|146| Trabalho & Educação | v.31 | n.3 | p.146-161 | set-dez | 2022
https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
DOI: https://doi.org/10.35699/2238-037X.2022.41563
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“There were multiple requirements without support”: organization and working conditions in
primary and secondary education during the covid-19 pandemic
PASSINI, Eduardo Souza2
MAKEWITZ, Gabriela Gomes3
DIAS, Fernanda Gomes4
GIONGO, Carmem Regina5

Este estudo possui o objetivo de descrever e analisar as transformações provocadas pela pandemia
de COVID-19 na organização e nas condições de trabalho de docentes da educação básica no Rio
Grande do Sul. Trata-se de uma pesquisa exploratória de metodologia mista, que contou com a
participação de 686 professores. A coleta de dados foi realizada entre junho e outubro de 2021, de
forma online, através de questionários e entrevistas semiestruturadas. Os dados foram submetidos à
análise estatística descritiva e à análise temática. No momento da pesquisa, 53,5% dos participantes
estavam exercendo atividades parcialmente presenciais e parcialmente remotas. Os docentes
declararam estar trabalhando mais (85,6%), realizando mais horas extras (79%), com algum tipo de
dificuldade em planejar e executar as atividades à distância (87%) e com dificuldades na utilização
de ferramentas virtuais requeridas na realização de seu trabalho (80,4%). Todavia, apenas 43,1%
tiveram formação promovida pela instituição de ensino. Os dados coletados evidenciaram um
contexto laboral marcado pela sobrecarga de trabalho e pelo frágil suporte institucional. Concluiu-
se que são necessárias políticas públicas de atenção à saúde do trabalhador na educação básica,
fortalecendo os coletivos de trabalho e as ações de suporte aos docentes.
 Professores. Saúde Mental. Trabalho. COVID-19.
Trabalho inédito, não foi apresentado ou publicado, anteriormente, em encontros e/ou outros eventos
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Provocadas pela Pandemia do Novo Coronavírus: um olhar sobre a saúde de trabalhadores e trabalhadoras
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5 
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
This study aims to describe and analyze the changes caused by the COVID-19 pandemic in
both organization and working conditions of primary and secondary education teachers in Rio
Grande do Sul, Brazil. A total of 686 teachers took part in this exploratory research with a mixed
methodology. Data collection was performed online between June and October 2021, through
questionnaires and semi-structured interviews. Data were submitted to descriptive statistical
analysis and thematic analysis. At the time of the survey, 53.5% of the participants were performing
their activities partially on-site and partially remotely. The teachers indicated that they were working
more (85.6%), doing more overtime (79%), having some difficulties in planning and implementing
activities remotely (87%), and having difficulties in using the virtual tools required to perform their
job (80.4%). Nonetheless, only 43.1% of them had been trained by the educational institution.
The data collected revealed a work environment marked by work overload and poor institutional
support. It has been concluded that occupational health public policies are necessary in primary and
secondary education to strengthen work groups as well as support actions on behalf of teachers.
 Teachers. Mental Health. Work. COVID-19.

O mundo enfrenta, desde dezembro de 2019, uma das maiores crises sanitárias já
registradas em esfera mundial. A doença COVID-19, causada pelo novo coronavírus
         
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dos períodos mais difíceis já enfrentados pela saúde pública internacional, em que
mais de 6,5 milhões de mortes por COVID-19 foram registradas. Dois anos depois,
mesmo diante da vacinação e de novas medidas de proteção, ainda são vivenciados
grandes picos de contágio da doença (WHO, 2022).
Como estratégia de enfrentamento à pandemia de COVID-19, foram adotadas
drásticas medidas de biossegurança, como o isolamento e o distanciamento social,
impactando diretamente, para além da saúde, os contextos sociais, culturais,

se tornaram necessárias para evitar a propagação do vírus (GALLASCH et al.,
2020). Dentre essas transformações, destacam-se o fechamento de fronteiras, a
restrição de eventos públicos, a suspensão de aulas presenciais, a proibição do
funcionamento de estabelecimentos comerciais não considerados essenciais e a

