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DOI: https://doi.org/10.35699/2238-037X.2019.9896
MUDANÇAS NO MUNDO DO TRABALHO E A EXPANSÃO DO ENSINO
SUPERIOR DA REDE PRIVADA NA CIDADE DE MANAUS/AM
1
Changes in the world of work and expansion of private higher education
at the city of Manaus/AM
LIMA, Elourdiê Macena Corrêa de
2
PEREIRA, Luciana de Lima
3
OLIVEIRA, Selma Suely Baçal de
4
RESUMO
Esta produção objetiva laar luzes sobre as mudaas no mundo do trabalho a partir das últimas
décadas do culo XX, e, tem como objetos, a expansão do ensino superior na rede privada da
cidade de Manaus e a absoão da o de obra no setor produtivo das instrias do Polo Industrial
de Manaus (PIM). O estudo é de cater bibliogfico e foi construído à luz das leituras e dos debates
ocorridos no Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas e Educação/GPPE, da Universidade Federal
do Amazonas. Está dividido em ts itens. O primeiro trata das mudanças no mundo do trabalho, suas
repercussões para a classe trabalhadora e seus impactos na sociedade contemponea
fundamentados nos autores Harvey (1992; 2014), Antunes (2011), Salerno (2008) e Hirata (2008). O
segundo faz uma incursão no processo de desenvolvimento histórico da escola e o seu papel para a
qualificação” para o trabalho no trato da relão com a produção, reprodução e a acumulão do
capital. O terceiro item tece considerações sobre o Estado Neoliberal e seu idrio de “mercado livre”.
A pesquisa aponta que existe descompasso entre o espraiamento das instituões privadas na cidade
de Manaus e a pouca absorção pelas instrias locais da o de obra qualificada, o que evidencia
um processo contradirio, uma vez que, a expansão do ensino superior privado da cidade de Manaus
é fomentada, também, como requisito de preparo de o de obra qualificada para o PIM.
Palavras-chave: Trabalho. Qualificação. Ensino Superior.
ABSTRACT
This production intends to shed light on the world of work from the last decades of 20th century, and
has, as its objects, the expansion of higher education in the private higher education at the city of
Manaus and the absorption of labor in the productive sector of Manaus Industrial Pole (MIP). The
study adopts a bibliographic approach and was built in the light of readings and debates occurred on
the Group on Public Policies and Education /GPPE, from Federal University of Amazonas. It is divided
into three topics. The first deals with the changes in the world of work, its repercussions for the working
class, and its impact on contemporary society, based on the works of Harvey (1992; 2014), Antunes
1
O texto é fruto de pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de Pesquisa em Políticas blicas e Educação (GPPE), da Universidade Federal
do Amazonas, do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE). Esse artigo não foi apresentado ou publicado anteriormente. A
pesquisa foi aprovada pela avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) sob o Certificado
de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) de nº 92162418500005020. Recebe apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES).
2
Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Amazonas- UFAM. Mestrado em Serviço Social pela Universidade Federal da
Paraíba UFPB. Graduação em Serviço Social pela Universidade Federal do Amazonas- UFAM. Foi Professora Substituta do
Departamento de Serviço Social da UFAM. E-mail: elourdie@gmail.com.
3
Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Amazonas- UFAM. Mestrado em Educação pela Universidade Federal do
Amazonas- UFAM. Graduação em Pedagogia pela Universidade Federal do Amazonas- UFAM. Funcionária blica Municipal,
Professora da Educação sica. E-mail: azgade@hotmail.com.
4
Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo. Mestrado em Educação pela Universidade de São Paulo. Graduação em
Pedagogia pela Universidade Federal do Amazonas. Professora Titular da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Pró-Reitora de
Pesquisa e Pós-Graduação. E-mail: selmabacal@ufam.edu.br.
