VOLUME 14

2024

ISSN: 2237-5864


Atribuição CC BY 4.0 Internacional

Acesso Livre

DOI: https://doi.org/10.35699/2237-5864.2024.54177

SEÇÃO ESPECIAL: DEMOCRACIA E ENSINO NA UNIVERSIDADE: 60 ANOS APÓS O GOLPE DE 1964

No caminho da máquina, a universidade: história, memória, ditadura e o ensino superior no Brasil

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En el camino de la máquina, la universidad: historia, memoria, dictadura y educación superior brasileña

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On the machine’s path, the university: history, memory, dictatorship and higher education in Brazil

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Heloisa Maria Murgel Starling 1 ,

Daniel Santos Braga 2 , Marjory dos Santos Muniz 3

RESUMO

O golpe de 1° de abril de 1964 instaurou no Brasil um regime de exceção que perdurou por 21 anos e afetou de forma indelével todas as dimensões da vida social no país. Uma dessas dimensões foi a educação superior em seus mais diversos aspectos: sua organização e estrutura, autonomia e relações de ensino e aprendizagem. Compreender as repercussões da ditadura militar na universidade brasileira pode contribuir para lançar luz sobre o papel dessas instituições na sociedade, bem como na necessidade de sua defesa. Este texto apresenta entrevista realizada com a historiadora, cientista política e professora titular do Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais, Doutora Heloísa M. Starling. Em sua explanação, a entrevistada aborda desde análises sobre o contexto do golpe e do regime instalado, em grande medida já referenciadas em sua vasta obra, quanto sobre suas vivências como estudante de graduação, pós-graduação e no exercício da docência naquele contexto. O texto, mais do que uma incursão ao passado, enseja um exercício de reflexão sobre o presente e sobre o lugar da universidade nele, na construção de uma sociedade mais justa, e de um conhecimento científico mais democrático.

Palavras-chave: golpe militar de 1964; ditadura; autonomia universitária; educação superior.

RESUMEN

El golpe del 1 de abril de 1964 instauró en Brasil un régimen de excepción que perduró durante 21 años y afectó de manera indeleble todas las dimensiones de la vida en el país. Una de estas dimensiones fue la educación superior brasileña, en términos de su organización, autonomía y relaciones de enseñanza y aprendizaje. Comprender las repercusiones de la dictadura militar en la universidad puede ayudar a esclarecer su papel en la sociedad, así como la necesidad de su defensa. Este texto presenta una entrevista realizada con la historiadora, politóloga y profesora titular del Departamento de Historia de la Universidad Federal de Minas Gerais, Doctora Heloísa M. Starling. En su exposición, la entrevistada aborda tanto el análisis del contexto del golpe y del régimen instaurado, en gran medida ya referenciados en su vasta obra, como sus vivencias como estudiante de pregrado, posgrado y en el ejercicio de la docencia en ese contexto. El texto, más que una incursión en el pasado propone un ejercicio de reflexión sobre el presente y sobre el lugar de la universidad en este presente, en la construcción de una sociedad más justa y de un conocimiento científico más democrático .

Palabras clave: golpe militar de 1964; dictadura; autonomía universitaria; educación superior.

ABSTRACT

The coup of April 1, 1964 established an authoritarian regime in Brazil that lasted for 21 years and left an indelible mark on every aspect of life in the country. One such aspect was Brazilian higher education, which was deeply affected in terms of its organization, autonomy, and teaching and learning dynamics. Understanding the repercussions of the military dictatorship on universities can help illuminate their role in society and underscore the need for their protection. This text presents an interview with Doctor Heloísa M. Starling, a historian, political scientist, and professor in the Department of History at Federal University of Minas Gerais. In her discussion, she offers analysis of the coup and the regime it established — many of which have already been extensively addressed in her body of work — while also sharing her experiences as an undergraduate and graduate student and as a professor during that period. The text is not just a reflection on the past, but also an invitation to think critically about the present and the role of the university today in building a more just society and fostering a more democratic body of scientific knowledge .

Keywords: 1964 military coup; dictatorship; university autonomy; higher education.

APRESENTAÇÃO

Articular historicamente o passado não significa conhecê-lo ‘como ele de fato foi’. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo [...]. O dom de despertar no passado as centelhas da esperança é privilégio exclusivo do historiador convencido de que também os mortos não estarão em segurança se o inimigo vencer. E esse inimigo não tem cessado de vencer”

Walter Benjamin, 6ª tese sobre o conceito de História.

O título deste texto faz referência direta ao recém-lançado livro da historiadora e cientista política, professora do Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), doutora Heloísa Maria Murgel Starling, intitulado A máquina do golpe – 1964: como foi desmontada a democracia no Brasil (Companhia das Letras, 2024). A escolha não é fortuita, mas visa dialogar com a relevante produção acadêmica e científica da autora, que concedeu a entrevista na sala do Projeto República, sediado na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (FAFICH/UFMG), aos 26 de junho de 2024. Afinal, se por um lado as forças conspiradoras funcionaram de forma sistemática como verdadeiras engrenagens para derrubar a democracia – tendo inclusive apoio externo –, por outro, o golpe precisava lidar não somente com as estruturas de poder (Presidência da República, Congresso Nacional, governos estaduais e municipais, justiça etc.), mas também com instâncias da própria sociedade, como sindicatos, igreja, mídia, entre outros. Uma dessas instâncias eram as universidades que, para o bem ou para o mal, se colocaram no caminho dos militares, seja para apoiá-los, seja para resistir a eles.

