Delgado, Márcia Cristina. Cartografia sentimental de sebos e livros. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. 167 p.

Autores

  • Maria da Conceição Carvalho

Resumo

Originalmente apresentado como dissertação de mestrado no Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da UFMG, o livro da socióloga Márcia C. Delgado representa importante contribuição à bibliografia sobre a história do livro e da leitura no Brasil. Embora venha se ampliando, desde a última década o número de trabalhos, acadêmicos ou não, contemplando essa temática da história cultural brasileira, ainda são muitos os silêncios e as lacunas referentes ao estudo das práticas sociais da leitura. Nesse sentido, essa investigação sobre o comércio de livros usados, publicada em 1999, merece uma divulgação mais ampla entre os profissionais da área da ciência da informação interessados nos processos de leitura e formação de leitores. Cartografia sentimental de sebos e livros enseja, de fato, o reencontro de bibliófilos, colecionadores e estudiosos do campo da bibliofilia na celebração de uma das formas mais peculiares de se amar o livro: a garimpagem de obras, raras ou especiais, nas livrarias chamadas sebos. Significativamente, quem escreve a orelha do livro é um bibliófilo, entre os brasileiros o mais conhecido na atualidade, seja pela qualidade de sua coleção de obras raras, seja pelo entusiasmo com que participa, apesar de seus noventa anos de idade, de todos os eventos culturais relacionados ao livro. Trata-se do empresário paulista José Mindlin. Ele reafirma aqui sua fascinação de toda uma vida pela garimpagem de livros em sebos do Brasil e do exterior e antevê o recrutamento de novos aficionados para essa prática entre os que vierem a ler esse livro sobre os sebos de Belo Horizonte. Dividido em seis capítulos, acompanhados de notas explicativas, além de uma bibliografia abrangente, é uma obra que deve agradar tanto aos iniciados, já rendidos ao mal de sebo (parodiando Jacques Derrida com seu belíssimo Mal de arquivo; uma impressão freudiana, 1995), quanto a outro tipo de leitor que, por diferentes motivos, apresente preconceitos em relação aos livros usados. Os primeiros, imagino e julgo pela minha própria leitura, percorrerão as páginas com a sensação prazerosa de quem refaz um belo caminho conhecido, identificando endereços, reencontrando pessoas, confirmando afinidades e escolhas de amante e/ou colecionador de livros. Diálogo renovado e possível graças à escrita apaixonada e cúmplice da autora que, sem perder a lucidez e o rigor necessários ao historiador, não tenta esconder ou diminuir sua emoção ao falar do livro e seu interesse pelas pessoas que interagem no circuito livreiro. De fato, mais do que o roteiro das sete casas selecionadas no campo de Belo Horizonte, com informações importantes como endereço, natureza do acervo e estado de conservação, a intenção maior da pesquisadora parece ter sido a de dar voz ao sebista e ao freqüentador de sebos, traçando desses uma tipologia e trazendo à luz depoimentos reveladores de um universo fascinante, de intrincadas associações. O outro leitor potencial de Cartografia sentimental de sebos e livros, o consumidor de livros que, por diferentes razões (ainda) não freqüenta esse tipo de livraria, encontrará nesta obra aquilo que o seu título promete: um mapeamento histórico e geográfico dos sebos da capital mineira, ao mesmo tempo informativo e sedutor que conta, inclusive, com o recurso que a autora chama de um iconográfico mergulho pelo mundo dos sebos de Belo Horizonte, que vem a ser o último capítulo. Começando do início apresenta-se, no primeiro capítulo intitulado O mercado de livros no Brasil: uma breve incursão histórica, o cenário histórico do surgimento do sebo como segmento do mercado livreiro. De sebos e sebistas é o título do segundo capítulo, onde a autora apresenta os diferentes termos relacionados com o comércio de livros usados, trazendo, inclusive, o ponto de vista dos livreiros entrevistados. Buquinagem, buquinista, alfarrábio, caga-sebo, sebista, são alguns dos termos que ela recupera em dicionários etimológicos e outras fontes de referência. Motivo de depreciação para alguns, de orgulho para outros conforme mostram depoimentos transcritos na íntegra, os termos sebo e sebista parecem estar consolidados, tanto na representação dos leitores quanto na literatura especializada, haja visto o mais recente guia lançado no mercado intitulado Guia dos sebos do Brasil, de Antônio Carlos Secchin. O terceiro capítulo constitui o eixo central do livro onde se desenha a cartografia dos sebos de Belo Horizonte, tomando-se, como amostra, sete livrarias consideradas representativas dentre os estabelecimentos da capital que trabalham com livros usados, além de edições esgotadas e livros raros. Considera -se, como foco de análise de cada livraria o acervo, os livreiros e o público leitor. O quarto capítulo pretende inserir os achados dessa pesquisa no campo de estudos das práticas sociais de leitura, travando-se um diálogo com os historiadores mais destacados da atualidade nesta linha como Robert Darnton e Roger Chartier. No último capítulo, imagens, já mencionadas, contam mais sobre o universo dos sebos. Foram incluídas fotos dos sebistas em seus locais de trabalho, de bibliófilos no ato de garimpar preciosidades, além dos trapeiros que, eventualmente, compram obras raras misturadas a papel velho. Interessante é, também, saber da diferente gama de objetos encontrados dentro de livros vendidos aos sebos: fotos, santinhos, marcadores de livros, folhetos de propaganda política e cultural, restos, como diriam os freudianos, que ajudam a traçar o perfil do leitor através dos tempos. Que este livro cumpra uma trajetória importante junto ao leitor brasileiro, inclusive apontando caminhos para futuros estudos.

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Publicado

2007-11-20

Como Citar

Carvalho, M. da C. (2007). Delgado, Márcia Cristina. Cartografia sentimental de sebos e livros. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. 167 p. Perspectivas Em Ciência Da Informação, 7(1). Recuperado de https://periodicos.ufmg.br/index.php/pci/article/view/23415

Edição

Seção

Resenhas