mediante a combinação dos apontamentos econômicos sobre a viabilidade
das fábricas e os registros dos militantes sobre a sobrevivência do grupo de trabalho.
REJUVENESCIMENTO DO COLETIVO SINDICAL E A REDUÇÃO DE MEIOS DE
INTERVENÇÃO
Cockerill é um bastião sindical. Além dos dirigentes sindicais (delegados sindicais
provenientes das fábricas que compõem o escritório da direção sindical e representantes
da Federação regional de metalúrgicos), cada fábrica preserva um ou mais delegados
permanentes remunerados por empresa.
8
Alguns, às vezes os mesmos, são eleitos para
os órgãos consultivos de Cockerill (o Conselho de Empresa e o Comitê de Prevenção e
Proteção no Trabalho). Até o final dos anos de 1990, as delegações sindicais se
7
CSC-FGTB, "Siderurgia: propostas sindicais alternativas ao fechamento", 25/06/2012, 36p.; ou entrevista
de vídeo de José Verdin "Siderurgia: propostas sindicais alternativas ao fechamento", 10/09/2012, 47
minutos.
8
Eles são eleitos pelos aderentes da FGTB e nomeados pelo sindicato à CSC.
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beneficiavam de uma relativa autonomia de organização, contornando prerrogativas
legais, no que contrasta com as de outras empresas que enfrentavam a repressão
patronal (PENISSAT, 2013). Alguns documentos da direção de Cockerill mostram as
tentativas fracassadas de um controle mais rigoroso sobre as horas e comportamentos
dos delegados.
9
Neste momento, em Cockerill, a relação de forças jogava a favor dos
sindicatos (FGTB era representada por 140 delegados de fábrica), mas também de uma
estratégia tácita da direção que esperava neutralizar os protestos locais, especialmente
as greves qualificadas como "selvagens", iniciadas pelos trabalhadores.
10
Logo se
manifesta um desejo da direção em reduzir os numerosos conflitos locais na fábrica
(mais de uma centena por ano) no contexto de uma queda brutal da demanda por aço e
de "domesticar" os delegados e "sua base" que a dirão apresenta como incontroláveis
pelos seus quadros e lideranças sindicais. Pode-se pensar, e as entrevistas realizadas
com gestores e antigos diretores apontam nesse sentido, que as sucessivas gestões
tendem a recuperar a organização da vida na fábrica e relegar os delegados de base
vistos como militantes políticos de extrema esquerda e/ou como pessoas incapazes de
compreender a necessidade de mudaas diante dos desafios econômicos. Isso é
particularmente verdadeiro desde a privatização, quando a direção internacional aplica
rigorosamente o contingente de horas da delegação que diminuem notadamente o
número de trabalhadores: dos 64 mandatos de trabalhadores do FGTB em 2000,
restaram 11 em 2013. Essas reduções não ocorreram sem causar divergências entre os
delegados, que não desejam deixar suas funções e retornar aos seus cargos, e entre
estes e a dirão sindical.
No início dos anos 2000, o presidente da delegação da FGTB incentiva um comi
sindical no qual ele exige a retirada de um delegado de uma fábrica para transferi-lo para
outra fábrica de Cockerill. Um delegado respondeu: "Não apoiarei uma estrutura imposta
a mim. Não lutarei por 4 anos em uma equipe que não é minha". Outro respondeu:
"Como você pode querer formar uma equipe onde há pessoas que jogaram contra outras
nas eleições?".
11
Nota-se, por este exemplo, os conflitos internos causados pela relativa escassez de
lugares. É relativo na medida em que, em comparação com outros setores ou países,
como França e Grã-Bretanha, o número de delegados permanentes permanece elevado
e possibilita assegurar uma presença tanto nas instâncias representativas como nas
fábricas.
Esses delegados são também parcialmente renovados. A geração dos delegados mais
antigos, do final dos anos 90, é uma pequena parte do aparato sindical da Federação
dos Metalúrgicos, sendo a maioria aposentada antecipadamente. Depois de 2000,
portanto, a delegação sindical tende a se rejuvenescer (cerca dos 40 anos de idade),
com poucos idosos nas estruturas sindicais, enquanto antes, na progressão para o
estatuto de delegado permanente, era necessário anos de militância sindical. No entanto,
os delegados ainda provenientes do grupo dos trabalhadores continuam a compartilhar
as características comuns com as gerações mais antigas. Mas, segundo eles, esta é
9
"Informe da reunião do Departamento Pessoal", Direction du Personnel de Cockerill, arquivos Léopold Dor,
05/10/1971.
10
"Informe da reunião do Departamento Pessoal", Direction du Personnel de Cockerill, arquivos Léopold
Dor, 08/06/1976.
11
"Comitê Sindical FBTB de Cockerill", notas manuscritas, arquivos sindicais de Cockerill, início dos anos
2000.
