Tradução ética
Guimarães Rosa, Homero à brasileira
Mots-clés :
tradução, fidelidade, ética, Henri Meschonnic, João Guimarães Rosa, translation, fidelity, ethicsRésumé
Resumo: O artigo pretende refletir sobre critérios fundantes nas análises das traduções, a saber, “fidelidade” e “confiabilidade”, os quais são frequentemente tratados como conceitos absolutos. O texto procura relativizar e problematizar tais noções, contrapondo à fidelidade ao conteúdo a fidelidade à criatividade e à excelência poética. A proposta caminha pela discussão sobre ética (po)ética fundamentada nos estudos de Henri Meschonnic e conclui que podemos considerar como uma “tradução fiel” também aquela pela qual o “tradutor” (no caso, João Guimarães Rosa), antes de buscar reproduzir a história e o conteúdo formal da obra emulada, resgata pequenos trechos de uma grande obra e vivifica-os em sua própria criação, preservando e magnificando as estratégias poéticas do autor objetivado que mais o impactaram. Exemplificamos com a recriação de uma passagem de Homero (Ilíada, 24, v. 785-788), o nascer da Aurora, a qual é, assim, mantida viva, em detalhes, na cultura de chegada. Afirmamos, deste modo, que é possível perceber uma atitude de fidelidade e devotamento nas minúcias da criação poética, o que, por sua vez, justifica a inusitada autodenominação de “tradutor” firmada por Guimarães Rosa a Günter Lorenz em Gênova, em janeiro de 1965.
Palavras-chave: tradução; fidelidade; ética; Henri Meschonnic; João Guimarães Rosa.
Abstract: The article aims to reflect on fundamental criteria in translation analysis, namely “fidelity” and “reliability”, which are often treated as absolute concepts. The text seeks to relativize and problematize such notions, contrasting fidelity to content with fidelity to creativity and poetic excellence. It discusses (po)ethical ethics based on Henri Meschonnic’s studies and concludes that we can consider a “faithful translation” to be one in which the “translator”, in this case João Guimarães Rosa, before reproducing the history and formal content of the work he has emulated, retrieves small passages of a great work and vivifies them in his own work, preserving and enhancing the poetic strategies that had the greatest impact on the target author. We exemplify this with the recreation of a passage from Homer (Iliad, 24, v. 785-788), the dawning of the dawn, which is thus kept alive, in detail, in the target culture. We affirm, thus, that it is possible to perceive an attitude of fidelity and devotion in the minutiae of poetic creation, which, in turn, justifies the unusual self-denomination of “translator” signed by Guimarães Rosa to Gunther Lorenz in Genoa, January 1965.
Keywords: translation; fidelity; ethics; Henri Meschonnic; João Guimarães Rosa.
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