Trabalho & Educação | v.30 | n.2 | p.7-10 | maio-ago.| 2021
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https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
EDITORIAL: EDUCAÇÃO NO NOVO ESTÁGIO DA COVID-19
O primeiro semestre de 2021 foi marcado pelo avanço da vacinão contra a Covid-19
fruto de lutas pelo direito a saúde e, sobretudo à vida, e a esperaa do fim dessa
pandemia. Uma pandemia que asfixia no sentido mais amplo, pois vai desde a
impossibilidade de respiração biológica, até a respiração enquanto direito à vida, haja
vista o acirramento das desigualdades, o aumento da fome e das mortes,
especialmente dos(as) mais pobres. Finalmente os(as) professores(as) foram
incluídos(as) nos grupos prioritários, e, a conclusão do ciclo de vacinas para os(as)
profissionais da educação juntamente com os protocolos de seguraa, como exigido
pela categoria, podem possibilitar o retorno gradual das aulas.
A educação tem sido uma das áreas mais afetadas pela pandemia, gerando impactos
diretos na rotina das famílias brasileiras. As criaas e jovens tiveram que se manter em
casa em meio ao trabalho de seus familiares ou também trabalhando, no caso de jovens
que já exercem atividades laborais. Além disso, destacamos o clima de insegurança
quanto ao processo de ensino-aprendizagem e o aumento das desigualdades
educacionais no que se refere às estratégias de ensino adotadas (ou não) para suprir a
distância física necessária neste momento.
O Ensino Remoto Emergencial (ERE) consensualmente tem sido a modalidade adotada
nesta pandemia, estabelecendo o distanciamento físico de professores(as) e alunos(as),
e propondo usos e apropriações das tecnologias em substituição a aulas regularmente
presenciais. Pode ocorrer em horários similares aos que ocorriam no formato presencial,
através de webconferências (comunicão síncrona) ou através de atividades e
propostas programadas, com cada sujeito realizando em seu tempo e com um prazo
estabelecido (comunicão assíncrona) (ARRUDA, 2020, p. 266
1
).
No entanto, o ERE não foi realidade para a maior parte das crianças e jovens
matriculados(as) em escolas públicas brasileiras. Questões como falta de acesso à
internet, falta de computadores com bom desempenho e falta de capacitação dos(as)
professores(as) para o ensino mediado por tecnologias, proporcionaram um apagão no
ensino para grande parte desse público escolar durante a pandemia.
Os dados de 2019, apresentados no relatório da PNAD Contínua intitulado Acesso à
Internet e à televisão e posse de telefone móvel celular para uso pessoal 2019
2
já
ilustravam a desigualdade de recursos tecnológicos entre os(as) alunos(as) da rede
pública e privada: 83,7% usavam a internet na primeira, e 98,4% na segunda,
considerando o Brasil (IPEA, 2020, s/p). Quando se leva em conta as questões regionais,
esses números são bem menos expressivos. Nas regiões Norte e Nordeste, 68,7%
dos(as) estudantes de escolas públicas e 77% dos(as) estudantes das escolas privadas
tiveram acesso à internet (idem).
1
ARRUDA, Eucidio Pimenta. Educação remota emergencial: elementos para políticas públicas na educação
brasileira em tempos de Covid-19. EmRede-Revista de Educação a Disncia, v. 7, n. 1, p. 257-275, 2020.
2
https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=36560
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Em agosto de 2020, o IPEA lançou a nota técnica Acesso Domiciliar à Internet e Ensino
Remoto durante a Pandemia
3
, e a partir das fontes de dados do PNAD/IBGE, e do
Censo da Educação Básica, Censo da Educação Superior referentes a 2018, portanto,
um pouco mais antigos. O cruzamento dessas diferentes fontes de dados permitiu
calcular aproximadamente a população sem acesso à internet em banda larga ou 3g/4g
em seu domicílio, considerando o nível ou etapa de escolarização, naquele ano: na Pré-
escola, 800 mil alunos(as), sendo que cerca de 720 mil eso em instituições públicas de
ensino; no ensino fundamental anos iniciais, 2,40 milhões, sendo 2,32 milhões de
escolas públicas; nos anos finais, 1,94 milhões, sendo 1,91 milhões pertencentes à rede
pública; e no ensino médio, até 780 mil, sendo 741 mil em instituições pública (IPEA,
2021). Estes dados mostram que, da população sem acesso à internet móvel ou fixa, a
esmagadora maioria dos(as) estudantes fazem parte da rede pública de ensino.