A entrevista com Heloísa Starling teve como objetivo refletir sobre as tensões entre a universidade e o regime militar, com ênfase nas repercussões da ditadura sobre as atividades acadêmicas. As perguntas, embora direcionadas para o ensino superior brasileiro em geral, dedicaram especial atenção ao lugar e papel da UFMG na trajetória da professora e no contexto de 1964 a 1985. O texto se insere no âmbito das comemorações dos 60 anos do golpe, completados em abril deste ano. Comemoração é compreendida aqui não por seu significado mais comum e popular (celebrar, festejar), mas em sua origem etimológica: co + memorar, lembrar juntos. Como a epígrafe de Benjamin revela, cabe ao estudo sistemático da História a tarefa de não deixar que o esquecimento sublime aquilo que não desejamos mais. Pelo contrário, trazer à tona os impactos da ditadura à universidade e ao ensino superior pode contribuir para a conscientização da importância da valorização da democracia. Isso se torna ainda mais necessário em tempos de negacionismo, revisionismo e flerte aberto com o autoritarismo e com o golpismo.

ENTREVISTA

Entendemos que o golpe de 1964 afetou todas as áreas do país. A sra. pode nos dizer um pouco sobre como era a estrutura da universidade brasileira (em geral) e da UFMG, em específico, antes de 1964?

No contexto que antecede o golpe, era uma universidade que estava atenta para a produção de conhecimento, mas que também tinha menos recursos para a formação e menos inserção social. Por outro lado, estavam em curso experiências inovadoras como, por exemplo, a criação da UnB (Universidade de Brasília), por Darcy Ribeiro, que estava propondo um novo modelo de universidade. Não é à toa que os militares vão invadir a UnB logo depois do golpe, pois ela conseguia combinar algo que era muito importante – e continua sendo – que é como é que a gente lida com a transdisciplinaridade do conhecimento acadêmico em um contexto em que a situação de analfabetismo correspondia a aproximadamente 54% da população brasileira. Então havia um projeto de construção de uma universidade preocupada com a realidade dos “muitos brasis”. Em outras palavras, combinar produção de conhecimento de ponta, mas que, ao mesmo tempo, fosse capaz de levar isso para o povo brasileiro. Então havia uma vitalidade que estava germinando ali e cujo melhor exemplo é a UnB, e que os militares naturalmente vão cortar.

Os militares que ocuparam o poder em 1964 também tinham um projeto de Brasil, e, consequentemente, uma ideia de universidade que estivesse em consonância com esse projeto. Daí você pensar, por exemplo, nos centros tecnológicos e o não envolvimento, por óbvio, das Ciências Humanas. Fazendo uma comparação com a contemporaneidade, o projeto de universidade dos militares é diferente do projeto bolsonarista. O projeto bolsonarista é o de destruição da universidade, tal como ela é. Ela tem que ser um lugar simplesmente de repetição de conteúdo para te colocar no mercado de trabalho. A ditadura militar pensou e montou um projeto em que a universidade seria um centro de produção de tecnologia para uma modernização. Porém, esse projeto eliminou do modelo anterior a criatividade, a interdisciplinaridade e a importância de a universidade fazer o que Hannah Arendt nos ensina: abrir a janela e deixar o vento do pensamento entrar. A função da universidade é sempre essa, porque aí o vento entra no pensamento, tira tudo do lugar e temos que reconstruir. E, para isso, é preciso se acionar a imaginação. Então, imaginação e pensamento são fundamentais para que se possa pensar uma universidade de fato.

Esse projeto militar tinha uma perspectiva mais tecnicista?

Completamente tecnológica e tecnicista, mas sem pensamento, sem imaginação, porque o pensamento é perigoso. Não são os pensamentos que são perigosos. Perigoso é o próprio pensar, porque quando eu começo a pensar, com a minha própria cabeça, eu sou capaz de analisar, e eu sou capaz de ver o que é melhor para mim, e o que é que nós podemos fazer em comum. Então, essa é vitalidade que a UFMG, diferentemente de várias outras universidades, mantém com o golpe: ela conseguiu se manter e conseguiu se blindar em muitas áreas. E isso foi muito importante para nós, porque nos permitiu conservar elementos que estão presentes nesse processo de pensar uma universidade que abra a janela para o pensamento.

Por falar da UFMG, no capítulo Noturno do Campus do livro Campus UFMG (Editora Conceito, 2019), a sra. diz sobre algumas tensões que existiam entre a universidade e setores militares (General Guedes) antes e nos primeiros momentos do novo regime. Como a tomada do poder reverberou sobre a autonomia universitária (e na autonomia docente) e qual a relevância dessa autonomia para o ensino superior? A universidade conseguiu resistir de alguma forma?

Resistiu. Resistiu porque nós tínhamos um reitor e nós tínhamos diretores nas unidades.

A Universidade conseguiu resistir de diferentes formas, por exemplo, o general Guedes 4 colocou um interventor dentro da UFMG e a UFMG reagiu, fazendo inclusive com que o [presidente] Castelo Branco tivesse que voltar atrás. O Guedes já havia se indisposto com a Universidade, porque mesmo antes do golpe, houve um enfrentamento com alguns estudantes da FACE (Faculdade de Ciências Econômicas) cujo diretor, professor Yvon Leite, se recusou a denunciar qualquer um deles pelas chamadas “atividades subversivas”. Da mesma maneira, o reitor, professor Aluísio Pimenta, articulou junto ao Conselho Universitário a defesa da autonomia da Universidade. Não quer dizer que o Conselho Universitário foi todo favorável, mas nós ganhamos. Então, nesse sentido, ele conseguiu criar várias formas de resistência: quando o General Guedes intervia, o Aluísio Pimenta mobilizava Minas Gerais inteira, jornal, governador – que inclusive era golpista –, e aí os militares se viram em uma situação difícil e Castelo Branco teve que recuar.