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(2011), Salerno (2008) and Hirata (2008). The second topic makes an incursion into the process of the
historical development of school and its role for labor skilling in relation to production, reproduction and
capital accumulation. The third topic presents some comments about Neoliberal State and its ideology
of free market”. The research points to the existence of a mismatch between the spreading of private
institutions at the city of Manaus and the low absorption of skilled labor by the local industries, which
shows a contradictory process, since the expansion of private high education at the city of Manaus is
also fostered as a requirement of skilled labor provision for the MIP.
Keywords: Labor. Skilling. Higher Education.
INTRODUÇÃO
O artigo analisa as mudanças no mundo do trabalho a partir das últimas décadas do
século XX quando da inserção das novas tecnologias na escala industrial, faz
interlocução com o conceito de formação/qualificão para o mercado formal de
trabalho e a expansão do ensino superior na rede privada da cidade de Manaus tendo
como referências a qualificação profissional e a absorção da mão de obra nas
indústrias do Polo Industrial Manaus (PIM).
A metodologia consiste no levantamento bibliográfico, sistematização de leituras e
debates ocorridos no Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas e Educação/GPPE, do
Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal do Amazonas -
PPGE/UFAM.
A primeira parte apresenta um panorama das mudanças no mundo do trabalho, suas
repercussões para a classe trabalhadora e os impactos dessas mudanças na
sociedade contemporânea. O aporte teórico utilizado perpassa por Harvey (1992;
2014), Antunes (2011), Chesnais (1996), Hirata (2008), Salerno (2008) dentre outros,
os quais discorrem acerca do atual modelo de produção capitalista.
A segunda parte procura fazer uma breve incursão sobre o processo histórico da
escola como guardiã da propriedade privada e sua relação com a educação/formão
para o trabalho no trato com a prodão, reprodução e acumulação do capital,
fundamentados especialmente nos textos de, Enguita (1993), Ramos (2011), Saviani
(2008) e Oliveira (2007).
A terceira parte tece considerações sobre o Estado Neoliberal e seu idrio de
mercado livre para o capital e nimo para as políticas públicas sociais. Nessa lógica, a
expansão do ensino superior da rede privada de Manaus/AM, a qualificação para o
mercado de trabalho e a inserção da mão-de-obra nas indústrias do Polo Industrial de
Manaus (PIM), ganham destaque nos estudos de Assis (2008), que aponta o estatuto
da qualificação como um dos principais requisitos adotados pelas empresas do sudeste
do país e de Oliveira (2007), que revela que a qualificação do trabalhador exigida pelo
PIM está estritamente relacionada às atividades do seu posto de trabalho, ou seja, o
trabalhador qualificado para o contexto empresarial é aquele que atende à demanda
técnica restrita do e para o capital.
Este estudo culmina com as análises de Pereira e Oliveira (2015) acerca do
desemprego no PIM diante das crises capitalistas, afirma que, por mais que o
trabalhador esteja qualificado para a fuão que desempenha tal fator não é garantia
de sua empregabilidade. Sem o propósito de esgotar a tetica, apresenta-se ao leitor
a discussão empreendida em seus elementos para futuros aprofundamentos.
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AS MUDANÇAS CONTEMPORÂNEAS NO MUNDO DO TRABALHO
O mundo do trabalho assistiu, a partir das últimas décadas do século XX, significativas
transformações. A inserção da microeletrônica, as mudanças na dinâmica
organizacional das indústrias (com destaque para as automobilísticas e de
eletroeletrônicos) nos países centrais - em especial no Japão - e a globalização da
economia mundial condicionaram” modificações para outros países e continentes,
guardadas as devidas proporções de caráter técnico, político, cultural e geográfico.
Entende-se que, o maior impacto social das mudanças no mundo do trabalho é o
desemprego estrutural, fenômeno que se manifesta com a extinção dos postos de
trabalho e com o avanço tecnológico em escala global atingindo diretamente a classe
trabalhadora. Sobre esse assunto, Antunes (2011) diz que, na França o contingente
operário diminuiu de 39% para 29,6%, entre 1975 e 1989, e, nos EUA, no setor de
manufatura, esse contingente decresceu de 20.286 milhões, no ano de 1980, para
18.994 milhões, em 1986, enquanto o setor de serviços cresceu de 11.390 para 22.531
milhões no mesmo período.
