Trabalho & Educação | v.30 | n.2 | p.11-31 | maio-ago. | 2021
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DOI: https://doi.org/10.35699/2238-037X.2021.33775
https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
MOREIRA, Jorge
1
CORREIA, Jo Alberto
2
CARAMELO, João
3
RESUMO
Tendo como ponto de partida a investigação realizada no quadro de um doutoramento, procede-se a uma
análise do processo de alfabetização e educaçãosica dos adultos em Portugal, no período que decorre
entre os anos trinta do século XIX e meados da década de oitenta do século XX. Os autores partem de um
marco teórico que reconhece a impossibilidade de uma educão neutra ou apolítica, situando-se numa
perspectiva crítica relativamente a perspectivas pedagogistas, economicistas ou meramente gestionárias do
fenômeno educativo. A investigação baseou-se num processo de pesquisa e análise documental, a partir de
fontes primárias e secundárias, e num trabalho de análise e discussão da literatura educativa e pedagógica
existente sobre o tema em apreço. O trabalho desenvolvido permitiu efetuar uma caracterização dos
períodos, das iniciativas ou etapas determinantes do seu percurso histórico, da sua integração nos contextos
mais amplos das diversas dimenes da educação de adultos e da educação popular, de que é parte
integrante; permitiu igualmente evidenciar os laços estruturais entre o processo de alfabetizão e educação
básica e os processos de industrialização e urbanização da sociedade portuguesa nos culos XIX e XX,
bem como dar conta das tensões, dos conflitos e ambiguidades que este processo suscitou nos diversos
grupos e classes sociais e nas instituições que os representaram.
Palavras-chave: Alfabetização e educação básica. Educação de adultos. Educação popular.
ABSTRACT
Taking as a starting point the research carried out as part of a doctoral thesis, we analyze the process of
literacy and basic education of adults in Portugal, in the period between the thirties of the nineteenth century
and the mid-eighties of the twentieth century. The authors start from a theoretical framework that recognizes
the impossibility of a neutral or apolitical education, placing themselves in a critical perspective in relation to
pedagogical, economic or merely managerial perspectives of the educational phenomenon. The research was
based on a process of documentary research and analysis, from primary and secondary sources, and on an
analysis and discussion of the existing educational and pedagogical literature on the subject. The work carried
out allowed us to characterize the periods, the initiatives or determining stages of its historical path, its
integration in the broader contexts of the various dimensions of adult education and popular education, of
which it is an integral part; it also allowed us to highlight the structural links between the process of literacy and
basic education and the processes of industrialization and urbanization of Portuguese society in the nineteenth
and twentieth centuries, as well as to account for the tensions, conflicts and ambiguities that this process raised
among the various groups and social classes and the institutions that represented them.
Keywords: Literacy and elementary education. Adult education. Popular education.
1
Doutorando em Ciências da Educação pela Universidade do Porto. Mestre em Educação e Formação de Adultos pela Faculdade de
Psicologia e de Cncias da Educação da Universidade do Porto. E-mail: jorgemsmoreira.mc2@sapo.pt.
2
Doutor e Mestre em Ciências da Educação pela Universidade de Bordeaux II. Professor Catedrático da Faculdade de Psicologia e de
Ciências da Educação da Universidade do Porto. Professor Emérito da Universidade do Porto. E-mail: correia@fpce.up.pt.
3
Doutor em Ciências da Educação pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Mestre em Cncias
da Educação pela Universidade de Lisboa. Professor Auxiliar e membro do Centro de Investigação e Intervenção Educativa na Faculdade
de Psicologia e de Cncias da Educação da Universidade do Porto. E-mail: caramelo@fpce.up.pt.
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INTRODUÇÃO
A educação de adultos tem uma longa trajetória em Portugal, integrada na problemática
mais vasta da educação, de que é uma componente, com as suas especificidades
próprias. O lugar da educão de adultos, bem como o da educação em geral (formal e
não formal), vai modificar-se profundamente, tal como noutros países europeus, na
transição do século XVIII para o século XIX, num quadro mais geral de reconhecimento
da importância do papel dos sistemas educativos e da necessidade da sua reforma. No
contexto das sociedades liberais que, então, se vinham implantando nas sociedades
europeias, herdeiras de conceções sociais e políticas iluministas que valorizavam o
conhecimento e confrontadas com as mudanças induzidas pelos novos processos de
produção (manufatura e indústria), atribuíam-se novas funções à educação, ainda que,
conforme as circunstâncias sociais, ecomicas e políticas de cada país, estas se
fossem delineando de formas muito diversas.
A educação de adultos surge associada, muito estreitamente, à instrão/educação
popular, entendida, sobretudo, como alfabetização (o ler, escrever e contar) da
generalidade da população ou como a frequência do ensino primário elementar
(educação básica) embora não se esgotando, todavia, nessa vertente da intervenção.
Com efeito, outras dimensões da educação de adultos, como a difusão do conhecimento
cultural e científico, a animação e a dinamização da ação cultural autónoma das
populações ou a promoção do ensino profissional, suscitaram a atenção e ação do
Estado e de muitos cidaos. Durante largos períodos, designadamente no caso
português, a alfabetização e a educação básica dos adultos desempenharam,
sobretudo, um papel complementar no contexto das políticas públicas ou das iniciativas
particulares dirigidas à promoção da instrução popular, as quais atendiam
prioritariamente à educação das novas gerações, esperando-se assim uma progressiva
eliminação do analfabetismo e o alargamento do número daqueles que passariam a
pertencer ao mundo da cultura letrada.
Em Portugal, a questão da alfabetização e da instrução/educão popular (e da
educação de adultos) entrelaçou-se ainda com um outro tema; o «atraso» educativo (da
educação formal) do povo português, que mobilizará intensas disputas ideológicas e
retóricas ao longo dos séculos XIX e XX. Com efeito, o reconhecimento por parte de
determinadas frações das classes sociais dominantes, de parte da classe política, da
generalidade dos intelectuais, das classes dias em crescimento e, inclusive, de
setores mais avançados das classes populares, da importância crescente dos processos
educativos, associado ao reconhecimento do atraso da alfabetização e da escolarização
da população portuguesa, quando comparada com a situação de muitos outros países
europeus e do mundo, e a discussão dos caminhos que deveriam ser trilhados para
superar essa diferença, constituiu um tópico muitas vezes presente no debate político e
pedagógico ao longo de todo este período. Do mesmo modo, foi-se cimentando, ao
longo de décadas, a consciência de que os esforços implementados no campo educativo
não estavam a produzir os resultados necessários, fosse como se aventava por
resistências estruturais e culturais da sociedade e do povo português, fosse pela
inconsistência das políticas elaboradas e da fraqueza dos recursos a elas alocados,
fosse mesmo pela incúria ou incompetência dos governantes. Não faltam testemunhos
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dessa continuada discussão que mobilizou políticos, pedagogos, intelectuais,
movimentos cívicos, etc.
Optamos por discutir, no presente artigo o processo que designamos por alfabetização
e educação básica (ensino elementar primário) da população portuguesa, focando,
sobretudo, a expressão desse processo na população adulta, sem desconhecer, no
entanto, a sua profunda interligação com a globalidade do conjunto do fenómeno
educativo e com as outras dimensões da educação de adultos. Por essa razão,
procuramos explorar, em primeiro lugar, a origem e o significado de alguns conceitos
essenciais à compreensão do percurso histórico do que habitualmente designamos por
educação de adultos para, em seguida, nos determos mais pormenorizadamente na
questão da alfabetização e da educação básica. Ao longo do período que aqui
abordamos (anos trinta do século XIX a meados da década de oitenta do século XX), e
relativamente a esta temática, muitas políticas e programas foram sendo ensaiados,
muitos atores e intervenientes se empenharam no processo, muitas etapas se foram
sucedendo, alguns êxitos e muitos fracassos se foram registrando. Convencidos de que
o conhecimento do passado permite um melhor entendimento do presente e ajuda a
pensar o futuro, procuramos também, com base numa investigação de doutoramento
em torno da educação de adultos, que realizamos, discutir algumas das características
essenciais desse processo.
