Os limites do testemunho literário: compreendendo o paradoxo de Levi
DOI:
https://doi.org/10.17851/1982-3053.11.21.127-150Palavras-chave:
Testemunho, Primo Levi, Experiência-LimiteResumo
Auschwitz, muitas vezes, foi pensado como evento irrepresentável, que transcende as possibilidades linguísticas disponíveis de representação. O escritor italiano Primo Levi (1919-1987) tentou enfrentar tal problemática, revelando o chão aporético sobre o qual pode se desenvolver o trabalho do testemunho literário: impossível, mas necessário. Este artigo pretende analisar alguns dos problemas éticos e epistemológicos que o testemunho de eventos traumáticos poderia suscitar para a literatura. A hipótese é deque a construção do testemunho, do modo como foi elaborado por Levi, contém em si uma lacuna, ou uma falta que o constitui: ao mesmo tempo em que transmite, por imperativo, uma experiência-limite, deixa de comunicar, por inabilidade ou incapacidade, outras experiências. O argumento central é de que a condição de possibilidade do testemunho é justamente sua característica lacunar, algo que confere potência ao processo de transmissão de experiências.
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