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uma geração menos consciente das queses, mas também mais aunoma em relação
à Federão e menos respeitosa quanto às cerimônias de negociação (HENRI, 2009).
A formação sindical sempre acompanha a trajetória militante, mas o enquadramento
institucional dos estilos militantes se afrouxa assim que, por um lado, a matriz intelectual
defendida pela direção sindical perde parte do seu crédito de mobilização (especialmente
na região), e, por outro lado, a direção sindical da empresa é muito instável (em particular,
seis presidentes da delegação de FGTB desde o início dos anos 2000).
Na maior parte das vezes, os delegados sindicais se apresentam como testas de ferro e
ranzinzas que se atrevem a contestar a hierarquia direta. Eles têm sido frequentemente
trabalhadores "com aspirões profissionais em vez de acadêmicas" (MISCHI, 2013),
que leem as relações sociais como relações de classe e se permitem ser criticados
publicamente. Eles aprendem a dominar o ethos do trabalhador masculino por meio da
comunicação oral e dos conflitos diretos com os gestores e diretores. Para os novos
delegados, no contexto de enfraquecimento do aparelho sindical, de revolta das
organizações trabalhistas e de reduções muito significativa de mão-de-obra, o
compromisso sindical não está isento de riscos em suas próprias carreiras. É certo que
o mandato oferece proteção em caso de demissão coletiva e fornece compensações
concreta e simbólica aos porta-vozes que se reúnem regularmente com outros grupos
sociais, fazem exigências, encontram soluções e deixam o local de trabalho e das
equipes em horários alternados (GAXIE, 1977).
Mas o mandato também pode ser demorado e tenso - arriscado se as eleições para a
reeleição não forem bem-sucedidas no contexto de uma diminuição do número de
delegados. É necessário então "reconverter-se" em trabalhador, encontrar um lugar na
equipe que foi modificada e, às vezes, encontrar uma reclassificação em outra fábrica
Cockerill com uma reputão de trabalhador sindicalista. Isso explica por que eles estão
entre os mais vingativos que ainda se comprometem com a delegação, especialmente
aqueles que sofreram atrasos em suas carreiras em razão, segundo eles, das críticas
que carregam. A longa socialização para a militância dos trabalhadores antigos contrasta
com o acesso mais rápido da gerão mais jovem de delegados dos anos 2000, mesmo
que o processo de engajamento permana coletivo (DIANI e MC ADAM, 2003). Alguns
são identificados pelos delegados para renovar a equipe sindical. Outros são levados à
arena sindical pelos colegas contra os delegados que eles julgam muito ausente das
preocupões da fábrica ou que defendem posições que o são suficientemente
críticas. É o caso, por exemplo, de um delegado de trinta anos de alto-forno, sem
passado militante, levado a concorrer às eleições sindicais: "Depois de tudo que critiquei
o meu delegado, os outros me disseram: "Vá em frente." E eu disse para mim mesmo,
vou tentar ir além do meu antecessor" (entrevista com um delegado sindical nos anos
2000, 2011). Nestes casos, "a adesão a uma organização sindical consagra sua
ocupação de porta-voz, ao invés de despertá-la" (COLLOVALD e MATHIEU, 2009). De
maneira mais geral, o envolvimento sindical só pode ser entendido como um processo
coletivo, reunindo um trabalhador que não é somente crítico, mas que critica
publicamente (em frente aos gestores ou representantes sindicais) e um pequeno
coletivo que realiza e apoia esse engajamento pessoal.
A AMPLIAÇÃO DO ARCO DE TRABALHO DOS SINDICALISTAS
A importância das atividades sindicais em Cockerill está relacionada tanto com a fixão
das delegações nas fábricas como às reestruturações. Não se trata aqui de discernir
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radicalmente o papel desempenhado pelos dois fenômenos, mas de assinalar a escala
das atividades sindicais e pontuar particularmente aquelas ligadas às sucessivas
mudaas na organização do trabalho. Em Cockerill se observa um fenômeno notável,
o da ampliação das tarefas assumidas por cada delegado. Decorre mecanicamente do
fato de que se o mero de delegados seguir a curva dos empregados, as tarefas podem
não variar. Eles também são obrigados a se tornarem delegados de "dupla função"
(delegados e representantes eleitos nas instâncias paritárias). Da mesma forma, e isso
é importante, a natureza das atividades é modificada pelas mudanças organizacionais,
das alterações na carreira, do clima de incerteza que os trabalhadores enfrentam e da
fragmentação do estatuto laboral nas reestruturações.