No que se refere ao sistema de educação e as novas práticas criadas para o
enfrentamento da pandemia, a imprevisibilidade provocada pelo alto contágio e
transmissão do vírus fez com que o fechamento parcial ou total das escolas afetasse
mais de 90% dos estudantes em escala global, segundo a Organização das Nações
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as primeiras medidas de segurança se deram através do fechamento das escolas
e universidades, com a instauração de portarias que garantiram o seguimento de
aulas por meio da modalidade remota emergencial, permitida pela Lei de Diretrizes
de Bases da Educação (BRASIL, 2020).
Dessa forma, a partir da legalidade do ensino remoto emergencial, a rotina docente

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buscassem novos formatos de ensino, utilizando-se de recursos digitais e tecnológicos
para dar continuidade às aulas em ambientes virtuais, muitas vezes sem o preparo
e capacitação adequadas para tais mudanças no trabalho (MARTINS et al., 2021).
           
improvisando equipamentos e formas de atender seus alunos através de longos
períodos de formação para a prática de propostas pedagógicas remotas. Além disso,
vivenciou-se de maneira mais intensa uma indissociabilidade entre o trabalho doméstico
           
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
obrigações incorporassem o ambiente doméstico e as relações familiares.

não somente os professores, mas também o acesso à educação pelos próprios
       
pelos órgãos de gestão fossem muitas vezes inviabilizadores de uma prática
         
desenvolvimento pedagógico dos alunos e torná-los participativos. Para tanto, além
da maior disponibilidade de tempo exigida no processo de planejamento das aulas e
correção de trabalhos nesta modalidade, os professores ainda precisaram organizar
na sua rotina momentos para atendimentos individuais aos alunos e familiares

Além disso, de modo semelhante à imprevisibilidade provocada pela pandemia e
pela migração para o trabalho remoto, o retorno às aulas presenciais na maior parte
das cidades brasileiras também ocorreu em condições epidemiológicas inadequadas

no número de contratos de trabalho encerrados por motivo de morte no setor da
educação entre janeiro e abril de 2021, em relação ao mesmo período no ano anterior,
segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos
(DIEESE). Nos subgrupos de ocupação, esse aumento foi de 137% em professores
da Educação Infantil e Fundamental e de 258% em professores do Ensino Médio.
Apesar do levantamento não apontar as causas das mortes, o aumento no número de
desligamentos foi mais acentuado nas regiões com maiores taxas de mortalidade por
COVID-19 (DIEESE, 2021). No Rio Grande do Sul, por sua vez, foram registrados,
até julho de 2021, 3,7 mil casos da doença apenas em escolas estaduais, desde a
reabertura das instituições em maio de 2021 (GALLISA, 2021).
O planejamento do retorno à presencialidade da comunidade escolar deve estar

          

e do acolhimento institucional frente aos medos e angústias inerentes ao contexto
  et al., 2020). Assim, foram evidenciadas demandas de
maior coordenação entre gestões de nível municipal, estadual e federal e da



impactos associados ao luto, insegurança e medo, além do próprio contágio (PLÁ,
2020). Em relação aos professores, esses fatores podem se agravar ao articularem-se
com a organização e as condições de trabalho pouco adequadas, caracterizadas por
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aumentos na carga horária, indisponibilidade de recursos, frágil suporte institucional