Foi uma situação semelhante com o diretor da FAFICH, professor Pedro de Bessa, na época do Ato Institucional n° 5. Em um momento em que as tropas cercaram a Universidade e queriam invadir a FAFICH, o então diretor foi até a porta, com a Congregação atrás dele (e todo mundo apavorado): “O que o senhor veio fazer aqui?”, perguntou ao comandante, que disse: “Nós vamos entrar”. Assim, Pedro de Bessa responde: “Claro, sem problema nenhum. O negócio é o seguinte, para entrar aqui é muito fácil, é só fazer o vestibular. Vocês sendo aprovados, vão ser muito bem-vindos. Passar bem”, entra e fecha a porta.

Então, numa ponta você tem figuras com esse porte e que, de alguma forma, ensinaram para os estudantes o valor da autonomia, o que reverberou depois em algumas ações que o próprio movimento estudantil veio a adotar. Eu me lembro de uma ação específica, logo que eu entrei na Universidade como estudante, que nós queríamos fazer uma passeata e nos foi dito que não poderia haver passeata de jeito nenhum. Aí o diretor da FAFICH falou: “Menos, né? Como é que vocês vão fazer uma passeata?”. Então, depois de idas e vindas, nós conseguimos achar uma imagem de Nossa Senhora da Liberdade. Nós fizemos uma procissão no bairro Santo Antônio 5 em homenagem à Nossa Senhora da Liberdade. Assim, não tinham mais argumentos para impedir a nossa “procissão”, nem mesmo o arcebispo.

Outra experiência sensacional, foi uma ação para dialogar junto aos estudantes calouros sobre o que estava acontecendo no país. Então, nós achamos um livro que havia sido publicado e imediatamente proibido, que era o Zero , de Inácio Loyola Brandão. E o Inácio fez um livro sensacional, porque ele pegava tudo o que era censurado no jornal e guardava em uma gaveta. A partir desses recortes, ele construiu o Zero , ou seja, era a história daquele momento. Aí pensamos: “Pô, esse livro aqui, né?”. Então o que é que nós fizemos na FAFICH? Nós passamos 15 dias indo para a Faculdade, tarde da noite, ficando lá no Diretório Acadêmico (DA), rodando em mimeógrafo, a álcool, o livro Zero do Inácio Loyola. Na hora que um desanimava, o outro falava “Não, mas olha, isso aqui é fundamental. Essa é a história do Brasil”. Aí fizemos, grampeamos, entramos, de madrugada, nas salas dos calouros, em cima de cada carteira tinha um exemplar do Zero para cada um deles.

E são formas de resistência?

Sim, e sensacionais, não são? Claro que dava um trabalho danado. Se o Inácio Loyola Brandão souber disso, certamente vai cobrar direitos autorais da UFMG. A gente fez mais de 300 livros. Existiam Diretórios Acadêmicos muito atuantes, o da Engenharia (Escola de Engenharia da UFMG), por exemplo, era muito forte. E aí nós fizemos uma outra coisa também, que foi muito importante na época, que era o Cineclube. O Cineclube FACE era essencial por várias razões. Havia curadorias que eram muito boas porque você passava filmes que levavam a pensar, que abriam a janela. Era aquela coisa boa, porque aí a menina da História ia tomar cerveja depois com os “caras” da Economia. E você criava debates. Acabava o filme, você fazia um debate. E isso é essencial para a Universidade, porque cria cultura. Você botar o livro na mão do calouro é típico da Universidade. Você botar filmes para todos os estudantes, vindos de áreas diferentes, pensarem e discutirem, é típico da universidade. Então, podemos dizer que tivemos muitas formas de resistência nesses moldes por aqui.

É claro que teve outras, de ir para o enfrentamento de rua, mas teve uma forma de resistência aqui, que eu acho que é característica de uma universidade como a UFMG e que ajudou muito a preservar esse ethos , porque a UFMG tem uma tradição também muito bonita. Tivemos um reitor, professor Gerson Boson que pensou assim: “Pô, proibiu tudo, então… como é que nós vamos fazer?”. Aí ele fez uma coisa sensacional. Chamou o povo da Belas Artes (Escola de Belas Artes da UFMG) e mandou instalar obras em todo o campus que evocassem a Liberdade. Então, o Monumento a Aleijadinho é também um monumento à Liberdade. 6 O painel da Yara Tupinambá, na entrada da Reitoria, 7 conta todas as revoltas em defesa da Liberdade. Na Fundep (Fundação de Apoio da UFMG), aquele painel enorme também. 8 Então, você vai criando maneiras que são muito características da nossa Universidade.

Figura 1 – Monumento a Aleijadinho

Fonte: obra de Sylvio de Vasconcellos (1969), fotografia de Isabela C. Passos e Possas (2024).

Figura 2 – Painel O Trabalho

Fonte: obra de Yara Tupinambá (1970), fotografia de Daniel Braga (2024).

Figura 3 – Parte do painel Inconfidência Mineira

Fonte: obra de Yara Tupinambá (1967-1969), fotografia de Isabela C. Passos e Possas (2024).

O fato de nós termos essa unidade, não significa que não havia reacionários na UFMG. Mas eles também não estavam organizados, o que nos trouxe possibilidades. Eu vi isso na última eleição e na pandemia, né? Não é que todo mundo seja democrático. Eu acho que existem bolsões, mas o ethos , a maneira de ser da UFMG, tem uma cultura que começa lá na fundação da Universidade, quando o Getúlio Vargas diz para o Mendes Pimentel que ele teria que passar os estudantes de ano por causa da revolução de 1930, porque os meninos foram participar dos Batalhões Patrióticos 9 e o Mendes Pimentel fala: “Não, aqui quem manda é a UFMG. Aqui tem uma coisa chamada autonomia, não sei se você sabe”. E nós sempre usamos essa autonomia. Então, mesmo nos momentos em que a Universidade se vê invadida, ainda assim ela conseguiu construir essa cultura. Eu não acho que isso é comum a todas. Né? Mas a nossa tem.

