Monstros e fronteiras
manifestações do gótico em Úrsula e Uma história de quilombolas
DOI:
https://doi.org/10.17851/2358-9787.31.2.193-219Palavras-chave:
Maria Firmina dos Reis, Bernardo Guimarães, góticoResumo
O artigo compara o romance Úrsula (1859), de Maria Firmina dos Reis, e a novela Uma história de quilombolas (1871), de Bernardo Guimarães no que diz respeito ao diálogo que ambos estabelecem com as convenções do romance gótico inglês. O objetivo é examinar como Reis e Guimarães se apropriam, atualizam ou subvertem o componente étnico-racial da representação do monstro dentro do contexto escravocrata de suas narrativas. Examina-se a hipótese de que, em cada uma delas, a construção do medo se dá por meio da figuração do monstruoso, sendo que essa figuração se relaciona intimamente com a identificação racial da voz narrativa. Nesse sentido, pretende-se também contribuir com a teoria sobre o gótico literário perscrutando o seu inconsciente não em suas narrativas modelo, em ascensão durante o período imperialista ocidental, mas nos desvios, em narrativas provenientes de uma ex-colônia. Como resultado, observa-se que o aspecto do medo do cruzamento de fronteiras étnico-raciais é um fator central para que se compreenda melhor esse gênero.
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