O estudo Cerio da Exclusão Escolar no Brasil um alerta sobre os impactos da
pandemia da Covid-19 na Educação
4
, realizado pela UNICEF, mostrou que, em
novembro de 2020, mais de 5 milhões de crianças e adolescentes não tiveram acesso à
educação no Brasil. Deste total, 1,5 milhões não frequentavam a escola e 3,7 estavam
matriculados(as), mas não tiveram acesso às atividades (UNICEF, 2021, s/p). Como
será o futuro das crianças e jovens que tiveram defasagem escolar causada tanto pelo
contexto da pandemia, quanto pelo negligenciamento do direito a educação blica? Se
nada for feito, veremos o aumento da desigualdade social a níveis ainda mais alarmantes
nos próximos anos.
Mesmo com o avanço da vacinação (ainda aquém da necessidade), não vemos sinais
de fim da pandemia, já que novas variantes têm surgido, os protocolos de seguraa
ainda têm sido desrespeitados por alguns e, especialmente a ausência de políticas e
propostas, no âmbito federal, com foco na saúde da população.
A mudança paradigmática para o uso de tecnologias na educão já tem sido discutida
desde o final do século XX. No ensino público, fica o desafio de investimento em políticas
públicas que permitam o acesso às redes de banda larga e móveis para toda a
população, em especial em idade escolar; bem como de fornecer condições para que a
educação pública avance na consolidão deste novo paradigma, capacitando
profissionais da educão para o uso de tecnologias e equipando as escolas com
suportes tecnológicos adequados ao cenário covid e pós-covid.
É com essas e tantas outras inquietações que publicamos a presente edição de Trabalho
& Educação.
Abre a seção de ARTIGOS o texto de Jorge Moreira; José Alberto Correia e João
Caramelo, ALFABETIZAÇÃO E EDUCAÇÃO BÁSICA: UMA DIMENSÃO CENTRAL DA EDUCÃO DE
ADULTOS EM PORTUGAL. Os autores apresentam uma análise do processo de
alfabetizão e educação básica dos adultos em Portugal, no período que decorre entre
os anos trinta do século XIX e meados da década de oitenta do século XX, para tanto,
partem de um marco teórico que reconhece a impossibilidade de uma educação neutra
3
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101794_informativo.pdf
4
https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/criancas-de-6-10-anos-sao-mais-afetadas-pela-
exclusao-escolar-na-pandemia
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ou apolítica, situando-se numa perspectiva crítica relativamente a perspectivas
pedagogistas, economicistas ou meramente gestionárias do fenômeno educativo.
Em seguida, temos a contribuição de Cédric Lomba, DESESTABILIZAÇÕES E
APRENDIZAGENS DO SINDICALISMO BELGA NAS REESTRUTURAÇÕES PERMANENTES, em uma
ótima tradução de Rafael Fermino Beverari. O artigo analisa as práticas e reações dos
coletivos sindicais no contexto de reestruturações permanentes da instria europeia
desde 1975. Parte-se do caso da indústria siderúrgica belga, onde as fábricas passaram
por repetidos planos de redução de mão-de-obra, mas onde a taxa de sindicalização se
manteve muito alta.
Érica Lui Reinhardt e Frida Marina Fischer, em SONOLÊNCIA E FADIGA EM TRABALHADORES
DIURNOS E NOTURNOS, nos brindam com uma interessante discussão. O objetivo do artigo
foi avaliar a duração do sono, sonolência, fadiga e outras variáveis entre trabalhadores
diurnos e noturnos. Os resultados da pesquisa confirmam a associação do trabalho
noturno com prejuízos ao sono, sonolência e fadiga. Más condições de trabalho
associaram-se a níveis mais elevados de estresse, maior sonolência e fadiga. As
autoras, por fim, recomendam que as avaliações em segurança e saúde do trabalho
incluam análises de sono, sonolência e fadiga e de outros fatores relacionados à
organização do trabalho.
Elaine dos Santos Pinto e Aline Grunewald Nichele, em EDUCAÇÃO SANITÁRIA EM
DEFESA AGROPECUÁRIA: ENTRELAÇAMENTOS COM A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E
TECNOLÓGICA E A EDUCAÇÃO POPULAR EM SAÚDE, buscaram estabelecer um diálogo
entre as bases conceituais da Educação Profissional e Tecnológica (EPT),
principalmente referentes aos conceitos de trabalho como princípio educativo e a
formão humana integral, e o campo da Educação Popular em Saúde, ressaltando os
pontos de interseção entre as duas bases teóricas, a fim de observar seus
desdobramentos para a Educação Sanitária em Defesa Agropecuária.