A dinâmica de tempo e movimento preconizada por Taylor (1990), e a prodão em
massa, em série, rígida e estandardizada que caracteriza o fordismo, alinhado ao
Estado de bem-estar social, o qual sustentou as bases econômicas e políticas de
acumulação de capital, a partir do pós-guerra, e se mantive forte até a década de 1970,
com relativa estabilidade, lucro e monopólio nos EUA e na Inglaterra, dão sinais de
esgotamento no decorrer da década de 1970 (HARVEY, 1992).
Os debates sobre as novas tecnologias, e os processos de trabalhos delas advindos,
estão longe de serem esgotados pelos estudiosos do mundo do trabalho; nesse
sentido, Piore e Sabel (1984) advogam a favor do esgotamento da produção fordista-
taylorista e o surgimento de um novo modelo produtivo calcado em novos métodos e
técnicas de trabalho; outros, a exemplo de Harvey (1992, 2014) e Antunes (2011),
consideram que houve significativas mudaas no mundo da produção, a chamada
acumulação flexível, mas, reiteram que há de se ter cautela ao afirmar sobre o
surgimento de um novo modelo produtivo, sem uma reflexão cuidadosa das dimensões
políticas, econômicas e sociais, bem como de seu alcance. O que pode ocorrer é o
recrudescimento em outros pses de modelos que se tornaram obsoletos em seus
locais de origem. Wood (1993), em estudo sobre o modelo japonês nos países da
Europa (Grã-Bretanha), e, Estados Unidos da Arica, alerta para um sistema híbrido
de produção.
Em termos nacionais, Leite (1994) assegura que, no Brasil, o modelo deixa de ser
japonês para tornar-se nissei, quando aponta para ausência de autonomia dos
operários, na definição de métodos de trabalho, e na alocação das atividades, no
decorrer da jornada de trabalho nas empresas com células de produção.
Hirata (2008), ao analisar as tendências recentes sobre a divisão sexual e social do
trabalho, no que concerne às mudanças tecnológicas alternativas ao modelo fordista-
taylorista, tece críticas aos novos paradigmas, e assevera que, esses têm como
referencial, o trabalhador homem, como que encarnando o universal. O modelo de
trabalho em equipe, diante da falta de demarcação das tarefas implica na polivalência,
e, na rotação das atividades prescritas ao trabalhador.
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O próprio Ohno (1997) reverbera sem qualquer polidez, a necessidade de
reorganizão dos espaços de trabalho de modo que evite qualquer tipo de desperdício
para o empresário, inclusive de não utilização eficaz da mão de obra humana, para
Ohno produzir mais com menos é a máxima, pois [...] com operários demais, inventa-
se trabalho desnecessário [...] (p.71).
Assim, a rentabilidade do capital se processa também pela redução de [...] custos
eliminando gorduras de pessoal e automatizando em velocidade máxima.