Nos acostumamos a ver histórias sobre as resistências da Universidade e do movimento estudantil ao golpe e ao regime militar. Porém, no volume 1 do livro A máquina do golpe (Companhia das Letras, 2024), a sra. conta que granadas com que o exército estava municiado no golpe foram fabricadas em laboratórios que também eram usados para aulas da Escola de Engenharia. Ainda nessa obra, se diz que entre os “Novos Inconfidentes” havia estudantes e professores da Escola de Direito da UFMG. Como eram as disputas ideológicas internas à Universidade que refletiam as disputas políticas gerais do país? Afinal, podemos dizer que houve apoio de setores da Universidade ao golpe de 1° de abril?

Nós tivemos eixos golpistas. Nós não éramos uma ilha, uma utopia, mas construímos uma cultura. É esse o meu argumento. Tanto nesse sentido de não ceder as oficinas quanto porque quando você constrói a propaganda do golpe, principalmente, através do IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais), 10 eles vão atuar muito diretamente com outras universidades. Então, por exemplo, a UNE (União Nacional dos Estudantes) naquele momento era uma força progressista, então o IPES vai difundir na Universidade um livrinho intitulado UNE instrumento de subversão . Esse “instrumento de subversão” é impressionante, porque eles fizeram milhares de cópias. O IPES era composto por empresários que financiaram a distribuição desse livro nas universidades.

Outro organismo pró-ditadura foi o GAP, o Grupo de Ação Patriótica, com uma forte base na Faculdade de Direito, que naquela época tinha uma cultura reacionária entre os estudantes, chegando inclusive a fazer transporte de armas clandestinas para grupos paramilitares. Ou seja, foi uma ação política direta dentro da Universidade para criar condições de fazer frente ao movimento estudantil, de combater o campo progressista e apoio aos grupos paramilitares. Eu imagino que gente dos Novos Inconfidentes 11 e provavelmente estudantes também podem ter participado de organizações paramilitares, mas eu não saberia dizer. Mas o combate foi muito direcionado. Eles não conseguiram se inserir, por exemplo, em outras unidades cujo enraizamento talvez fosse/era mais forte, no caso da FACE. Então, você tem essa disputa muito clara na Faculdade de Direito. Falta, para mim, um estudo que a gente possa pensar especificamente como é que o apoio à ditadura se deu dentro da Faculdade.

Imagino que em alguns momentos o Conselho Universitário também deva ter sido o palco de disputas e de debates muito fortes. Não quer dizer, portanto, que nós passamos incólumes; quer dizer que nós enfrentamos essas disputas. E hoje, talvez, a importância que a UFMG tem/teve no momento da pandemia, no fato de que eles não conseguiram corromper a Universidade, tenha um pouco a ver também com toda essa cultura e todo esse imaginário que está sendo construído há 100 anos e que não podemos nunca esquecer.

Como foi ser estudante de graduação e de pós-graduação no contexto do regime militar?

Olhando hoje, certamente a minha formação democrática, os meus grandes temas de interesse e pesquisa, vêm daí. Tem a ver com essa história. Quer dizer, eu vivi na Universidade um momento em que nós já estávamos fora do período Médici, então foi um momento em que a Universidade estava se mobilizando e que a sociedade estava se mobilizando. Você tinha uma atividade de vários grupos. Eu fiz parte de um deles que se chamava Liberdade e Luta (Libelu), e que foi muito importante para mim, porque a Libelu tinha uma característica que era a importância da cultura para você poder pensar como se ia resistir, como se ia pensar o Brasil. Então a primeira vez que eu li Walter Benjamin foi a partir da Libelu. Esse mundo mais ligado à imaginação, às artes.

Figura 4 – Professora Heloísa Starling e um cartaz da Libelu (Liberdade e Luta)

Fonte: fotografia de Marjory Muniz (2024).

Nosso grupo valorizava muito essas expressões, como a poesia, a importância da poesia, sabe? O Leminski 12 era da Libelu e eu me lembro do Leminski declamando versos e discutindo política. Então você não passa impunemente por isso, né? Nosso grupo era relativamente pequeno, então como íamos disputar com as outras tendências do movimento estudantil? Por isso fazíamos algumas ações para chamar a atenção. Por exemplo, eu me lembro que em certa ocasião, picharam “reconstrução e luta” na velha FAFICH. A gente saía ali do lado de fora, [onde] tem aquela platibanda e, [assim] deu para pichar. Estava começando a discussão da reconstrução da UNE, e aí nós fizemos uma coisa ótima. Escondido, lógico, nós conseguimos colocar uma bandeira da UNE no mastro de ferro da FAFICH e tirar a cordinha. Então o diretor chegou, e o comando militar mandando tirar aquilo. Porém, sem a cordinha, como é que tirava? Demos muito trabalho para eles e devem ter nos xingado bastante!