Para Dejours (2004), o conceito de organização do trabalho está atrelado aos aspectos
da divisão do trabalho e da divisão dos seres humanos. A divisão do trabalho está
relacionada ao escopo de atuação dos trabalhadores, ao modo como as atividades são
organizadas, ao ritmo, à repartição e às prescrições de modo geral. Já a divisão dos


o grau de autonomia, as possibilidades de cooperação e comunicação, as relações de

organização do trabalho é diferenciada das condições de trabalho, sendo o segundo
            
mesmo, as condições de saúde, segurança e higiene no trabalho. De acordo com

a organização do trabalho atua no nível do funcionamento psíquico. Portanto, esta

sendo também responsável pelo estado de saúde mental de seus integrantes.
Mesmo em um período anterior à pandemia, pesquisas já apresentavam dados
preocupantes em relação ao adoecimento mental de professores decorrente de

     et al., 2018). Com a pandemia,
revela-se uma nova conjuntura de trabalho que acentua os agravos à saúde mental

et al. (2020) apontaram para a depressão e a ansiedade como as alterações mais
frequentes na saúde mental dos docentes e indicaram que a maior parte desses
trabalhadores estavam preocupados com a exposição ao novo coronavírus. Nesse
sentido, a literatura destaca a constante sobrecarga dos docentes, em que há a
necessidade de se reinventarem e planejarem novas metodologias de ensino, sem
considerar, no entanto, as contradições das condições trabalhistas, estruturais e

Diante das argumentações tecidas, são diversos os impactos gerados no trabalho
docente e, consequentemente, na forma de viver e adoecer desses trabalhadores. Além
disso, tais efeitos repercutem diretamente na conjuntura de oferta e acesso de um ensino
de qualidade à população, de modo a acentuar o cenário de desigualdades já existente
na educação oferecida no Brasil. Frente a essas adversidades, cabe destacar que as

deste modo, analisar a organização do trabalho e as condições de trabalho dos docentes

o desenvolvimento de ações capazes de intervir nas situações que estejam gerando

como objetivo descrever e analisar as transformações provocadas pela pandemia de
COVID-19 na organização e nas condições do trabalho docente, compreendendo as

M
Este estudo possui um delineamento descritivo, transversal, de metodologia mista.
Nesta abordagem, caracterizada pela coleta e análise de dados quantitativos e
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qualitativos em uma única pesquisa, o pesquisador integra as duas formas de dados
concomitantemente, combinando-os de modo a facilitar a compreensão do problema

Participaram deste estudo 686 docentes da educação básica, do Estado do Rio Grande
do Sul. De acordo com a Tabela 1, os participantes tinham em média 45 anos (DP:
9,85), sendo compostos em sua maioria por mulheres (83,9%), brancas (90,4%), que
tiveram acesso à pós-graduação (77,3%). Foram considerados os seguintes critérios


          
Assim como foram considerados como critérios de exclusão: não consentimento


 
 n %
Mulher 575 83,9%
Homem 110 16,0%
 1 0,1%
 n %
Especialização 408 59,5%
Ensino Superior Completo 138 20,1%
Mestrado 106 15,5%
Doutorado 16 2,3%
Ensino Superior Incompleto 15 2,2%
Ensino Médio Completo 3 0,4%
 n %
Branca 620 90,4%
Parda 39 5,7%
Preta 20 2,9%
Amarela 4 0,6%
Indígena 3 0,4%
 Elaborado pelos autores (2022).
Como instrumentos de coleta de dados quantitativos, foram aplicados um questionário
        

que avaliou as condições e a organização do trabalho dos docentes. Além disso, como

um modelo que, apesar de possuir um roteiro prévio, o entrevistado tem a possibilidade
de falar livremente sobre o assunto investigado (MINAYO, 2006). A entrevista foi

transformações do contexto laboral provocadas pela pandemia de COVID-19.
Trabalho & Educação | v.31 | n.3 | p.146-161 | set-dez | 2022 |151|
A pesquisa foi realizada entre junho e outubro de 2021, de forma online, uma vez que
esta estratégia era a mais recomendada no cenário de distanciamento social vivido
pela sociedade no momento da coleta de dados. Neste sentido, a coleta foi realizada
em duas etapas principais: a) aplicação dos questionários através da plataforma
virtual Google Forms, em que a disponibilização e divulgação ocorreu através
das redes sociais, com a ajuda de sindicatos, instituições escolares, associações
           