A polivalência dos delegados sindicais
O tempo dos delegados sindicais é dividido entre fábrica, visitas, sede do sindicato,
reuniões, ações e formões. No entanto, o se pode considerar, como alguns autores
afirmam, que a atividade sindical foi completamente burocratizada nos últimos anos,
longe do mundo da fábrica (ANDOLFATTO e LABBÉ, 2007). A atividade sindical, e isto
não é exclusivo de Cockerill, envolve um compromisso e uma experiência em ltiplos
temas de naturezas muito variadas. A leitura dos e-mails ou cartas enviadas pelos
delegados para a direção da fábrica estabelece a grande variedade de questões em que
eles estão envolvidos em paralelo. Se a maioria dos trabalhos em Ciências Sociais se
concentra principalmente nas atividades mais letimas, a preparão dos dossiês, a
negociação e a mobilização (RIMBERT e CRESPO, 2004), não representam mais do
que uma parte de suas intervenções. Em particular, eles precisam estar envolvidos no
apoio individual e em demandas mais coletivas.
Em termos de apoio individual, trata-se de um discurso consensual dos delegados mais
antigos, ouvido em entrevistas (PIALOUX, 1991), que desdobra a função do sindicalista
na rejeitada figura de "assistente social", ofício feminino de care. É certo, e isto não é
novidade, que os delegados dedicam parte de seu tempo em apoio individual. Às vezes
o fazem para resolver os problemas que conhecem dos trabalhadores em uma situação
de anstia social (alcoolismo, endividamento, depressão, problemas familiares, etc.).
Além disso, também participam dos conflitos interpessoais que enfrentam os
trabalhadores com seu supervisor:
Estou escrevendo para lembrar que o Sr. Petit precisa deixar o serviço liderado pelos Srs.
Palm e Meurice e isso antes que ocorra um problema grave! Para registro, o Sr. Petit trabalha
em condições tensas e estressantes ao máximo. Penso que podemos até mesmo falar de
assédio moral de seus superiores hierárquicos, para ser mais preciso
12
O exemplo corresponde a rias correspondências que relatam novos elementos e
ameaças de processos perante o Tribunal do Trabalho. Assim, os delegados também
intervêm no âmbito das acusações apresentadas pelos superiores sobre o
comportamento de um trabalhador. Isto às vezes é delicado, na medida em que a defesa
dos "indefensáveis", que são vistos como preguiçosos, falsos doentes ou até como
ladrões, é um motivo argumentado por alguns trabalhadores para se recusarem a
comparecer nas eleições sindicais. Tanto que o número de dias perdidos devido a
doenças não relacionadas ao trabalho e os atrasos tendem a aumentar após cada
12
"Carta manuscrita de um delegado a um diretor da fábrica", anos 2000, arquivos sindicais de Cockerill.
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anúncio de um plano social. Os delegados também podem apoiar a candidatura para
um trabalho de verão do filho de um trabalhador ou ajudá-los a preencher os formulários
fiscais (uma operação que se tornou mais complexo nas reestruturações com a
multiplicão dos dias de desemprego parcial).
13
Finalmente, eles também monitoram o
direito de formação de seus sindicalizados, a mudança de coeficientes e as
reclassificações. Esta atividade se tornou muito importante na década de 2000 em um
contexto de grande incerteza. Quando as fábricas são desativadas, às vezes por vários
meses, alguns trabalhadores praticamente não recebem quase nenhuma informação do
departamento de recursos humanos. Os delegados são então solicitados, muito
frequentemente por telefone ou nas instalações, por aqueles que estão preocupados
com o andamento de seu caso ou para aqueles que pedem conselhos sobre vagas
disponíveis em outras fábricas de Cockerill. Isto ocorre no caso do fechamento de uma
fábrica, mas também devido ao resultado das reorganizações, como no exemplo de um
delegado que alertou a direção da fábrica várias vezes nos anos 2000 para o caso de
um trabalhador que estava retornando mais de um ano após uma doença que o
afastou por dois anos. Seu antigo serviço foi dissolvido e seus colegas foram enviados
para outros.
Já faz mais de 13 meses que estamos tentando reclassificar este senhor e todo esse
contexto não favorece em nada. Vejo que uma certa tensão se instala tanto em sua nova
brigada como ao nível da hierarquia local. A fim de evitar um conflito entre estes três atores,
pergunto-lhe, por um lado, se vale a pena uma requalificação das competências; por outro,
que retire o Sr. X de seu atual ambiente de trabalho que o é nada gratificante.
Em seguida, ele envia mensagens para a direção de recursos humanos de outras
fábricas e, na ausência de uma resposta positiva, mobiliza suas redes de delegados para
encontrar-lhe uma nova alocação.
Além disso, em outra situação, observo numerosos trabalhadores na sala do sindicato
dentro de uma fábrica, em 2011, para obter informações sobre o fechamento temporário,
remunerão, renovação de contrato para os empregos de curta duração, etc. Muitas
dessas questões ocupam grande parte da jornada do delegado que às vezes se diz estar
sobrecarregado pelas regulamentações e forçados a aprender sobre situões muito
diferentes, especialmente em mudanças de pessoal nos serviços de recursos humanos
- ele próprio absorvido nas reestruturações - que não simplificam as coisas em termos
de conhecimento dos arquivos e manutenção das redes interpessoais.
