QUANDO CONTAR É RESISTIR
REFLEXÕES EM TORNO DE MULHERES ARTISTAS NO NEORREALISMO PORTUGUÊS
DOI:
https://doi.org/10.17851/2359-0076.44.72.%25pPalavras-chave:
Artes plásticas, Ficção de autoria feminina, Neorrealismo, Fortuna críticaResumo
No presente ensaio, pretende-se refletir sobre a presença de algumas mulheres artistas no elenco de participantes no Neorrealismo português. A partir da leitura da própria fortuna crítica do movimento, será possível detectar uma ausência de nomes femininos, sobretudo, no campo literário, ao contrário do que ocorre no setor das artes plásticas, entre as décadas de 1940-1960. Numa breve visada em alguns manuais de história da literatura portuguesa da época, não será difícil detectar que a literatura de autoria feminina é relegada a um espaço mínimo, ou quando sequer é mencionada. No entanto, certas obras, como as de Judith Navarro, Lília da Fonseca e Maria Archer, atestam a adesão de mulheres escritoras à estética neorrealista, seja de forma direta e incisiva, seja de maneira indireta e eventual. Neste sentido, trazer à cena a presença destas escritoras constitui uma forma de demonstrar que o exercício de contar pode ser entendido como um gesto de resistência no cenário português do Estado Novo Salazarista.
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