EM TORNO DE ALGUNS CONCEITOS CENTRAIS: DA INSTRUÇÃO POPULAR À EDUCAÇÃO DE
ADULTOS
A pessoa humana é, por natureza, um ser aprendente, com a potencialidade de retirar
ensinamentos dos diversos contextos e experiências que vivencia. A expressão o
comum «aprender até morrer» é uma tradução popular dessa realidade. De facto, a
maioria das aprendizagens, e talvez as mais significativas de um ser humano ao longo
da sua vida, decorrem das interações que vai estabelecendo com o meio natural e social
envolvente e a forma como as processa e internaliza. Há muito que se reconhece a
importância dos processos de socialização na formação dos indivíduos e, no campo da
educação, o conceito de educação informal assinala a relevância educativa da
participação dos sujeitos nos seus diversos contextos de vida. Para além destes
processos informais, nos quais não existe uma intencionalidade educativa prévia, as
sociedades humanas sempre foram desenvolvendo formas mais ou menos formais e
intencionais de transmitir informações, conhecimentos e saberes diversos. O recurso aos
perceptores/professores para o ensino/educação dos filhos das classes nobres ou
burguesas no âmbito familiar, a transmissão do saber profissional, no âmbito das
organizações dos ofícios medievais, a constituição de grupos de natureza variada nas
paróquias (para aprendizagem do catecismo) ou na vida militar (para diversos fins), a
edição de materiais impressos (jornais, revistas, livros), a realização de conferências,
palestras, sessões de leitura coletiva, cursos, a frequência da escola, constituem
exemplos dessas modalidades formais/não formais de ensino/aprendizagem. Todavia,
seria a escola, enquanto estrutura privilegiada de educação, permitindo chegar a um
número elevado de pessoas, que viria a tornar-se no modelo educativo referencial e
dominante nas sociedades modernas, remetendo as outras modalidades de
ensino/aprendizagem para uma situação de menor reconhecimento social. A escola,
como a conhecemos hoje, com alunos, professores, edicios próprios, programas
específicos, etc. começa a desenvolver-se a partir dos séculos XVII e XVIII, na Europa,
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e é concomitante com a afirmação dos Estados-Nação de que constituiu um elemento
essencial.
Nestas «novas» sociedades, a educação seria chamada a desempenhar um papel mais
importante e central do que até aí, já que os processos económicos, sociais e culturais
que as atravessavam exigiam uma expansão significativa da cultura letrada: não apenas
o domínio dos códigos da leitura e da escrita e de operações matemáticas simples, mas
também a compreensão elementar dos conhecimentos da ciência e da técnica em
desenvolvimento acelerado, ou dos saberes necessários para o funcionamento dos
crescentes e mais complexos aparelhos económicos, administrativos, judiciais, etc.
Novos protagonistas surgiriam no campo da educação, particularmente o Estado, mas
também organizações da sociedade civil, que disputariam à Igreja o papel que, neste
campo, esta desempenhava tradicionalmente. Tratava-se, por um lado e em primeiro
lugar, de renovar a educação e a formação das elites dirigentes, para a gestão do Estado
e dos negócios, num mundo crescentemente globalizado, proporcionando aos filhos da
aristocracia ou da burguesia um percurso escolar longo e, por outro lado, de permitir a
determinados estratos das classes médias ou das «classes laboriosas» uma
educação/formão para a sua entrada no mercado de trabalho, ocupando posições
intermédias no Estado ou nas atividades económicas (as classes médias) ou para o
desempenho de determinadas ocupações profissionais mais especificas nas
manufaturas, na indústria ou no comércio (as classes populares). É neste
enquadramento que, do ponto de vista ideológico, se vão suceder diversas discussões
sobre se os esforços educativos da sociedade se deviam direcionar prioritariamente às
elites dirigentes, abarcando igualmente determinados estratos médios da população ou
se deveriam também envolver as camadas populares e em que grau ou intensidade.
Nos seus primórdios, a expansão da instrução/educação organizada é concebida,
sobretudo, como dirigida às crianças e aos jovens e pressupunha, em geral, o ensino da
escrita e da leitura e de noções básicas de história e geografia e, quase sempre, a
educação moral e religiosa. Para os mais afortunados (filhos das classes mais abastadas
ou com algum patrono) poder-se-ia seguir um percurso escolar mais longo, que
assegurasse o estatuto social de partida ou um trajeto de ascensão social. Os adultos
ficavam, tendencialmente e conceitualmente, à margem do sistema escolar, em sentido
estrito, ficando reservadas para eles outras modalidades menos formais de educação.
Todavia, de forma paulatina, o modelo escolar de formação, ou modelos próximos, ir-se-
iam impondo também na sua dirão. Um dos primeiros paladinos da ideia de uma
educação base aberta a todas as crianças e jovens é Comenius que já no século XVII
argumentava a favor dos benefícios que uma literacia generalizada acarretaria para as
sociedades, embora não visse vantagens em se procurar ensinar os adultos, já que a
educação, enquanto processo organizado, se deveria dirigir à infância, quando a
imaginação é ágil e os dedos fleveis (2001, p. 115). Já Condorcet (1792) igualmente
defensor da universalidade da instrão, mas pública e gratuita (no ensino primário
elementar), afirmava que aquela se deveria proporcionar em “todas as idades da vida
com a finalidade de conservar os conhecimentos e se adquirir novos (1792). Neste
sentido, pode ser considerado um precursor da educação de adultos.
Conceito de instrução/ educação popular
O conceito de instrução/educação popular, que começa a emergir destes
posicionamentos, tem a ver exatamente com a ideia de ser vantajoso para a sociedade,
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no seu conjunto, o «derrame da ilustração» (como por vezes se vê escrito) pelos
indivíduos pertencentes às camadas populares, ideal que demoraria a implementar-se e
que só progressivamente faria o seu caminho. Voltaire, ilustre iluminista do século XVIII,
por exemplo, não partilhava dessa ideia de «ilustrar» o povo (a população que não tinha
mais que os seus bros para viver, como dizia)
4
. Em Portugal, também se polemiza
sobre o assunto. Ribeiro Sanches escreve em 1760, nas Cartas Sobre a Educão da
Mocidade, que o rapaz de doze ou quinze anos que chegou a saber escrever uma carta,
não quererá ganhar a vida a trazer uma ovelha cansada às costas, a roçar de manhã até
à noite, nem a cavar (1922, p. 111). Ou que não precisava esta classe de povo mais
do que seguir aquele caminho que seguiam os seus progenitores e tutores (idem, p.
114). Em sentido contrário, o padre Luís António Verney defendia, no Verdadeiro Método
de Estudar, a responsabilidade do Estado na promoção de uma escolaridade nima
acessível para todos as criaas e jovens fossem do sexo masculino ou do feminino,
referindo que devia haver em cada rua grande ou ao menos nos bairros, uma escola
pública para que todos os pobres possam mandar lá os seus filhos, o que se prática em
várias partes” (1746, p. 254). É assim que o conceito de Instrução Pública gratuita, nos
seus níveis elementares, se cruza com o conceito de Instrução/Educação Popular já que,
sendo difícil aos indivíduos das classes populares suportarem os custos da sua própria
educação, esta teria que ser suportada pelo Estado. O acréscimo da despesa pública
seria compensado, nas palavras dos que o defendiam, pelos benecios sociais que d
decorreriam.
As expressões «educação» e «instrução» são, muitas vezes, utilizadas indistintamente.
No entanto, também não é raro, na literatura pedagógica dos séculos XVIII, XIX e XX,
encontrarmos o seu uso com significados distintos, sendo que, neste caso, a instrução
é, em geral, considerada apenas um aspeto do conceito mais abrangente de educação.
A título de exemplo, refira-se um artigo no Panorama Jornal Literário e Instrutivo, óro
da Sociedade Promotora dos Conhecimentos Úteis (nº 122, 1ª série, a0gosto de 1839),
intitulado Da educação em todas as idades”, no qual se afirma que:
De ordinário confundimos estas duas palavras educação e instrução; mas cada uma tem
a sua acepção diversa. A educação é mais ampla que a instrução porque abrange todos os
meios de desenvolver e cultivar todas as faculdades do homem segundo os fins para que
os recebemos da Natureza; a instrução, porém é um desses meios, destina-se a exercitar
só uma espécie dessas faculdades, isto é, as intelectuais.
E, num outro número dessa publicação (nº 27, 1ª série, 1837), esclarece-se quais são
essas diferentes espécies de faculdades a necessitar de exercitação, exigindo cada uma
delas uma determinada modalidade de educação: a intelectual que trata de compor a
intelincia, isto é, de dar [à pessoa] os conhecimentos necessáriosao papel que tem
de representar na cena da vida”; a moral que trata da alma”, isto é, dos valores morais
e religiosos; a física que trata do corpo.
Quanto à educão nas diversas idades, afirma-se, no artigo que acima referimos, que
quando pensamos em educação pensamos logo na mocidade, o que se considera ser
um grande erro, já que qualquer que seja a idade do homem, cumpre-lhe instruir-se e
aperfeiçoar-se sempre. Mas fica-se por aí, assinalando a importância da aprendizagem
quotidiana a partir da experiência de vida. No mesmo artigo, é possível ainda colher
4
«  ; ils mouraient de faim
avant de devenir philosophe» (Voltaire, 1784, citado por Luísa Messina, 2018).