(CHESNAIS, 1996, p. 306)
Antunes (2011) salienta que, a técnica de produção, organizão e gestão utilizada no
modelo japonês, toyotismo ou ainda ohnismo, tem causado grande impacto no mundo
da produção e do trabalho, em resposta ao esgotamento à crise do fordismo dos anos
70. Para o autor, seus traços constitutivos básicos podem ser assim resumidos:
Ao contrário do fordismo, a produção sob o toyotismo é voltada e conduzida diretamente
pela demanda. A produção é variada, diversificada e pronta para suprir o consumo. É este
quem determina o que será produzido, e não o contrário, como se procede na produção
em série do fordismo. Desse modo a produção sustenta-se na existência do estoque
mínimo. O melhor aproveitamento possível do tempo de produção [...] é garantido pelo just
in time (ANTUNES, 2011, p. 33)
Essa nova” forma de integração social requer um trabalhador polivalente para o
modelo flexível de produção, apto a manusear várias máquinas simultaneamente e dar
respostas rápidas e eficazes aos eventos apresentados. Requer, ainda, a eliminação
do trabalho morto, a gestão horizontalizada e o trabalho integrado e em equipe,
decorrente de um tipo de racionalização de caráter sistêmico ou, nas palavras de
Machado (1994) a sistemofatura, que contribui para escamotear o despotismo de
fábrica e o pseudo consenso do trabalho participativo. Ainda que, a sociedade
tecnizada não seja a sociedade industrial mais desenvolvida, trata-se de algo novo,
mas que não modifica a lógica de acumulação do capital, pois o processo de transição
de um a outro tipo de sociedade é descontínuo, eivado de mudaas (quantitativas e
qualitativas) complexas. Faz conviver no mesmo cenário e simultaneamente o velho e
o novo” modelo.
Assim, a sociedade tecnizada marcada pela substituição da produção maquinizada
pela eletrônica, surge quando a sociedade industrial ainda não se esgotou e, no caso
dos países subdesenvolvidos, ela se esboça por meio de graves distorções que
acentuam os descompassos de tempo, ritmo e movimento que caracterizam o
desenvolvimento do capitalismo periférico incidindo, também, no centro nervoso dos
processos ecomicos, políticos e sociais.
A ESCOLA E O PROCESSO DE QUALIFICÃO PARA O TRABALHO
Historicamente a concepção de educação na sociedade de classes esteve voltada aos
interesses da produção, reprodução e acumulação do capital expressando-se nas
diversas fases do capitalismo como a fiel guardiã da propriedade privada na clássica
concepção dual de educão para a divisão social do trabalho: a educação voltada
para a elite e a educação voltada para os trabalhadores.
Ramos (2011) destaca que, o ensino efetivado pelas escolas populares não visa
somente o ato de disciplinar para o ritmo da fábrica, mas também de conferir ao aluno-
trabalhador o domínio de um ofício para o mercado de trabalho. Nessa esfera, a
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formação para o trabalho passa a significar formão profissional, e, assim, a
emergência das profissões modernas se constitui em atendimento à divisão técnica e
social do trabalho que se mostram no cenário do capital classificadas de acordo com as
classes a que se destinam: operários, técnicos, engenheiros, cientistas e assim por
diante.
Enguita (1993) argumenta que o ensino, no interior da sociedade capitalista, tem
cumprido o papel de qualificar a força de trabalho necessária ao atendimento das
demandas da produção. Nesse sentido, o autor defende que a educação se
caracteriza no plano simbólico e concreto, como um processo privilegiado para a
inculcação da cultura à qualificação para o trabalho.
Ao analisar o papel da escola, na sociedade moderna, Saviani (2008) apresenta
indícios de que essa escola, baseada nas relações formais (contratuais), vai trazer
consigo a exigência de generalização e massificação, pois[...] a prodão centrada na
cidade e na indústria implica que o conhecimento, a ciência que é uma potência
espiritual, converta-se através da indústria, em potência material (p. 155, 156).
Nesse sentido, o modelo de escola requerida pela sociedade capitalista exige que a
qualificão do trabalhador esteja voltada para a produção e reprodução do capital e
para o regime fabril de trabalho. O que remete, simultaneamente, à existência de
práticas educativas que ajudam a legitimar o estatuto do trabalho considerado
qualificado (RAMOS, 2011).
A qualificão é compreendida como uma constrão social dinâmica, isto é, tomada
como um constructo, que é síntese, das dimensões: conceitual, social e experimental
eivada de [...] múltiplas dimensões, que caracterizam esse conceito e que ordenam
práticas e procedimentos concretos no plano das relações sociais de produção,
construindo códigos de sociabilidade associados à cultura do trabalho (RAMOS, 2011,
p. 54 - 61).