semiestruturadas através do Google Meet. Os professores que sinalizaram
interesse em participar de outras etapas da pesquisa, deixaram seus contatos ao

pelos integrantes do grupo de pesquisa. A partir do aceite dos docentes, foram
realizadas entrevistas individuais, com duração média de uma hora. Os encontros
foram gravados e transcritos na íntegra, com a concordância dos entrevistados e
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Os participantes receberam explicações sobre todos os procedimentos éticos de

qualquer momento sem causar qualquer prejuízo, a possibilidade de contatar os
     
que consentiram em participar da pesquisa assinaram, por meio digital, o TCLE. O

          
estudo está de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas
Envolvendo Seres Humanos (Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016) do Conselho
Nacional de Saúde (CNS), e com as Normas do Conselho Federal de Psicologia
(Resolução CFP Nº 016/2000, de 22 de dezembro de 2000).
A técnica utilizada para a análise dos dados qualitativos foi a análise temática, que
consiste em delimitar os núcleos de sentido que integram o processo de comunicação,
      
para o objeto analítico (MINAYO, 2016). Do ponto de vista operacional, essa análise

tratamento e interpretação dos dados. Além disso, os dados quantitativos obtidos
por meio do questionário foram submetidos à análise estatística descritiva, por meio


Os trabalhadores participantes da pesquisa são compostos, em sua maioria,
por pessoas que possuem vínculo empregatício exclusivamente em uma única

e que trabalham na rede pública estadual de ensino (57,7%). Além disso, de acordo
com a Tabela 2, a maioria dos trabalhadores (64,3%) atuaram predominantemente
em home oce ou teletrabalho durante a pandemia, apesar de que, no momento
de participação da pesquisa, 53,5% já estavam exercendo atividades parcialmente
presenciais e parcialmente remotas.
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 
: n %
Com atividades híbridas 367 53,5%
Trabalhando presencialmente 170 24,8%
󰀩 131 19,1%
Afastado(a) do trabalho por motivo de doença 17 2,5%
Aposentado(a) 1 0,1%
 n %
󰀩 441 64,3%
Com atividades híbridas 219 31,9%
Trabalhando presencialmente 18 2,6%
Afastado(a) do trabalho por motivo de doença 6 0,9%
Desempregado(a) 2 0,3%
 Elaborado pelos autores (2022).
Diante dessas novas modalidades do trabalho docente, marcadas pela demanda de
atividades que, ora presenciais, ora remotas, os dados coletados evidenciaram um
contexto laboral descrito, essencialmente, por sobrecargas de trabalho. Destaca-
se, assim, que 85,6% dos participantes declararam estar trabalhando mais e 79%
estavam realizando horas extras, ao passo que apenas 14,7% estavam realizando
mais intervalos. Da mesma forma, em relação à jornada de trabalho, 41,3 %
dos professores estavam trabalhando mais de 40 horas semanais. As falas dos
entrevistados expressam esse panorama:
Durante a pandemia a gente triplicou nosso trabalho, acho que todos são unânimes
quando falam sobre isso, na questão de trabalho, de envolvimento com aluno, de prazo,
de inúmeras planilhas solicitadas pelas escolas que não tem fundamento nenhum, é
apenas uma burocracia interna (Entrevistada A.).
             
em casa, era tudo muito complicado, em casa tu não tem horário pra trabalhar né.
Trabalhava das 8h ou 9h da manhã até 00h, tinha pais ali que te chamavam 10h ou 11h
da noite, então realmente o fato de voltar para a escola não me incomodou. Claro que
tive um pouco de medo pela questão do contágio, mas a questão do trabalho fora de
hora me incomodava mais, pois era muita coisa: planejamento pros alunos que estavam
           
alunos que não iam frequentar a escola e permaneciam no remoto… (Entrevistada B.).
E eu sempre fui uma pessoa muito participativa, muito, muito, muito. Aí no remoto essa
participação ela realmente foi progressão geométrica, porque daí tudo demandou muito
mais. Então, aquilo que eu já estava participando presencial parece que eu faço muito
mais coisa, mas, no entanto, não é, se vai botar no papel, não é tanta coisa assim
(Entrevistada C.).



