Limites do discurso político na lei da anistia

Novas perspectivas a partir do controle de convencionalidade

Autores

DOI:

https://doi.org/10.35699/2525-8036.2022.38995

Palavras-chave:

Discurso político, Lei da anistia, Controle de convencionalidade

Resumo

O presente artigo tem por objetivo avaliar os limites do discurso político utilizado como fundamentação da Lei da Anistia. Sob uma metodologia de abordagem hipotético-dedutiva, o trabalho busca superar o seguinte problema: O discurso político e a perpetuação do modelo adversarial (amigo-adversário) podem ser superados por meio da aplicação de instrumentos jurídicos? Utilizando-se uma metodologia de procedimento monográfica, por meio de pesquisas exploratórias na doutrina de ciências políticas e de direito nacional e internacional, além de investigações na jurisprudência dos Tribunais brasileiros e estrangeiros, o artigo apresenta um panorama histórico da ideologia utilizada na edição da legislação, avançando sobre o papel de resgate das Comissões de Verdade, inclusive sob o espectro internacional. Investiga-se a alteração do paradigma norteador da anistia a partir do controle de convencionalidade e da jurisprudência estrangeira, sobretudo com a ressignificação dos atos praticados durante o regime militar de 1964 como crimes lesa-humanidade. Analisando-se julgamentos realizados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos e pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a partir da atuação do Ministério Público Federal, debate-se a reclassificação jurídica dos crimes como um limite ao discurso de impunidade e de legitimação do grupo político hegemônico, promovendo-se uma releitura da anistia brasileira. Conclui-se que adoção de um posicionamento consentâneo à valorização dos Direitos Humanos no plano global impede a perpetuação do discurso político da Lei Federal nº 6.683/1979, declarando-se sua inconvencionalidade de forma a permitir que instrumentos jurídicos influam na construção e definição da Política.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Felipe Cidral Sestrem, Universidade Federal de Santa Catarina

Mestrando em Direito, Estado e Sociedade na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil. Pós-graduado lato sensu em Direito Tributário (IBET) e em Direito e Saúde (FIOCRUZ). Integrante do “Grupo de Estudos Compliance, Conformidade, Processo e Constituição” e “Direitos Humanos da Tributação” da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Procurador do Município de Joinville/SC. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5244-2359. Contato: f_cidral@hotmail.com.

Henrique da Silva Telles Vargas, Universidade Federal de Santa Catarina

Mestrando em Direito, Estado e Sociedade na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil. Pós-graduado (LLM) em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Procurador-Geral do Município de Garopaba/SC. Membro da Comissão Estadual de Conformidade e Compliance da OAB Seccional de Santa Catarina. Integrante do Grupo de Estudos “Compliance, Conformidade, Processo e Constituição” da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3590-5881. Contato: henrique.telles0@gmail.com.

Ricardo Fretta Flores, Universidade Federal de Santa Catarina

Mestrando em Direito, Estado e Sociedade na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil. Advogado. Pós-graduado lato sensu em Direito Processual Civil pelo CESUSC. Advogado. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7955-9605. Contato: ricardofretta@hotmail.com.

Referências

ABBOUD, Georges; SCAVUZZI, Maira Bianca; FERNANDES, Ricardo Yamin. Controle de convencionalidade e direitos fundamentais. Revista de Processo, São Paulo, v. 268. pp. 569-584, jun., 2017.

ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Mutações do Conceito de Anistia na Justiça de Transição Brasileira. Revista de Direito Brasileira – RDBras, v. 3, n. 2, jul./dez. 2012, p. 357-379.

ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução de Roberto Raposo. 10. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2007.

ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. 7. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1992.

BARBOSA, Marco Antônio Rodrigues; VANNUCHI, Paulo. Resgate da memória e da verdade: um direito de todos. In: SOARES, Inês Virgínia Prado; KISHI, Sandra Akemi Shimada (coord.). Memória e verdade: A Justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009, pp. 55-68.

BARRETO, Renata Caldas; BORGES, Arleth Santos. Ditadura, Controle e Repressão: Revisitando teses sobre os Governos Militares no Brasil. Revista de Ciências do Estado. Belo Horizonte, v. 1, n. 2, 2016, p. 107-129.

BECHARA, Gabriela Natasha. Antecedentes históricos da lei de anistia e da justiça de transição no Brasil. PFLUG, Samantha Ribeiro Meyer; MALISKA, Marcos Augusto (coord.). Justiça de transição: verdade, memória e justiça. Florianópolis: FUNJAB, 2013, pp. 44-73.

BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. 6. Ed. Trad. Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2006.

BUFF, Luci. Tempo de perdão? In: SOARES, Inês Virgínia Prado; KISHI, Sandra Akemi Shimada (coord.). Memória e verdade: A Justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009, pp. 235-248.

CAMPANTE, Rubens Goyatá. O patrimonialismo em Faoro e Weber e a sociologia brasileira. Dados. v. 46, n. 1, 2003, pp. 153-193.

