Max Martins e a consciência crítica do Anti-retrato
DOI:
https://doi.org/10.17851/2359-0076.43.69.28-54Palavras-chave:
Max Martins, retrato, autorretrato, poesia contemporânea brasileiraResumo
Nos dois primeiros livros do poeta Max Martins, O estranho (1952) e Anti-retrato (1960), há um número considerável de poemas que se permitem ler como retratos e autorretratos. O problema da impossível retenção do tempo e a forma ambígua de lidar com a relação entre ausência e memória são aspectos fundamentais da prática do retrato em âmbito pictórico. No entanto, o retrato poético verbal praticado por Max Martins coloca desde o início a dificuldade de seus meios representacionais não se pautarem na figuração visual e na iconicidade. A palavra, como meio de significação, convoca a imagem enquanto imagem mental, não literal ou ótica, abrindo espaço para uma vazão simbólica ampliada, grosso modo, menos controlada que a da imagem visual. A reflexão sobre esse desnível de materiais e meios dá lugar à hipótese de que Anti-retrato não se limite a encenar um drama do tempo — ancorado no conflito entre imagens da decadência e da permanência, da morte e da continuidade —, mas que, além disso, desempenhe um papel de autorreflexão sobre a própria obra, ao projetar uma instância crítica no interior do texto poético. Desse modo, o anti- de Anti-retrato, além de afirmar a impossibilidade de cristalizar o tempo na forma geral do retrato, também viria negar um específico retrato anterior, isto é, viria manifestar um afastamento, crítico e consciente, da poética proposta em O estranho, oito anos antes.
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