Trabalho & Educação | v.31 | n.3 | p.146-161 | set-dez | 2022 |153|
requeridas na realização de seu trabalho. Ainda sobre o uso dos recursos digitais,
89,6% dos participantes declararam que a própria instituição de ensino indicou as
ferramentas a serem utilizadas, todavia menos da metade (43,1%) tiveram formação
ou orientação promovidas pela instituição. Soma-se a isso, como observado nas
entrevistas, o pouco apoio institucional oferecido a esses trabalhadores associado

nenhuma contrapartida, era o mínimo, sabe? Eu não sabia usar o Meet, eu nunca
usei Meet e eu tinha que dar aula pelo Meet, mas ninguém me ensinou, não me
mandaram nem um vídeo tutorial” (Entrevistada E.).
Foi tudo meio na marra, aprender sozinho. Foi imposto o atendimento pelo telefone
e não podia ser utilizado o nosso número pessoal, então eu tive que sair na loucura
da pandemia, comprar um chip novo com o meu dinheiro pra fazer atendimento pelo
celular. Era imposição sem suporte. Teve dias em que eu me encontrava tão estressada,
que eu ligava o computador e só conseguia chorar na frente da tela (Entrevistada B.).
Além disso, como indicado na Tabela 3, 82,6% dos professores sofreram alterações
nas atividades exercidas, 63% tiveram benefícios reduzidos e mais de um terço (34,5%)
sofreram reduções salariais. No que tange às estratégias de apoio aos trabalhadores
diante de tais mudanças, 51,6% referiram receber apoio sindical e 47% possuíam

 
 
n % n %
Possui equipamentos de proteção? 458 75.3% 150 24.7%
Sua carga horária de trabalho foi reduzida? 59 8,8% 612 91,2%
Sua remuneração foi reduzida? 232 34,5% 440 65,5%
Suas atividades foram alteradas? 561 82,6% 118 17,4%
Seus benefícios foram reduzidos? 419 63% 246 37%
Recebe apoio sindical? 312 51,6% 293 48,4%
Possui canal de comunicação ou apoio da instituição frente às
 291 47% 328 53%
 Elaborado pelos autores (2022).
Em relação aos recursos materiais oferecidos pelas instituições aos professores,
metade dos participantes (50,1%) tiveram acesso a computadores disponibilizados.
Apesar disso, outros equipamentos ou recursos foram minimamente distribuídos aos




trabalho, e nunca vista como um apoio, não havia essa característica de acolhimento,
não havia um ambiente para que se desenvolvesse esse acolhimento que tanto a
gente precisou nesse período” (Entrevistada A.). Outra participante complementa:
|154| Trabalho & Educação | v.31 | n.3 | p.146-161 | set-dez | 2022

escola mais preocupada com questões administrativas [...] A questão da pandemia,
também, com esse apoio da higienização, do uso da máscara, também não tem. A

professoras fazer isso (Entrevistada F.).
As falas dos entrevistados, ainda, demonstram esses agravos ocupacionais
          
poder fazer as coisas, porque eles [equipe diretiva] chamavam toda hora para
reuniões. Então foi uma carga excessiva de trabalho e por conta disso eu tive um

vi adoecendo, pois eu não dava mais conta de tudo, não dava conta de preencher
documentação, de fazer chamada, de fazer planejamento, enviar coisas, corrigir”


ó, eu tenho vontade de chorar, tem vez que eu tenho vontade de chorar, entendeu?”
(Entrevistada C.). Além disso, outro participante corrobora a discussão:
            


A gente tem muito esse negócio, né? O trabalho aliado à realização da vida. Com certeza.