A atividade dos delegados também atinge a defesa dos interesses coletivos. Sua
principal tarefa é defender com muita exatidão a manutenção de cada posto de trabalho,
ou mais exatamente, negociar a aplicação do plano geral de redução deo-de-obra,
monitorar as transformações técnicas e organizacionais a fim de obter compensações
salariais e planos de formação (conforme comprovam as múltiplas anotações de
sindicalistas sobre propostas de mudanças na organização do trabalho), definir os
critérios de transferências, assegurar as boas condições de trabalho, particularmente no
que diz respeito ao horários de trabalho e monitorar o acúmulo de dias de recuperação.
Isto requer um bom conhecimento do terreno sobre o plano técnico e social (COROUGE
e PIALOUX, 2011). Para entender melhor estes compromissos para o coletivo, tomamos
o caso da tecnicização contínua dos postos obtida pelos gestores, essencialmente os
13
O subsídio de trabalho parcial é pago aos operios cuja fábrica está temporariamente fechada por baixa
demanda.
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engenheiros, a fim de reduzir o número de trabalhadores. Diante disso, os delegados
sindicais se veem em uma situão desconfortável. Não notei nenhuma disposição da
parte deles, nem da parte dos trabalhadores, de atacar diretamente os procedimentos
técnicos. Pelo contrário, os anúncios de investimento são percebidos como promessas
de longevidade da fábrica (BACON, BLYTON e MORRIS, 1996). Por outro lado, no
espírito do "compromisso fordista", os delegados pagam o pro do aumento da
produtividade (TRENTIN, 2013). Cada mudança (automação parcial, integração de uma
tela tátil na cabine de pilotagem, etc.) é uma oportunidade de pedir, e muitas vezes obter,
um aumento salarial para os trabalhadores que teriam que monitorar as novas
instalações, como pode ser lido nesta mensagem enviada pelos delegados da
siderúrgica à direção (04/2003): "Informamos que a partir deste dia nossos menicos e
eletricistas no intervalo e no trabalho não estarão mais envolvidos em novos
investimentos (coberturas automáticas, pórticos, medição automática de temperatura na
WM e nos chifres, ...) até que haja novas negociações paritárias". Acrescentam ainda
que as formações previstas estão condicionadas por "uma revalorização salarial".
A tenncia é, portanto, a troca de uma redução de empregados por melhores condições
salariais para os trabalhadores qualificados que permanecem em seus postos. Se a
análise das intervenções individuais e coletivas dos delegados fosse dividida, na verdade
a cisão não seria muito evidente. Nicolas Hatzfeld (2006) aponta, em relação à
segurança do trabalho, que ela é uma alavanca que entrela a defesa individual dos
assalariados e o questionamento dos modos de organizão. Os eventos que podem
parecer secundários ou superar um caso individual são uma oportunidade para os
delegados criticarem os fenômenos mais gerais nas instâncias paritárias: uma queda
devido a um vazamento de óleo viria da falta de manuteão das instalações, o que
também comprometeria a salvaguarda da máquina; um esmagamento seria causado
por pilhas de materiais desarrumados porque não há mais trabalhadores designados
para estas tarefas e as equipes estão competindo por produtividade; assim como um
pequeno corte em um dedo viria da redão do tempo de treinamento dos trabalhadores
polivalentes, etc.
A extensão do domínio de representação
Se a redução de militantes sindicais é um fator importante nas transformões da
atividade dos delegados, também o é a de seus apoiadores. Os delegados se esforçam
para aumentar o número de afiliados de modo a ter mais influência local contra o
sindicato concorrente. Os trabalhadores mudam pouco ao longo de suas carreiras, mas
as transferências de filiação não são incomuns, como mostram as listas conservadas
pelos delegados. De acordo com as entrevistas, estas mudanças organizacionais estão
relacionadas às críticas da estratégia geral do sindicato na fábrica, ou mais
frequentemente ao que é visto como falta de empenho por parte do delegado ou falta de
apoio pessoal na alocão de cargos ou liceas. Para os delegados, é também um
meio para se afirmarem à sua própria organização, especialmente para aqueles que
estão fora das posições da direção sindical. Um exemplo ocorreu quando depois de ter
elaborado uma lista com nomes dos membros de sua fábrica, um delegado muito crítico
escreveu à direção sindical do FGTB da empresa: "Conto com sua graça pelo apoio para
silenciar os maus rumores, aliás, doentios, que circulam na (minha brica) que os
delegados da FGTB estão perdendo seus apoiadores" (e-mail, 2006).