CAMPOS, Maíra Prado. Os Movimentos Sociais e os significados da Comissão Nacional da Verdade no Brasil: A Memória da Ditadura vinculada aos Direitos Humanos. Relatório Final – PIBIC. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas, 2016. Disponível em: < https://pesquisa-eaesp.fgv.br/sites/gvpesquisa.fgv.br/files/publicacoes/relatorio_final_-_2016_-_maira.pdf> Acesso em: 08.07.2022.

CIDH, Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Situação dos direitos humanos no Brasil: Aprovado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 12 de fevereiro de 2021. San Salvador: OEA, Doc. 9, 2021.

CIDH, Comissión Interamericana de Derechos Humanos. Situación de los derechos humanos en Mexico. San Salvador: OEA, Doc. 44/15, 2015.

CIDH, Corte Interamericana de Derechos Humanos. Caso de las Hermanas Serrano Cruz Vs. El Salvador. Sentencia de 23 de noviembre de 2004. Washington, 2004.

CIDH, Corte Interamericana de Direitos Humanos. Caso Gomes Lund e Outros (Guerrilha do Araguaia) Vs. Brasil. Sentença de 24 de novembro de 2010. Washington, 2010.

CIDH, Corte Interamericana de Direitos Humanos. Caso Herzog e Outros Vs. Brasil. Sentença de 15 de março de 2018. Washington, 2018.

CIDH, Corte Interamericana de Direitos Humanos. Caso Julia Gomes Lund e Outros (Guerrilha do Araguaia). Washington, 2009.

COMISSÃO Nacional da Verdade. Relatório da Comissão Nacional da Verdade. Brasília, Casa Civil, 2014. Disponível em: <http://www.cnv.gov.br/> Acesso em 09.07.2022.

COMPARATO, Fábio Konder. A responsabilidade do Estado brasileiro na questão dos desaparecidos durante o regime militar. In: TELES, Janaína (org.). Mortos e Desaparecidos: reparação ou impunidade? 2. ed. São Paulo: FFLCH/USP, 2001, pp. 55-63.

CONCI, Luiz Guilherme A. O controle de convencionalidade como parte do constitucionalismo transnacional fundado na pessoa humana. Revista de Processo. v. 232, pp. 363-382, jun. 2014.

CORREIA, Marcus Orione Gonçalves. Anistia para quem? In: SOARES, Inês Virgínia Prado; KISHI, Sandra Akemi Shimada (coord.). Memória e verdade: A Justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009, pp. 141-152.

COSTA, Alexandre Bernardino; AGUIAR, Roberto Armando R. O legado da ditadura para educação jurídica brasileira. In: SOUSA JUNIOR, José Geraldo de; SILVA FILHO, José Carlos Moreira da; PAIXÃO, Cristiano; FONSECA, Lívia Gimenes Dias da; RAMPIN, Talita Tatiana Dias (org.) O direito achado na rua: introdução crítica à justiça de transição na América Latina. Brasília: UnB, 2015, p. 392-399.

COSTA, Frederico Alves; PRADO, Marco Aurélio Máximo. Artimanhas da hegemonia: obstáculos à radicalização da democracia no Brasil. Psicologia & Sociedade. V. 29, 2017, p. 1-11. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/1807-0310/2017v29152680 Acesso em: 12 de fevereiro de 2022.

DUTRA, Deo Campos; LOUREIRO, Sílvia Maria da Silveira. A Declaração de Inconvencionalidade da Lei de Anistia Brasileira pela Corte Interamericana de Direitos Humanos: Caso Gomes Lund e Outros vs. Brasil (Guerrilha do Araguaia). Revista dos Tribunais I. v. 920, jun. 2012, p. 183-203.

FABBRI, Paolo; MARCARINO, Aurelia. El Discurso Político. DeSginis. N. 2, abr. 2002, Barcelona: Editorial Gedisa, 2002, p. 17-32.

FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. 3. ed. Porto Alegre: Globo, 2001.

FORJAZ, Maria Cecília Spina. Coronelismo, enxada e voto. Revista de Administração de Empresas. v. 18, n. 1, 1978, pp. 105-108.

FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. Aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. São Paulo: Edições Loyola, 1996.

GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. 3. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1999.

GOHN, Maria da Glória. Teoria dos Movimentos Sociais: Paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo: Loyola, 2010.

GRAMSCI, Antonio. Selections form the Prison Notebooks. New York: International Publishers, 1971.

GUERRA, Sidney. Controle de convencionalidade. Revista Jurídica. Curitiba, v. 1, n. 46, pp. 1-21, 2017. Disponível em: <http://revista.unicuritiba.edu.br/index.php/RevJur/article/viewFile/1994/1275> Acesso em: 11 de fevereiro de 2022.

HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 36. ed. São Paulo: Cia das Letras, 1995.