O trabalho qualificado para o capital, ora é o trabalho […] parcelizado, fragmentado e
repetitivo [] operacionalizado por uma força de trabalho pouco qualificada ou sem
nenhuma qualificação [] (NOGUEIRA, 2009, p. 76). Ora é o trabalho exercido por
meio do donio técnico, seja de maquinário, seja das novas tecnologias, bem como, o
preparo para situações de imprevisibilidade, requisitos para o exercício da polivalência,
que se caracteriza como um perfil de trabalho que exige pessoas mais qualificadas,
todavia, uma qualificação afinada às demandas do capital.
Assim, o diploma escolar (estatuto formal) é frequentemente almejado e perseguido
pelos aspirantes aos postos de trabalho como uma interface entre formação, emprego
e remunerão. Embora a certificão não seja o único e principal pressuposto de
qualificão, como assevera Ramos (2011), essa certificão irá formalmente
garantir, em tese, o nível de domínio e conceitos de conhecimentos exigidos pelo
mercado de trabalho, bem como, o status almejado.
A explorão de fontes de o de obra qualificada, abundante e barata, cuja [...]
transmissão de know-how, proporcionam um ambiente de produção que gera
economia de custo. Tal situação incentivou certas companhias de origem americana ou
britânica a deslocarem sua produção [...] (CHESNAIS, 1996, p. 203).
No movimento do capital, em busca de países de capitalismo menos desenvolvido,
com pouca ou inexistente ação sindical, e mão-de-obra inexperiente e barata, instala-se
no Estado do Amazonas, a Zona Franca, Polo Industrial de Manaus (PIM), entre 1957
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e 1967, que inicialmente apresenta-se como entreposto aduaneiro até o Decreto-Lei nº
288 que a alarga para Zona Franca (MOURÃO, 2009), o que fomentou na região norte
do País, um comércio transnacional, cujas indústrias abastecem não só mercados
locais, mas também mundiais.
Ao examinar o quadro das recentes modificações do processo de trabalho no ramo da
indústria brasileira, particularmente do Polo Industrial de Manaus (PIM) com relevância
às ões de formão/qualificação da o-de-obra aos trabalhadores do chão da
fábrica, Oliveira (2007) deixa claro o que entende por ações de educação/formação e
qualificão/treinamento: as primeiras visam dar ao trabalhador um determinado grau
de escolarização concedendo-lhe o estatuto formal, ao passo que as segundas
buscam capacitar o trabalhador para o exercício stricto sensu do seu posto de trabalho.
Em sua pesquisa empírica a autora revela que apesar da exigência do estatuto formal
de escolarização pelas indústrias do PIM, o que determina a contratão para o posto
de trabalho é, muitas vezes, o conhecimento tácito e a experiência prática para o
exercício do trabalho.
Nesse sentido ao trabalhador são exigidas a educação/formação escolar e a
qualificão/treinamento, mas, voltados ao aprimoramento da força de trabalho para o
capital em detrimento da formação do ser social.
O ESTADO NEOLIBERAL E A EXPANSÃO DO ENSINO SUPERIOR
A crise estrutural do capital nos anos 1970 redireciona as bases da produção e
reprodução do capital atingindo diretamente o mundo do trabalho, mas se expressa
também no campo político reordenando o papel do Estado que se reconfigura para
atender aos interesses do capital como seu arauto e representante legal (MARX;
ENGELS, 1986).
A expansão do ensino superior privado no Brasil vem se configurando desde a década
de 1960 com o decisivo apoio do Estado, mas é nos anos de 1980 que esse segmento
ganha maior impulso e recebe o marco legal da Constituição Federal de 1988 e na Lei
nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 que institui as Diretrizes e Bases da Educão
Nacional - LDBEN.