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O apoio individual fortalece a relação de dependência sindical. Isso também requer
atenção diária no coletivo, bem como nos comitês paritários (sindicatos e gestores) que
se ocupam da manutenção dos vestiários (número de duchas, armários, limpeza, etc.) e
são monitorados com maior cuidado. Apesar desses assuntos não ocuparem a maior
parte de suas atividades, não são questões negligenciadas em favor de intervenções
que possam parecer mais legítimas ou intelectuais.
De modo mais surpreendente, os novos delegados têm conseguido expandir o perímetro
de sindicalização para além dos trabalhadores de Cockerill. À medida que se estendem
os recursos aos trabalhadores subcontratados e temporários, os delegados ampliam
seus mandatos por um sistema quase de closed shop em meados da década de 1990
(organização do trabalho onde a afiliação sindical é uma condição para a contratação).
Diante de um novo plano para diminuição de custos, os sindicatos aceitaram o uso de
trabalhadores temporários sob duas condições: o credenciamento pelos sindicatos de
agências temporárias, comprometendo-se a respeitar os direitos sociais e o respeito à
distribuição sindical entre o FGTB e o CSC. Ao contrário disso, o que se pode observar
em contextos em que o sindicalismo é menos estruturado (WAGNER, 2009) é um
momento - que desaparece progressivamente com a aquisição pela Mittal - de quase
co-gestão, onde a flexibilidade é aceita em troca de sua estrutura sindical.
O controle dos subcontratados e dos temporários também se efetua na organização. Os
delegados podem assistir às "aberturas de obras", após cada intervenção de uma
empresa externa, para especificar, num relatório oficial, as condições de intervenção e
de seguraa (tais como procedimentos de bloqueio elétrico, uso de protões
individuais e marcão do local). Isto lhes assegura um bom conhecimento in situ da
fábrica e a capacidade de conter o uso de subcontratação. Os delegados intervêm
regularmente sobre as condições de trabalho dos temporários para denunciar, por
exemplo, o fato de estarem "submetidos a um regime de trabalho incomuns, isto é, a
maioria deles trabalha de 20 a 30 dias por mês com somente um dia de descanso por
ciclo" (6/2002) e para aliviar os problemas de segurança. No caso de Cockerill, os
sindicatos estão tentando integrar os trabalhadores para além dos "estáveis", levando-
os a acompanhar as carreiras destes e seus ambientes de trabalho.
AS RECONFIGURAÇÕES DA CONFLITUOSIDADE EM ARCELORMITTAL
Apesar das sucessivas reestruturações, o sindicalismo de fábrica o perdeu seu poder
de reivindicação. O número de paralisações (fora das mobilizações gerais na empresa)
permanece importante ao longo do período e significativamente mais elevado do que
nas outras fábricas da multinacional. A cada ano, mais de cem greves mobilizam uma
oficina, uma equipe ou uma fábrica. Elas podem ser iniciadas pelo delegado ou pelos
trabalhadores que param de trabalhar e, em seguida, chamam o seu delegado. Mesmo
a nova geração, que está passando por condições difíceis, consegue manter as relações
de força.
As trocas de cartas e e-mails entre um delegado e a administração local nos anos 2000
mostram um registro de escrita direta, sem nenhuma deferência particular, ao utilizar
ameaças. Isto pode ser notado, por exemplo, em relação aos acidentes de trabalho,
como a queda de um maquinista de locomotiva após o descarrilamento de um vagão:
Se necessário que a inspeção do trabalho chegue ao local para que você realmente aceite
o assunto? [...] Senhor, é tempo mais que suficiente para que responda sobre o assunto,
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pois os trabalhadores esperam de você um gesto forte, caso contrio, espere resistência de
nossa parte! (08/2002)
Em outras ocasiões, particularmente nas interações verbais, as relações são menos
ameaçadoras, mas os delegados se colocam com firmeza frente à administração, como
por exemplo quando Jean-Claude liga para um jovem engenheiro-chefe de serviços
encarregado da equipe de segurança as uma semana de fechamento da fábrica.
Sim, olá, como está? Me disseram que você teve problemas com o carro. [...] é uma BMW
que você tem, tem que andar em um francês. Como gerente de serviço em Arcelor é em
frans que precisa andar [risos]. Eu te liguei porque passei pela oficina e me parece que,
em vista do trabalho, os serviços previstos são leves. [...] Suspeito que sejam as instruções
que você tem, mas eu disse aos rapazes que eles estão para trabalhar, mas não para
correr. Se o trabalho não estiver pronto para o reinício, eu realmente não me importo. Eu sei
que você não pede para correrem, Damien, mas quando vai encontrá-los, você diz a eles
que existem 5 prioridades e 52 urgências. A pressão está colocada. Mas quando uma
grande parte da equipe é deixada em casa, não precisa ter pressão. [...] Mas você vai notar
que eu não coloco muita pressão nos seus ombros, eu faço isso com calma. De qualquer
forma, passarei aqui na segunda-feira para cumprimentá-lo e tomar um café com você
[risos]. Tenha um bom fim de semana, tchau." [Depois de desligar, acrescentou:] "Este é um
engenheiro que sabe que há trabalho na oficina, mas foi informado para colocar apenas três
homens. Não posso estar em conflito, tenho que deixar uma porta de saída (Observação,
11/2011).
