Um estranho chá e outros bichos

“Tigrela”, de Lygia Fagundes Telles, e os Estudos Críticos Animais

Autores

  • Naira de Almeida Nascimento Universidade Tecnológica Federal do Paraná

DOI:

https://doi.org/10.17851/2358-9787.32.3.305-323

Palavras-chave:

Tigrela, Lygia Fagundes Telles, Estudos Críticos Animais, Gabriel Giorgi, Julieta Yelin

Resumo

Conotada normalmente com o gênero fantástico, uma parte da contística de Lygia Fagundes Telles pode, contudo, ser relida pela perspectiva dos Estudos Críticos Animais. O recente falecimento da escritora, culminando também em iniciativas como a da Companhia das Letras, que fez a publicação integral de seus contos (2018), enseja a uma retomada de sua obra. A virada animal, ponto de partida das reflexões conduzidas, prima, primeiramente, por questionar a centralidade conferida ao animal humano, em particular na cultura ocidental e sobretudo a partir da modernidade. A era do antropoceno caracteriza-se justamente por esta imposição autoritária das necessidades e dos desejos humanos frente aos direitos advindos de outras formas de vida. A análise do conto “Tigrela”, de Seminário dos ratos (1977), pretende atentar para sentidos além da mera animalização contida na evocação da protagonista e, perceber na escrita de Lygia um jogo entre as figurações de animais não-metafóricas (FERRREIRA, 2005), que se aproxima de algumas realizações de João Guimarães Rosa e de Clarice Lispector. Lidos hoje pelos Estudos Críticos Animais, tanto os textos de Rosa como de Clarice elucidam uma relação possível e até desejada entre animais humanos e não-humanos, a partir de uma conscientização do papel subalterno exercido pelos não-humanos no nosso imaginário. A leitura do texto conta ainda com a fundamentação teórica baseada no conceito de devir (DELEUZE; GUATTARI, 2012) e nas apreensões do antiespecismo feminino, além das considerações críticas de Gabriel Giorgi e de Julieta Yelin.

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Publicado

2024-04-23