Mas, então, você fazia algumas ações também que davam visibilidade. Era importante dar visibilidade a isso. E ao mesmo tempo a Universidade inteira estava fervendo no movimento estudantil. Nos debates que você tinha com o partidão (Partido Comunista Brasileiro) e com outros, nós acabávamos aprendendo. Eu não tinha nenhuma consciência disso. Eu estava ali, mas isso formou a minha geração. Foi uma experiência muito importante na minha formação. Tem uma canção do Paulinho da Viola que fala isso, né? “Quando eu penso no futuro, não esqueço meu passado”. 13 Trazer um pouco dessa bagagem é importante para eu pensar o meu futuro. E por outro lado, eu dei uma sorte danada, porque quando eu entrei na pós-graduação na Ciência Política, e eu tinha dois interesses: eu queria entender a ditadura e eu achava – e acho que eu tinha uma certa razão – que a Ciência Política ia me dar ferramentas para que eu pudesse pensar sobre isso. Em parte, [em pensava isso] porque o nosso curso de História à época chegava até aproximadamente 1930. Eu tive grandes professores; por exemplo, Efigênia [Maria Efigênia Lage] foi uma grande professora, mas ela dava [a disciplina de Brasil] Colônia. Você tinha jovens professores que eram monitores na época, como a Carla Anastasia, que puxavam a história para frente. Então você tinha uma ação ali, um movimento ali. Mas aí eu dei uma sorte incrível, porque quem veio para Belo Horizonte no momento que eu passei na pós-graduação foi o René Dreifuss, que é o autor do livro 1964 , até hoje o livro mais importante sobre o golpe. E ele foi meu orientador. Não é à toa que [o livro] A máquina do golpe é dedicada ao Dreifuss. Ele foi um orientador maravilhoso, porque mesmo sendo um autor no auge, badalado, tinha uma generosidade enorme com a menina que tinha acabado de sair da graduação e estava ali, sem saber nada. E então ele me ensinou, não só a pesquisa: como é que você vai atrás, os macetes da pesquisa, como é que você contorna o objeto quando ele não quer, quando você não tem acesso… “Olha, se você sabe o endereço, vamos olhar no catálogo para ver quem é que são os proprietários do telefone? Vamos olhar no cartório para ver quem é o dono daquilo ali?”. Porque aí você começava a engatar, né? E ele me ensinou não só a pesquisa, como também a importância da literatura. Ele dizia: “Vai para literatura, vai para canção”. [Essa é] a importância da canção como ferramentas para que você possa entender aquela época.

Se você olhar Os senhores das Gerais , 14 minha dissertação de mestrado, é cheia de música, tá vendo? “Bossa nova mesmo é ser presidente”, 15 “Avante, avante, companheiros, vamos fazer mais filmes”, 16 “Você que inventou esse estado (...) ora, tenha a fineza de desinventar”. 17 Ele me ensinou a importância da canção popular, que ninguém usava na época, e eu usei muito nesse livro, e nunca mais larguei. E [tem] a importância de você olhar para o detalhe... Por exemplo, onde esses caras estavam se reunindo? Que tipo de lugar é esse? Por que é que eles estão se reunindo lá e não cá? Isso conta alguma coisa para nós da História? Então, por exemplo, esse capítulo que eu estou escrevendo agora n’ A máquina do golpe é inspirado no Dreifuss, porque ele abre comigo contando [sobre] a sede do Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais no Rio de Janeiro: Por que é naquele prédio? Que prédio é aquele? Onde aquele prédio está? E qual é a relação dos empresários com aquele tipo de prédio? Isso é o Dreifuss, tá? Não estou fazendo nada novo, aprendi com ele. E essa preocupação que o Dreifuss tinha, que ele usa pouco no livro [ 1964 ], porque ele naquele momento [não tinha tanta abertura para usar seu estilo], provavelmente, se ele fosse reescrever hoje o 1964 , [ele usaria mais]. [Mesmo assim,] você nota na hora que você lê o 1964 , o momento do Dreifuss acadêmico: “Sabe, ó, eu tenho que falar aqui desse jeito, porque é assim, né?”. E aí, [de repente], tem hora que ele escorrega e te conta uma história, sabe? É sensacional. Eu reli, depois de muitos anos e fiquei falando: “gente, olha aqui...”. Então aquela coisa grande, e de repente vem uma narrativa... Porque ele falava isso muito: “É muito importante que a gente conte essa história. É muito importante que as pessoas saibam da história, para que elas possam enfrentar o que vem por aí”.

E, certamente, as camisas de força da universidade, da academia, naquele momento, [para] ele, [que] estava vindo de uma universidade na Escócia, de Glasgow, eram muito fortes. Então, se o seu olhar põe esse olhar para o 1964 , você vai encontrar as duas coisas, e que depois ele retoma um pouco no A Internacional Capitalista, 18 no qual ele tenta pensar como é que essas elites multinacionais, que fizeram o golpe no Brasil, vão exportar o caso do Chile e tal... Eu dei muita sorte e acho que não estou envergonhando o Dreifuss, não é mesmo?

Também no capítulo Noturno do campus, a sra. nos convida a nos demorarmos um pouco mais sobre algumas obras espalhadas pelo campus. Poderia nos falar um pouco sobre documentos, monumentos e a memória que o campus da UFMG guarda daquele período? Ainda sobre a questão de monumentos e a memória, a capa do volume 10 (de 2020) da Revista Docência do Ensino Superior traz uma fotografia do Monumento Liberdade , que atualmente não existe mais, pois as placas foram retiradas. Uma membra de nossa equipe editorial acionou a ouvidoria e outros órgãos da universidade, sem resposta acertada. 19 Como a sra. vê esse tipo de situação ou mesmo a decisão de não se fazer atos oficiais sobre os 60 anos do golpe?