          
49,4% dos participantes alegaram continuar convictos acerca de sua escolha



Aí tu perguntou, assim, se teve alguma perda, alguma coisa. Não, eu não tive nenhuma
perda, eu não morri, não morreu ninguém ou não perdi ninguém, eu não perdi dinheiro,
não perdi o emprego, eu não perdi nada… Mas eu perdi o tesão de dar aula, perdi o vício
de ser professora e isso está me matando (Entrevistada C.).


nesse momento, por mais contraditório que parecesse, a minha opção era sair. Quando

a gente acredita, eu disse isso pros meus alunos no meu último dia: ‘Eu não deixei de

participar da entrevista, porque é uma forma de nos ouvirem (Entrevistada A.).

A organização do trabalho na educação básica no contexto da pandemia de COVID-19
pode ser caracterizada pela sobrecarga laboral, demandando maior dedicação ao
trabalho, redução das pausas e intervalos e aumento da conexão dos professores
às redes sociais e ferramentas de comunicação com os alunos, familiares e colegas.

uso de recursos digitais que antes não faziam parte do trabalho docente tornou-
se essencial para viabilizar as práticas educativas, mas também representou um

Trabalho & Educação | v.31 | n.3 | p.146-161 | set-dez | 2022 |155|
preparados para o uso de alguns recursos digitais. Dados similares aos achados
neste estudo foram encontrados em outras pesquisas realizadas, como a falta de
apoio institucional frente à formação necessária para o uso dos novos mecanismos

O frágil apoio institucional relatado pelos participantes perpassa aspectos relacionados
à formação e ao uso adequado de ferramentas digitais, mas também se materializou na


adequados. No que se refere ao papel sindical, mais da metade dos participantes
contaram com apoio das entidades, fator que pode ter impedido uma situação ainda
mais grave de precarização e perda de direitos dos trabalhadores, além de representar
um importante fator de proteção à saúde e fortalecimento da categoria. Cabe salientar

11,2% dos trabalhadores brasileiros são sindicalizados (IBGE, 2019).
Apesar da presença e apoio sindical, observou-se que a extensão da jornada de
trabalho e da sobrecarga laboral evidenciada não foi reconhecida do ponto de vista
salarial, já que muitos participantes tiveram sua remuneração e benefícios trabalhistas
reduzidos. Esses fatores se agravam, sobretudo, frente à necessidade de adaptação
ao cenário doméstico para atender as demandas de trabalho, muitas vezes sem as

um escritório ou espaço já existente, salas de estar, quartos e mesas de jantar foram

2021). Essa migração no contexto de trabalho, atrelada à indisponibilidade de

trabalhadores, uma vez que os custos dos recursos materiais necessários para o

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na migração do ensino presencial para o remoto, pois não foram preparados
para lidar com os recursos digitais e sofreram impasses para planejar e executar
atividades de ensino à distância. Diante disso, diversos relatos apontaram para

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e professoras, palavras como ansiedade, cansaço mental, insegurança e estresse
demonstraram o adoecimento gerado frente ao seu contexto laboral. Corroborando
esses achados, Saraiva, Traversini e Lockmann (2020) reforçam que os sentimentos
gerados diante das rápidas adaptações, a ansiedade gerada pelas condições


pesquisa realizada com gestores de escolas públicas estaduais de Porto Alegre
evidenciou que os professores estavam mais sobrecarregados e vivenciando
sentimentos de medo, frustração e incerteza diante das novas demandas provocadas

destacar a importância de um olhar atento das instituições de ensino para as
necessidades dos trabalhadores docentes quanto aos recursos para a efetivação do
trabalho e aos fatores de risco e proteção relacionados à saúde. O apoio institucional
aos professores é fundamental, visto que auxilia as equipes a lidarem com o excesso
de demandas, ampara e valida o trabalho, fortalecendo estratégias individuais e