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outras perspectivas quanto à educação como a da educação diferenciada segundo a
classe social de pertença já que os favores da fortuna” (e o talento) são desigualmente
distribuídos. Assim, às classes inferiores oferecem-se menos meios de instrução”,
reconhece-se, acrescentando que essa deve ser uma razão para os indivíduos desses
grupos sociais aproveitarem o que puderem.
O conceito de educão/instrução popular, como apropriação pelo «pov de um saber
letrado que lhe estava vedado, vai ser conceitualizado, pelos seus defensores, como
fator necessário à integrão social das camadas populares na sociedade que emergia
da transição do Antigo Regime, assente na autoridade real e no domínio feudal da
nobreza, para as sociedades liberais e capitalistas do século XIX, que se procuravam
fundar numa ideia de soberania popular (ainda que limitada) e na expansão comercial e
industrial dos necios, que vinham a fazer crescer uma burguesia dinâmica em alguns
pses europeus e da arica do norte. Será mesmo visto, por alguns, como criador de
hábitos de ordem e de disciplina necessários ao bom funcionamento das sociedades
contemporâneas. A ideia do acesso à educação/instrução como um direito dos cidadãos,
ou como um fator de emancipação dos indivíduos e dos grupos populares, embora
subjacente, por vezes, ao discurso dos pioneiros da educação popular, apenas iniciaria
a sua afirmação, associada à ideia de transformação do sistema social pela ação dos
«explorados», com a emergência dos movimentos populares e operários já na transição
do século XIX para o século XX.
Ainda que defendida, por determinados setores, a vantagem da generalização da
alfabetização e da educação elementar, para o desenvolvimento das sociedades liberais,
encontraria uma significativa desconfiança e resistência, a maioria das vezes de forma
passiva (por omissão), mas por vezes, ativamente, em parte das suas elites (no caso
português de forma bastante evidente), por receio das consequências que poderiam
advir de um «povo ilustrado» para o exercício do seu poder (as mais temidas: recusa do
trabalho duro e subalterno; contestação dos poderes estabelecidos). A elite dirigente
portuguesa, por razões que terão a ver com as alterações estruturais relativas à inserção
da sociedade e da estrutura produtiva portuguesa numa Europa em profunda
transformação (revolução industrial) e que a remeteram para um papel secundário
(semiperiférico), nomeadamente ao não conseguir acompanhar a dinâmica industrial e
comercial dos países do centro europeu, conduzindo a uma sobrevivência prolongada
de fatores socioeconómicos e culturais pré-capitalistas, apresentar-se-á dividida quanto
à necessidade e interesse de uma mais rápida expansão da cultura letrada entre as
camadas populares. Como refere Hobsbawm, caracterizando a atitude da burguesia
europeia, no século XIX, perante determinados aspetos da evolução política e
socioeconómica das suas sociedades (nomeadamente nos seus estratos superiores),
verificou-se uma eterna batalha política entre os partidos do movimento ou do
progresso e os partidos da ordem (1990, p. 237). Já as classes médias seriam
maioritariamente, para este autor, próximas dos «partidos do progresso», mas de modo
algum insensíveis à ordem” (idem). Também se verificariam, no outro lado da escala
social, nas camadas populares, fruto das condições socioeconómicas em que viviam,
dificuldades objetivas no envio dos seus filhos à escola, acompanhadas, em muitos
casos, por um discurso de rejeição ou incompreensão das vantagens da cultura letrada.
De qualquer modo, a questão da educação/instrução popular, enquanto alfabetização e
escolarização elementar do conjunto da população, associada também ao tema da
instrução pública, atravessará todo o século XIX, no mundo ocidental, como uma
questão candente e central dessas sociedades, prolongando-se ainda para grande parte
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do século XX. Em Portugal, constituiria um tópico presente nas discussões educativas e
nas políticas públicas até aos anos sessenta do século passado, data a partir da qual as
prioridades educativas com os estratos sociais populares em idade escolar se comam
a centrar na efetivação de graus de escolaridade mais elevados. No entanto, e no que
concerne aos adultos, os ecos em torno da educação popular estender-se-iam até ao
final da década de oitenta. Hoje em dia, a expreso «educação popular» praticamente
já não se faz ouvir, mesmo no caso da educação de adultos onde, como referimos, o
conceito se manteve atuante por mais tempo. Não que tenha perdido inteiramente o seu
significado e importância. Na realidade, a maioria das pessoas que constituem a
população portuguesa continuam a integrar-se no que poderíamos designar por
camadas populares e a expressar determinadas necessidades educativas/formativas.
Mas, num tempo de complexidade crescente das sociedades, de alterões profundas
no mundo do trabalho e nas sociabilidades, onde parece exigir-se dos indivíduos, e cada
vez mais intensamente, novos conhecimentos e competências sociais e profissionais, a
ideia da educão popular necessitaria certamente, para se manter eficaz, de uma
reconceptualização.
As dimensões da educação de adultos
A educação de adultos, em Portugal, regista, um percurso histórico alargado. Com efeito,
é possível remontar a organização de ações de alfabetização/educação/formação
dirigidas à população adulta, embora dispersas, pouco numerosas e centradas num
público restrito e na divulgão das «novidades» cienficas, a épocas anteriores ao
século XIX (Rogério Fernandes,1984, refere vários exemplos desse tipo de ações
organizadas nos séculos XVII e XVIII). Será, contudo, ao longo do século XIX, e
particularmente da segunda metade, que as questões relativas à educação de adultos
começam a surgir de forma mais regular e consistente, quer nas preocupações dos
governantes quer na atenção da sociedade civil e de algumas das suas organizações.
Neste enquadramento, a questão da educação dos adultos tendeu a ser considerada
principalmente como um aspeto da instrução e educação popular, despertando a
atenção e o esforço de várias gerações de portugueses que se empenharam em
promover políticas e iniciativas educativas que contribuíssem para a promoção da
alfabetização e da educação/instrução entre as classes populares.
Do nosso ponto de vista, são três as dimensões principais a partir dos quais se
desenvolve o grosso das políticas e das práticas educativas no campo da educão de
adultos em Portugal, entendida esta como um conjunto de ações de diversa índole,
organizadas, mais ou menos sistematicamente, com uma intencionalidade
educativa/formativa, dirigidas a uma populão que, por diversas razões, não seguiu o
percurso habitual de educação/formação inicial na «idade própria» (que foi variando
consoante as épocas) ou que, tendo-o feito, procurou em idades mais tardias aprofundar
ou complementar a sua educação escolar ou profissional: a alfabetização e promoção
da educação elementar ou básica; o ensino técnico-profissional; e uma área mais
abrangente, difusa e menos formalizada, em torno do acesso e democratização do
conhecimento e da cultura bem como da promoção da cidadania e participação social e
política. Nenhuma destas áreas é exclusiva da educação de adultos, nem sequer, com
exceção da última, desempenhou aí o «papel» principal.
Estas três dimensões da educação de adultos estão presentes ao longo da evolução
deste setor da educação, por vezes tocando-se, por vezes interligando-se a
alfabetização/educão elementar com os aspetos cívicos e culturais, por vezes
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correndo autonomamente, em linhas paralelas a ritmos diferentes. No seu conjunto,
constituem grande parte do que podemos considerar como dimensões fundamentais da
educação de adultos portuguesa no período a que nos reportamos. Das três, a questão
da alfabetizão/educação elementar foi aquela que foi sentida como mais decisiva pela
generalidade dos atores educativos e sociais, na medida em que o donio da leitura e
da escrita se revelava, aos olhos de muitos, como um fator básico de acesso à
participação na vida das sociedades modernas e como fator de desenvolvimento
individual e coletivo. Só a posse desses códigos parecia arrancar os indivíduos ao
domínio da ignorância e da superstição (como muitas vezes se escreveu) e fazê-los
aceder (bem como ao conjunto da comunidade) às promessas da modernidade. O
ensino técnico-profissional constitui, durante a maior parte do tempo que aqui tratamos,
a única via possível ao dispor dos adultos ou dos jovens já inseridos no mercado de
trabalho, para prosseguirem estudos para além do ensino primário, já que o ensino liceal
apenas, a partir de 1973, passou a oferecer cursos noturnos. Sem dúvida, foi neste tipo
de ensino que muitos jovens e adultos das classes trabalhadoras procuraram a
oportunidade de se valorizarem pessoal e profissionalmente. Se a alfabetização das
camadas populares constituiu um tópico estruturador de mobilização e ação, de muitas
personalidades e movimentos cívicos, ao longo dos séculos XIX e XX, vista como
condição de cidadania, a ação e a dinamização cultural, numa perspectiva de maior
amplitude, exprimindo-se de formas diversas, representou para muitos dos movimentos
e organizações que se dedicaram à educação popular, uma linha de atividade
indispensável. A «construção» de um cidadão culto, informado e atuante na sociedade
a que pertence, pareceu a essas entidades um fator indispensável para o progresso e o
desenvolvimento de sociedades democráticas e desenvolvidas.