A UFMG tem que tomar uma providência “pra ontem”, porque esse momento foi muito importante. Era a reitoria da Ana Lúcia Gazzola, que tinha como vice-reitor, o professor Marcos Borato Viana. Decidiram fazer isso [o Monumento], para homenagear os estudantes e fizeram uma divulgação ampla. A Universidade parou nesse dia para pegar os quatro troncos cortados e colocar ali o nome dos estudantes, porque o objetivo era exatamente esse: eles não podem ser esquecidos! Porque se você esquece... e os gregos falam isso: o esquecimento é pior do que a morte, porque a morte se leva no coração, já o esquecimento é como se você nunca tivesse existido. Então, a lembrança te faz retornar à pessoa... A preocupação da reitora na época era: ao longo do tempo, como faríamos para que isso não fosse esquecido?

Figura 5 – Placas antigas do Monumento Liberdade

Fonte: fotografia de Diego Rodrigues de Souza (2020) 20 .

Para que as pessoas inclusive passem ali [no Monumento Liberdade ] e vejam da mesma forma que elas vão ver o Painel da Yara e vão ver os outros monumentos que têm no campus, que também é uma coisa da cultura da UFMG, e que foi criada lá com Gerson Boson.

Você repara que só um reitor, em toda a história da UFMG, teve o privilégio de estar na porta da Reitoria, que é o Mendes Pimentel. 21 Merecido. O moço enfrentou Vargas, não é? A primeira vez que se garantiu a autonomia da Universidade. Então ele merece estar ali. A avenida principal se chama Mendes Pimentel. Faz sentido ele estar ali, porque seria muito bom que os estudantes passassem ali e falassem “Mas quem é esse cara? Por que ele está aqui?”.

Então eu acho que é muito importante a gente recuperar isso [o Monumento], porque o propósito da reitora era exatamente esse. Como nós vamos garantir que as pessoas que vão estar aqui, vão sentar-se aqui para ouvir uma música, para ler um livro, se elas não sabem quem é, quem são? A gente põe aí como uma minhoca no anzol para pescar. Elas vão olhar e falar assim: “Mas eu quero saber mais desse cara”. Entendeu? “Quem é esse cara? Qual que é a história dele, né?” E na hora que você pensa no passado, você constrói repertório para a Universidade que nós queremos ter no futuro. Você constrói o repertório no presente. Então, se essa é uma Universidade que tem uma tradição, que tem grandes professores que lutaram contra a ditadura, que passou por todos os apertos que ela passou. Ela precisa desse repertório para que ela possa pensar o futuro dela. Então é fundamental que a gente faça isso.

O capítulo Pelas Liberdades Democráticas do livro Brasil: uma biografia [Cia das Letras, 2015], que a sra. escreveu com a professora Lilia Schwarcz, conta-nos sobre a morte do estudante Alexandre Vannucchi Leme, em março de 1973, e sobre as homenagens realizadas a ele: a missa rezada por D. Paulo Evaristo Arns e a canção Calabouço, de Sérgio Ricardo. Vocês escrevem ali que "A história começou a mudar nesse ano de 1973" (p. 705). Começamos nossa conversa falando sobre o papel da Universidade no golpe. Queríamos caminhar para o encerramento, te perguntando sobre o lugar da Universidade na reabertura e na redemocratização.

Olha, eu acho que nós podemos pensar que a UFMG teve um papel que foi conservar determinadas ferramentas que nos permitiram não perder o fio. Então eu penso nas bibliotecas, no fato de que os livros aqui não foram proibidos. Não se tirou um livro da biblioteca, muito pelo contrário. Os jornais de estudantes que circulavam no campus, que também traziam a possibilidade de acender à imaginação. Mas teve ações que foram muito importantes no período da redemocratização. Você tem a primeira eleição para reitor na Universidade.

E eu até apoiei outra pessoa, que foi a Beatriz Alvarenga, que é uma grande professora. Uma das referências da Universidade e que era da Física. E, aproveitando que falamos disso, precisamos reparar que de todas as ruas da Universidade só uma tem o nome de mulher, a professora Conceição (Ribeiro da Silva Machado), uma mulher incrível que merecia um perfil maior. Está na hora de colocar também o nome da professora Beatriz Alvarenga nesse campus!

Mas, então você tem isso... Você teve algumas situações, assim, muito decisivas, por exemplo, ganhou nessa eleição um professor da Medicina que era o Cid Velloso, e ele chamou para chefia de gabinete, talvez uma das maiores historiadoras que a UFMG teve, a Maria Efigênia Lage de Resende. Nós tínhamos uma agência do SNI (Serviço Nacional de Informação) 22 aqui dentro da UFMG, a AESI (Assessoria Especial de Segurança e Informação). E o reitor à época, professor Eduardo Cisalpino, combinou com o responsável pela AESI, para que ele guardasse toda a documentação. O que foi feito. Quando a professora Efigênia bateu o olho nesse material, ela falou: “Eu vou organizar isso”. Então, toda a memória da Universidade do período do golpe, as intervenções, como que foi, como que não foi, tudo isso foi organizado. Nós somos provavelmente a única Universidade pública que tem essa memória documental. Eu lembro quando eu estava na reitoria, a presidente na época era a Dilma (Roussef), e ela queria o arquivo da AESI por ocasião da Comissão da Verdade. Eu falei: “Sem chance. A senhora manda o recurso, a gente faz um xerox. Agora, tirar da UFMG?”, “Ah, mas a UFMG é pública”. Eu falei: “E tem autonomia. Então nem vem, tá?”.

Então, isso foi importantíssimo para nós, porque nos permite reconstruir essa história de uma maneira muito, muito, muito forte. É um material rico não só para a gente entender a história e as intervenções, mas para a gente achar os personagens dessa história, as figuras que agiram contra e a favor da Universidade. São umas histórias que valem muito a pena, porque você tira repertório. Se o Cisalpino, o Cid Velloso, a Efigênia tiveram cuidado com essa memória, era bom botar as placas lá nos quatro troncos, porque isso faz parte do ethos da nossa Universidade.