Em SOBRE O TRABALHO E A APRENDIZAGEM DO PROFESSOR: UMA CONTRIBUIÇÃO DA
VERTENTE FRANCESA DE DITICA PROFISSIONAL, Francisco Regis Vieira Alves nos
esclarece que a Didática Profissional permite a identificação de um cenário importante,
visando um exame pormenorizado da aprendizagem do professor e uma compreensão
qualitativa de sua atividade e da competência profissional. Por fim, o artigo visa
disseminar um viés de análise e pesquisa ainda pouco conhecido em território brasileiro.
O artigo de Mariana Ramos de Melo, Mônica de Fatima Bianco e Priscilla de Oliveira
Martins Silva, PROBLEMÁTICAS NO TRABALHO DOCENTE BRASILEIRO: UMA REVISÃO DE
LITERATURA NA PERSPECTIVA ERGOLÓGICA, objetivou identificar as principais problemáticas
vivenciadas no trabalho docente em estudos recentes brasileiros de perspectiva teórico-
analítica ergológica. Para tanto, procedeu-se com uma revisão integrativa de literatura e
o quadro teórico utilizado baseou-se em pressupostos e conceitos advindos da
Ergologia.
Em PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM NAS PRECEPTORIAS EM SAÚDE PERCEPÇÃO E
ADAPTAÇÃO DE RESIDENTES MULTIPROFISSIONAIS, Karina Cicarelli e Camila Mugnai Vieira
analisaram as percepções de residentes sobre o processo de ensino e aprendizagem
em sua formação nos cenários de prática e sua adaptação ao mesmo.
José Aravena Reyes em RUMO A UMA FORMAÇÃO SOCIAL DO ENGENHEIRO: CRÍTICA ÀS
NOVAS DIRETRIZES CURRICULARES DE ENGENHARIA propõe uma discussão crítica no
espo estabelecido entre o modelo de sociedade que implicitamente consideram as
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diretrizes e as demandas por uma ampla formação social dos engenheiros, para
favorecer o desenvolvimento adequado dessas competências, ditas comportamentais.
Partindo do pressuposto de que a atividade realizada pelos professores emerge de
conflitos psíquicos subjacentes, o artigo ATIVIDADES DIDÁTICAS IMPEDIDAS E DILEMAS DE
ENSINO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA de Marcos Godoi; Cecilia Borges e Yannick
Lémonie analisa as atividades didáticas impedidas ou suspendidas, bem como os
dilemas de ensino na educação física.
No artigo ESCOLA VIVA: IMPLEMENTAÇÃO DOS INTERESSES DO BLOCO NO PODER NO ESTADO
DO ESPÍRITO SANTO Fernando de Oliveira
Leal e Marcelo Lima analisam como a
construção do projeto educacional, denominado Escola Viva” (forma antecipada de
reforma do ensino médio ainda em 2015) de viés privatista e gerencialista se articula com
os interesses e métodos de determinadas frações de classe.
Em A CONCEPÇÃO DE CURRÍCULO NOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA Antonio
Wherbty Ribeiro Nogueira; Ana Cristina de Moraes; e Antônia Solange Pinheiro Xerez
analisaram as conceões curriculares que fundamentam a educação superior
tecnológica na atualidade. A discussão justifica-se pela crescente oferta dos cursos de
graduação tecnológica no âmbito nacional e de seus programas curriculares voltados
para a formação de trabalhadores especializados em nível superior, identificados como
tecnólogos.
ANÁLISE DE CONTEÚDO SOBRE AS DEFINIÇÕES DE COMPETÊNCIA, COMPETÊNCIA DIGITAL E
COMPETÊNCIA DIGITAL DOCENTE, de Daiane Padula Paz Edilson Pantarolo Gilson Ditzel
Santos e Maria de Lourdes Bernartt, buscou identificar definições de competência,
competência digital e competência digital docente, no campo da educação, presentes
em publicações de relevância acadêmica internacional; analisar de forma quantitativa as
contribuições sobre estes temas em um corpus selecionado de referências da área; e
elaborar definições próprias sobre competência, competência digital e competência
digital docente sob um ponto de vista educacional.
Finalmente, convidamos os(as) leitores(as) a verificarem a seção RESUMOS onde
publicamos e, serve de convite à leitura, os resumos de duas teses de doutorado e duas
dissertões de mestrado.
Desejamos uma boa leitura a todos(as)!
Marcela Rosa de Lima Machado
5
Yara Elizabeth Alves
6
5
Pedagoga e Mestra em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais
(FaE/UFMG). Atualmente cursa o Doutorado em Educação pela mesma Universidade. E-mail:
marcelarlm@gmail.com.
6
Doutora e Mestre em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais
(FaE/UFMG). Graduada em Pedagogia pela FaE/UFMG. Pesquisadora do Observatório Nacional do
Sistema Prisional (ONASP). E-mail: yaraealves@gmail.com.