O percurso da educação de adultos em Portugal insere-se, como referimos, num
contexto educativo mais abrangente, ele próprio determinado, em grande parte, pelos
contextos sociais, económicos e políticos constitutivos da evolução socioeconómica e
política do país nos últimos dois séculos e, como tal, muito influenciado pelas dinâmicas
e pelos acontecimentos que constituem a nossa história. Um percurso marcado por
avanços e recuos, por linhas de continuidade (positivas umas, negativas outras), por
tensões e conflitos, por momentos de rutura que lhe imprimiram novas direções, por uma
grande diversidade de projetos e programas. Das primeiras medidas e referências que
ainda mal distinguiam a educação de adultos do «caldo» genérico da instrão popular,
nas primeiras cadas da monarquia constitucional, à lenta emergência das primeiras
políticas públicas no campo da educão de adultos; dos cursos noturnos, às Escolas
Móveis para adultos, começadas antes e institucionalizadas pela 1ª república; das
Universidades Livres e Populares promovidas por setores intelectuais progressistas à
atividade do movimento operário e sindical em prol da educão das «classes
laboriosas»; do elogio do analfabetismo à culpabilização do analfabeto como «sujeito»
perigoso para si e para a sociedade, enquanto construções ideológico-educativas do
Estado Novo; da revolução democrática, iniciada em Abril de 1974, que abriu novos
caminhos à educação popular de adultos e à consolidação da rede pública de educação
de adultos; à sua evolução, na década de noventa do século passado, para uma
vertente mais formal e escolarizada, por via do ensino recorrente, e de muitos outras
ocorrências, se constituiu a «história» da educação de adultos, em Portugal, nos séculos
XIX e XX. Torna-se, no entanto, necessário reconhecer que, apesar das políticas
públicas e das iniciativas cívicas que foram tendo a educação de adultos como objeto, e
da constatação da existência de ciclos de afirmão e desenvolvimento desta, tem
predominado um défice de atenção e de empenhamento na consolidação deste
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subsetor educativo, consubstanciado na dificuldade de estabilizar políticas e estruturas
coerentes e de longo prazo, o que se traduz na carência de reconhecimento do papel
que a educação de adultos poderia (e deveria) desempenhar na sociedade portuguesa.
APONTAMENTOS SOBRE O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO E EDUCAÇÃO BÁSICA DOS ADULTOS
EM PORTUGAL
Para uma visão geral
O processo de alfabetização e de educação elementar da populão portuguesa
concentrou-se, em grande medida, nos grupos etários entre os sete e os quinze anos,
esperando-se que a sua permanência por algum tempo na escola fosse generalizando,
progressivamente, ao conjunto da população, os conhecimentos elementares de cultura
letrada considerados indispensáveis à integração dos cidadãos numa sociedade que se
via em transformação. No seu desenvolvimento, encontrou resistências de diversos
tipos, quer em determinados grupos sociais, quer na elaboração, na consistência e na
persisncia com que as políticas dirigidas à sua concretização se desenvolveram. Deste
modo, um contingente significativo e, por muito tempo, até maioritário, dos indivíduos que
constituíam estes grupos da população, não frequentou a escola ou abandonou-a
demasiado cedo, passando a integrar-se no conjunto da sociedade, no que diz respeito
à literacia, na condição de analfabeto, ou com um grau de donio da leitura e da escrita
rudimentar.
A educação de adultos foi, portanto, chamada a desempenhar um papel complementar,
cuja contribuição não é fácil de quantificar, mas que não pode ser reduzido à irrelevância.
Numa perspectiva muito geral, podemos afirmar que a questão da generalização da
alfabetização e da educão básica dirigida aos adultos (leia-se indivíduos, em geral,
com mais de 15 anos, mas podendo ser menos, se considerarmos a idade com que se
aceitavam inscrições nos cursos que lhes eram dirigidos) se começa a colocar
oficialmente na década de trinta do século XIX, quando é inscrita, pela primeira vez, na
legislão do Estado português, a obrigação, em certas circunstâncias, de se realizarem
aulas noturnas para os adultos que as não pudessem “ouvir durante o dia (decreto de
15 de Novembro de 1836). Até esse momento, a aprendizagem da escrita e da leitura,
para um adulto, apenas era possível pela ação «benemérita» de algum mestre ou
professor que se dispusesse a acol-lo nas suas aulas (era aceitável, à época, juntar
na mesma sala crianças e adultos desde que do mesmo género), ou da ajuda de alguém
«letrado» capaz de transmitir esse saber. Também nos quarteis, por determinadas
necessidades de serviço, podiam organizar-se cursos de iniciação à leitura e à escrita
para alguns soldados e marinheiros.
O processo de alfabetização e educão básica dos adultos manter-se-á na ordem do
dia, até meados/finais dos anos oitenta do século XX, quando se extinguem os ecos do
último grande programa de combate ao analfabetismo, o Plano Nacional de
Alfabetização e Educação Básica de Adultos (PNAEBA). A partir dessa data, as
preocupações com a educação de adultos (do ponto de vista da escolaridade), passaram
a dirigir-se, preferencialmente, para a obtenção de graus escolares mais elevados, sem
que, contudo, o problema do analfabetismo ou o da baixa escolaridade entre os adultos
estivesse totalmente resolvido.
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Se considerarmos a evolução da taxa de analfabetismo, que constitui um indicador da
evolução do processo de alfabetização, podemos constatar a sua longa duração entre
nós. E ainda que se possa verificar uma tendência de redução continua e mais ou menos
regular da taxa de analfabetismo, de década para cada, respondendo a uma evolução
de fundo socioeconómica e cultural da sociedade portuguesa, no sentido de uma
penetrão cada vez mais significativa da alfabetização e da escolarizão, uma
apreciação mais pormenorizada desse indicador, mostra variações nos ritmos de
redução do analfabetismo, que se poderão considerar resultantes da intensificação de
processos socioeconómicos e culturais em curso ou, em certos casos, de políticas
públicas ou iniciativas da sociedade civil, direcionadas mais intensivamente para esse
objetivo. Assim, a taxa de analfabetismo na populão portuguesa seria, segundo
algumas estimativas (CARVALHO, 2008, p. 549), no início do século XIX, de 90%. No
começo do século XX, essa taxa rondaria, na população com 10 anos ou mais, os 73%
5
.
Em 1930, finda a I República, situava-se ainda nos 60%. Em 1970, já perto do final do
Estado Novo, situava-se nos 26%. Em 1991, mais de década e meia após o 25 de Abril,
a taxa de analfabetismo era ainda de 11% e de 5% em 2011 (último censo realizado).
De facto, considerando a evolução das taxas de analfabetismo, em Portugal, a partir de
1878, quando se começam a organizar os censos populacionais com regularidade,
podemos constatar, até 1930, uma diminuição progressiva, regular, mas lenta, década a
década, sem oscilões muito expressivas (aproximadamente na ordem dos 3 a 4%),
aparentemente indiferente aos ciclos políticos e económicos, às políticas públicas e às
diversas iniciativas.
Do início dos anos trinta ao final da década de cinquenta constata-se uma aceleração da
taxa de redução de analfabetismo entre 8 a 10% por decénio (ainda assim, apenas 1%
ao ano, no melhor dos casos), que parece resultar do impacto das alterações
socioeconómicas verificadas na sociedade portuguesa, nomeadamente dos processos
de industrialização e de urbanização (também eles lentos, quando comparados com
outras sociedades do centro europeu) e de uma ação mais efetiva do Estado com vista
ao cumprimento da escolaridade obrigatória, pela população em idade escolar.
Infelizmente, esta ação do Estado fez-se acompanhar de uma redução do número de
anos dessa escolaridade (de cinco para três), de uma contratação significativa de
«professores» sem a formação adequada para o exercício da profissão docente e da
introdução de um programa curricular marcado por uma ideologia de cariz nacionalista e
autoritária que exaltava as «qualidades» da raça, louvava a infalibilidade do «chefe»,
glorificando a obediência à autoridade.
5
Evolução da taxa de analfabetismo de 1878 a 2011, segundo os Censos.
Ano
%
Δ
%
Δ
Ano
%
Δ
Ano
%
Δ
1878
79
65
- 3%
1960
33
- 10%
2001
9
- 2%
1890
76
- 3%
60
- 5%
1970
26
- 7%
2011
5
- 4%
1900
73
- 3%
52
- 8%
1981
19
- 7%
1911
69
- 4%
43
- 9%
1991
11
- 8%
Δ Variação face ao Censo anterior
1878 - Taxa de analfabetismo na população com mais de sete anos
1890 a 2011 Taxa de analfabetismo na população com 10 anos e mais
Dados entre 1878 e 1970, em CANDEIAS, A. (dir. e coord,), 2004; dados entre 1981 e 2011, em:
https://www.pordata.pt/Portugal/Taxa+de+analfabetismo+segundo+os+Censos+total+e+por+sexo-2517 Acesso em: 03
mar. 2021.