A partir da década de 1980 os países de capitalismo avançado passam por
significativas mudanças na ordem econômica e política: por um lado assistem-se, no
mundo do trabalho, as mudanças da esfera produtiva do capital que redireciona o seu
modus operandis com o fim de se reestabelecer da crise de superacumulação de
mercadorias que se dera com a produção em rie e em massa e o declínio de
consumo (FORD, 1926) que se constituíra em um dos pilares da crise estrutural do
capital.
É nesse contexto de crise orgânica do capital, que o Estado de Bem Estar Social se
expressará, a partir do pós-guerra, com o modelo fordista-keynesiano de produção,
pleno emprego e consumo nos EUA e em alguns países da Europa Central com
relativa estabilidade e lucro, mas logo apresentará sinais de esgotamento
redirecionando a agenda política de países como os EUA, a Inglaterra e a Alemanha.
Assim, a Nova Direita que saíra vitoriosa de recente processo eleitoral nos referidos
países, dita suas normas para o mundo como condição de manter sua lucratividade e
submete o ideário neoliberal aos países de economia dependente. Harvey (2014)
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assevera que[...] a revolução neoliberal que se costuma atribuir a Thatcher e Reagan
a partir de 1979 tinha de ser instaurada por meios democráticos [...] (p.49).
Todavia, na América Latina, a porta de entrada para a ideologia neoliberal se deu pelo
Chile, com Augusto Pinochet (1974-1990), seguido da Argentina, com Carlos Menen
(1989-1999) e do Brasil com Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), os quais
adotam medidas principalmente no que se refere à abertura ao mercado internacional
via redução de impostos e barreiras alfandegárias, programas de privatização, políticas
públicas sociais focalizadas e estabilização da moeda.
O receituário neoliberal concebido desde o governo de Fernando Collor de Mello (1990-
1992) e aprofundado por Fernando Henrique Cardoso atinge, sobretudo os avanços
ainda que tímidos da Constituição Federal (se comparados às constituições anteriores)
promulgada no final da década de 1980 em contra fluxo ao cenário de mudanças que
estavam por vir.
O Brasil, que ainda não respirara as conquistas da Carta Magna, tem suas políticas
públicas sociais também para educação comprometida pela redão das atribuições
do Estado, pois, o estado de viés neoliberal torna-se protetor dos interesses dos
organismos internacionais, e como representante do grande capital, desloca as
desigualdades sociais às periferias do capital, subordina todos os setores, inclusive o
educacional às suas orientações.
Nesse contexto, a diversificão do ensino superior regulamentada pela via legal
recebe o enquadramento da lucratividade pelo Art. 20 da LDBEN/9.394 de 20 de
dezembro de 1996. Esse dispositivo constitucional que inaugura o seu reconhecimento
oficial e aprofunda o modelo técnico-napoleônico que Sguissardi (2009) denomina de
neoprofissional, heterônoma e competitiva, abre leque à possibilidade de lucro, por via
legal, ao estabelecer às IES privadas o dispositivo de particulares em sentido estrito. A
Emenda Constitucional nº 95 de 2016, também propicia este cenário de mercadificação
do ensino, diante do Novo Regime Fiscal, com seus planos fiscais e políticas de
austeridade.
No governo de Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010) quando da aprovação da Lei nº
10.973 de 2 de dezembro de 2004 que dispõe sobre incentivos à inovão e à
pesquisa científica e tecnológicas no ambiente produtivo, da Lei nº 11.079 30 de
dezembro de 2004 que dispõe sobre as normas gerais para licitação e contratão de
parcerias público-privada no âmbito da administração pública, atingindo em especial as
Instituições Federais de Ensino Superior - IFES, a da Lei nº 11.096 de 13 de janeiro de
2005 que institui o Programa Universidade para Todos - Prouni: Tem continuidade e
está pronto o cenário para a expansão do ensino superior privado.