Sabemos que o anacronismo é o “pecado do historiador”, mas não pudemos deixar de compartilhar suas impressões ao final do livro Campus UFMG sobre os sinais de que “alguma coisa está fora dos eixos na democracia brasileira”. Nos últimos anos, estamos novamente escutando discursos já utilizados em regimes fascistas no mundo, como “guerra ao comunismo” e “defesa da liberdade”, que em alguns momentos quase (re)ssoam como as denúncias da Liga da Mulher Democrata (LIMDE) ou dos Novos Inconfidentes. Que lições podemos tirar da história para pensar o papel da universidade e do ensino superior na defesa da democracia e em um diálogo maior com a sociedade nos dias de hoje?

Olha, eu acho que esse diálogo a UFMG tem feito em vários níveis. Tomo, por exemplo, a questão da pandemia, porque, inclusive, nós só construímos pensamento e história, né? E nós construímos também recursos para enfrentar os desafios que a história nos impõe. Essa coisa que o Mendes Pimentel e todo o mundo diz que a UFMG tem que fazer, está lá no Darcy Ribeiro também: Como é que você produz o conhecimento de ponta? A vacina? Como é que você leva isso para a sociedade? [Pensar sobre isso] é fundamental para que a gente possa garantir a democracia. A universidade de maneira geral, e a UFMG, em específico, enfrentou aquilo que eu e a Lilia (Schwarcz) escrevemos no Brasil: uma biografia : “que a democracia está dada, o importante é a República”. E nós depois tivemos que pedir desculpa ao leitor... Mas foi fundamental pensar os diferentes recursos que a universidade teve, por exemplo, quando ela cria um caminhão museu, quando ela faz uma exposição… Eu estou usando muito o caso da cultura, porque eu acho que isso leva à imaginação, sabe? E na hora que você acende a imaginação, ninguém segura mais. Esse é o papel da universidade. Porque na hora que ela produz o conhecimento para a sociedade e leva para a sociedade, e na hora que ela acende a imaginação e abre a janela do pensamento, [essas] são ferramentas que a democracia precisa.

O historiador também é fundamental para defender a democracia pela seguinte razão: talvez uma das ações mais eficientes para destruir a democracia seja apagar o passado e poder reescrever esse passado. E o historiador, ele só tem uma verdade, que é a verdade factual. Então ele vai para a praça pública e diz o seguinte: “Olha, isso aqui é um golpe”. E aí não tem mais jeito, entendeu? Então, a importância do historiador na defesa da democracia é essa. Ele vai para a praça e diz o que aconteceu. E quanto mais tirânica é a forma de pensar e a sociedade, mais o alvo é o historiador. Pensa isso multiplicado dentro desse campus quando ampliamos esse raciocínio para pensar o pessoal das Exatas, o pessoal da Belas [Artes], o pessoal da FaE (Faculdade de Educação), o pessoal das Engenharias... É quando eles dizem assim: “Isso aqui não pode ser feito, porque vai acabar com o meio ambiente. Então, como é que nós vamos fazer?”. Você está enfrentando a tirania, você está trazendo a verdade factual e dizendo que o que [os tiranos] estão fazendo, portanto, é uma mentira ou é uma falsificação da realidade. Quando você faz isso, de quebra você chama a imaginação e acende o pensamento... não é à toa que eles querem destruir a universidade, para a universidade ser apenas um repositório de formação de jovens para um mercado de trabalho cada vez pior. Eles têm que destruir... Olha o que nós estamos fazendo? É compreensível, né? Porque olha o trabalho do ICB (Instituto de Ciências Biológicas da UFMG). Olha o trabalho da Farmácia (Faculdade de Farmácia da UFMG). Olha o trabalho lá da Medicina (Faculdade de Medicina da UFMG) quando ela pensa na questão da AIDS. E na época da pandemia: “Não, isto aqui é uma doença. Funciona desse jeito e nós vamos combatê-la dessa forma”. Então, na hora que você multiplica isso em todas as nossas Unidades, isso para as tiranias é insuportável. Imaginação, pensamento e verdade factual!

REFERÊNCIAS

BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito da História. In : BENJAMIN, Walter. O anjo da história . Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012. p. 7-20.

DREIFUSS, René A. 1964 : a conquista do Estado – Ação política, Poder e Golpe de Classe. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1981.

SCHWARCZ, Lilia M.; STARLING, Heloísa M. Brasil : Uma bibliografia. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.

STARLING, Heloísa M. A máquina do golpe - Engrenagens militares e apoio externo. 1964: Como foi desmontada a democracia no Brasil. vol. 1, São Paulo: Companhia das Letras, 2024.

STARLING, Heloísa M. Campus UFMG . Belo Horizonte: Conceito, 2019. (BH - A cidade de cada um, 33).

Heloisa Maria Murgel Starling

Historiadora e cientista política, é professora titular livre no Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde dirige o centro de pesquisas Projeto República. Formada em Comunicação Social (PUC-MG, 1979) e História (UFMG, 1981), com mestrado e doutorado em Ciência Política (UFMG, 1986; IUPERJ, 1997). É referência em estudos sobre a Ditadura Militar no Brasil e autora de livros como Os senhores das Gerais (1986), Lembranças do Brasil (1999), Brasil: uma biografia (2015, com Lilia M. Schwarcz), República e Democracia: Impasses do Brasil Contemporâneo (2017) e Ser republicano no Brasil Colônia (2018).