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Nas décadas de sessenta, setenta e oitenta, a velocidade de redução da taxa de
analfabetismo desacelera um pouco, mas é ainda assim significativa, resultante quer dos
efeitos indiretos da continuidade dos processos de industrialização e urbanizão na
procura de educação e escolarização (anos sessenta e setenta), quer dos esforços para
a alfabetização dos adultos (anos oitenta). A partir dos anos noventa, o ritmo de redução
diminui significativamente, em resultado, por um lado, da reorientação das prioridades
das políticas de educação de adultos para outros patamares de escolaridade e, por outro
lado, do facto de a populão analfabeta se concentrar, cada vez mais, em níveis etários
elevados.
Uma análise mais complexa e rigorosa da evolução dos processos de alfabetizão e
educação elementar exigiria a consideração da sua variabilidade em função do gênero,
da sua expressão nas diferentes regiões do país e em contextos urbanos ou rurais e nos
diversos escalões erios. A sua análise detalhada afastar-nos-ia dos objetivos
essenciais do presente artigo. No entanto, pode dizer-se que o género constitui uma
variável significativa, mostrando as estatísticas taxas superiores de analfabetismo no
género feminino, bem como uma menor participação no processo de escolarização, ao
longo do tempo, derivada das conceções atribuídas, em cada tempo histórico, aos
diversos papeis de género. Contudo, essa diferenciação apresenta uma tenncia
decrescente à medida que nos aproximamos do tempo presente
6
. Constatam-se
diferenças regionais com alguma relevância entre distritos e concelhos, entre interior e
litoral, entre zonas urbanas e zonas rurais, entre Lisboa e Porto e outras zonas do país,
que vão evoluindo ao longo do tempo, permanecendo algumas dessas diferenças,
modificando-se outras, mostrando o impacto dos processos de urbanização e
industrialização mas, também, de fatores de ordem local, que podem influenciar
significativamente a participação em ações de alfabetização e de escolarização. A
análise das taxas de analfabetismo, por escalões erios, também assinala diferenças
que tendem a perpetuar-se no tempo, revelando-se, como esperado, uma maior
incidência nas faixas erias superiores. Inclusive, à medida que o processo de
escolarização se acentua, conduzindo a uma permanência maior das novas gerações
na escola, essas difereas acentuam-se. Deve-se, no entanto, fazer notar a
circunstância de, até aos anos trinta do século passado, as faixas de idade com menor
percentagem de analfabetos se encontrarem entre os vinte e os trinta e nove anos e não
naquelas onde seria suposto que o analfabetismo menos se faria sentir (a faixa entre os
sete e os quinze anos), cujos elementos eram abrangidos pela obrigatoriedade de
frequentarem a escolaridade primária elementar). Esta circunsncia demonstra, como
referimos anteriormente, que um contingente muito grande do escalão entre os sete e os
quinze anos, de facto, «fugia à escola», mas mostra, também, que uma parte do
contingente entre os quinze e os trinta e nove anos encontrava formas alternativas
(alguns certamente nos cursos noturnos) de aceder à aprendizagem da leitura e da
escrita.
Os processos de alfabetização e de educação básica da população portuguesa, embora
seguindo curvas de evolução próximas, constituem, apesar de todas as similitudes e
entrelaçamentos existentes, processos, em certo grau, autonomizados um do outro. Os
dados disponíveis, a literatura pedagógica e as peças legislativas, mostram que mesmo
que a alfabetizão se fizesse, em geral, na escola e em cursos de ensino primário
6
Pode-se inclusive dizer que, em grande medida, hoje, este é um não problema. A taxa de participação feminina nos
processos educativos (tamm nas ações dirigidas aos adultos), em Portugal, é idêntica, e em muitos casos superior, à
do gênero masculino.
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elementar, com recurso a professores e aos programas oficiais, ou em modelos
similares, se pode fazer a distinção entre as duas situões. Decorre essa distião do
facto de até épocas próximas da atualidade ser frequente o abandono da escola, ou dos
cursos de ensino básico, logo que se obtinham os rudimentos de leitura e de escrita, pelo
que muitas pessoas se «satisfaziam» com estas noções básicas ou, mais
realisticamente, por diversas razões, viam-se impedidas de prosseguir com a sua
aprendizagem. De qualquer modo, no final dos anos oitenta do século passado, quando
as políticas públicas de educação dirigidas aos adultos, se começam a concentrar na
promoção de escolarização de nove e doze anos, cerca de um milhão de indivíduos com
quinze ou mais anos, ou não possuía as competências básicas de leitura e de escrita ou
não tinha ainda concluído quatro anos de escolaridade
7
. Dados do Observatório das
Desigualdades mostravam que, em 2017, 52% da população ativa portuguesa (25-64
anos), não tinha mais do que a escolaridade obrigatória (nove anos). Num conjunto de
31 pses europeus. Portugal encontrava-se na penúltima posição, a uma distância
considerável do antepenúltimo (Espanha com 40,9%)
8
, embora se possa dizer que
essas diferenças se fazem sentir, sobretudo, nos escalões etários mais elevados.
Mantém-se, pois, uma certa dificuldade em «acertar o passo» com os restantes países
europeus dado o «lastro» da herança histórica dos processos de alfabetização e
escolarização da população portuguesa. Todavia, sendo certo que o nível de
escolaridade não deve ser o único (nem talvez o principal) aferidor do nível educativo de
um povo, existindo essa diferenciação, só poderá ser compensada por uma política de
educação de adultos diversificada e dirigida às múltiplas necessidades e interesses que
os adultos e a sociedade contemporânea demandem.
Mais de um século e meio levou a concluir-se (no essencial) o processo de alfabetização
e escolarizão básica da população portuguesa. Sem dúvida, demasiado tempo para
os muitos que se exasperaram com a lentidão com que avançou. Nele, a educação de
adultos desempenhou a sua parte, umas vezes de forma mais atuante, encontrando os
intervenientes implicados novas modalidades de organização e intervenção ou
dinamizando as já existentes, outras vezes, limitando-se aos «serviços mínimos»,
vivenciando situões de estagnação ou até de retrocesso.
Sem estruturas organizativas autónomas ao nível do Estado, que só se afirmariam
depois da revolão de abril de 1974, as políticas e as iniciativas relativas à educação de
adultos foram evoluindo ao sabor dos ciclos políticos e económicos e das sensibilidades,
projetos e interesses colocados em jogo pelos diversos atores e organizações sociais
que sobre ela agiam.
Momentos-chave do processo de alfabetização e educação básica dos adultos em
Portugal
Talvez se possa afirmar que a «grande questão» da educação de adultos, em Portugal,
durante os séculos XIX e XX, tenha sido o problema do analfabetismo e da alfabetizão
- a «educação do pov como foi, muitas vezes, designada. Como afirmava um
historiador português, já depois da II guerra mundial, quando quase todos os países
europeus há muito que tinham logrado a alfabetização do conjunto da sua população
7
https://www.pordata.pt/Portugal/Popula%c3%a7%c3%a3o+residente+com+15+e+mais+anos++segundo+os+Censos
++sem+n%c3%advel+de+ensino+total+e+por+sexo-859 Acesso em: 03 mar. 2021.
8
https://observatoriodasdesigualdade.wordpress.com/2018/06/14/nivel-de-escolaridade/ Acesso em :03 mar. 2021.
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A doença que enferma a Nação é o seu atraso cultural em relação aos Estados Civilizados,
colocando-a fora de toda a possibilidade de competir com eles, e condenando-a à derrota
em toda a concorrência; a sua inferioridade marca-a o estigma do analfabetismo, mais do
que qualquer outro. Os demais aspetos de degradação da Grei são secundários e quase
todos daí derivam. As taras de que sofre o nosso viver social e a nossa organização política
provêm, sobretudo, de que não vencemos nunca a nossa crise de educação (LOPES
DOLIVEIRA, s/data, p. 12).
Em seu redor estalaram polêmicas, gizaram-se campanhas de alfabetização,
conceberam-se programas e legislou-se bastante, mobilizaram-se vontades de muitas
pessoas. Com efeito, como referimos, se atendermos às taxas de analfabetismo da
nossa população durante este período, comparativamente com a maioria dos países
europeus, elas colocam-nos num lugar pouco honroso de uma virtual tabela
comparativa. Associada a outros indicadores educativos que, de um modo geral,
remetiam para as baixas taxas de escolarização da população portuguesa e para um
atraso geral do setor da educação, com consequências no desenvolvimento global do
ps, a questão da alfabetização encontrou-se, por essa razão, frequentemente, no
centro do combate político. Os movimentos republicanos criticaram asperamente a
monarquia pela sua incapacidade de promover a alfabetizão da população e até pelo
seu desinteresse em fazê-lo; os movimentos socialista, anarquista e operário
censuraram a República (mas também a monarquia) pelas mesmas razões; os
movimentos de oposição ao regime ditatorial do Estado Novo acusaram-no de incentivar
e glorificar a ignorância e o analfabetismo entre as massas populares; e, mesmo depois
do 25 de Abril, o poder democrático que saiu da revolução foi, muitas vezes, criticado
pela pouca atenção e interesse dedicado à resolução dessa questão.