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Além disso, cabe destacar que aspectos relacionados à organização do trabalho,
como o aumento da jornada de trabalho, a realização de horas extras e o frágil suporte
emocional e psicológico relatados pelos participantes, estão intimamente relacionados

realização de seu trabalho. Esses elementos, por sua vez, encontram seu sustento na
precarização estrutural do trabalho, já anterior à pandemia. Ao tratar da precarização
do trabalho docente, Moura et al., (2019) evidenciam fatores como a exaustiva jornada
de trabalho e a extrapolação à sua área de formação, em que, em algumas situações,
os professores são levados a cumprir, por exemplo, o trabalho do assistente social,
do psicólogo e do psicopedagogo, uma vez que o sistema educacional não oferece

Nesse contexto, Moura et al. (2019, p. 11) reforçam que, em detrimento de melhores
condições de vida e de trabalho, a precarização do trabalho docente integra um projeto

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dadas as investidas neoliberais que se manifestam em ações do Estado”. Ações estas

Câmara dos Deputados, e da PEC 55, no Senado Federal, que geraram a Emenda
Constitucional 95, conhecida como a PEC do Teto dos Gastos, que preconiza o
congelamento de gastos públicos com a Educação, entre outros serviços, por 20 anos

trabalho, tem-se historicamente a política de contratação temporária de trabalhadores
docentes na rede estadual de ensino através da Lei estadual nº 10.376 de 1995,
atualizada até a Lei nº 15.579 de 2020, que prorroga esses contratos temporários por

O trabalho docente constitui-se enquanto um pilar para a formação dos cidadãos.
São os professores os responsáveis pela transmissão e mediação de saberes

  
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Lessard (2014) chamam a atenção para a atividade docente enquanto uma ocupação
pouco valorizada na sociedade capitalista por ser considerada apenas uma preparação
para o desenvolvimento do trabalhador ‘real’, produtivo. Quanto à sobrecarga, esses

da instituição escolar. Nessa perspectiva, Gomes et al. (2012, p. 280) apontam que a
prática pedagógica está diretamente atrelada a estrutura física das escolas, a jornada
de trabalho adequada, aos salários justos, ao plano de carreira e a organização do

os professores não se reconheçam no produto de seu trabalho”.
Conforme Dejours (2007), o trabalho perde seu estatuto de sofrimento e passa para prazer
ao passo que a qualidade do trabalho é reconhecida e os desânimos e contradições

atividade ocupacional fortemente exigente em relação às cargas psíquicas e de alta
exposição a estressores psicossociais. Com condições frequentemente adversas, o
alto investimento afetivo dos trabalhadores docentes para responder às demandas

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essa dinâmica se mantém em um cenário em que a falta de recursos emerge enquanto
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agravante de uma situação já desfavorável a estes trabalhadores, uma vez que a o
apoio institucional deveria ser fator de proteção que os permitiria lidar de modo mais

Através dos relatos, percebe-se a angústia dos docentes diante da situação da
organização e das condições de trabalho em que a educação se encontrou durante

sofreu grandes abalos e segue tentando se reestabelecer. No Rio Grande do Sul,
o desempenho da educação básica em 2020 foi inferior ao da média nacional,
segundo o Observatório do Plano Nacional de Educação (2020). Somado a isso,
observou-se que muitos participantes se sentiram inseguros quanto à qualidade e
et al.
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crescimento da responsabilidade posta nos professores não somente pelo sucesso
ou fracasso dos alunos, mas também do próprio sistema de ensino.
           