A gestão das emões (BEAUJOLIN-BELLET e GRIMA, 2011) é necessária para
assegurar a continuidade das relações com o enquadramento hierárquico. É também na
sua capacidade de negociar discretamente, fora dos procedimentos oficiais, que este
poder sindical se afirma no cotidiano. Como Pierre Bourdieu (1984) assinalou, existem
discrepâncias no próprio ato de delegação, que neste caso resultam em acusações
regulares dos trabalhadores com relação aos delegados que eles podem considerar
muito distante do mundo da fábrica, especialmente no trabalho em 3X8, muito
preocupados com suas próprias situações salariais ou parcialmente responsáveis pelas
reestruturões porque foram muito ou pouco exigentes. Por outro lado, os delegados
se queixam da falta de participação nas ações, principalmente quando os fechamentos
são anunciados. Mas não se observa uma desconexão evidente entre os delegados e
os trabalhadores. Pelo contrário, são modos distintos de engajamento encontrados nas
delegações de fábrica, com tradições mais ou menos combativas e de orientações de
luta. Dois delegados sindicais permanentes dos anos 2000, majoritários em suas
fábricas, reunidos no mesmo escritório sindical, e ambos ingressos do ensino médio
técnico, ilustram parcialmente esta diversidade.
Jean-Claude vem de um universo fora da indústria siderúrgica (seu pai é bombeiro e sua
mãe faxineira). Se apresenta como aficionado a leitura, "pedras velhas" (edifícios
históricos), contestador (na escola, no exército e na fábrica) e de cultura operária
(condenando a "burguesia boêmia" e os "cultos"). Contratado nos anos 1980 em
Cockerill como operário de produção, passou por várias paralisações e fortes conflitos
(ameaças de demissões) com as direções e sua hierarquia sindical. Ansioso por
conhecimento, frequentou aulas noturnas em soldagem e inglês, para compreender a
música anglo-saxônica que aprecia. Ele foi liderança local do Partido Socialista, antes de
se juntar há alguns anos a um partido de extrema esquerda. Divorciado de uma
assistente social e muito engajado em sua luta sindical, de risada alta, intransigente frente
à direção, conseguiu se impor à delegação local se aproximando de um grupo de
trabalhadores combativos. Ele aprecia o trabalho de combate militante, se oferecendo
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sem contar suas horas (sempre disponível, não importa quando) a informações diárias
aos trabalhadores, mas se queixa da atitude muito limitada de sua dirão sindical para
resolver problemas de pagamento.
Dimitri, 30 anos, filho de um delegado sindical siderúrgico, casado com uma professora
de Educação Física, conheceu uma difícil entrada na indústria siderúrgica após algumas
passagens como temporário. Juntou-se a uma equipe de jovens trabalhadores
combativos que exigiram a substituição do delegado em função. Reconhecido como um
bom trabalhador, prestativo e correto, envolveu-se na ajuda aos trabalhadores, o que por
vezes o leva a conflitos muito difíceis com a direção local. Contudo, a fábrica não é
apenas um aspecto de sua vida e sua atividade sindical raramente se estende além do
horário de expediente (aqueles a quem Jean-Claude se refere como os delegados
"7h30-16h00"). Ele tem ao seu lado outra vida militante (é membro do Partido Socialista
e candidato nas eleições municipais), e acima de tudo segue as atividades esportivas de
seus filhos. Deixou a delegação em 2012 cansado de ter que viver uma segunda
paralisão e de se encontrar em uma fábrica vazia.
Estes dois compromissos no sindicalismo emergem de diferentes maneiras de perceber
o mundo social e a relação com a profissão. Jean-Claude distingue os gestores de
acordo com suas origens sociais (valorizando aqueles que são filhos de operários) e seu
respeito pelos trabalhadores, enquanto Dimitri os julga de acordo com suas origens
geográficas (valorizando os gestores da região) e suas capacidades técnicas. O último
insiste nas habilidades dos trabalhadores de sua fábrica, enquanto Jean-Claude não está
muito interessado na técnica e nos produtos. Ele se concentra principalmente na
condição da classe trabalhadora (salários, condições de trabalho, condições de
emprego). Quando ele deve arbitrar entre diferentes tarefas, preza especialmente pela
garantia da presea de um maior mero de trabalhadores na fábrica e o
estabelecimento de um tratamento equitativo entre trabalhadores subcontratados e
temporários em Cockerill. Esta postura de protesto é seguida pelos trabalhadores mais
jovens ativos nas mobilizações, que têm maior capital escolar (ensino secundário) e
provenientes de um meio de militância operária. Isso é compartilhado por trabalhadores
que se identificam pouco com o ofício, especialmente em algumas fábricas de Cockerill
onde a atividade de trabalho consiste principalmente em monitorar os processos
automáticos, como na linha de galvanização. Por outro lado, a postura de Dimitri,
baseada nos princípios da equidade, mais do que de justiça social, é sustentada pelos
trabalhadores e delegados que trabalham em postos complexos que exigem adaptação
coletiva e por trabalhadores qualificados que o participam de coletivos de luta.