Pode-se destacar alguns «momentos» ou «iniciativas em que a questão do
analfabetismo/alfabetização mereceu uma atenção particular, ligados à emergência de
movimentos cívicos em torno do tema ou a uma maior atenção do poder político ao
assunto:
a) a década de cinquenta do século XIX, que assinala o «nasciment de uma nova
dinâmica, ainda que breve, no campo da alfabetização/educação de adultos resultante
de dois «acontecimentos» confluentes: a criação do método de «leitura repentina», por
A.F. Castilho
9
, e o seu proselitismo em prol deste que, conjugado com o reconhecimento
que obteve junto das elites intelectuais e políticas, conduziu a um significativo aumento
da promoção e organização, por iniciativa pública ou particular, de cursos diurnos e
noturnos para o ensino das «primeiras letras»; a emergência das primeiras formas de
organização operária, como é o caso do Centro Promotor dos Melhoramentos das
Classes Laboriosas, que tendo como missão principal o apoio à constituição de
associões profissionais nos diversos setores da indústria, orientou também a sua
atenção para a organização de cursos de «ler e escrever» (recorrendo ao método da
«leitura repentina») e para cursos de cultura geral ou profissional, dirigidos aos artesãos
e operários da área de Lisboa. A falta de apoio blico continuado a estas iniciativas
resultantes, na sua maioria, da ação de associações de diversos tipos, induziu ao seu
progressivo esmorecimento;
9
António Feliciano de Castiho (1800-1875) foi um poeta e escritor português que criou um método de ensinar a ler e
escrever que ficou conhecido por «método de leitura repentina», «método Castilho» ou «método português». Bastante
influente junto das elites políticas e intelectuais do seu tempo, exerceu uma ação prolifica no campo da educação popular.
O seu todo suscitou tanto apoios entusiásticos quanto críticas veementes.
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b) a iniciativa governamental, em 1866/1867, que procurava «fundar o ensino de
adulto, dando origem a legislação com esse objetivo (decreto de 20 de junho de 1866),
seguido da aprovação do que pensamos constituir o primeiro regulamento específico
para os cursos noturnos (isto é, autonomizado da legislação geral relativa ao ensino
primário), em 1867 (decreto de 28 de novembro). A dinâmica então instituída levou a um
crescimento, em poucos meses, do número de cursos de 62 para 547 e de 2 866 alunos
inscritos, no ensino noturno, para cerca de vinte mil (Costa, 1870:260). Todavia, a falta
de empenho continuado nesta direção pelo poder central, que empurrava
responsabilidades e gastos para as entidades locais, e a falta de respostas destas,
nomeadamente das Câmaras Municipais, derrubaram a iniciativa. Em 1870, já só
restavam em funcionamento a terça ou quarta parte dos referidos cursos (idem).
c) o movimento das «Escolas Móveis», que se desenvolveu entre 1880 e 1930 (data da
sua extinção pelo Estado Novo), ligado a personalidades republicanas, que tomou para
si próprio a missão de combater o analfabetismo, utilizando o todo de ensino da leitura
e escrita criado por João de Deus
10
, e que organizava cursos ditos móveis ou
temporários onde quer que um pequeno grupo interessado se disponibilizasse a
frequentar as sessões. A 1ª República viria a oficializar esse tipo de escolas (diurnas e
noturnas), destinando-lhe um financiamento próprio. As escolas veis conhecem então
um grande crescimento: entre os anos letivos de 1913/14 e 1929/30, terão sido
realizados 4 778 cursos móveis, envolvendo 214 590 inscritos, dos quais (para os anos
em que existe registo) terão tido aproveitamento, isto é, aprenderam a ler e a escrever,
cerca de 30% (dados recolhidos em Sampaio, 1969, p. 22). As escolas móveis também
podiam preparar para o exame da 2ª classe, no entanto foram poucos os que a
concluíram por essa via. Objeto de críticas relativamente às fragilidades do modelo
utilizado (temporalidade, voluntariado, preparação dos docentes, escassez de recursos
materiais e pedagógicos) constituiu, apesar disso, um impulso e crescimento no campo
da educão popular/educão de adultos. Todavia, e mesmo tendo em consideração
o aumento do número de indivíduos inscritos nas escolas de ensino pririo ou em
atividades de alfabetização e outras de educação de adultos, o esforço realizado não foi
o suficiente para compensar as necessidades criadas por uma população que, desde
1880, crescia sensivelmente meio milhão de pessoas por década;
d) As duas últimas décadas do regime monárquico (1890-1910), e o período republicano
(1910-1926), constituíram uma época de particular atividade de movimentos cívicos
diversos, do movimento operário, de partidos políticos que se preocupam com a questão
da educação popular e a educação de adultos e que vão conduzir a uma forte
interpenetração entre educão e atividade política. Com efeito, quer os setores críticos
no interior da monarquia, quer organizões ligadas ao republicanismo ou ao movimento
operário, colocam a educação, nomeadamente a educação popular, como vetor
estratégico do país, assumindo-a como uma linha de ação cívica. É um período em que
surgem e ganham expressão as Sociedades e os Grémios de Instrão Popular,
normalmente ligados ou ao Partido Republicano ou a setores mais dinâmicos da
burguesia industrial e comercial, e que se dedicam quer à organização de atividades na
10
João de Deus (1830-1896) foi um poeta português muito popular no seu tempo. Foi também o autor de um método de
ensino de leitura e de escrita da língua portuguesa, que ficou conhecido pelo Método de João de Deus. Apresentou-o na
obra Cartilha Maternal ou a Arte da Leitura, publicada em 1876.Tendo alcançado imenso sucesso com esse método, que
concitou admiradores entusiastas, provocou também muita polémica e discussão e suscitou detratores acérrimos, à
semelhança do que tinha acontecido 25 anos antes com o todo de leitura repentina de A.F. Castilho. Tal como tinha
acontecido com aquele, o método de João de Deus chegou a ser proposto como método oficial para aprendizagem da
leitura e da escrita, mas tal não se veio a concretizar.
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área da alfabetização e do ensino primário elementar, quer à organização de palestras e
sessões de divulgação cultural e científica. Mas é também um período de forte atividade
no campo da alfabetização/educação popular a partir dos Sindicatos e Associações
Profissionais (o caso da Voz do Operário é exemplar neste domínio
11
) e em que, parte
dessas estruturas, sob influência de correntes anarco-sindicalistas, irão mesmo contestar
o «ensino burguês» e investir num modelo de ensino autónomo, pensado a partir da
realidade social do mundo operário e visando a emancipação dos trabalhadores, o que
implicava a constrão de uma rede própria de escolas e a sua autonomizão
administrativa e pedagógica. Desenvolve-se, igualmente, um movimento associativo
popular de carácter cultural e recreativo em volta dasica, do teatro, dos passeios e
visitas «ao campo», mas que não é indiferente à temática da alfabetização e da
educação de base dos adultos. Apesar do dinamismo do associativismo educativo,
cultural e popular, neste período, em torno da educação, a sua atividade o de
compensar a insuficiência da ação das estruturas do Estado central e local;
e) a «Campanha Nacional de Educação de Adultos», desenvolvida no âmbito do Plano
de Educão Popular, entre 1952 e 1956, pelo Estado Novo, que exaltara o
analfabetismo na sua fase inicial e cujos dirigentes máximos defendiam a ideia de que
era mais importante «formar as elites» que ensinar o povo a ler. Procura o regime, finda
a II guerra mundial, responder a novas necessidades de formação de mão-de-obra
suscitada por uma vaga de industrialização que crescia na Europa e que chega a
Portugal, em regime de «condicionamento industrial», mas que procura, igualmente,
melhorar a sua imagem e legitimidade internacional face à divulgação de estudos
internacionais comparativos que deixavam Portugal bastante mal colocado em diversos
indicadores. Propõe-se, então, aos adultos analfabetos ou que tivessem um domínio
precário da leitura e da escrita, a inscrição em cursos de ensino primário, com o objetivo
de concluírem a 3ª classe. A Campanha vai recorrer a uma intensa mobilização dos
meios de comunicação social (jornais, rádio e cinema) e de diversas corporações
(empresas, igreja, entidades públicas) com vista a uma participação massiva dos adultos
nas atividades propostas. Tamm se vai caracterizar pelos seus aspetos discricionários
(dirigia-se apenas aos «adultos» entre os 14 e os 35 anos), punitivos (ameaça de
despedimento em caso de recusa, impossibilidade de emigrar ou de passar à
disponibilidade, caso estivesse no serviço militar, sem a 3ª classe concluída), e
culpabilizantes dos analfabetos, difundindo-se deles uma representação de pouco valor
social, responsabilizando-os por essa circunstância. Embora concluindo pelo êxito da
campanha, que terá conduzido à certificação de 247 277 indivíduos (dados oficiais) com
o diploma da classe, o regime também concluiu pela dificuldade da ão
recuperadora em idades que diminuem a facilidade de aprendizagem e aumentam os
fatores que desviam do caminho da escola (decreto 40 964 de 31 de dezembro de
1956). A Campanha Nacional de Educação de Adultos constituiu a ação mais marcante
do Estado Novo, no campo da alfabetização/educação básica de adultos, ao longo dos
seus 48 anos de duração. Para além da manutenção dos cursos noturnos do ensino
básico (até à 4ª classe), sem, no entanto, os promover ou valorizar, registe-se a criação
da Direção-geral de Educão Permanente (Decreto-Lei nº 408/71 de 27 de setembro)
com a incumbência de desenvolver programas de educação extraescolar, atividades de
11
O jornal a «Voz do Operário» surge, em 1879, no seio dos trabalhadores do tabaco, para ajudar na organização dos
operários deste setor e denunciar as péssimas condições de trabalho que os atingia. Em 1883, é constituída a cooperativa
com o mesmo nome com o objetivo de assegurar a sobrevincia ecomica do jornal. A «Voz do Operário» terá um
importante e continuado papel (ainda hoje se mantém em atividade) no campo da educação popular.