reconhecimento, como garantir esse reconhecimento em um cenário em que o
trabalho docente é sistematicamente precarizado? Visto por este ângulo, depreende-
se que as transformações provocadas no trabalho docente pela pandemia do novo
coronavírus encontram em seu cerne processos que não são assim tão novos, pois
amparam-se em um movimento já existente de precarização do trabalho e desmonte
da educação brasileira. Assim sendo, cabe destacar que a precarização do trabalho
docente deve ser compreendida no quadro das mutações em curso no mundo do
trabalho em um contexto marcado pela hegemonia de políticas neoliberais, tal qual
apontam Antunes e Alves (2004).
Logo, pensar no trabalho docente em tempos de pandemia implica pensar no trabalho

marcas deixadas pela naturalização do aumento de trabalho característico do tempo
em que vigoravam as medidas de isolamento social. O grande crescimento de registros
pedagógicos e estratégias de acompanhamento continuam fazendo parte da rotina
escolar, mesmo que o tempo destinado a essa parte documental do trabalho docente
seja relativamente curto para tal demanda. Ademais, faz-se importante ressaltar a luta
que professores ainda enfrentam para a garantia do tempo de planejamento didático,

o contexto de trabalho que atravessa esses professores e professoras tem sido

sofrimento. Sofrimento este que emerge das contradições que a dimensão material do
trabalho docente apresenta, e que requer um olhar atento das instituições de ensino e


Este estudo teve como objetivo descrever e analisar as transformações provocadas
pela pandemia de COVID-19 na organização e nas condições do trabalho docente,
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Grande do Sul. Do ponto de vista da organização do trabalho, os resultados apontaram
para uma sobrecarga de trabalho dos professores, ocasionada pela necessidade
de adaptação do processo de ensino-aprendizagem à modalidade remota e,
posteriormente, à organização da retomada das aulas presenciais. Neste contexto,
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a maioria dos participantes não recebeu as condições de trabalho necessárias para
a execução das atividades e contou com precário apoio institucional. Este processo,
associado aos impactos emocionais causados pela pandemia de COVID-19,

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Percebeu-se, através dos relatos dos participantes da pesquisa, que a
responsabilização pelo acesso à educação no contexto da pandemia de COVID-19
recaiu fortemente sobre os professores, que precisaram lançar mão, não apenas de
recursos materiais próprios para efetivarem o ensino remoto, mas também de recursos
emocionais e subjetivos. Como problematizado por Gomes et al. (2012) é preciso
lembrar constantemente que a prática pedagógica e a qualidade da educação estão
diretamente associadas às condições dignas de trabalho e de saúde dos docentes.
Sem apoio e garantias institucionais e governamentais, a responsabilização pelo
direito à educação continuará incidindo sobre os professores.
         
docente, cabe destacar que mais da metade dos participantes contaram com
apoio sindical, aspecto que merece ser reconhecido em um contexto de diversos
ataques às instituições que contribuem para a garantia de direitos dos trabalhadores
brasileiros. Finalmente, salienta-se que a sobrecarga que esteve e ainda está
presente no trabalho docente, deve ser compreendida no âmbito do planejamento e
execução de políticas preventivas para futuras situações similares e de ações que
estimulem o suporte institucional e a coletivização desses trabalhadores. Concluiu-
se que são necessárias políticas públicas de atenção à saúde do trabalhador na
educação básica do Rio Grande do Sul, fortalecendo os coletivos de trabalho e as
ações de suporte aos docentes.
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
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contexto da pandemia de COVID-19. , v. 46, 2021.
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educação brasileira em tempos de Covid-19. , v. 7,
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. São Paulo: Blucher, 2008.
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sistemática da literatura., v. 7, n. 2, p. 64-85,
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. 2021.

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
atuação docente em época de isolamento social. , v. 15, p. 1-24, 2020. DOI:
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da precarização do trabalho. , v. 1, n. 2, p. 32-47, 2015. DOI: http://dx.doi.
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pandemia. , v. 7, n. 4, p. 39193-39199, 2021. DOI: https://doi.
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
de professores, por tempo determinado, para atender necessidade temporária do ensino, de
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
temporários para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público em até 3
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
COVID-19: ensino remoto e exaustão docente. , v. 15, p. 1–24, 2020. DOI:
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pandemia: como conectar professores desconectados, relato da prática do estado de Santa
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