As reestruturações transformam as modalidades de emprego porque se os planos
sociais muitas vezes dão origem a protestos, às vezes violentos, seu acúmulo coloca
esses trabalhadores em novas configurações. Para os delegados sindicais, a atividade
militante se intensifica durante estes momentos de ruptura, assim como os conflitos
internos nos sindicatos. Logo, participam de numerosas reuniões sindicais para definir a
estratégia militante, às vezes indo a encontros com representantes locais, sendo
necessário também mobilizar os grupos de trabalhadores próximos para os piquetes, às
vezes escassos quando se trata de conflitos duradouros, para supervisioná-los durante
as manifestações, convencê-los da ação sindical, liderar as assembleias gerais, preparar
os folhetos, a prestação de contas, etc. As tensões entre alguns delegados de fábrica e
a direção sindical são ainda mais frequentes até o ponto de serem confrontados como
ambíguos onde é necessário arbitrar constantemente entre uma postura contestatória e
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de defesa das conquistas ou de apoio à direção local nas lutas competitivas entre as
fábricas da multinacional.
Se as delegações constituem um ponto de referência para muitos trabalhadores (como
fonte de informação em tempos incertos e de leitura de acontecimentos), permanece o
fato que os confrontos entre os delegados e os trabalhadores são observáveis. A
escansão dos conflitos garante a aprendizagem de diversos repertórios de ão coletiva,
lutas e mobilizões (até o aprendizado do domínio da violência coletiva), mas também
utiliza uma parte dos trabalhadores, como já foi apontado. Em outro nível, os delegados
são forçados a escolher entre a durabilidade da ferramenta ou as condições dos
trabalhadores, ou mesmo a arbitrar entre subgrupos de trabalhadores.
Foi o caso, por exemplo, do estabelecimento da "polivalência" da laminadora na década
de 1990, onde a administrão local planejava montar as equipes de produção, de
controle de qualidade e de manuteão para exigir que os operadores se "auto-
controlassem" e participassem dos reparos de suas máquinas. Esta ampliação de
tarefas, ao contrário da tecnicização, foi muito mal recebida por alguns dos trabalhadores
mais antigos e estáveis - que a consideraram como uma desvalorização de suas
habilidades, além do risco de intensificação do trabalho devido à redão dos tempos de
intervalo (DURAND, 2007). Por outro lado, os jovens trabalhadores, e aqueles
reclassificados de outras bricas de Cockerill, puderam ver isso como uma oportunidade
de ascensão. Quanto à tecnicização, os delegados obtiveram compensações salariais,
mas a maioria dos trabalhadores estáveis se opuseram ao acordo elaborado, após um
referendo organizado pelos sindicatos. Apesar disto, o acordo foi adotado pela direção e
os delegados foram duramente criticados pelos trabalhadores.
No caso da automação, o "compromisso fordista" (mudança de um aumento da
produtividade frente a um aumento dos salários) é aceito pelos trabalhadores no caso de
recusa da polivalência. Assim, são os trabalhadores menos qualificados (trabalhadores
manuais) que sofrem com tais mudanças, e para a polivalência, são os mais qualificados
(operadores, mecânicos, eletricistas) (DURAND, STEWART e CASTILLO, 1999). No
entanto, do ponto de vista dos delegados e da direção, esse "entendimento" é em si
mesmo uma forma de resistência e vitória sindical. Há, portanto, um duplo descompasso
da delegão da fábrica nesse caso. O primeiro refere-se à caracterização da ação de
resistência; o segundo, à representação dos vários componentes do grupo de
trabalhadores cada vez mais fragmentados (entre trabalhadores estabelecidos e
reclassificados, entre gerações, entre trabalhadores de ofício e trabalhadores pouco
qualificados, entre trabalhadores estáveis e trabalhadores precários, etc.). Isto pode ser
observado muito claramente nas estratégias que os delegados defendem, que varia
muito de uma fábrica para outra e duráveis localmente, quando interferem na escolha de
receber trabalhadores estáveis reclassificados de outras fábricas ou a manutenção dos
precários já em seus postos.