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promoção cultural e profissional, o fomento de bibliotecas educativas e casas de cultura
e, ainda, o desenvolvimento de uma ão supletiva no ensino básico. No entanto, a
atividade desta entidade, junto dos adultos, durante o período final do regime do Estado
Novo, não foi significativa.
f) Os dois anos que se estendem entre a revolução de Abril de 1974 e a aprovação da
Constituição do país, em Abril de 1976, período habitualmente designado por Processo
Revolucionário em Curso (PREC), constitui uma época de particular intensidade de
transformação política e social, na qual a contribuição da educação para a
democratizão social adquire uma forte centralidade nos discursos dos agentes
educativos, conduzindo a uma definição da educão que contribuía simultaneamente
para a formação da democracia e a legitimação do exercício da democracia no próprio
espaço educativo (CORREIA, 1999, p. 83). Derrubada uma longa ditadura,
reconquistadas as liberdades políticas, o direito a falar e a escrever livremente, as
«massas populares» vão transformar as ruas e praças das cidades, as fábricas e as
escolas em locais de exercício de cidadania e reivindicão, com que o poder político
não podia deixar de contar. Uma onda de energia transformadora, de entusiasmo, de
vontade de participação percorreu Portugal, levando a mudanças em todos as áreas da
sociedade. A educação não fugiu à regra. No campo da alfabetização e da educação
básica dos adultos, reanimam-se movimentos e estruturas. A taxa de analfabetismo
ronda ainda os 25% entre a população com mais de quinze anos. Multiplicar-se-iam
então, um pouco por todo o país, iniciativas visando a alfabetização dos adultos, num
movimento que envolveria coletividades e associações populares, sindicatos, comissões
de trabalhadores, comissões de moradores, ou a criação de associações de educação
popular, para melhor responder às necessidades educativas dos adultos. Entre esta
disseminão de iniciativas, pode-se referir, pela sua especificidade, duas delas: as
campanhas de alfabetização promovidas pelos estudantes no verão de 1974, em zonas
rurais do norte e centro do país e algumas ilhas dos Açores e que, apesar da sua curta
duração e de se terem caracterizado por um certo romantismo revolucionário, algo
ingénuo, exprimem simbolicamente a vontade de transformão social que animou
muitos setores sociais da época e, sobretudo, teve o mérito de, logo no início do processo
de democratização, ajudar a recolocar novamente o tema da alfabetização num terreno
de maior visibilidade institucional e política; a ação da Direção-Geral de Educação
Permanente, entre Outubro de 1975 e Julho de 1976, que colocou em marcha um
programa de educação de adultos, numa perspectiva de educação permanente,
articulando apoios públicos com a ação autónoma de estruturas populares dedicadas à
alfabetização/educão de adultos, configurando a primeira tentativa de constituição de
uma rede de atores no campo da educão de adultos, constituindo um marco
fundamental no percurso deste setor em Portugal. Como referem investigadores da
educação que se têm debruçado sobre este período, predomina, neste movimento, uma
«lógica da educão popular» (LIMA, 2005; LIMA e GUIMARÃES, 2018; ARJO,
2014), entendida já não como um «derramamento» da educão, a partir das pessoas
instruídas, em dirão ao povo, mas como uma constrão autónoma do próprio povo.
Um outro autor (CANÁRIO, 2007, p.11) considerá-lo-á, mesmo, operíodo de ouro da
educação e formação de adultos em Portugal.
g) A primeira metade da década de oitenta do século XX, já algo «arrefecidos» os
entusiasmos revolucionários, com o país em plena institucionalização da sua democracia
política de tipo ocidental, imerso no esforço de construção de um «Estado-Providência»
que garantisse os direitos sociais adquiridos pela revolução e consagrados na
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Constituição Portuguesa, a braços com uma difícil situação ecomica e com o projeto
de adesão à Comunidade Europeia em marcha, em termos de alfabetizão e educação
de adultos seria dedicada, em grande medida, à implementação do PNAEBA,
desenvolvido sob responsabilidade da Direção-Geral de Educação de Adultos.
Organizado ainda numa lógica de educação popular, previa o envolvimento direto de
estruturas populares (os Centros de Cultura e Educão Permanente), visando
prioritariamente a eliminação definitiva do analfabetismo no país e a promoção da
educação básica elementar (instrução primária). Neste plano, a alfabetização e a
educação de base não surgiam isoladas, mas inseridas em lógicas de animação cultural
e até de desenvolvimento social e ecomico, a partir de dinâmicas territoriais e das
características e necessidades das comunidades locais envolvidas. Nos anos seguintes,
disseminou-se pelo país uma malha densa de Cursos de Educão Básica de Adultos
(CEBAS), multiplicaram-se as iniciativas culturais (projeção de filmes, espetáculos de
teatro, música, folclore, recolha de tradições), promoveram-se festas, atividades oficinais,
sessões sobre sde, planeamento familiar, educação sanitária, cursos profissionais,
projetos de desenvolvimento local, sobretudo na área agrícola, entre tantas outras
iniciativas. Surgiu igualmente uma rede pública de coordenações concelhias e distritais
dedicadas ao planeamento e coordenação das atividades do plano. Apesar de não se
ter ido tão longe quanto desejável no envolvimento das populações, nem se ter atingido
todos os objetivos propostos, o PNAEBA constituiu um dos maiores e diversificados
programas de alfabetização e de educação de base dos adultos já realizado em Portugal.
Envolveu dezenas de milhares de adultos (cerca de cem mil) nas suas atividades
educativas e muito mais no conjunto das ações realizadas; constituiu a primeira rede
pública de educação de adultos, efetivamente distribuída pelo conjunto do território
português; e tornou-se um campo de experimentação e inovação de formas de ação e
de metodologias no terreno da luta contra o analfabetismo e pela promoção da educação
de base dos adultos, da animação sociocultural, da formação profissional e do
desenvolvimento local, que muito marcariam a evolução do setor da educação de
adultos. Constituiu, também, o último grande programa no campo da alfabetização da
população adulta portuguesa, sem que a questão do analfabetismo estivesse, como
referimos, inteiramente resolvida. A escolarização acentuada da educação de adultos no
período de 1986-1995, conduziria, igualmente, à extião da entidade que, sob várias
designações, e desde 1971, assumia no interior do Estado central a implementão das
políticas blicas relativas à educação de adultos
12
. Esta extião marca,
simbolicamente, o culminar de um processo em que as políticas públicas de educação
de adultos se passaram a preocupar, predominantemente, com o fornecimento de uma
segunda oportunidade escolar aos jovens saídos precocemente do sistema educativo e
centrava-se prioritariamente em promover percursos escolares mais longos. O campo
das políticas educativas passa então a reger-se, fundamentalmente, por uma
progressiva desreferencialização da contribuição da educação para a democracia, para
passar a orientar-se por uma ideologia de modernização tecnocrática e por uma
definição económica da educação (CORREIA, 1999, p. 89). A partir de 1995, com as
mudanças políticas que se verificaram e que conduziram à criação da Agência Nacional
de Educação e Formão de Adultos (ANEFA), dos cursos de Educação e Formação
de Adultos (EFA), dos processos de Reconhecimento, Validão e Certificão de
Competências (RVCC) e de outras medidas, inicia-se, do nosso ponto de vista, um novo
12
Direção-geral de Educação Permanente (1971-1979); Direção-geral de Educão de Adultos (1979-1987); Direção-
geral de Apoio e Extensão Educativa (1987-1988); Direção-geral de Extensão Educativa (1988-1993).