JFSP, Justiça Federal de São Paulo. Ação Penal nº 0011580-69.2012.4.03.6181. 9ª Vara Criminal. Juiz Silvio C. A. Gemaque. DJ 18.06.2021. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/0011580-6920124036181-mpf-obtem.pdf> Acesso em: 02.02.2022.

KOPITTKE, Alberto L. Reforma da Segurança Pública: superar o autoritarismo para vencer a violência. In: SOUSA JUNIOR, José Geraldo de; SILVA FILHO, José Carlos Moreira da; PAIXÃO, Cristiano; FONSECA, Lívia Gimenes Dias da; RAMPIN, Talita Tatiana Dias (org.) O direito achado na rua: introdução crítica à justiça de transição na América Latina. Brasília: UnB, 2015, p. 410-415.

LEAL, Rogério Gesta. Verdade, Memória e Justiça: um debate necessário. Santa Cruz do Sul, EDUNISC, 2012.

MACHADO, Flávia Burlamaqui. As Forças Armadas e o processo de anistia no Brasil (1979-2002). 2006. 133p. Dissertação (Mestrado em História Social). Programa de Pós-Graduação em História Social. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2006.

MANN, Michael. The Social Cohesion of Liberal Democracy. American Sociological Review. v. 35, n. 3, jun. 1970, pp. 423-439.

MEZAROBBA, Glenda. Violência de Estado e Impunidade: Relatório sobre recomendação da CNV a respeito da Lei da Anistia. São Paulo: Friedrich Ebert Stiftung, 2021. Disponível em: <https://vladimirherzog.org/acoes-ivh/violencia-de-estado-e-impunidade-relatorio-lei-da-anistia> Acesso em: 5 de fevereiro de 2022.

MOUFFE, Chantal. Sobre o Político. Trad. Fernando Santos. São Paulo: Editora WWF Martins Fontes, 2015.

MPF, Ministério Público Federal. Crimes da ditadura militar. 2ª Câmara de Coordenação e Revisão Criminal. Brasília: MPF, 2017.

OLIVEIRA, David Barbosa de. (Des)acertos no julgamento da Lei de Anistia de 1979: O Supremo Tribunal Federal e a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre a autoanistia. Revista de Direito Brasileira. São Paulo, v. 19, n. 18, jan./abr. 2018, p. 382-394.

OLIVEIRA, David Barbosa de. Redemocratização e justiça de transição na Argentina e no Peru: Uma análise comparada das leis de anistia e seus julgamentos pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Revista de Direito Brasileira. v. 21, n. 8, set./out. 2018, p. 198-214.

PINTO, Céli Regina Jardim Pinto. Elementos para uma análise de discurso político. Barbarói. n. 24, 2006, pp. 78-109. Disponível em: <https://doi.org/10.17058/barbaroi.v0i0.821> Acesso em: 13 de fevereiro de 2022.

QUINALHA, Renan Honório. Justiça de Transição: contornos do conceito. São Paulo: Outras Expressões, 2013.

SCHWARCZ, Lilia Mortiz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

SILVEIRA, Vladmir Oliveira da; MEYER-PFLUG, Samantha Ribeiro. A Decisão do STF na ADPF 153 (Lei de Anistia). Revista de Direito Brasileira – RDBras. v. 3, n. 2, jul./dez. 2012, p. 451-462.

TELLES, Edson L. de A. Brasil e África do Sul: rupturas e continuidade nas transições políticas. In: SOARES, Inês V. P.; KISHI, Sandra A. S. (coord.). Memória e verdade: A Justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009, pp. 119-134.

TENAGLIA, Mônica; RODRIGUES, Georgete Medleg. Negação, Ocultamento e (falta de) Gestão Documental: o acesso aos arquivos nos relatórios finais das Comissões da Verdade no Brasil. Revista Informação & Informação. V. 25, n. 1, jan./mar. 2020, p. 276-301.

TRF2, Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Carta Testemunhável 0500068-73.2018.4.02.5106. Turma Especial I. rel. Simone Schreiber. DJ 14.08.2019. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/acordao-casa-morte.pdf> Acesso em: 04.02.2022.

WESTIN, Ricardo. O Senado na história do Brasil. Reportagens publicadas pelo Jornal do Senado com base no acervo do Arquivo do Senado Federal. v. 5. Brasília: Senado, 2021.

ZILLI, Marcos. O último tango? In: SOARES, Inês Virgínia Prado; KISHI, Sandra Akemi Shimada (coord.). Memória e verdade: A Justiça de transição no Estado Democrático brasileiro. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009, pp. 93-118.

Downloads

Publicado

25-07-2022

Como Citar

SESTREM, F. C.; VARGAS, H. da S. T.; FLORES, R. F. Limites do discurso político na lei da anistia: Novas perspectivas a partir do controle de convencionalidade. Revista de Ciências do Estado, Belo Horizonte, v. 7, n. 2, p. 1–26, 2022. DOI: 10.35699/2525-8036.2022.38995. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/revice/article/view/e38995. Acesso em: 24 nov. 2024.