Trabalho & Educação | v.28 | n.1 | p.251-265 | jan-abr | 2019
em grande parte, serviram de referencial dos processos de ensino/aprendizagem ainda
hoje em vigor no Ensino Superior.
Esta dissociação entre a figura do jovem que habita a Universidade e a figura do
Estudante Universitário é de tal forma profunda que toca os fundamentos sociais e
cognitivos da vida académica.
A escritora Lídia Jorge, numa notável conferência que fez na Faculdade de Letras da
Universidade do Porto, dizia que a atual geração que habita as Universidades tem
metade do cérebro fora dele, ou seja tem metade do cérebro nas redes sociais e na
internet, mas tem também metade do cérebro fora da razão; metade do cérebro é
marcada pela sensibilidade, pela estética, pela afetividade e por razões, saberes e
relações com os saberes que escapam, em grande parte, àquelas que nós supomos
estruturarem a figura do estudante.
Michel Serres (2013), por sua vez, chama a atenção para que estas transformações já
não podem ser interpretadas no quadro das relações inter-geracionais, nem são do foro
cultural. Nas suas palavras, são transformações “homoneiscentes”, de tal forma
profundas que ainda não as conseguimos discernir em toda a sua radicalidade. Estas
mudanças anunciadas e prenunciadas põem, desde já, em causa as atuais
“delimitações espaciais”, dado que o antigo espaço das concentrações – o espaço
onde eu falo e vocês escutam – se dilui e expande, para dar lugar a um espaço de
proximidade imediata que tende a ser cada vez mais distributivo.
Na opinião deste mesmo autor torna-se imperativo produzir uma verdadeira revolução
pedagógica no trabalho com estes jovens, abandonando as regras que estruturaram a
pedagogia da memória e a pedagogia da razão, para se afirmar a pedagogia da
invenção; esta, sendo em grande parte indefinida, exige seguramente que o trabalho
de formação se permeabilize às gramáticas das formas de vida dos jovens.
Não sendo ainda possível definir, de forma segura, os contornos das alternativas, as
Universidades só podem envolver-se neste trabalho, escutando os mundos que as
habitam e que elas desconhecem e contribuindo, deste modo, para que se anule a
dissociação entre os espaços e os tempos de aprendizagem e a sua organização.
O Ensino Superior convive com aprendizagens cada vez mais difusas e discretas, com
dinâmicas de aprendizagem que são dificilmente planeadas ou integradas nos planos
de estudo. Estas aprendizagens, embora façam parte do cotidiano da instituição, são
remetidas para as periferias, são consideradas como epifenómenos cujo
reconhecimento e conhecimento está subordinado à sua congruência com dinâmicas
construídas em torno de saberes concentrados.
De uma forma, ainda incipiente, a FPCEUP desenvolveu um Dispositivo de Mentoria
que se distingue de outras experiências similares, pelo facto de encarar a integração
dos novos estudantes não como um evento, mas como um processo. Um processo
que, num primeiro momento, seria facilitador do desenvolvimento de um trabalho de
ressocialização relacional, para, num segundo momento, desenvolver também
dinâmicas relacionadas com a aprendizagem do ofício do estudante e, começar hoje, a
desenvolver dinâmicas facilitadoras da sua integração em comunidades científicas,
com as suas culturas, rituais e procedimentos mais ou menos codificados.
O apoio à inscrição dos novos estudantes não se confina ao ato administrativo nem ao
conhecimento físico das instalações. A inscrição não é unidimensional, mas