Finalmente, há outro registro cuja atividade dos delegados se torna senvel no contexto
das reestruturações: o trabalho de "enquadre" (GOFFMAN, 2006) dos delegados, que
neste caso específico abrange a análise da situação dada, o sentido a ser atribuído às
injustiças e decisões de atores distantes e a atribuição das causalidades de
responsabilidade pela deteriorão das condições dos trabalhadores. Esses delegados
mantêm credibilidade na expressão do universo de referências e explicações oficiais, em
particular sobre o papel do capitalismo financeiro ou sobre um determinado saber-fazer
das fábricas de Cockerill que pode ser observado durante os contatos no escritório do
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sindicato, nas fábricas ou nas reuniões informativas coletivas. A partir deste ponto de
vista, estamos lidando com trabalhadores intelectuais fora de seus postos. Mas estas
explicações sindicais perdem sua eficácia na medida em que os previsões sindicais
foram por vezes contraditórias com os fatos (especialmente após o apoio sindical à
aquisição do grupo Arcelor por Mittal que finalmente fechou as fábricas) e onde as
próprias análises sindicais eso divididas diante de processos de decisões que não são
transparentes e imprevisíveis (especialmente sobre a responsabilidade do poder blico
ou quando as fábricas da Cockerill competem por investimento) (HEERY e CONLEY,
2007). Como resultado, os delegados são frequentemente confrontados com discursos
acusatórios sobre suas estratégias, consideradas por alguns como muito conflituosas e
por outros como muito cautelosas ou co-gestoras. Esta incerteza também alimenta, em
alguns trabalhadores, as interpretões culturalistas ou mesmo racialistas (questionando
a natureza francesa, flamenga ou indiana da direção) ou conspirativa (contra a região da
Valônia ou a gestão local) em descompasso com as análises sindicais. Isto não é
exclusivo de empresas que passam por sucessivas reestruturações, mas pode-se
sustentar a hipótese de que a incerteza quase permanente em torno do futuro dos
trabalhadores favorece esses esquemas interpretativos e sua apresentação pública no
espaço da brica.
CONCLUSÕES
Finalmente, o estudo de um caso específico qualifica as teses que caracterizam as
resistências sindicais às reestruturações pelos estilos de ões (colaboração, ativismo
militante, etc.). A partir disso, estendemos a investigão para além das direções
sindicais ao integrar as práticas cotidianas dos delegados. A situação se torna complexa
e as reações contestatórias e mais participativas dos sindicatos se entrelam.
Entretanto, pode-se observar que neste contexto de forte sindicalizão de trabalhadores
homens estáveis e qualificados, a conflituosidade organizada se enfraquece em relação
ao conjunto, assumindo formas mais dispersas. O duplo movimento de diminuição do
número de delegados e as sucessivas reestruturações acentua de facto o papel dos
delegados de base, que ampliam suas tarefas ao tornarem-se sindicalistas polivalentes.
Ao assumirem mais responsabilidades rapidamente, confrontados com as direções da
fábrica que perderam parcialmente suas prerrogativas organizacionais, esses delegados
combinam a atividade militante e a atividade de negociação ou apoio individual. Eles são,
por outro lado, muito mais combativos, uma vez que se seus compromissos são menos
enquadrados pelo aparato sindical, por causa da renovação de gerações, sendo os
primeiros testemunhos das dificuldades dos trabalhadores que os solicitam por diversas
razões. Deste ponto de vista, se o recurso à experiência tende a "profissionalizar" os
dirigentes sindicais da empresa (GUILLAUME e POCHIC, 2014), o processo é menos
claro para os delegados das fábricas. De fato, estes adquirem as habilidades específicas
e são selecionados pelo aparato, mas a diferenciação com os demais não é completa e
sua carreira no sindicato não é garantida e nem sempre esperada (OFFERLÉ, 1999).
Nesta empresa siderúrgica, o peso do legado de uma forte presença sindical, as
orientações trabalhistas do sindicato majoritário e a relativa semelhança das
características sociais dos delegados e dos trabalhadores explicam seus vínculos ao
âmbito local da fábrica. As múltiplas transformões das organizações de trabalho e as
incertezas das carreiras alimentam a necessidade de contatos frequentes entre os
delegados e os trabalhadores. Seu estilo de ação militante combina a defesa individual
e coletiva dos trabalhadores ou, mais precisamente, mobiliza os casos individuais que
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portam os problemas coletivos. Entretanto, as tensões sobre o quadro de referência
cognitiva compartilhado na organização sindical (análises em termos de relações de
classe ou com o ofício) e a fragmentão das carreiras e estatutos dos trabalhadores
pesam tanto sobre as insncias de contestação quanto na representão das diferentes
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Data da submissão: 19/04/2021
Data da aprovação: 19/08/2021