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ciclo de políticas diferenciadas para a educão de adultos, em Portugal, marcadas por
aspetos inovadores que, integrando ensinamentos das experiências anteriores, têm
vindo a permitir a formulação de novas soluções e respostas para os problemas
colocados pela educação/formação dos adultos, embora mantendo-se muito permeável
a lógicas redutoras de modernização ou de simples gestão de recursos humanos (LIMA,
2005; LIMA e GUIMARÃES, p. 2018; ARJO, p. 2014) ou, então, procedendo a um
reajustamento desse referencial econômico da educação, pela integrão da
probletica da inclusão social e pelo discurso da igualdade de oportunidades que,
muitas vezes, tende a mascarar as desigualdades socias efetivamente existentes
(CORREIA, 1999, p. 99).
O debate em torno do «atraso» da alfabetização e da educação básica
O combate pela alfabetização da população portuguesa ocupou durante décadas e
décadas a atenção e os esforços de milhares de portugueses. Professores, intelectuais,
políticos, «militantes» da educação e da cultura, pessoas comuns, mobilizaram-se em
prol desta causa, por vezes perante a incompreensão, a indiferença e até a hostilidade
de determinados segmentos da sociedade. Também a discussão sobre as causas da
lentidão com que esse processo decorreu foi atravessando as diferentes épocas.
Argumentou-se com o desinteresse dos trabalhadores rurais e dos operários pela
instrução, esquecendo-se, tantas vezes, as suas duras condições de vida, a escassez
dos seus recursos, a necessidade frequente de recorrer ao trabalho infantil para a
sobrevivência das famílias, o cansaço após as longas jornadas de trabalho nos campos
e nas fábricas, que impedia ou desincentivava a ida à escola ou a participão em
atividades educativas; criticou-se (justamente, aliás) a atitude das «elites» políticas e
económicas por não terem apostado tão fortemente como deviam na «educação e
instrução do povo», não criando as condições necessárias para isso, ou mesmo
obstaculizando a sua integração nos processos educativos.
A este propósito, Alberto Melo fala de uma atitude de obscurantismo programado, como
forma de controlo social (2012, p. 383-384) e Licínio Lima acrescenta que essa postura
se revelou uma invariante estrutural que permanecerá sempre dominante (2005, p. 32);
chamou-se a ateão para a diferença de posicionamento das igrejas protestantes no
norte da Europa, que incentivavam a populão à leitura e da igreja católica romana, nos
pses do sul, que pouco fizeram pela sua promoção; mostraram-se os efeitos negativos
da instabilidade política que caracterizaram largos períodos da história portuguesa dos
séculos XIX e XX, marcados por invasões, guerras, revolões, mudanças de regime,
levantamentos populares e muitos outros acontecimentos que perturbaram o normal
funcionamento das instituições (mas nos outros países não parece que a situação tenha
sido muito diferente). Certamente que as causas para a morosidade do processo de
alfabetização e escolarização básica da população portuguesa reside nestas e noutras
razões. O facto de a sociedade portuguesa ter permanecido até à década de sessenta
uma sociedade predominantemente rural, apesar dos fenómenos de industrialização e
urbanização que foi experimentando, constitui também um fator apreciável neste aspeto.
No quadro de uma sociedade rural, a «pressão para a alfabetização faz-se sentir com
menor intensidade, já que a utilidade da alfabetizão ou da frequência escolar não
parecia repercutir-se de forma evidente no melhoramento da situação económica ou nas
possibilidades de mobilidade social dos camponeses e trabalhadores rurais.
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Pode-se afirmar que, no caso português, os processos de industrializão, urbanizão
e nível de educação caminham a par. Com isto, não queremos dizer que a ação do
Estado, as políticas públicas ensaiadas ou a ação dos movimentos cívicos em prol da
alfabetização e da educação popular, não produziram os seus efeitos, mais ou menos
eficazes, mas os resultados alcançados dependeram de um conjunto complexo de
fatores, de processos, de tendências, de movimentos de carácter económico,
demográfico, cultural e político, entrelando-se uns nos outros, que foram moldando a
evolução do ps (e da educação) e definindo os seus traços essenciais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como fomos referindo ao longo do texto, o curso histórico do processo de alfabetização
e educação básica da população portuguesa, para além de prolongado, foi sendo
realizado em situão de «atraso» face ao que acontecia na maioria dos pses
europeus e vivenciado por diversos setores da sociedade portuguesa com angústia e
dramatismo, vendo na persistência do analfabetismo e das baixas qualificações
escolares um sinal evidente da incapacidade do país para se desenvolver e modernizar,
económica, cultural e socialmente, e de criar uma sociedade mais equilibrada e justa
para o conjunto dos seus cidadãos. Para muitos dos intervenientes (individuais e
coletivos) que se empenharam e assumiram para si a tarefa de promover a alfabetização
e a educação básica, entre os adultos, esta não era de maneira nenhuma a única
questão relevante. De facto, em simultâneo com ela, e de acordo com as circunstâncias
históricas, como fomos assinalando ao longo do texto, outras causas se lhe foram
associando. A promoção de graus mais elevados de escolaridade, a intervenção cívica,
a intervenção política, a educação socioeducativa, a animação cultural, a recuperação
de tradições culturais, a formão para o trabalho, o desenvolvimento social, a luta pela
justiça social, constituíram «bandeiras» de muitos desses movimentos. Tratou-se,
efetivamente, ou como tal foi sentida por diversos desses protagonistas, de uma
«batalha» pelo progresso, pela cultura, pela liberdade e pela justiça social, que se foi
desenvolvendo década após década, e cuja memória merece ser reconhecida.
Hoje, vencida, em grande medida, a luta contra o analfabetismo e pela efetivação da
educação básica da população portuguesa, a educação de adultos continua a ter um
papel a desempenhar, confrontando-se com novos desafios. Numa sociedade que
tantas vezes se diz em crise, em processo de globalização ou mudança (para onde?);
em que os vínculos profissionais se precarizam e desumanizam; na qual os
conhecimentos e saberes de hoje correm o risco de perder valor no futuro próximo; em
que se diz vivermos num mercado competitivo de competências e qualificações, em que
cada sujeito é responsabilizado por se manter adaptável, flexível e competente, numa
corrida sem fim; em que a tecnologia informática, robótica ou biológica muda a face dos
contextos de vida do indivíduos, das modalidades do trabalho e da comunicão entre
as pessoas, de forma por vezes paradoxal; em que o verdadeiro e o falso de uma
informão sobrecarregada circula vertiginosamente, tornando mais difícil o seu
processamento; onde crescem os sinais de ansiedade e depressão individual e social;
onde se mantêm ou aumentam as velhas desigualdades sociais e novas o
aparecendo; onde crescem as ameaças à liberdade e à democracia e a intolerância e a
xenofobia se fazem sentir sob novas roupagens; em que a crise clitica se constitui
como ameaça existencial à humanidade, a educação de adultos, tal como no passado,
nas suas múltiplas formas de ação/intervenção, é colocada perante o desafio de
contribuir para o questionamento e reflexão destas questões, para o desenvolvimento
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dos indivíduos, dos grupos e das comunidades que aqueles integram, nas suas múltiplas
dimensões cognitivas, emocionais, educativas, profissionais, culturais e outras e de
ajudar, por essa via, no progresso social e na construção de uma sociedade mais justa
e equitativa. Ao mesmo tempo, uma educação de adultos para o tempo atual exige, do
nosso ponto de vista, a assunção de objetivos e modelos de organizão e
funcionamento abrangentes e diversificados, capazes de articular a educação formal e
não formal ou informal; a educação para o trabalho, mas também para a cidadania, a
participação e vivência democrática; a informação e o conhecimento mas, igualmente, o
estimulo à análise, à reflexão crítica e à promoção de práticas culturais emancipatórias,
essenciais para o desenvolvimento do indivíduo, da sua subjetividade e das
comunidades em que se insere. Uma reflexão que, partindo dos pressupostos de uma
análise crítica, contribua para a emergência de um “discurso da utopia realizável, que
permita dar visibilidade às práticas alternativas ao pragmatismo dominante (CORREIA,
1994, p. 7) e identificar os caminhos que se apresentam à educação de adultos no tempo
presente.
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Data da submiso: 08/05/2021
Data da aprovação: 18/05/2021