projetorepublicaufmg@gmail.com

Daniel Santos Braga

Graduado em História e em Pedagogia, é mestre em Educação pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e doutor em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) (2022). Docente na UEMG Ibirité em cursos de formação de professores. Atua nos Programas de Pós-Graduação em Educação e Formação Humana (Faculdade de Educação da UEMG) e Educação Inclusiva (PROFEI/UEMG/Ibirité).

daniels.braga@hotmail.com

Marjory dos Santos Muniz

Graduanda em Antropologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É bolsista na Diretoria de Inovação e Metodologia de Ensino (GIZ), desde 2022. Já foi bolsista de extensão no Projeto Interagindo, pela Faculdade de Educação da UFMG (2023), tendo atuado como apoio pedagógico.

marjorymuniz.universidade@gmail.com

Como citar este documento – ABNT

STARLING, Heloisa Maria Murgel; BRAGA, Daniel Santos; MUNIZ, Marjory dos Santos. No caminho da máquina, a universidade: história, memória, ditadura e o ensino superior no Brasil. Revista Docência do Ensino Superior , Belo Horizonte, v. 14, e054177, p. 1-19, 2024. DOI: https://doi.org/10.35699/2237-5864.2024.54177.




1 Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil.

ORCID ID: https://orcid.org/0000-0003-2951-3689. E-mail: projetorepublicaufmg@gmail.com

2 Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Belo Horizonte, MG, Brasil.

ORCID ID: https://orcid.org/0000-0001-5075-4570. E-mail: daniels.braga@hotmail.com

3 Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil.

ORCID ID: https://orcid.org/0009-0005-8620-6804. E-mail: marjorymuniz.universidade@gmail.com


Recebido em: 30/08/2024 Aprovado em: 19/09/2024 Publicado em: 04/10/2024

4 General Carlos Luís Guedes.

5 O antigo prédio da FAFICH-UFMG ficava localizado na Rua Carangola, 288, no Bairro Santo Antônio. O imóvel é tombado como Patrimônio Cultural da cidade de Belo Horizonte e hoje abriga a Secretaria Municipal de Educação.

6 Localizado no gramado da Reitoria.

7 Intitulado Painel Inconfidência Mineira .

8 Painel O trabalho , de Yara Tupinambá (com assistência de Olímpia Couto e Lúcia Marques).

9 Durante os acontecimentos da chamada Revolução de 1930, muitos estudantes se envolveram nas lutas da Aliança Liberal que depôs, pelas armas, o presidente Washington Luís. O recém-empossado presidente provisório Getúlio Vargas assinou um decreto que aprovava automaticamente todos os alunos ao final daquele ano, sem necessidade de exames finais.

10 O IPES foi um dos principais ideólogos da propaganda anticomunista no Brasil, assessorando e instrumentalizando teoricamente os movimentos que culminaram no golpe de 1964 e na institucionalização do regime militar.

11 Autodenominação de um grupo de políticos e empresários mineiros que se organizaram para ajudar na deposição do presidente João Goulart em 1964.

12 Paulo Leminski (1944-1989), escritor, poeta, músico, crítico literário, jornalista, publicitário, tradutor e professor curitibano.

13 Dança da Solidão (1972).

14 Os senhores das Gerais: os novos inconfidentes e o golpe de 1964 (Editora Vozes, 1986).

15 Presidente Bossa Nova, de Juca Chaves (1959).

16 Avante camaradas, canção militar brasileira, com autoria atribuída a Antônio Manuel do Espírito Santo, na década de 1920.

17 Apesar de você, Chico Buarque (1978).

18 A internacional capitalista: estratégias e táticas do empresariado transnacional (1918-1986), publicado pela editora Espaço e Tempo (Rio de Janeiro), em 1987.

19 Durante a preparação e realização desta entrevista, o Monumento Liberdade estava invisibilizado no campus Pampulha, as placas tinham sido retiradas. Uma membra do corpo editorial da Revista Docências do Ensino Superior, servidora da UFMG, havia acionado a ouvidoria a esse respeito, em março de 2022, recebendo uma resposta que demonstrou intenção de reestabelecer o monumento sem, no entanto, informar uma previsão para tal. Em abril de 2024, ela enviou e-mail apelando diretamente à Pró-Reitoria de Administração, à Coordenadoria de Assuntos Comunitários, à Diretoria de Ação Cultural e à Pró-Reitoria de Graduação. Dessa vez, não houve resposta. Em agosto de 2024, iniciou-se a reinstalação da obra no mesmo local. Em 24 de setembro, a UFMG concedeu diplomas póstumos aos estudantes mortos pela ditadura militar, além de homenagear dois professores e dois técnicos que foram afastados de suas funções à época. Na data da publicação da entrevista, a reinstalação do Monumento já estava concluída. Optamos por manter, na publicação, a pergunta e a resposta da entrevistada, tendo em vista sua importância e relevância como um libelo pela manutenção das obras do campus, assim como pela memória dos quatro estudantes da UFMG, vítimas da ditadura militar: Gildo Macedo Lacerda (estudante de Economia na Face), Idalísio Soares Aranha Filho (estudante de Psicologia na Fafich), Walkíria Afonso Costa (estudante de Pedagogia na FaE) e José Carlos Novaes da Mata Machado (estudante de Direito na Faculdade de Direito).

20 A fotografia de Diego Souza foi capa do volume 10 da Revista Docência do Ensino Superior, https://periodicos.ufmg.br/index.php/rdes/issue/view/864.

21 Monumento em homenagem ao reitor Mendes Pimentel, localizado à porta da reitoria.

22 O Serviço Nacional de Informações (SNI) era o órgão que supervisionava e coordenada as atividades de informações e contrainformações no Brasil e exterior, servindo como órgão de espionagem da ditadura.

Rev. Docência Ens. Sup., Belo Horizonte, v. 14, e054177, 2024 6