modo de ser e de viver do camponês precisa ser valorizada e que a educação precisa
acontecer em diálogo com essa realidade protagonizada pelo sujeito camponês.
Nessa perspectiva, o que o acesso à escola formal pelos trabalhadores poderia
representar? Com certeza, ameaça à manutenção do poder e à dominação imposta
pelas elites, uma vez que o conhecimento se torna fator essencial na manutenção das
riquezas e isso é um privilégio da elite para que obtenha enriquecimento às custas da
exploração da mão de obra do trabalhador. “Qualquer forma de educação que
monopoliza os saberes para fins civilizatórios resulta tão somente num processo dado,
terminado; preocupa-se em apenas cuidar de sua continuidade e manutenção, a fim de
configurar e legitimar o poder.” (BERTICELLI; RAMLOW. 2018, p. 75).
Para a população camponesa, a oposição caneta versus enxada resulta em amargas
consequências, portanto é no campo que se intensifica a desigualdade no acesso aos
serviços públicos, como exemplo o descaso ao direito à escola pública de qualidade.
Para o campo, são destinados crescentes investimentos com vistas ao superávit na
produção agropecuária, mantendo o foco no agronegócio, na monocultura, na produção
desmedida, sem a mínima preocupação com o esgotamento dos recursos naturais. A
preocupação do agronegócio consiste em produzir e gerar lucros em detrimento à
qualidade e aos direitos de quem ali trabalha. A lógica do capitalismo é investir no lucro
e não nas pessoas, pouco importando o que pensam ou do que necessitam essas
pessoas.
Alguns fatores são determinantes na Educação do Campo, dentre estes: a ausência de
escolas, a precarização nas estruturas, a distância percorrida pelos estudantes e o
emprego do modelo urbanocêntrico na formação escolar. Esses fatores inviabilizam a
compreensão do jovem camponês no sentido de entender como o estudo pode contribuir
para a mudança de sua realidade e, além disso, há o fato de que a contribuição por meio
de seu trabalho na propriedade familiar é uma necessidade para a sobrevivência, sendo
esses alguns indicadores dos motivos que o levam à evasão escolar.
Outra consequência é o êxodo rural, visto que dirigir-se a um centro urbano para dar
prosseguimento nos estudos ou buscar um emprego ocasiona o abandono da família na
propriedade. Com situação similar de descaso do Estado frente às necessidades de vida
e sobrevivência no campo, na década de 1930, na França, famílias camponesas
enfrentavam os mesmos entraves, ou seja, restrição no acesso aos serviços básicos ou
até mesmo inexistência deles, como, por exemplo, a educação. Essa situação gerava
um grande desestímulo nos jovens daquelas localidades, pois frequentar as escolas na
zona urbana significava afastar-se de suas famílias e do trabalho na propriedade e
estudar obedecendo a um currículo incompatível à realidade vivida por eles, realidade
que impõe conhecer as questões agrárias que envolvem o campo à sua dinâmica social.
Nesse contexto, em 1935, um grupo de agricultores familiares, juntamente com o padre
Abbé Granereau, preocupados com a situação de acesso e de incompatibilidade da
aprendizagem recebida pelos jovens camponeses na escola urbana, organizaram a
primeira experiência de pedagogia da alternância, num sistema de Maisons Familiales
Rurales. Essa experiência teve início com um pequeno grupo de jovens que estudava
na casa paroquial auxiliados pelo padre, por meio de correspondências, durante uma
semana. Depois disso, vivenciavam o ensino durante três semanas no trabalho da
propriedade, em companhia de suas famílias.
Esse modelo tinha como característica central um ensino voltado para as especificidades
da vida do campo, distinguindo-se daquele modelo ofertado pelas escolas urbanas.