[Chamada para (in)submissões] Dossiê #2 - Outras vidas contra o espetáculo: o animal, o vegetal, a máquina e o alien (1º/2021)

31-03-2021

Recebimento de trabalhos no formato de artigos científicos, ensaios, textos literários e imagens que reflitam sobre a temática, até o dia 31 de maio de 2021.

Parafraseando Guy Debord, em uma das passagens de Pornotopia Paul Preciado afirma que as “coelhinhas” da Playboy eram capital em um grau tão intenso de acumulação que teriam se transformado em corpo. Com isso Preciado confirma e radicaliza as análises de Debord nos anos 50 e 60 do século passado, tendentes a revelar o processo de capitalização do mundo que, contudo, não se limitaria apenas às imagens, invadindo e domesticando os corpos viventes e, em última análise, a própria vida. Diante de um diagnóstico aparentemente tão inapelável, parece que toda resistência seria vã, dado que estaria condenada a se integrar nos onipresentes circuitos semióticos do espetáculo global. Todavia, tal se deve a um singular erro de interpretação, a uma sinédoque antropocentrada que toma a parte pelo todo e insiste em ler na vida humana o resumo e o ápice de toda vida. Dessa feita, uma alternativa ético-política realmente revolucionária nos nossos dias passa pela necessária compreensão das dimensões outras da vida que, apesar de não serem imunes ao poder espetacular, constituem anticampos – opostos, portanto, aos campos teorizados por Giorgio Agamben – em que se gestam experimentos colaborativos, imanentes e potentes que, por se colocarem de alguma maneira fora de nossas subjetividades e sensibilidades, apontam para caminhos de reversão do processo necropolítico de redução de tudo o que é vivo ao destino miserável de tornar-se imagem mercantil. Nesse sentido, o segundo número da (Des)troços: revista de pensamento radical pretende refletir em seu dossiê temático sobre as outras vidas que habitam ou podem habitar este e outros mundos imagináveis, de forma a participar da potência política que as outras nos oferecem diante da mesmice do espetáculo humano. Vidas animais, vidas vegetais, vidas maquínicas, vidas alien são então apenas alguns exemplos de formas outras que, por não serem humanas, nem por isso carregam consigo a marca da negatividade, eis que se afirmam em seus próprios termos, que cabe a nós compreender e maximizar, em uma aliança acêntrica, horizontal, múltipla e comunal com o que não é humano para, paradoxalmente, tornar de novo habitável o mundo. Trata-se, portanto, de uma aliança multiespécie da vida contra a morte representada pelo capital espetacular que pretendemos desvendar e fomentar nas páginas da revista.

Serão aceitos trabalhos inéditos sob a forma de artigos científicos, ensaios, textos literários e imagens (pintura, desenho, fotografia etc.) que reflitam: 1) sobre a temática do espetáculo e sua dominação global, levando em consideração elementos conceituais fundamentais pensados pelos situacionistas que, como Debord, previram a redução de tudo que vive à categoria de mercadoria, usando para tanto construtos críticos como os de alienação, jogo, relação entre arte, escritura e vida etc.; 2) sobre as potencialidades antagonistas e ético-políticas das outras vidas diante do atual cenário espetacular-necropolítico, em um diálogo com autores que pensam a complexidade e o caráter democrático-plural das plantas, a exemplo de Stefano Mancuso e Emanuele Coccia; a potência do animal, suas mutações e relações autorrecurssivas diante do humano, a partir do pensamento de sábios indígenas como Davi Kopenawa e antropólogos como Eduardo Viveiros de Castro e seu perspectivismo ameríndio; as dimensões filosóficas e a vertigem das máquinas e seus derivados (robôs, ciborgues, inteligência artificial etc.), na linha de autoras como Donna Haraway; e, por fim, a vida possível, a vida completamente outra, de fora, imaginada por filósofos como Frédéric Neyrat no campo do que ele chama de alienoceno. Evidentemente, os exemplos acima não são exaustivos, podendo e devendo ser complementados e implodidos pela criatividade de nossas colaboradoras em seus textos e imagens.

Para além desses dois eixos de seu dossiê temático – crítica do espetáculo e vidas outras – a revista (Des)troços recebe em fluxo contínuo artigos de caráter geral que se vinculem à temática do pensamento radical e à linha editorial do periódico, conforme descrito em: https://destrocosrevista.wordpress.com/sobre-a-revista/

As contribuições devem ser enviadas para o e-mail da revista (revistadestrocos@gmail.com), respeitando-se as regras de submissão no caso de textos (https://destrocosrevista.wordpress.com/submissoes-submissions/ ) até o dia 31 de maio de 2021. As exigências de titulação não se aplicam às autoras de imagens, cujas contribuições serão avaliadas unicamente pela comissão editorial. As contribuições sob a forma de textos serão avaliadas pelo comitê editorial e pelo sistema de double blind review. Uma vez aprovados, textos e imagens serão publicados no segundo número da revista, previsto para ser lançado em junho de 2021.