Frigotto (1993) esclarece que:
Na medida em que o Estado se torna ele próprio um capitalista, gerindo empresas
lucrativas ou associando-se às grandes firmas multinacionais [...] os investimentos dos
recursos públicos irão ter uma destinação cada vez mais particular garantir a
centralização. Drena-se, desta forma, os recursos das áreas sociais- saúde, educação,
moradia, ou as arrecadações de PIS, FGTS, e impostos para os setores produtivos, ou
investe-se nestes setores, em programas cuja adencia ou cuja mediação com a
produção seja mais imediata (p.118)
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Nesse âmbito, assiste-se a diminuição do Estado no trato das questões sociais, dentre
as quais a política educacional para todos os segmentos, e a atuação da sociedade
civil no avanço corporativo da educão privada (PERONI, 2003; 2008).
No ensino superior ocorre não só o espraiamento das instituições privadas, mas
também, a formação de conglomerados empresariais que ganharam respaldo legal do
Estado com o artigo 213 da Carta Magna de 1988 que promulga a possibilidade de
investimento em instituições educacionais para este segmento.
Acertadamente Chaves (2010) aponta que o processo de privatização do ensino
superior no Brasil se deu em duas distintas direções: pela fragmentação do setor
público e expansão do setor privado; pela formação de oligopólios e a criação de redes
por meio da compra e de fusão por empresas nacionais e internacionais de capital
aberto negociado nas bolsas de valores, fazendo da educão, segundo Adrião (2017)
um grande negócio.
Desse modo, assiste-se no campo do ensino superior, a partir da década de 90, ao
aumento de matrículas da rede privada de Manaus que passam de 8.802 em 1995,
para 134.154 em 2010, acompanhando a tendência de crescimento nacional que tem
suas matrículas acrescidas de 961.455, em 1990 para 6.075.152, em 2015
(MEC/Censo/Sinopses do Ensino Superior/2015).
Para além das motivações de lucratividade propiciadas pelo modelo neoliberal para a
expansão do Ensino Superior esse espraiamento pressupõe, na estreita relação com
as demandas do mundo do trabalho, visto que este requer, em tese, o estatuto da
formação à demanda do seu novo modelo produtivo. Entretanto, o levantamento de
literatura realizada para este estudo apontou para direções divergentes.
Por um lado, segundo a pesquisa realizada por Assis (2008), as diversas categorias
profissionais ampliam seu nível de qualificação na proporção direta ao grau de
exigência ora demandada. Para a autora, essa perspectiva encontra justificativa na
natureza das mudanças que a indústria vem sofrendo para a nova base técnica e para
absorção aos novos processos de organização do trabalho, embora essa não seja uma
variável causal.
Em outra direção, a pesquisa de Oliveira (2007) que apresenta como campo empírico o
Polo Industrial da cidade de Manaus, aponta que, apesar da busca pelo estatuto formal
da escolarização de nível superior e do simbolismo que este representa ao imaginário
social, não é a realidade para a empregabilidade nas indústrias da capital amazonense.
Segundo a autora,
[...] a qualificação dos trabalhadores, demandada pelas grandes empresas do setor
eletroeletrônico da Zona Franca de Manaus (ZFM), no geral, não coincide com os
conhecimentos efetivamente mobilizados nos postos dos operadores de quinas de
inserção. Desse trabalhador são exigidos, no processo de seleção, níveldio de
escolarização, conhecimentos básicos em eletrônica, conhecimentos em infortica e
conhecimento em língua estrangeira, notadamente o inglês (p. 193).
A autora desvela em sua pesquisa que o modelo fordista/taylorista convive com
nuances da produção flexível nessa periferia do capital e é reveladora do
descompasso entre o espraiamento das instituições privadas na cidade de Manaus e a
pouca absorção pelas indústrias locais da o de obra qualificada. O que evidencia um
processo contraditório de qualificação e desqualificão profissional, uma vez que a
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expansão do ensino superior privado da cidade de Manaus é fomentada também pelos
requisitos de preparo para inserção da mão de obra qualificada no PIM.
Pereira e Oliveira (2015) apresentam um fator interessante na pesquisa que realizaram
acerca do desemprego no PIM, nenhum dos trabalhadores entrevistados, segundo as
autoras, pediu demissão do emprego, pelo contrário, ainda que frequentes,
participando de cursos[...]obrigatórios erepetitivos ofertados pelas empresas,
submetendo-se a horas extra, foram surpreendidos com: redão de quadro, crise,
fechamento de fábricas, baixa demanda de produção e, término do contrato temporário
sem renovação ou efetivão”(p.12).
O enxugamento do quadro de trabalhadores do PIM se deve também, à enorme
capacidade de mobilidade sica das empresas, que sem qualquer vínculo com a
região, diante de qualquer instabilidade ou crise no mercado, partem em busca de
localidades mais procias aos seus interesses de lucratividade e requerendo sempre,
mão de obra que se sujeite aos seus intentos.
O regime da economia internacional atual pode ser definido como sendo de um espaço de
concorrência diversificado, mas em vias de unificação, no qual a concorrência se dá cada
vez mais diretamente entre companhias, que têm necessidade imperativa de todo o
espaço para se desenvolverem. A palavra-chave desse regime de economia internacional
é competitividade. Nos mercados de bens de consumo final, em particular, as empresas,
apesar da diferenciação de produtos, estão em situação de concorrência direta, quando
não frontal. O sucesso de uma empresa significa, cada vez mais, a falência ou absorção
de outras. Quando esse processo se exerce entre países diferentes, chega
necessariamente um momento em que países se sentem atingidos [...] (CHESNAIS, 1996,
p. 218).
As questões mais importantes, segundo o autor, dizem respeito “[] à orientão das
decisões de investimento, bem como à intensidade da exploração dos assalariados e
às formas que esta assume: demissões massivas []” (p.292), seguidas das mais
variadas técnicas que são empregadas tais como: []reengenharia, rebaixamento do
nível salarial e instauração da mais completa precariedade no trabalho [...] (p. 293).
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
O estudo aponta que, ainda com a inserção da microeletrônica em vários ramos
industriais, não se pode afirmar que o modelo de prodão fordista/toyotista esteja
suplantado. Os estudiosos da sociologia do trabalho divergem sobre essa questão,
apontando concepções diferenciadas até mesmo em seu ps de origem, o Japão.
No Brasil, as pesquisas de Hirata (2008) indicam que as práticas e os métodos
tayloristas vão coexistir com algumas ilhas de modernidade e de sofisticação
tecnológica organizacional, linha de análise que tem consonância com a exposição de
Oliveira (2007) ao indicar que a produção do capital não tem modelo, seu modelo é o
lucro.
Nas indústrias de Manaus é revelado, pela pesquisa de Oliveira (2007) que o
fordismo/taylorismo não foi suplantado - convive simultaneamente com os novos
métodos de produção - e que a requisição da mão de obra ainda se dá aos moldes do
trabalho repetitivo e massificado, dispensando a qualificão aprimorada na
compreensão do processo e dinâmica de trabalho.
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O que importa é a competência requerida e desenvolvida na e pela indústria para o
exercício stricto senso do posto de trabalho evidenciando, assim, que o capital não tem
solo, não tem modelo, não tem regra, que seu mirante é o lucro e que a categoria
tempo-espaço na divisão social e técnica do trabalho se desloca em atendimento aos
interesses de sua acumulação.
A contradição entre o espraiamento das IESs privadas na cidade de Manaus e a
pouca absorção pelas instrias locais da mão de obra qualificada pelo estatuto formal,
demonstra ainda que, ao sonido de crise própria do sistema capitalista, configura-se
desemprego em massa na região, o que não tem relação nem com a alta qualificação
ou alta escolarização por parte dos trabalhadores locais, apontando para problemáticas
mais profundas que a simples afirmação de ausência de trabalhadores qualificados, ou
maior escolarizados, como tem sido o discurso propagado pelas mídias sociais,
nacionais e locais.
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Data da submiso: 17/01/2019
Data da aprovação: 31/08/2019